Incerteza política aumenta tensão entre grupos étnicos da Crimeia

Não há como ignorar a analogia: assim como os deputados do Parlamento ucraniano estão sendo observados pelos autoproclamados “Defensores da Euromaidan”, também os parlamentares da península da Crimeia tomam suas decisões sob uma vigilância especial. Isso é o que provavelmente imaginaram as “Unidades Russas de Autodefesa da Crimeia” na última quinta-feira (27/02), ao invadirem os prédios do Parlamento e do Conselho de Ministros na capital Crimeia, Simferopol.

Para enorme satisfação dos manifestantes pró-Rússia na capital, no mesmo dia os deputados da assembleia regional decidiram autorizar um referendo sobre a situação da Crimeia no dia 25 de maio, simultaneamente às eleições presidenciais da Ucrânia (posteriormente a data foi antecipada para 30 de março). À noite, homens armados e portando bandeiras russas invadiram os aeroportos de Simferopol e Sevastopol.

Temores russos

A maioria da população na República Autônoma da Crimeia é russa e, desde a recente troca de poder em Kiev, boa parte dela fala de uma conspiração do Ocidente contra o Leste Europeu. O ativista Alexei, de cerca de 50 anos, acredita que ele e seus companheiros precisam defender a “civilização russa” contra os nacionalistas ucranianos.

Ele considera especialmente ameaçador o grupamento ucraniano Setor de Direita, que estava bem ativo na Praça da Independência (Maidan) de Kiev. “Eles dizem que precisam lutar contra nós, russos, e os judeus. Devemos assistir a isso de braços cruzados?”, questiona o ativista.

Muitos dos russos que se reúnem na praça em frente ao Parlamento da Crimeia temem, sobretudo, por seus direitos e por seu idioma – apenas há pouco elevado a língua regional pelo ex-presidente ucraniano Viktor Yanukovytch. “Cresci na antiga União Soviética, minha língua é o russo”, ressalta Dimitri, na faixa dos 30 anos de idade. Ele critica o fato de a nova maioria do Parlamento em Kiev ter anulado a lei do idioma.

Dimitri está convencido de que, com o novo governo ucraniano, não haverá um caminho comum. “Eles estão trazendo o nacionalismo e o caos. Eles tentam gerar a discórdia entre gente de diferentes religiões.”

O que está acontecendo agora na Crimeia é apenas uma reação de defesa, diz. “Quem começou isso foram os três cabeças vazias: o Oleh Tyahnybok [presidente do partido de extrema direita Svoboda], o [primeiro-ministro] Arseniy Yatsenyuk e esse lutador, o Vitali Klitschko [líder do partido pró-europeu Udar]”, opina o manifestante.

Soldados russos ocupam área próxima à fronteira com Ucrânia.

Tártaros contra a independência

Tanto Dimitri quanto Alexei garantem que não há qualquer conflito entre os grupos étnicos da Crimeia. No entanto, as imagens de confrontos entre russos e tártaros, transmitidas pela televisão nesta semana, desmentem a afirmação.

Os tártaros – que o ditador soviético Josef Stalin chegou a extraditar para a Ásia Central, na década de 1940 – respondem por 14% da população da Crimeia. De acordo com Leyla Muslimova, integrante da representação política dos tártaros denominada Medchlis, eles são os únicos povos verdadeiramente originários na península.

Para os tártaros, a elaboração de um referendo para definir a situação da península soa como uma conspiração russa. Eles criticam que o governo em Kiev simplesmente se cale, quando no parlamento em Simferopol pratica-se abertamente o separatismo.

Apoio ucraniano ao Euromaidan

Em contrapartida, os tártaros e os ucranianos parecem estar se dando muito bem. Diferentemente dos russos, que defendem a independência da península, ambos os grupos defendem que a Crimeia continue pertencendo à Ucrânia.

Os ucranianos, porém, são minoria na península. Muitos apoiaram as recentes manifestações pró-europeias em Kiev. Entre eles, Andrei Chekun, coordenador do movimento Euromaidan da Crimeia, que desde o início deu apoio aos protestos na capital ucraniana.

Ele lamenta que grupos pró-russos tenham frequentemente atrapalhado seu movimento. “Fomos chamados de os traidores da Crimeia. Havia vídeos difamatórios sobre a gente, que eram mostrados em estabelecimentos públicos e em ônibus”, conta Chekun em entrevista à Deutsche Welle.

O ativista considera infundado o medo da população de origem russa de que a troca de poder em Kiev possa tirar a autonomia da península. Ele acredita que Moscou está por trás dos últimos distúrbios na península, e que as forças pró-russas na Crimeia se deixaram instrumentalizar pelo Kremlin.

Medo de escalada de violência

Diante dos distúrbios ocorridos nos últimos dias, alguns moradores da Crimeia temem que possam eclodir conflitos armados. “Não descartaria uma guerra neste momento, mas não por causa dos protestos. Isso é tudo cortina de fumaça. Na verdade, a questão aqui são os grandes interesses militares e econômicos”, afirma o advogado Ivan, de idioma russo.

“Não se deve ter receio nenhum. Aqui não haverá guerra, nem separação”, garante uma empresária natural de Kiev. “Com esses truques tipo KGB [antigo serviço de inteligência soviético], Moscou quer garantir a sua base militar no Mar Negro. A Crimeia foi tomada como refém para que Kiev se comporte direitinho.”

 

 Fonte: DW.DE

 

7 Comentários

  1. Senhores.
    vejam este importante documentario da Al Jazeera sobre a inedita operação da ONU que jamais havia enviado um contigente para missão ofensiva e esta delicada decisão foi confiada a um excelente e estrategico general Brasileiro.
    Sob o titulo de O Congo e o General.

    http://www.youtube.com/watch?v=de2Im4rh948 video com legenda em Portugues

  2. O ocidente ,leia-se OTAN, vai por a mão nesse vespeiro ? Bom se não colocarão a mão lá na Síria e nem no Irã vão ter coragem para por a mão no quintal russo. Pensando cá com meus botões o mundo está com sorte, pois se é o George Walker Bush lá na casa Branca eu já estaria estocando comida, se é que isso resolveria alguma coisa em um mundo radioativo.

  3. Do jeito que começou, Putin vai ter que ir até o fim, se nas eleições o Gov eleito não for favorável a Rússia, eles terão que depô-lo, caso contrario só jogarão a Ucrânia no colo da Otan.

  4. Crise na Ucrânia…
    Quem está perdendo e quem está ganhando?

    A curto prazo: USA 1 X 0 Rússia
    A médio prazo: USA ? X ? Rússia
    A longo prazo: USA 1 X 0 ????

    A curto prazo:
    Independente da Ucrânia continuar unida ou se dividir, os EUA já ganharam a partida, que era o enfraquecimento de uma força política multipolar em germinação no mundo.
    Com esse desafio de enfraquecimento ou fortalecimento das fronteiras russas do oeste através de uma maior ou menor participação da Ucrânia na Europa, os russos (Putin) sem querer estão fazendo corretamente o jogo de polarização do Lobo Alfa, no qual ele se fortalece (sua indústria armamentista e dólar – status quo do sistema financeiro capitalista ocidental) e se perpetua inconteste no poder.
    Inclusive, caso surja algum uso de força militar na região, essa partida de poder tradicional não muda, já foi ganha. E os EUA e OTAN vão se limitar a fazer o mínimo, pois o que importa já foi ganho… USA 1 X 0 Multipolaridade.

    Nessa partida o que Putin deveria estar fazendo é justamente nada de nada, deixar que o povo ucraniano se mate se for o caso, e os russos da Criméia que voltem para a Rússia se assim fosse o mais correto e de desejo genuíno deles. Ou seja, não disputar força. Não fazer o jogo de poder tradicional que apenas polariza as coisas.
    Porém, eis Putin fazendo justamente o jogo previsível de poder imediatista. Que beneficia o status quo de poderosos antigos.

    A médio prazo:
    Caso a Ucrânia se divida, teremos uma pró Rússia e outra pró Ocidente ficando o jogo quase equilibrado, contudo com uma leve tendência pró USA pela cabeça de ponte ocidental conquistada.
    Caso a Ucrânia continue unida, isso reforçará os russos, pois certamente que a vontade da parte russa da Ucrânia sairá mais forte dessa crise. Neste caso a balança de dois pratos ucraniana tenderá para os russos.
    Assim, com um sossego político relativo voltando à sociedade ucraniana, o jogo permanecerá num certo banho maria: USA ? X ? Rússia

    A longo prazo:
    A polaridade do Lobo Alfa continuará – com trilhões investidos nas suas indústrias armamentistas e as crises financeiras causadas por descapitalização atingindo de forma intermitente seus concorrentes.
    Ou seja, com o estancamento da atual divisão de poder no mundo neste início do terceiro milênio, vamos nos aprofundar mais ainda num Estado Mundial Policial (com as novas tecnologias de monitoramento em crescente desenvolvimento)…
    A NSA vai dar asas, sem escrúpulos ou contenção, a sua atuação internacional… Com o Lobo amordaçando algum possível rival.
    No fundo a tal Liberdade, Democracia almejada e idealizada sairá perdendo.
    Lobo Alfa 1 X 0 Multipolaridade.
    E o risco de uma possível guerra nuclear devastadora vai se manter, para o rompimento violento dessa polaridade pela força.
    Coisa que agora, neste início de um novo milênio, estava sendo neutralizada, aos poucos, de forma pacífica… fazendo surgir no horizonte as luzes de um mundo democrático e de desenvolvimento e felicidade geral.



    O que já houve até agora e o que ainda vai ocorrer são fatos de capital importância, com reflexo para todos nós.
    Ainda que exista quem fique dando risadinhas desses acontecimentos atuais na Ucrânia e Criméia.
    Onde a diplomacia russa está erroneamente atuando.
    Tudo que as forças financeiras e armamentistas vampirescas querem é justamente lutas e conflitos de força.
    Continuaremos reféns delas.
    Elas devem estar estourando champanhe pelo mundo afora com esses acontecimentos naquele ponto delicado do mundo.

    • Deixar claro, que não sou contra EUA ou Rússia, ou qualquer outro país, quanto a seus povos e tradições culturais.
      Não posso é concordar com estados policialescos travestidos de qualquer sistema político, sejam democráticos ou socialistas.

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