Brexit deixa empresas da Europa de mãos amarradas

Não há Plano B.

É isso o que muitas empresas em toda a Europa têm dito aos investidores desde que o Reino Unido votou a favor de deixar a União Europeia, decisão batizada de Brexit. A saída em si e quando ela deve ocorrer são questões tão incertas, dizem os executivos, que poucas companhias tinham algum plano de contingência, seja para se defender dos efeitos da decisão ou mesmo aproveitar as oportunidades criadas.

“Não posso sequer avaliar os impactos que isso pode ter sobre nós em termos operacionais”, diz Maurizio Focchi, diretor-presidente da Focchi, construtora italiana de controle familiar que obtém cerca de 90% da sua receita no Reino Unido. Em torno de 70% das firmas da Alemanha que participaram de uma pesquisa da Federação das Indústrias Alemãs (BDI), antes da votação, afirmaram não saber como reagiriam a uma eventual Brexit.

A empresa de telecomunicações Vodafone Group PLC afirma que a decisão significa que ela pode ter que transferir sua sede, hoje em Newbury, na Inglaterra, para algum outro lugar na Europa. Ou talvez não. Ainda “não é possível tirar nenhuma conclusão firme”, afirmou a empresa na semana passada.

“Minha mensagem para os meus investidores”, diz Michael O’Leary, diretor-presidente da Ryanair Holdings PLC, a maior companhia aérea da Europa por número de passageiros transportados, “é não me pergunte o que isso significa porque nós não sabemos”.

Qualquer eleição importante traz incerteza para os negócios. Mas nenhuma, nos últimos anos, gerou tantas incertezas para as empresas, envolvendo uma gama tão grande de setores e regiões, quanto o referendo do mês passado no Reino Unido. No curto prazo, pelo menos, o resultado paralisou planos de investimento no continente afora.

As negociações sobre como o Reino Unido vai se separar da UE podem durar até dois anos e não devem começar antes de 2017. As conversas podem manter o “status quo”ou mudar radicalmente a relação do Reino Unido com o mercado comum europeu.

A Cie. de Saint-Gobain SA, fabricante francesa de materiais de construção com forte presença no Reino Unido, não fez planos para uma possível Brexit porque a hora e o escopo de qualquer impacto são impossíveis de prever, diz o diretor-presidente, Pierre-André de Chalendar.

Enquanto muitas grandes companhias se opuseram à Brexit, vários donos de pequenos negócios britânicos disseram que uma ruptura com a UE permitiria que eles prosperassem livres das regras do bloco.

Emma Pullen, diretora-presidente da British Hovercraft Co., fabricante de pequenos barcos infláveis na Inglaterra, diz que há incertezas imediatas, mas que o resultado da votação foi uma grande notícia no longo prazo.

Nos dias seguintes ao referendo, nenhum setor fora do mercado financeiro enfrentou tantas turbulências quando o das companhias aéreas.

Mais de 70% dos voos que decolam e pousam nos aeroportos britânicos são internacionais, com uma média de 53% deles destinados a outros países da UE, diz o consultor Oliver Wyman.

A irlandesa Ryanair e rivais com grandes centros de operação no Reino Unido, como a International Consolidated Airlines Group AS, que controla a British Airways, estão particularmente vulneráveis.

Os investidores vêm castigando o setor. Ontem, as ações da Ryanair acumulavam queda de 18,3% desde 23 de junho, dia do referendo. No caso da IAG, o recuo foi de 28,3%.

A queda atual da libra esterlina ameaça elevar os custos de novas aeronaves e do querosene de aviação, que geralmente são negociados em dólar. A maioria das companhias aéreas faz operações de hedge para se proteger de oscilações cambiais, mas isso só vai adiar as perdas se a libra continuar se desvalorizando.

A maior preocupação do setor no longo prazo é como a separação pode afetar anos de trabalho para harmonizar as regras e regulações da aviação civil no bloco.

O’Leary, que lidera a Ryanair desde 1994, considerou o resultado do referendo britânico o pior choque enfrentado pelo setor desde os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001.

Segundo ele, a questão dos futuros direitos de tráfego aéreo — onde e com qual frequência os aviões da Ryanair podem pousar nos aeroportos britânicos — é uma grande incerteza. Isso inviabiliza os planos de expansão no Reino Unido. Logo após a votação, ele disse ser improvável que a Ryanair use no Reino Unido algum dos 50 novos jatos que a firma deve colocar em operação no próximo ano.

Na easyJet, a diretora-presidente, Carolyn McCall, tinha um Plano B um pouco mais detalhado. A empresa britânica centraliza suas operações no pequeno aeroporto de Luton, a cerca de uma hora de Londres, e cerca de 43% dos seus voos vão e vêm de outros países.

Na manhã seguinte ao referendo, ela falou com sua equipe e fez ligações a investidores. Ela tinha redigido previamente cartas para serem enviadas aos reguladores do setor aéreo no Reino Unido e na Europa, pedindo que eles elaborassem rapidamente as novas regulações que a Brexit exigiria.

Minutos depois de o primeiro-ministro britânico, David Cameron, anunciar que planeja deixar o cargo, McCall divulgou um comunicado com o objetivo de tranquilizar os investidores.

Já a IAG tomou uma iniciativa mais drástica. Antes da votação, seu diretor-presidente, Willie Walsh, tinha evitado posicionar publicamente a empresa sobre o referendo. Privadamente, porém, ele disse que a Brexit seria ruim para as empresas em geral, mas não afetaria as operações da IAG substancialmente.

Isso mudou no dia 24 de junho, quando a empresa anunciou que seus resultados poderiam ficar bem aquém das estimativas, já que as viagens de negócios, uma das suas principais fontes de lucros, tiveram uma queda considerável à medida que o referendo se aproximava.

Robert Wall

Manuela Mesco / Inti Landauro / Alex MacDonald

Imagem: Plano Brasil

Fonte: The Wall Street Journal

1 Comentário

  1. O Mercado sempre se adapta e com o brexit, nao sera diferente… quem esta reclamando, parece que tinha acordos demais com governos…

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