Combatendo de perto e de longe

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É possível que o EI esteja lançando ataques no exterior por ter sido debilitado em seu território; mas não será fácil vencê-lo

“Resistir e expandir”: o sonoro lema do Estado Islâmico (EI) não faz menção à sanha destrutiva do grupo, mas, tirando isso, sintetiza bastante bem suas ambições. Se nos últimos tempos o EI parece mais ocupado em resistir, sua história mostra que o grupo nunca perdeu de vista o objetivo de se expandir de todas as formas possíveis: conquistando território, criando ramificações por toda parte, inspirando novos recrutas e espalhando o medo. Como controla recursos escassos e não tem aliados propriamente ditos, o grupo precisa ser um alvo sempre em movimento.

Não está claro em que medida as recentes incursões fora do território que o EI tomou da Síria e do Iraque sinalizam uma mudança de curso. Faz algum tempo que seus diversos afiliados – cerca de 36 grupos espalhados pelo mundo já declararam lealdade a Abu Bakr al-Baghdadi, o misterioso califa do EI – vêm realizando atentados terroristas. Segundo levantamento recente do New York Times, é possível que, com suas ações no Iêmen, na Tunísia, em Ancara e em Beirute, essas ramificações do EI tenham provocado a morte de mil civis de janeiro até agora – não foram computadas as vítimas dos massacres executados pelo Boko Haram na Nigéria.

O grupo também tem incentivado aspirantes a terroristas que compartilham de sua ideologia a empreender ações individuais, por conta própria. Mas o número de mortes nas últimas semanas parece colocar as coisas num novo patamar.

Pode ter sido por coincidência que planos envolvendo o assassinato de centenas de pessoas em Paris, a explosão de um avião sobre o Sinai e mortes indiscriminadas nas ruas de Beirute tenham sido executados em tão curto intervalo de tempo. Nada impede que essas ações estivessem sendo planejadas há meses e tentativas similares podem ter sido frustradas antes. Mas também é possível que elas façam parte de uma reação calculada aos desafios que o EI atualmente enfrenta para manter seu território.

Baixas. Fontes do Pentágono dizem que os ataques aéreos da coalizão internacional liderada pelos Estados Unidos mataram 20 mil homens do EI em 14 meses. Parece uma avaliação excessivamente otimista da operação iniciada em agosto de 2014. Mas é verdade que entre os mortos havia vários comandantes. Acredita-se que os combates intensos travados em Kobani, enclave curdo no norte da Síria que as tropas do EI sitiaram em setembro de 2014, para serem por fim repelidas sob pesados ataques aéreos, três meses depois, tenham custado 2 mil homens ao grupo.

Um dissidente do EI disse ao jornalista americano Michael Weiss que as perdas correspondem ao dobro disso, no mínimo, e controles mais rígidos na fronteira da Turquia fizeram com que o EI passasse a ter dificuldade para repor os combatentes mortos. O dissidente disse também que foi em resposta a essa nova situação que o grupo passou a organizar atentados contra o inimigo “distante”. Ações únicas e dramáticas têm imenso efeito multiplicador em termos de propaganda.

Perdas tão grandes quanto as que o EI sofreu em Kobani são um revés, sem dúvida; mas, infelizmente, não chegam a constituir um golpe fatal. As estimativas sobre o tamanho das tropas sob comando do EI vão de 30 mil (segundo a CIA) a 100 mil homens (segundo com o iraquiano Hisham al-Hashimi, um especialista em segurança). Hashimi calcula que aproximadamente 20% desses combatentes sejam estrangeiros – porcentual similar ao mencionado em documentos da ONU.

É preciso levar em conta, também, o fato de que as forças do EI dão mostras de ser militarmente muito mais eficientes do que as tropas que os enfrentam. Em abril, para derrotar um contingente de mil combatentes do EI e retomar a cidade iraquiana de Tikrit, foi preciso mobilizar 30 mil homens, entre soldados do Exército iraquiano e milicianos xiitas. Ao capturar Ramadi, também no Iraque, o EI tinha um combatente para cada dez soldados das tropas que defendiam a cidade.

Táticas. Parte da vantagem das tropas do EI é consequência, sem dúvida, da disposição para recorrer a táticas camicases, mas as forças do grupo também são criativas, bem treinadas e comandadas com mais competência do que muitos de seus adversários. Em abril, o EI usou um drone para registrar a tomada de uma refinaria de petróleo. Depois, o vídeo foi postado na internet.

Um ex-boina verde americano, citado pela agência de notícias McClatchy, disse que os combatentes do grupo demonstram “confiança e compostura tática: movimentam-se corretamente, guardam intervalos, têm disciplina na hora de efetuar disparos”.

Combater bem não é suficiente. Apesar do bom desempenho de seus combatentes, o EI vem perdendo terreno, em grande parte porque seus adversários dispõem de poderio aéreo. Forças curdas capturaram Sinjar, no Iraque, junto com uma área contígua, em território sírio. E há outras regiões do Iraque em que as tropas do EI também estão sendo obrigadas a recuar.

Com o auxílio de aeronaves russas e de milícias apoiadas pelo Irã, as forças do governo sírio recentemente romperam o cerco que havia muito tempo o EI fazia a uma base aérea nas proximidades de Alepo. Depois da morte de 224 russos no atentado contra o avião da Metrojet, no dia 31, é possível que a Rússia tenha passado a concentrar seus ataques no EI, poupando os outros inimigos do regime de Bashar Assad.

Apesar disso, o EI resiste. A bem da verdade, seu território continua sendo uma das áreas mais seguras da Síria: autoridades turcas envolvidas na organização da ajuda humanitária dizem que entre setembro e outubro 70 mil civis, provenientes da província de Homs, buscaram refúgio no EI.

Os bombardeios que as forças da coalizão internacional lançam contra o califado são muito menos indiscriminados do que os executados pelas forças aéreas russas e sírias em outras regiões. Além disso, os alimentos são mais baratos e o EI impõe a obediência a um arremedo de Justiça. Há também uma economia em funcionamento, graças, em larga medida, a 20 mil ou 30 mil barris de petróleo que, calcula-se, são extraídos de campos petrolíferos capturados no Leste da Síria e no Norte do Iraque.

A dependência em relação às receitas do petróleo – que somam cerca de US$ 50 milhões por mês, segundo reportagem investigativa conduzida pelo Financial Times – é só um dos aspectos que fazem o EI parecer mais uma ditadura árabe ao velho estilo do que uma nova Utopia Islâmica. Seus líderes dão esmolas aos pobres em troca de obediência absoluta. Estimulam um culto personalista em torno da figura de Baghdadi. Produzem pomposas peças de propaganda sobre pontes reformadas e escolas recentemente inauguradas. Como todas as bem-sucedidas autocracias da região, o EI criou vários órgãos de segurança, estimulando a desconfiança mútua, a fim de se precaver contra golpes.

Reação. Depois dos atentados de Paris, tudo aponta para a implementação de ações militares destinadas a privar o EI de sua base territorial. Os recursos do grupo, mesmo que mobilizados ao máximo, não seriam suficientes para constituir senão uma força nanica perto do poder de fogo de seus adversários.

Em entrevista à BBC, o chefe de segurança do Curdistão iraquiano disse que, havendo a disposição necessária, a coisa pode ser resolvida em questão de meses, ou mesmo semanas. A França já intensificou seus ataques aéreos e a Rússia, agora empregando bombardeiros de maior porte, diz que dobrará o número de missões diárias.

Os caças americanos estão atacando novos alvos na infraestrutura petrolífera do grupo. Ações recentes, precedidas de alertas à população civil, destruíram centenas de caminhões-tanque.

Sob tamanha pressão, a área controlada pelo EI deve encolher. Mas a tomada de cidades grandes, como Raqqa e Mossul, exigirá uma mobilização de tropas muito maior. E, como mostram Sinjar e Kobani, o custo será alto: as duas cidades ficaram em ruínas. Além disso, por maior que seja o desafio diplomático e militar de mobilizar, motivar, coordenar e colocar em ação forças suficientes, a questão não se resume a isso. Há também o aspecto humanitário. Uma campanha militar desse tipo provavelmente resultará na fuga de um número ainda maior de refugiados, aos quais não restará, depois, muito para o que voltar.

As potências ocidentais e a Rússia não se mostram inclinadas a enviar tropas para a região. Sua disposição para, num momento seguinte, controlar um território arrasado e provavelmente hostil é ainda menor. As forças iraquianas estão sobrecarregadas e não inspiram confiança em muitos dos sunitas que elas libertariam. Muitos preferem viver sob o domínio do EI do que se submeter ao comando de milícias xiitas.

Além de sobrecarregadas e exauridas, as forças sírias devem lealdade a um regime responsável por crimes de guerra. Atores regionais importantes, como iranianos, turcos, curdos e sauditas cultivam uma série de objetivos conflitantes. E a eliminação do EI não é prioridade para nenhum deles. No entanto, certos avanços não dependem da presença de soldados nas ruas de Raqqa. Ações policiais mais eficientes podem ajudar – e já vêm produzindo resultados na Turquia, onde, nas últimas semanas, foram desbaratadas diversas células terroristas.

Melhorar o planejamento e a coordenação entre as forças que combatem o EI também seria proveitoso. É preciso construir confiança, lamentavelmente ausente no momento.

Ideias. Derrotar militarmente o pretenso califado acabaria com a aura de invencibilidade que é responsável por boa parte do poder de atração do grupo. Mas, enquanto existir o pântano pestilento em que ele aflorou, outros grupos – e o que é pior, sua própria ideologia – resistirão. Uma lista parcial dos ingredientes que alimentam esse atoleiro inclui o exagerado senso de vitimização prevalecente entre os sunitas, a doutrinação promovida por wahabistas xenófobos, a anomia e o anseio de heroísmo que lamentavelmente proliferam entre alguns grupos urbanos de jovens muçulmanos na Europa e em outras paragens e o ódio gerado por regimes brutais e opressores como o da Síria.

Essas águas pútridas inundam a faixa de países convulsionados ou cujo sistema político entrou em colapso que se estende da Argélia ao Paquistão. Sol quente e artilharia pesada não serão suficientes para fazer secar o lodaçal./TRADUÇÃO DE ALEXANDRE HUBNER 

© 2015 THE ECONOMIST NEWSPAPER LIMITED. DIREITOS RESERVADOS. PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS ESTÁ EM WWW.ECONOMIST.COM

Fonte: Estadão

1 Comentário

  1. “FBI incentivou atos terroristas em operações infiltradas

    O FBI encorajou e até mesmo pagou muçulmanos americanos para incitá-los a cometer atentados durante operações infiltradas, montadas depois dos atentados do 11 de setembro, segundo um relatório da ONG Human Rights Watch (HRW) divulgado nesta segunda-feira.Em muitos dos 500 casos de terrorismo analisados por tribunais americanos desde 2001, “a promotoria americana e o FBI tiveram como objetivo muçulmanos americanos em operações clandestinas de contraterrorismo abusivas, baseadas na condições religiosa ou étnica”, denuncia o informe da HRW.A conceituada organização estudou 27 casos, com a ajuda da Escola de Direito da Universidade da Columbia. Foram examinados os processos de investigação, acusação e as condições de prisão de dezenas de pessoas. Foram compilados 215 testemunhos, entre acusados, processados, advogados, juízes e promotores.“Em alguns casos, o FBI pode ter criado terroristas a partir de pessoas que respeitavam a lei, ao sugerir a ideia de realizar ações terroristas ou ao encorajar o alvo a agir”, diz o texto, que considera que metade das condenações são resultado de operações infiltradas. Em 30% dessas situações, o agente infiltrado joga um papel ativo na tentativa de atentado.“Muitas das pessoas nunca teriam cometido um crime, se as forças de ordem não as tivessem estimulado, impulsionado e até mesmo pago, para cometer atos terroristas”, explicou Andrea Prasow, uma das autoras do trabalho.O relatório cita o caso de quatro indivíduos de Newburgh (Estado de Nova York) acusados de ter planejado atentados contra sinagogas e uma base militar americana. De acordo com o juiz do caso, o governo “proporcionou a ideia do crime, os meios e lhes abriu o caminho”, transformando em “terroristas” pessoas “de uma bufonaria digna de Shakespeare”.Segundo a ONG, o FBI busca pessoas vulneráveis, com problemas mentais ou intelectuais. Outro do caso apresentado é de Rezwan Ferdaus, de 27 anos, condenado a 17 anos de prisão por pretender atacar o Pentágono com pequenos drones carregados de explosivos. Um agente do FBI reconheceu que Fergus apresentava “claramente” problemas mentais, mas que isso não impediu o policial infiltrado de planejar o atentado.”

    o uso intencional e indiscriminado destes drones sobre populações civis do oriente médio senhores tem como objetivo inflamar a região…insuflar caos, desestabilizações e perturbações…mas principalmente por o mundo contra o oriente médio e vive versa…para criarem o cenário que querem e terem justificativas convincentes para suas movimentações obscuras…por trás disso tudo esta uma guerra velada e de quarta geração do ocidente para conter os Brics em especial Russos e Chineses…impedir aproximações e estabelecimento de relações dos Russos e Chineses com países estratégicos da região como Iran e Síria…os Brics representam ameaça ao ocidente pois atualmente se expandem principalmente pelo o oriente médio e atlântico sul estabelecendo acordos econômicos e estratégicos com os países das regiões…tomando assim áreas de mercados e influencia desta gente pelo o mundo…fazendo-o perder força para este bloco rival e ameaça a sua hegemonia que se constitui hoje os Brics…

    orquestrar um ataque de falsa bandeira como fizeram no 11 de setembro foi uma excelente estratégia para conquistar as mentes e os corações das massas e assim conseguir desculpas para poder grampear telefones, e-mail’s, fax, celulares fixos, telefones móveis, redes sociais, torturar pessoas, invadir outros países e obter informações privilegiadas….Tudo em nome da “SEGURANÇA NACIONAL”…tratam-se senhores de atos perpetrados pelo próprio governo estadunidense para acusar inimigos externos, assim justificando guerras, invasões, repressão militar, revoluções, prisões, cerceamento das liberdades civis…

    SENHORES….vcs já repararam que estes “grupos terroristas” El e Boko Haran nunca realizaram um único ataque contra o estado/povo judeu até hoje?!..qual sempre é o primeiro/principal alvo de qualquer grupo terrorista fundamentalista islâmico?!….rs….

    não se enganem senhores…muito destes grupos terroristas de hoje como o EL e o boko haram não passam de mercenários teleguiados da cia….não lutam por causa alguma e sim para inflamar e instaurar a instabilidade na região…sabotar governos locais que busquem aproximações com os Brics…com nações rivais dos EUA hoje como a China e a Rússia…ingênuos ou alienados aqueles que acham que os eua são os defensores da liberdade e da democracia, vide o estado que se encontra países como líbia, Afeganistão, Iraque entre outros…

    Inúmeras guerras têm sido travadas pelos eua diretamente e por mãos alheias…as forças especiais dos eua operam de forma sigilosa e aberta em mais de 130 países semeando perturbações…

    os eua são hoje os principais fomentadores, financiadores e promotores do terrorismo pelo mundo…são eles que estão por trás das principais ações terroristas da atualidade…

    A cultura ocidental não apedreja por questões religiosas…Mas bombardeia, tortura ou mata por poder e questões econômicas…Neste caso as pessoas acham normal e algumas até aplaudem…

    https://www.youtube.com/watch?v=rKJqraGls_A

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