EVASÃO DE OFICIAIS DAS FORÇAS ARMADAS

militarForças Armadas: 249 oficiais se demitiram no ano passado. Neste ano, até julho, foram 162. O que é que está acontecendo?

Por Marco Antonio Esteves Balbi (*)

No dia 6 de agosto passado este blog publicou o post “Baixos salários fazem o Exército perder oficiais – inclusive majores e capitães“.

Gostaria de compartilhar com os leitores do blog alguns dados a mais, ampliando um pouco a pesquisa para as demais Forças Armadas. Infelizmente vou me restringir aos oficiais, uma vez que os dados referentes aos graduados são divulgados em outras publicações de acesso mais restrito.

Computados os números disponíveis no Diário Oficial da União até 31 de julho deste ano, 162 oficiais se demitiram das Forças Armadas. Para efeito de comparação este número, referente a 7 meses, é superior ao total dos anos de 2007 (152), 2011 (153) e aproxima-se do ano de 2009 (180).

No ano passado 249 oficiais se demitiram das Forças Armadas.

A predominância recai sobre os postos de capitães e tenentes; e os oficiais engenheiros e dos quadros de saúde e intendência superam aqueles dos quadros operacionais, em todas as três Forças Armadas. A evasão ocorre, pois, nos postos mais baixos da carreira e incide nas qualificações mais demandadas no atual mercado de trabalho – engenharia, medicina e logística.

Remuneração não é o único fator

Uma explicação simplista poderia considerar o fator remuneração como o preponderante, uma vez que a demissão deveu-se, em sua grande maioria, por aprovação em concurso público para ocupar cargo que provavelmente pague melhor.

Tal fato não é uma verdade absoluta. Conheço casos de oficiais que se demitiram até mesmo para perceber menor vencimento, mas sem os ônus que a profissão militar requer, como por exemplo a dedicação exclusiva.

Não sei se é do conhecimento geral, mas sempre é bom ressaltar que a profissão militar é sideral, ou seja, permanece-se 24 horas por dia, 365 dias ao ano completamente à disposição da organização militar. O expediente é uma mera referência. As horas do serviço de escala regular, as horas das missões de rotina ou inopinadas, as horas dos exercícios em campanha todas compõem o dia a dia do militar, sem que este perceba qualquer adicional no contracheque.

Certamente, ninguém adere às Forças Armadas pensando em ficar rico. Outros fatores e motivações levam o jovem a passar até cinco anos interno em instituições de ensino, preparando-se para o oficialato.

Por certo, uma das principais emulações será a possibilidade de interação com seus pares, superiores e subordinados, num exercício diário de convivência baseada na disciplina e na hierarquia. Nesse ambiente de sadia camaradagem nasce a liderança que se irá exercer, em sua plenitude, numa situação real de atuação como fração ou unidade constituída.

Falta de recursos leva à realização de simulações e não de exercícios no terreno

A disponibilidade de material de emprego militar atualizado é outro fator crucial para o profissional motivar-se. Com o passar dos anos, torna-se difícil manter o material em condições plenas de uso, obrigando, por vezes, à canibalização. O recente exemplo dos caças ilustra bem a situação.

A realização dos exercícios de adestramento cumprem papel preponderante na combinação adequada homem-máquina, exigindo a aplicação de todo o cabedal de conhecimentos adquiridos. Nos últimos anos a descontinuidade das previsões orçamentárias dificultam em muito a realização plena dessas atividades.

Os seguidos contingenciamentos anuais do orçamento prejudicam até mesmo as mais comezinhas atividades administrativas das organizações militares. Nem sempre é possível realizar os exercícios de adestramento previstos, pois exigem deslocamentos para os campos de instrução e nem sempre o combustível está disponível e a munição é escassa.

Assim, muito tem se investido em manobras na carta, realizadas pelos quadros, e na aquisição de equipamentos de simulação, como forma de compensar a não realização de exercícios no terreno.

Obsolescência do material: ainda usamos fuzis do começo da década de 60 e canhões da Guerra da Coreia (1950-1953)

A obsolescência do material de emprego militar também avança a passos largos, até devido à rápida evolução tecnológica hoje existente no mundo. O armamento básico do combatente do Exército ainda é o fuzil automático leve, desenvolvido no início da década de 60 do século passado. Muitas unidades ainda estão dotadas de canhões e obuses utilizados na Guerra da Coreia.

Os Institutos de Pesquisa das Forças Armadas sofrem restrições orçamentárias que descontinuam estudos e projetos e frustram engenheiros e técnicos de alta qualificação formados nos reconhecidos IME e ITA. Assim, perde-se a massa crítica necessária e indispensável para pesquisar e desenvolver as ações nessa área crítica.

Por último, mas não menos importante, ressalte-se o suporte social que a família do militar deve receber, em face das características já citadas da profissão, particularmente no aspecto da saúde, com o funcionamento em boas condições das organizações militares responsáveis pela prestação desse serviço.

Infelizmente, a Lei de Remuneração dos Militares em vigor, remetida como medida provisória para o Congresso Nacional em 2001, e até hoje não votada, promoveu alteração fundamental quando da passagem do militar para a reserva, que contribuiu bastante para a tomada da decisão de deixar as Forças antes do tempo, abandonando-a ao menor sinal de falta de opção profissional, ou maiores desafios na carreira.

O que se pode fazer para minorar a situação atual e tentar reverter o quadro de evasão de oficiais

A legislação anterior contemplava o militar que passasse para a reserva com o soldo referente ao posto ou graduação acima da qual ele se encontrava no momento. Entendeu o legislador, quando estabeleceu a premissa, que características tais como risco de vida, dedicação exclusiva, disponibilidade permanente, mudança frequente de domicílio, vínculo com a profissão, formação específica e aperfeiçoamento constante e a sujeição absoluta aos princípios da hierarquia e da disciplina justificariam plenamente a norma.

Assim, para minorar a situação atual e tentar reverter o quadro de evasão, sugiro que o orçamento das Forças Armadas fique livre dos contingenciamentos e que os diversos projetos de modernização já elaborados e orçados, alguns até iniciados, não sofram restrições orçamentárias. E, que a Lei de Remuneração dos Militares seja discutida e votada pelo Congresso Nacional, preferencialmente recuperando a situação para a passagem para a inatividade.

Para finalizar quero afirmar a importância de se considerar a situação das praças, dos graduados.

Por certo o número de demissões é, também, significativo. A imagem estereotipada do sargento bronco e rude, não condiz com a realidade. Jovens muito bem preparados concorrem em grande número às vagas anualmente disponíveis nas escolas de formação de sargentos.

Concluído o curso, vão servir nas organizações militares onde cumprem papel importante na estrutura das Forças e sofrem as mesmas vicissitudes e dificuldades que os oficiais. Os sargentos são os responsáveis, muitas das vezes, por operarem e manutenirem equipamentos de grande sofisticação tecnológica e altamente custosos.

(*) Marco Antonio Esteves Balbi é Coronel Reformado do Exército Brasileiro

Fonte: Coluna do Ricardo Setti, Veja, Política & Cia, 16/08/2013

Em tempo, acesse e leia também as seguintes matérias:

22/07/2012: O DESABAFO DE UM CAPITÃO DO EXÉRCITO BRASILEIRO

18/06/2012: FORÇAS ARMADAS DO BRASIL: TREINADOS, ARMADOS E MAL PAGOS

 

13 Comentários

  1. Se não tem aptidão , não tem uma Emoção Pátria , se resmunga de tudo, de equipamentos, de rancho, de manobra, de jornada de serviço, de salários , ainda que tudo não satisfatório é melhor cair fora mesmo .
    Prefiro que um cidadão ocupe outra função no país o qual também pode ser útil do que ficar ali atrás do carreirismo e sem competência alguma, um marionete de político, um marionete de estrangeiro ou um marionete do diabo, ou tudo junto na verdade.

    http://www.youtube.com/watch?v=Bzngn8_7oRc

    http://www.planobrazil.com/como-fazer-uma-general/

  2. O revanchismo silencioso, esta desconstruindo seculos de empenho das forças armadas, do qual devemos muito ate hoje.

    Basta ver que a unica parte concluida, com economia de custos, da trasp. do rio São Francisco, foi a tocada pela engenharia do exercito.
    As demais frentes de trabalho, humf, alem de superfaturadas, estão inacabadas, atrasadas, e ficaram uma merda.

    • hmm… engenharia, medicina e logística

      justamente os melhores setores!

      Dentro ganha X, quando sai ganha 5X.

      Mesmo com recursos excassos priorizaram e priorizam a educação! 😉

    • Ups, o comentario nao era como adendo!.. O adendo é:

      Todos sabem da capacidade do exercito! A sociedade tem plena certeza de que se o exercito for encarregado vai ser concluida a obra. Por isto quando querem bem feito sem lhenga-lhenga o proprio governo quando pretende mostrar algo pronto chama o exercito.

      Aqui perto dá pra notar! O asfalto que o exercito fez é 4 vezes mais grosso que o da construtora civil!… Bem lisinho!… Até agora não apresentou buracos, rachaduras nem nada!…

    • Não tenho como não lhe dar razão, amigo… triste fim de nossas valorosas FA’s… fruto de décadas de influencia maligna da esquerda apátrida… no lugar irão construir uma força de manutenção política com finalidade de perpetuação no poder, a tal força nacional melancia…

  3. Putz…Quando fui soldado ganhava 1/3 do salario minimo o que não dava nem para eu pagar o transporte urbano para me deslocar para a unidade.
    Jamais reclamei.
    Hoje so tem chorões.Todos neste pais querem ganharem bem,ter regalias e ralar o menos possivel.
    Querem melhor salario estudem e se capacitem para uma profissão melhor.
    Tem muita gente que queria ter uma oportunidade e não tem e ainda tem aqueles que quando são solicitados para alguma coisa reclamam dizendo que não é função deles.
    Querem status e regalias de militares mas querem ser come-dorme.
    Militar é a profissão que deve ter a capacidade de desempenhar qualquer uma outra e não so um mocorrongo que reclama ate de exercicios e treinamentos.
    Pede pra sair.

  4. Xiii esse problema já é velho conhecido, já existe a mais de uma década. Também pudera, ninguém aguenta mais de 10 anos sem reajuste, ai quebra qualquer um mesmo. O que não falta são artigos reproduzidos ad nauseam sobre o assunto. Aliás, de certa forma é culpa do próprio Exército, vitimas da própria competência, fizeram sua parte, dar o treinamento e a educação, já o estado… Eu mesmo tenho vários colegas que fazem UFJF comigo, tudo do Colégio Militar, o nível do ensino de lá é sem comparação.

  5. Para essa informação deixar de ser um panfleto oposicionista e se tornar um assunto sério a ser considerado, aqueles que o trouxeram deveriam trazer para analise uma estatística feita em diversos anos dentro das Faz.
    Fui durante muitos anos militar da Força Aérea, e naquele tempo muitos oficiais optavam pela carreira civil onde os ganhos eram muito mais atraentes.
    Não é novidade as forças armadas remunerarem menos que a iniciativa privada, nem por isso tivemos a extinção das FAs. Sempre sobrarão brasileiros dispostos a seguir na carreira militar, que oferece outros atributos além de um salário bem acima da média da população brasileira.
    Melhorar é preciso, mas o Brasil precisa de muitas coisas que foram sendo negadas a maioria dos cidadãos, inclusive no período em que havia ditadura militar.

  6. E também gostaria de atentar a um fato curioso que diz um pouco sobre os recursos humanos e principalmente materiais do serviço de saúde nas forças armadas: Até onde eu saiba quase todos os oficias do quadro de sáude tem plano de saúde civil , notadamente UNIMED

  7. Enquanto não acabarem com o comunismo nas forças armadas brasileiras elas continuaram perdendo os melhores profissionais. É absurdo querer pagar o mesmo salário para um Major astronauta e um intendente. A mesma remuneração para um sargento especialista em eletrônica de caça e um infante. O militar deve ganhar mais que um civil (considerado o possível custo de moradia e alimentação fornecidos pelas forças e a aposentadoria especial) para a realização do mesmo trabalho, pelo simples fato de ser militar, e, por isso, ter uma série de restrições e perda de direitos civis, bem como, uma série de obrigações, que pode comprometer a própria vida.

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