Quem são os ‘homens de verde’ que assustam a Ucrânia?

Steven Rosenberg

BBC News, Donetsk

‘Na verdade, não existe uma nacionalidade ucraniana. Isso é uma invenção do Império Austro-Húngaro’, disse um dos ‘homens de verde’

Apoiando-se em sua bengala, Nikolai parou perto do prédio da administração municipal em Konstantinovka, balançando a cabeça em desaprovação.

Homens mascarados vestindo uniformes de camuflagem haviam ocupado o prédio e estavam vigiando a entrada. Enquanto isso, cantarolando uma canção pop cuja letra fala sobre a antiga União Soviética, militantes pró-Rússia construíam barreiras com blocos de concreto e sacos de areia.

Na antiga URSS, Nikolai havia trabalhado para a inteligência militar soviética. Ele está convencido de que os homens armados que ele observa agora são russos.

“Fui falar com eles”, contou. Tinham rifles automáticos russos de última linha. “Não acredito que vocês sejam ucranianos. Vocês são da Rússia, da Inteligência Militar. Não vão me enganar, também sou desse sistema”.

“‘Ah, ninguém engana um lobo velho, não é?’ – respondeu um deles”.

Nikolai disse não ter dúvidas. “Tenho certeza de que foram mandados para cá e estão sendo pagos para semear revoltas e calamidades”.

‘Invenção’ Ucrânia

Perguntei a um dos “homens de verde” armados de onde ele vinha.

“Ucrânia”, ele respondeu. Depois, sorriu. “Na verdade, não existe uma nacionalidade ucraniana. Isso é uma invenção do Império Austro-Húngaro. Somos russos e essa terra não é Ucrânia, é Nova Rússia. E vamos defendê-la”.

A 30 km dali, em Kramatorsk, militantes pró-Rússia também ocuparam o prédio da administração local. Dentro, encontrei Vadim Ilovaisky.

Ele se apresentou como o novo “comandante militar” da cidade.

Estava sentado, vestindo uniforme, no escritório do vice-prefeito, estudando mapas da região (o vice-prefeito, ele informou, estava adoentado). O comandante militar apontou para um aquário no canto da sala e me garantiu que estava cuidando bem dos peixes do vice-prefeito.

Perguntei a Vadim de onde ele vinha. “Sou cossaco” (povo nativo das estepes das regiões do sudeste da Europa, principalmente da Ucrânia e do sul da Rússia), respondeu. “Meu avô e meu bisavô eram de Stavropol” (sul da Rússia).

“Na minha vida civil, sou um consultor de relações públicas. Mas como comandante cossaco, participei da campanha na Crimeia. Sou um cidadão da Ucrânia”.

Quando perguntei onde ele mora agora, foi evasivo. “Minha casa é o prédio onde estou sentado agora”.

‘Conversas gravadas’

Assim como Nikolai, o veterano da inteligência militar russa que encontrei em Konstantinovka, o Ocidente também está convencido de que existe um vínculo direto entre Moscou e a milícia pró-Rússia que vem ocupando prédios governamentais e delegacias de polícia, com impunidade, no leste da Ucrânia.

Segundo o site americano de notícias Daily Beast, em uma reunião recente, a portas fechadas, nos Estados Unidos, o secretário de Estado John Kerry revelou que os Estados Unidos haviam obtido “conversas gravadas de agentes da inteligência (na Ucrânia) recebendo ordens de Moscou”

Washington já tinha acusado a Rússia de continuar “a financiar, coordenar e alimentar um forte movimento separatista” na Ucrânia.

O governo ucraniano alega que o líder dos militantes pró-Rússia no leste da Ucrânia – Igor Strelkov – é um militar russo. Kiev diz que seu nome verdadeiro é Igor Girkin e que ele é de Moscou.

Ele é um entre 15 indivíduos que estão sendo alvo de sanções anunciadas nesta semana pela União Europeia. E foi identificado como “funcionário” do principal órgão de inteligência das Forças Armadas da Federação Russa (GRU).

Em uma entrevista para o tabloide russo Komsomolskaya Pravda no último fim de semana, o comandante “Strelkov” disse que “mais de a metade, ou talvez dois terços, de suas forças” são ucranianos.

“Muitos têm experiência em batalhas, muitos lutaram no Exército russo”.

Poder em Desintegração

A Rússia nega ter tropas ou agentes em operação na Ucrânia. Moscou insiste que as milícias e as “forças de autodefesa” que emergiram no leste da Ucrânia são demonstrações espontâneas do poder do povo, e que sua origem está no temor da população em relação aos “fascistas” que tomaram o poder em Kiev.

Mas se a Rússia está orquestrando essa revolta, o que isso nos revela em relação à influência de Moscou no leste da Ucrânia e ao grau de controle que Kiev possui?

A julgar pela maneira fácil como os grupos pró-Rússia vêm ocupando prédios estratégicos, em muitos casos, simplesmente caminhando para dentro do prédio e assumindo o controle, o poder do governo central por aqui está se evaporando.

O próprio presidente interino do país, Olexander Turchynov, admitiu que nas regiões de Donetsk e Luhansk as forças “encarregadas de proteger os cidadãos” estavam “impotentes”.

E pior, “algumas unidades” – ele disse – ” ou ajudam ou cooperam com os grupos terroristas”.

Se o plano do presidente Putin é enfraquecer, ou dividir a Ucrânia ao meio, talvez ele não tenha de enviar tanques russos.

Em meio ao caos, violência e medo que se alastram pelo leste da Ucrânia, já brotaram divisões profundas.

E, por enquanto, Kiev parece ser incapaz de manter a unidade do país.

Fonte: BBC Brasil

8 Comentários

  1. Mercenários realizando ataques de falsa bandeira, querendo por em cheque o povo ucraniano, que no passado já sofreu muito sob o peso da foice e do martelo imperialista russo.
    Ucranianos tem verdadeira repulsa á russos, isto e histórico, e agora novamente um populistazinho de araque que tomar suas casa, lhes negar a determinação de nação.

    • Caro Capa Preta.

      Não sei se entendi bem seu comentário, mas essa falsa bandeira não engana ninguém. Daqui a pouco esses mercenários, completamente equipados pelos russos, estarão usando Flankers e T-90s, e Putin continuará afirmando que são apenas milícias lutando por seus direitos.

      Que os EUA não são santos todos sabemos, mas russos demosntram covardia e sujeira iguais.

      • O putin não tem outra alternativa… está acuado… eu disse isso desde o início… a invasão russa foi um ato de DESESPERO de Moscou… quem pode e tem poder usa o soft power… quem parte pros finalmentes é porque não tem outra alternativa… E O COLAR VAI SE FORMANDO !!!… 🙂

      • Onde você viu a invasão russa? Lembre-se o exército russo entra Ucrânia todos os bastardos fascistas não será neste mundo!

        Você me ou não entendeu? Se no Brasil seria um líder como Putin pode ser s viveria de modo diferente do que vivemos agora
        __
        Where did you see the Russian invasion? Remember if the Russian army enters Ukraine all fascist bastards will not be in this world!

        Do you understand me or not? If you in Brazil would be a leader like Putin can be s would live differently than live now

  2. Incrível.

    As histórias em torno desses “homens de verde” circulam na maioria dos noticiários internacionais a meses. Uma hora são classificados como “gentis” homens de verde (essa surgiu quando 50 deles ocuparam o aeroporto na Criméia sem dar um único tiro), em outros momentos são os “terríveis” homens de verde (termo utilizado após o referendo na Criméia). E hoje a BBC resolve ressuscitar novamente este personagem para justificar a afirmação que tropas russas estão no leste do país.

    Mais guerra de informação.

    Pra isso é que serve o negrito no início do texto, apresentando um personagem que é associado a sabedoria e não pode ser enganado facilmente. Então deve-se acreditar nas suas impressões, mesmo que meio mundo esteja afirmando isso a semanas.

    A mensagem é bem simples: TEMEI OS HOMENS DE VERDE POIS SÃO OS ARAUTOS DO APOCALIPSE (risada tétrica, por favor).

  3. O que está em jogo é a permanência de Putin e sua oligarquia amiga (apoiadora) no poder moscovita.
    Tudo pelo poder… até dividir e destruir uma nação vizinha.

    Querendo ou não Obama em 2016 dá adeus a Casa Branca, já Putin quer morrer engessado dentro do kremlin. Pequena diferença entre eles.

Comentários não permitidos.