Obama quer sair do Afeganistão

Obama pensou, pensou, consultou quem queria e decidiu por uma estratégia no Afeganistão com dois objetivos principais: destacar mais tropas americanas para preparar os afegãos para assumirem a guerra e viabilizar retirada americana. A memória é curta. Rodei por jornais de todos os cantos que destacaram e opinaram sobre o discurso do presidente. Não li ninguem que lembrasse como tudo começou.

Foi no século passado. Havia um governo comunista em Cabul, a capital do Afeganistão, país sem saída para o mar, montanhoso, dominado por tribos. Nunca fora um Estado com poderes sobre todos os seus habitantes. Os russos soviéticos mandaram tropas para apoiarem o governo comunista, que era seu aliado. Mas a maioria dos afegãos é de ultraortodoxos.

Para os muçulmanos ortodoxos o comunismo é ateu, inimigo de Deus. As tribos passaram a atacar a tropa russa comunista com táticas de guerrilha que jamais país algum conseguira derrotar por centenas de anos. E a CIA, com bases no Paquistão, país vizinho, passou a ajudar os guerrilheiros com dinheiro, armas, assessores militares. Os russos soviéticos usaram de todos os meios de ataque e defesa e acabaram derrotados. A volta para a então União Soviética, segunda mais poderosa potência da época, com tropas desmoralizadas por um inimigo primitivo foi um dos golpes que resultaram no fim do comunismo russo.

O governo comunista afegão se acabou. E da guerrilha vitoriosa surgiu o Taleban que impôs um sistema de governo medieval. E deu abrigo a Osama bin Laden, ex-guerrilheiro, árabe saudita, que tinha ódio dos não muçulmanos e se organizou para treinar e preparar crentes para o combate em defesa da fé. A Al-Qaeda, a Organização, patrocinou o ataque a Nova Iorque e Washington no qual foram destruídos edifícios-símbolo do poderio de Nova Iorque e parte do Pentágono, sede do Ministério da Defesa norte-americano.

O então presidente George W. Bush prometeu punir todos os responsáveis. E declarou guerra ao terrorismo cujo primeiro ato foi a invasão do Afeganistão e imaginou-se que tivesse derrotado decisivamente o Taleban e a Al-Qaeda. Ganhou uma primeira batalha e a responsabilidade de fazer do Afeganistão um país democrático. Foi também quando se iniciou a guerra contra Saddam Hussein do Iraque. A ofensiva não ganhou teve um sucesso decisivo no Iraque, nem no Afeganistão. A questão passou a ser como devolver o poder de governo a iraquianos e afegãos sem que a medida parecesse uma derrota.

No Iraque, o povo está tentando criar uma democracia e a ordem pública. A tropa americana ainda está lá. Mas o Iraque saiu das manchetes para uma posição secundária. É riquíssimo em petróleo e história, pois é a antiga Babilônia do mito da Torre de Babel e do nascimento de Abraão, o primeiro homem a se comunicar com Deus. Ainda não se pode jurar que continuará sendo um país, unindo xiitas, sunitas e curdos que não são compatíveis.

O Afeganistão é majoritariamente sunita, seita da maioria dos muçulmanos. Trata-se de um país com cerca de 30 milhões de habitantes, maior produtor mundial do ópio. O governo foi imposto pelos americanos e seria o veículo de implantação da democracia.

É notoriamente corrupto. Cabul é a capital, mas o Taleban, reorganizado e poderosamente armado, movimenta sua gente e tropa. E domina a maior parte do país. Bush conseguiu apoio militar – um pequeno número de tropas aliadas. A Otan entrou na luta contra o terrorismo pois a Al-Qaeda se espalhou pelo mundo. Oito anos de guerra que não termina. E oito anos a procura de bin Laden sem sucesso.

 Na verdade, o Paquistão fronteiriço foi que ganhou importância. É um país islâmico muito infiltrado pelo Taleban e possui um forte antiamericanismo. É uma potência nuclear cujos arsenais são atração para os grupos terroristas e uma ameaça à segurança internacional.

Obama atendeu ao pedido de seu comandante no Afeganistão e lhe enviará um total de 30 mil tropas em 2010. O objetivo é que treinem tropas afegãs para que assumam a guerra com o Taleban. Ele promete começar a retirada das tropas americanas em 2011. O povo americano desaprova a guerra que não parece ter fim. Mesmo reforçados, nem os americanos nem ninguém conseguirão vencer a guerrilha Taleban, que vive nas montanhas e conhece cada milímetro do terreno.

Todos os países que tentaram dominar as tribos do Afeganistão fracassaram. O fracasso americano é inevitável. As tropas modernas não sabem derrotar uma tropa inspirada pela fé religiosa. Mas não se pode esquecer – e estão deixando de lembrar – que a guerra atual começou na ordem de Bush para o combate dos terroristas.

Fonte:Nahum Sirotsky, correspondente iG em Israel