Turbulências Democráticas: Uma Análise da Dinâmica Política nos Estados Unidos e no Brasil

PETER MAMBLA

Tradução e adaptação E.M.Pinto


Se eu puder ser desculpado por usar o termo “racista”, “Ovelha negra” é algo que melhor classifica aos Estados Unidos da América, que por muito tempo, tem sido a ovelha negra da família anglo-saxônica. A mãe pátria sofredora há muito está à beira do desespero sobre como controlar esse filho problemático. Os outros filhos anglo-saxões, que se comportam bem, observam atônitos a habitual desobediência e desafio desse “enfant terrible”.

Sozinho entre seus irmãos anglo-saxões, o Filho Pródigo formalmente se separou da mãe pátria em sua famosa revolução de 1776. Em contraste, até hoje, o monarca reinante do Reino Unido também é o monarca do Canadá, Austrália e Nova Zelândia (junto com outros 12 “reinos” compostos por não-anglo-saxões). Nos juramentos de fidelidade desses países, seja para a própria cidadania (como no Canadá) ou para ocupar determinado cargo no governo ou servir nas forças armadas, um juramento é feito ao monarca reinante (Rei Carlos III) e seus herdeiros e sucessores.

A história americana consiste principalmente dessa dinâmica familiar, de um filho problemático recusando-se a ficar quieto, esforçando-se para afirmar sua independência, com o pai exasperado tentando impor sua autoridade e controlar esse filho de vontade forte. Essa dinâmica familiar também reflete o fluxo da história ocidental, com a transição de um sistema feudal da Idade Média para a modernidade, com suas manifestações como democracia liberal, liberdades civis e a crença no progresso constante, seja científico, tecnológico ou social.

Os Estados Unidos da América nasceram no meio da modernidade, rejeitando as propriedades tradicionais da Europa para declarar uma sociedade organizada em torno do princípio de governo do povo, pelo povo e para o povo – uma sociedade demótica por excelência. A transição da Grã-Bretanha para a modernidade tem sido uma evolução gradual, em contraste com a revolução súbita e violenta da França, seguida posteriormente pela da Rússia.

Refletindo isso, o parlamento bicameral da Grã-Bretanha é composto pela Casa dos Lordes, não eleita, a câmara alta, e pela Casa dos Comuns, eleita, a câmara baixa. Até 1999, a Casa dos Lordes era composta por pares hereditários, onde os membros da nobreza do país herdavam seus assentos na câmara alta do parlamento. Isso refletia o sistema ainda existente dos estados medievais do reino.

Em “A República”, Platão fala sobre as cinco formas de governo: aristocracia, timocracia, oligarquia, democracia e tirania. A modernidade representa a transição entre essas formas de governo, principalmente da aristocracia para a democracia, com agora a luta entre democracia e uma oligarquia ressurgente, com a tirania ameaçando impor-se para trazer ordem se as coisas descambarem para o caos completo.

Pensadores como Lorenzo Carrasco veem a história moderna através do prisma dessa interação entre diferentes formas de governo, lutando para avançar os interesses do demos contra os de uma oligarquia financeira. Carrasco, e outros como ele influenciados pelo ativista político americano Lyndon LaRouche, veriam as autoridades governantes britânicas como representantes do princípio da oligarquia, lutando para controlar os Estados Unidos da América, sendo este país o principal representante do princípio da democracia.

A história dos Estados Unidos, portanto, constituirá os altos e baixos dessa luta, com a democracia avançando contra a aristocracia e a oligarquia aqui, e recuando ali. A democracia avançou com a Declaração de Independência em 1776, e lutou contra um contra-ataque da oligarquia na Guerra de 1812 (onde a capital foi capturada pelos britânicos e a Casa Branca e o Congresso foram incendiados), que alguns americanos se referem como a “Segunda Guerra de Independência”.

Durante a Guerra Civil dos EUA, a melhor esperança da Confederação era que a Grã-Bretanha e a França interviessem em seu favor, especialmente dado o interesse da Grã-Bretanha pelo algodão da Confederação para abastecer sua indústria têxtil. No entanto, para contrariar seu rival estratégico (o Grande Jogo já estava em andamento), o Czar Alexandre II enviou suas frotas do Atlântico e do Pacífico para os Estados Unidos, dando a seus comandantes de frota ordens lacradas para serem abertas apenas no caso de a Grã-Bretanha ou a França entrarem na guerra em apoio à Confederação.

A subsequente vitória das forças da União foi uma vitória tão grande para a democracia sobre a aristocracia e a oligarquia que impulsionou a aprovação na Grã-Bretanha da Lei de Representação do Povo de 1867, que estendeu o direito de voto a parte da classe trabalhadora urbana masculina.

O autor G. Edward Griffin escreveu um livro em 1994 intitulado “A Criatura da Ilha Jekyll”, que teve algum impacto no ex-congressista dos EUA e candidato presidencial Ron Paul. Nele, ele afirma que o sistema da Reserva Federal foi em grande parte um cartel bancário privado criado por oligarcas financeiros que conspiraram para criar o sistema em uma reunião secreta na Ilha Jekyll, que subsequentemente resultou na aprovação da Lei da Reserva Federal em 1913.

Como resultado, quando a Reserva Federal compra títulos do governo dos EUA, ela cria esse dinheiro do nada, como uma entrada de computador, sem coletar esse dinheiro de depósitos existentes. Depois de criar esse dinheiro do nada e emprestá-lo ao governo dos EUA comprando seus títulos, ela recebe pagamento pelo empréstimo com juros. A constante injeção de novo dinheiro fiduciário na economia resulta em inflação, efetivamente um imposto oculto. Enquanto nos anos 1950 uma renda poderia sustentar uma família, isso na maioria dos casos é impossível para a grande maioria dos americanos, que veem seu poder de compra diminuindo com o tempo. Somente os pagamentos de juros para servir à dívida nacional dos EUA atualmente ultrapassam US$ 800 bilhões por ano.

O Sonho Americano repousa principalmente na ideia de que a próxima geração viverá melhor do que a anterior. De fato, toda a ideia da América, nascida na modernidade, é baseada na ideia de progresso, de progresso técnico, científico e social. As coisas estão sempre destinadas a melhorar. Mas enquanto o progresso técnico nunca parou, de fato só acelerou, o progresso em termos de padrão de vida não o fez, com o poder de compra diminuindo por causa do imposto oculto da inflação causada pela moeda fiduciária criada pela oligarquia financeira na Ilha Jekyll.

O demos está começando a ficar inquieto e há murmúrios sombrios de revolução. Pouco depois de assumir sua presidência em 2009, no meio da Crise Econômica Global, o presidente Obama advertiu a oligarquia financeira (da qual ele recebeu grande parte de seu financiamento), “Minha administração é a única coisa entre vocês e os garfos”. Obama teve sucesso em manter as massas uivantes à distância, mas apenas por um tempo. Na eleição presidencial de 2016, o demos mostrou sua insatisfação com o status quo votando em candidatos anti-establishment, com Donald Trump vindo da direita e Bernie Sanders da esquerda. As coisas estão longe de se acalmarem.

Há muita conversa hoje em dia sobre a possibilidade de guerra civil nos EUA, mas uma guerra civil já está em curso há alguns anos nas sombras. Essa guerra civil tem ocorrido dentro do chamado Estado Profundo, com a facção que apoia Trump conseguindo colocá-lo na presidência, tendo Trump sido empurrado para fora pela facção oposta (seja legitimamente ou ilegitimamente), e agora a facção Trump tentando colocá-lo de volta ao cargo novamente.

Como expliquei em meu artigo de 2018, a facção que apoia Trump parece ser composta de forma desproporcional por militares em atividade e aposentados, sendo o General Michael Flynn seu exemplo mais proeminente. Eles parecem representar o fantasma de Smedley Butler, se rebelando contra as guerras intermináveis do imperialismo, em prol do grande capital e do complexo militar-industrial, e contra os interesses do demos, “Nós, o povo”.

Com hostilidades limitadas por enquanto a escaramuças nos bastidores – as forças do status quo estão confiando na guerra jurídica enquanto os rebeldes estão confiando em kompromat (que eles hackearam de uma operação de armadilha de outro país em andamento) – a guerra civil propriamente dita está sendo mantida à distância por enquanto. Mas se Trump for impedido de contestar a próxima eleição presidencial, ou se Trump e seus apoiadores acreditarem que a eleição foi roubada novamente, então uma segunda guerra civil americana pode quase ser certa.

Para o Brasil, uma das maiores preocupações geopolíticas há algum tempo tem sido a ameaça à sua soberania pelos desenhos internacionais nas Amazônias verdes e azuis. Esses desenhos foram de interesses oligárquicos internacionais, publicamente representados pelas reuniões de Davos e, menos publicamente, através das reuniões de Bilderberg, frequentemente referidas coloquialmente como “os globalistas”. Os trilhões de dólares de riqueza potencial nessas Amazônias são simplesmente impossíveis de serem ignorados por esses “globalistas”.

Se o sistema de oligarquia conseguir suprimir com sucesso a democracia nos EUA, então o poder militar dos EUA, do qual eles dependem para alcançar seus objetivos globais, permanece em vigor. Se não, então eles se encontrarão na mesma situação do Imperador Palpatine quando Darth Vader parou de obedecer e, em vez disso, se voltou contra ele.

Se a oligarquia global tiver sucesso, então será muito difícil manter a Amazônia verde ou azul. Se falhar, então a ideia de o Brasil finalmente começar a realizar seu potencial começará a se tornar possível.


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