China sedia G-20 em meio a tensão com parceiros

A cúpula das principais economias, que deveria ser um momento de glória para a China, coincide com uma reação mundial adversa à globalização – e a China é responsabilizada por boa parte dela.

Pequim vê encontros de líderes mundiais como oportunidade de enfatizar o papel ascendente da China no cenário mundial, e não poupa esforços para garantir uma pompa incomum para a ocasião. Mas, no momento em que o presidente Xi Jinping se prepara para receber os líderes das economias do G-20 na cidade histórica de Hangzhou, o que desponta cada vez mais como meta é impedir que a China seja apontada como obstáculo ao crescimento mundial.

Num momento em que o crescimento da China desacelera e as economias dos EUA e da Europa seguem estagnadas, ganharam força nos últimos meses reclamações de que o excesso de capacidade industrial da China derrubou os preços no mundo. Além disso, o acesso de investidores estrangeiros à China não corresponderia às condições encontradas pelas empresas chinesas no exterior. E o país com o maior comércio exterior do mundo se tornou presença constante em disputas comerciais, que vão desde a celulose brasileira até pés de galinha americanos.

Por outro lado, autoridades e empresas ocidentais veem as empresas chinesas presentes em aquisições de grandes marcas mundiais como beneficiárias estatais de mercados protegidos.

“A China é o país do G-20 mais fechado em termos de ingresso de investimento externo e ao mesmo tempo desponta como o maior investidor do mundo”, disse David Dollar, professor visitante-do Brookings Institution. “Essa falta de reciprocidade representa um verdadeiro problema para o mundo.”

Acusações assim no G-20 seriam um revés para a aspiração da China de reformular a ordem mundial e embotará vitórias, como a fundação do Banco Asiático de Investimentos em Infraestrutura, resposta chinesa ao Banco Mundial e cuja filiação está crescendo. O Canadá se tornou ontem o primeiro país norte-americano a pedir adesão.

Autoridades chinesas sugerem que darão destaque às conversações voltadas para formalização de tratados de investimento no G-20, como prova de Pequim está comprometida com a abertura.

Pequim coloca a China na posição de vítima, não de causa, do “crescente protecionismo comercial”. O comunicado final do G-20 deverá incluirá menções à “redução do protecionismo comercial”.

Autoridades envolvidas na reunião do G-20 dizem ser pouco provável que o encontro produza um acordo relevante para respaldar o crescimento mundial, na linha da cúpula de 2009, em Londres, que reuniu mais de US$ 1 trilhão em compromissos de crédito para impulsionar os empréstimos. Agora, dizem, o foco será convencer a China a ajudar a economia mundial a recuperar dinamismo.

Na cúpula, é provável que Pequim enfatize sua liderança nas finanças “verdes”, na transparência fiscal, na regulamentação financeira e em outras áreas, em um Plano de Ação de Hangzhou coordenado pelo G-20 que lhe dará uma oportunidade pelo menos simbólica de mostrar liderança mundial.

Mas a tentativa da China de fazer a agenda do G-20 voltar à economia mundial como um todo poderá se revelar difícil. “Se o comunicado final for sobre excesso de capacidade ou outros problemas que afetam o comércio internacional, a China não vai querer seu nome” apontado como responsável, disse um alto funcionário de um grupo empresarial ocidental.

O que está em jogo é o prestígio, além de interesses mais tangíveis.

Dados da Organização Mundial do Comércio (OMC) mostram que as medidas antidumping, entre as quais tarifas, impostas por membros do G-20 contra produtos chineses aumentaram 47% no ano passado, para seu nível mais alto, em relação a 2010. As medidas compensatórias tiveram como alvo todos os tipos de produtos, de bicicletas infantis até aquecedores de água. Um terço delas incidiu sobre as vendas de aço chinês.

A escala e os baixíssimos preços dos produtos exportados pela China geram temor em comunidades operárias do mundo inteiro. Economistas de sindicatos do Ocidente argumentam que a abertura dos mercados, especialmente à China, achatou os salários e levou à transferência de nada menos que 3 milhões de empregos americanos. Opiniões desse tipo ganharam força até em círculos pró-comércio mundial nos EUA e são tema importante na campanha eleitoral.

Parlamentares europeus manifestaram forte objeção a mais abertura da economia do bloco à China sem a contrapartida das concessões chinesas. Um estudo da Comissão Europeia, o braço executivo da União Europeia (UE), estima que o fechamento de empregos na UE poderá alcançar 211 mil ou mais se a China receber o status de “economia de mercado”.

“Num momento em que o mundo precisa de mais globalização, a China segue no modo defensivo”, diz Jörg Wuttke, presidente da Câmara de Comércio da UE na China. “Nossa preocupação é que a China possa desencadear forças protecionistas que ninguém quer ver.”

Os investimentos externos chineses entram nos demais países com relativa facilidade, mesmo em setores supervalorizados como robótica e biotecnologia, como foi o caso da aquisição pela China da gigante de biotecnologia Syngenta, liberada pelos EUA em agosto.

Mas Pequim mantém setores fundamentais totalmente ou em boa parte fechados a investidores estrangeiros e usa o comércio exterior como fator impulsionador em investimentos transnacionais. Depois que a Austrália barrou, em agosto, a aquisição pela State Grid, da China, da maior rede de energia elétrica australiana, Pequim alertou que a rejeição poderia comprometer os laços comerciais.

“Esta é uma época muito cheia de disputas”, disse o analista Angus Nicholson, da trading IG. “E a China tem contribuído enormemente para essa inquietação.”

CHUIN-WEI YAP

Edição/Imagem: Plano Brasil

Fonte: The Wall Street Journal