E.M.Pinto
A possível aquisição de fragatas da classe Iver Huitfeldt pela Marinha Argentina representa um movimento estratégico para recuperar a presença marítima do país no Atlântico Sul e modernizar a desgastada frota de navios marcada pela obsolescência e severas limitações operacionais.
Em 22 de julho de 2025, o Secretário de Assuntos Internacionais da Defesa, Juan Battaleme, confirmou negociações com a Marinha Real Dinamarquesa para a compra de dois navios polivalentes, sinalizando uma reestruturação planejada da força naval argentina diante da retirada de serviço das então fargatas ARA Hércules e o ARA Heroína. Destaca-se que o último navio encontrava-se inoperante há anos por conta de um veto britânico que impediu a reposição de componentes essenciais.
A classe MEKO 360H2, introduzida na Marinha Argentina nos anos 1980, representou uma inovação à época por sua arquitetura modular e capacidade oceânica. No entanto, após décadas sem atualizações substanciais, seus sistemas tornaram-se obsoletos frente às exigências de combate naval moderno, tanto em capacidade de defesa aérea quanto em vigilância eletrônica e guerra antissubmarino.
A classe Iver Huitfeldt, desenvolvida pela Dinamarca e incorporada à sua marinha a partir de 2012, traz um avanço significativo nas capacidades combinadas de defesa aérea, guerra antissubmarino e combate de superfície. Inspirada no casco das fragatas classe Absalon, a Iver Huitfeldt foi concebida para atender a operações da OTAN, unindo versatilidade e interoperabilidade.
Suas características técnicas avançadas incluem sistemas de radar de longo alcance, sensores multifuncionais, lançadores verticais VLS Mark 41, capacidade para mísseis antinavio Harpoon e um convés apto para operações de helicópteros como o MH-60R Seahawk. Com deslocamento superior a 6600 ton e alcance de 9000 nm, as fragatas são adequadas para missões de longa duração e presença estratégica em zonas marítimas disputadas.
A decisão argentina ocorre em um contexto ambíguo. Apesar de modernas, as fragatas enfrentaram falhas operacionais significativas durante missões recentes, como as ocorridas com o HDMS Iver Huitfeldt no Mar Vermelho em 2024, quando falhas nos sistemas de controle de mísseis e de artilharia comprometeram temporariamente sua capacidade de combate. Tais episódios levaram o comando militar dinamarquês a recomendar a suspensão de atualizações da classe, focando na substituição por novas plataformas dentro do Plano de Frota da Dinamarca.
Para a Argentina, a aquisição dessas unidades usadas, mesmo com limitações, apresenta uma alternativa economicamente viável à construção de novos navios, uma tarefa praticamente inviável frente ao cenário econômico e fiscal atual do país. A parceria com empresas como a turca ASELSAN, especialista em modernizações navais a qual é mencionada na transação, oferece à Argentina a oportunidade de atualizar esses navios com novos sistemas eletrônicos, sensores e recursos de guerra eletrônica, conferindo-lhes maior adequação às exigências contemporâneas de combate.
A adoção da classe Iver Huitfeldt também se insere em um programa mais amplo de modernização naval que inclui investimentos em submarinos e na atualização das fragatas MEKO 360. Tais iniciativas visam restabelecer a capacidade dissuasória e de projeção marítima da Argentina, essencial para a defesa de seus recursos naturais e da soberania no Atlântico Sul, especialmente em um momento de crescente disputa por áreas estratégicas e de tensão latente em torno das Ilhas Malvinas.
Contudo, o sucesso da aquisição dependerá de fatores políticos e orçamentários internos, além do desfecho das negociações com a Dinamarca. Caso concretizada, a incorporação das Iver Huitfeldt representará um importante salto qualitativo para a Marinha Argentina, colocando-a novamente em condições de desempenhar um papel relevante na segurança regional e no apoio a operações multilaterais.
Tabela Comparativa : Iver Huitfeldt e MEKO 360H2
Características | Iver Huitfeldt (Dinamarca) | MEKO 360H2 (Argentina) |
---|---|---|
Ano de introdução | 2012 | 1983–1984 |
Deslocamento (cheio) | 6.645 toneladas | 3.600 toneladas |
Comprimento | 138,7 m | 125,9 m |
Boca (largura) | 19,75 m | 15 m |
Calado | 6,45 m | 5,8 m |
Propulsão | 4 x MTU 8000 M70 (diesel) | CODOG: 2 Turbinas GE LM2500 + 2 Motores MTU |
Velocidade Máxima | >28 nós | 27 nós |
Alcance | 9.000 mn a 18 nós | 4.500 mn a 18 nós |
Tripulação | ~165 | ~200 |
Radar principal | Thales SMART-L + Thales APAR | Signaal LW-08 + DA-08 |
Sonar | Atlas ASO 94 (casco) | Atlas DSQS-21B (casco) |
Sistema de Controle de Combate | Sistema dinamarquês + integração OTAN | Signaal SEWACO-FD |
VLS (Sistema de Lançamento Vertical) | 32 células Mk 41 (ESSM / SM-2) | Não possui |
Mísseis antinavio | 16 Harpoon Block II (NSM no futuro) | 8 MM-40 Exocet |
Canhões principais | 2x OTO Melara 76 mm (upgrade para Mk 45 opcional) | 1x Otobreda 76 mm |
CIWS | 1x Oerlikon Millennium 35 mm | Não possui dedicado (usa metralhadoras) |
Torpedos | 2x duplos (MU90 Impact) | 2x triplos (A244/S Mod.3) |
Hangar para helicóptero | Sim (para MH-60R Seahawk) | Sim (para Fennec ou Sea King) |
Capacidade Antiaérea | Elevada (SM-2, ESSM, integração OTAN) | Limitada (canhão + MANPADS ou sistemas locais) |
Guerra Eletrônica (EW) | Seagnat Mk 36, Terma Mk 137 | ECM/ESM obsoletos |
Status atual | Em serviço, com falhas relatadas | Em processo de desativação/descomissionamento |
Caso se concretize, a substituição da MEKO 360 pela Iver Huitfeldt não representa apenas uma troca de navio por navio, mas sim uma mudança de paradigma operacional. Enquanto a MEKO 360 foi concebida para operar de forma autônoma ou limitada em coalizões, a Iver Huitfeldt é um navio preparado para operar plenamente em redes integradas de defesa, com interoperabilidade plena com sistemas da OTAN.
Seu alcance, capacidade de sensores e poder de fogo proporcionam uma cobertura de área e tempo de resposta muito superiores, adequadas para vigilância das ZEE, combate a ameaças aéreas modernas e controle de áreas de interesse estratégico como o Atlântico Sul e as rotas marítimas ao redor das Ilhas Malvinas.
Além disso, o fato de os navios dinamarqueses estarem disponíveis no mercado e ainda operacionais, é algo relevante que ganha maior interesse pelos argentinos pelo fato de garantir possibilidade de modernização futuras conferindo à Argentina uma oportunidade rara de acesso rápido a tecnologia avançada, mesmo com restrições fiscais.
Fonte
Argentina considers acquiring Iver Huitfeldt-class frigates from Denmark to strengthen presence in the South Atlantic, Army Recognition [LINK]
Problematic ships: Denmark proposes to abandon modernization of Iver Huitfeldt class frigates, MilitarNyi[LINK]