No final de julho, o bloco socialista no Congresso da República do Peru apresentou o Projeto de Lei nº 11.973/2024-CR, que pretende estabelecer uma proibição à importação de mercadorias provenientes de territórios ocupados ilegalmente e restringir a aquisição de armas e equipamentos militares de países classificados como “potências ocupantes”.

Segundo seus autores, a medida busca “contribuir para a manutenção da paz e da segurança internacionais, no âmbito da responsabilidade do Estado peruano de respeitar as normas internacionais que proíbem a ocupação ilegal de territórios e a colaboração dos Estados Partes da Carta das Nações Unidas em violações graves do direito internacional”.

Helicóptero Mi-17-1B da Polícia Nacional del Perú

O projeto detalha, em seu artigo 4º, que está vedada a entrada de mercadorias originárias de assentamentos em territórios ocupados, mesmo que incorporadas a cadeias internacionais de produção antes de chegarem ao Peru. Empresas que descumprirem a norma poderão ser enquadradas no crime de tráfico de mercadorias proibidas, de acordo com a Lei de Crimes Aduaneiros. Já o artigo 6º proíbe explicitamente a compra de armas, munições e equipamentos de defesa de Estados considerados ocupantes, estendendo a restrição a aquisições realizadas por meio de contratos públicos ou privados.

Embora o texto não cite países diretamente, análises preliminares apontam que a proposta tem como alvo principal Israel, em razão da guerra em Gaza. Especialistas sugerem ainda que as restrições também poderiam se aplicar à Rússia, devido à invasão da Ucrânia.

Se aprovado, o projeto trará alterações em legislações estratégicas, como a Lei da Fábrica de Armas e Munições do Exército (Lei nº 29.314), a Lei Geral de Contratações Públicas (Lei nº 32.069) e a Lei Geral de Alfândegas (Decreto Legislativo nº 1.053). No caso da FAME SAC, braço industrial das Forças Armadas, seria acrescentado um novo artigo que proíbe qualquer relação comercial com empresas ou entidades vinculadas a potências ocupantes reconhecidas por tribunais internacionais.

Fuzil IWI Arad de fabricação israelense

Impactos para a defesa nacional

A proposta preocupa setores militares e industriais, que alertam para seus potenciais efeitos sobre a capacidade de defesa do país. Israel é hoje um dos principais fornecedores de sistemas estratégicos ao Peru. Em outubro de 2023, o Exército recebeu 10.000 fuzis de assalto IWI Arad 7 (7,62×51 mm), em contrato de US$ 27,3 milhões, enquanto a Polícia Nacional adquiriu em janeiro de 2025 um lote de 7.323 fuzis Arad 5 (5,56×45 mm), avaliados em US$ 19,6 milhões. Além disso, a FAME SAC mantém acordos de coprodução com a Israel Weapons Industries (IWI) e contratos ativos com a Elbit Systems, incluindo o fornecimento do sistema de lançamento múltiplo de foguetes PULS.

No caso da Rússia, a aplicação da lei agravaria a já delicada situação logística. As Forças Armadas e a Polícia Nacional do Peru operam mais de 70 helicópteros de origem russa, entre modelos Mi-8, Mi-17 e Mi-35, cuja manutenção já enfrenta dificuldades devido às sanções internacionais impostas a Moscou. A restrição legal poderia praticamente inviabilizar a obtenção de peças de reposição e suporte técnico, comprometendo o nível operacional desses equipamentos.

Próximos passos

O Projeto de Lei nº 11.973/2024-CR será analisado pela Comissão de Defesa Nacional, Ordem Interna, Desenvolvimento Alternativo e Combate às Drogas antes de seguir para debate no plenário do Congresso.

Se por um lado seus defensores sustentam que a medida reforça o compromisso do Peru com os princípios do direito internacional, por outro críticos alertam que, ao atingir diretamente parceiros estratégicos, o país pode colocar em risco sua capacidade de modernizar e manter suas forças armadas em plena operação.