O Ministério da Defesa da República Tcheca notificou oficialmente a fabricante franco-alemã KNDS (formada pela francesa Nexter e a alemã KMW) sobre a possibilidade de suspender os pagamentos relativos ao contrato de aquisição dos obuses autopropulsados CAESAR 8×8. O motivo: falhas graves no desempenho técnico e atrasos no cronograma de entregas.
A carta, enviada pelo diretor de Armamentos tcheco, Lubor Koudelka, exige que os veículos encomendados sejam entregues imediatamente para testes militares, conforme previsto em contrato. Caso a KNDS não cumpra essa etapa, os pagamentos futuros — estimados em cerca de 45 milhões de dólares para 2025 — serão congelados.
O contrato, assinado em setembro de 2021, prevê a entrega de 52 obuses CAESAR 8×8 montados sobre chassis Tatra T815, com participação de 40% da indústria tcheca. Em dezembro de 2022, o governo aprovou a compra adicional de 10 unidades, elevando o total para 62 sistemas de artilharia. O valor total da encomenda gira em torno de 450 milhões de dólares. Até o momento, o governo tcheco já pagou cerca de 7 bilhões de coroas (aproximadamente 315 milhões de dólares).
Segundo o Ministério da Defesa, os problemas são “muito sérios”. Os obuses não estão alcançando os 40 km prometidos no modo MRSI (impacto simultâneo de múltiplos disparos), algo que compromete sua eficácia operacional. Além disso, a KNDS ainda não entregou os dados balísticos necessários para que os CAESARs sejam integrados ao sistema de controle de tiro Adler III, fabricado pela empresa alemã ESG Elektroniksystem und Logistik. Sem esses parâmetros, não é possível garantir a interoperabilidade com os sistemas da OTAN — um requisito essencial para a artilharia tcheca.
A ministra da Defesa, Jana Černochová, reforçou publicamente a insatisfação com o andamento do programa, afirmando que “a entrega, o desempenho e a interoperabilidade dos sistemas estão aquém do esperado e do contratado”. Ela destacou que o contrato inclui cláusulas claras sobre a performance dos obuses, e que a não conformidade poderá levar à rescisão.
A KNDS, por sua vez, tem alegado que ainda está concluindo os ajustes finais nos sistemas, e que os testes e a entrega ocorrerão em breve. No entanto, a confiança tcheca no cronograma da empresa está abalada.
Esse impasse não é isolado. A Dinamarca também havia adquirido 19 unidades do CAESAR 8×8, mas cancelou o contrato em janeiro de 2023 devido a atrasos e preferiu adquirir obuses ATMOS de origem israelense. Parte dos sistemas franceses inicialmente encomendados pelos dinamarqueses foi então repassada à Ucrânia como ajuda militar.
O CAESAR 6×6, versão mais antiga e já amplamente usada por países como França, Indonésia e Ucrânia, tem desempenho comprovado em combate, incluindo no conflito ucraniano. Porém, a versão 8×8 — que oferece maior mobilidade e mais capacidade de munição — ainda não conseguiu se consolidar operacionalmente, e os problemas com os primeiros clientes vêm gerando incertezas sobre sua viabilidade.
Se a KNDS não corrigir os problemas técnicos e não entregar os veículos para testes ainda neste segundo semestre de 2025, o Exército Tcheco poderá não apenas suspender pagamentos, mas também cancelar parte do contrato e buscar alternativas em outros fornecedores.
A disputa expõe as dificuldades de programas de defesa multinacionais, especialmente quando exigem integração com sistemas complexos da OTAN e produção local. O caso também reforça os riscos de adquirir versões ainda não comprovadas de plataformas militares, mesmo quando baseadas em modelos já consagrados.