O rio Guaíba e o Parque Itaponã

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Por: Hiram Reis e Silva

Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA)

Acadêmico da Academia de História Militar Terrestre do Brasil (AHIMTB)

Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS)

Site: http://www.amazoniaenossaselva.com.br


O rio Guaíba e o Parque Itaponã

Por Cel Hiram Reis e Silva, Porto Alegre, RS, 29 de agosto de 2009.

– Parque Fazenda Itaponã

Localizado no Município de Guaíba, há apenas 35 km de Porto Alegre, o parque proporciona a oportunidade de conviver com a natureza em uma área de 35 hectares. Possui um grande bosque de eucaliptos e uma vegetação exuberante composta por coqueiros, eucaliptos, cactos, figueiras, bromélias e mato nativo. As opções de lazer são variadas: restaurante panorâmico, churrasqueiras, praia, trilhas ecológicas, pescaria, passeios a cavalo, quadras de futebol e vôlei, passeios de dindinho, carroça. O privilegiado ponto de parada de minhas incansáveis remadas é de propriedade do amigo Marcelo Fichtner e é administrado pelo seu fiel escudeiro Juarez Boneberg.

– A lenda do Itaponã

Karia’y Guatá (homem jovem e valente andarilho)

Havia, nos Pampas Gaúchos, lá pelos primórdios das civilizações nômades Guatá, tribos indígenas da ramificação dos pré-Canganges. Eram povos que vagavam pelos campos do sul, por volta dos séculos XVII a XIX, percorrendo caminhos de percursos constantes (Guatahá) sobre os Yvyaty (morros), que compõem o perfil da linha do horizonte que vemos ao observarmos do sul até o sudoeste do Parque. Esses morros são conhecidos, desde aquela época, como Morros da Guarita, por serem os pontos mais altos da região.

Um Karia’y guerreiro indígena, sempre quando passava pelo Morro da Guarita, parava e fitava ao longe, em direção nordeste, onde o céu se debruça sobre a terra e deixa uma semente como marca de seu amor. Eram pontos claros e escuros, ao longe, que não conseguia definir claramente por entre a Yvyatãty (neblina). Isto acontecia sempre à época em que a tribo cruzava pelo local. Era em tempos de frio, quando vinha do sul em busca de campos mais quentes.

Uma certa vez, quando sobrava o gelado vento Minuano, vindo das Cordilheiras, conseguiu ver aqueles pontos claros, quase brancos (Puí). Eram pedras (Itá), com certas manchas pretas (Hú) por entre elas, que mais pareciam silhuetas femininas. Por sua Angerú (ânsia, desejo), aguçada curiosidade e descontrole de sua tribo, conseguiu descer em busca daquele pedaço do “céu na terra”.

E se foi!

Quanto mais se aproximava, mais seu coração batia, pois, independentemente da aventura ao desconhecido, as imagens com contornos suaves lhe secavam a saliva da boca. Espreitando por entre Yvyra’í (arbustos) de camboins e aspargos, foi se aproximando. Foi quando percebeu que aquela ligação entre o céu e a terra era uma ponta (ponã) de pedras que se pronunciava às águas – Itaponã. Mas, e as silhuetas com formas e sensações suaves que até lhe pareciam movimentar-se ao ritmo das brumas, onde estavam?

Sentou-se às pedras tentando decifrar as imagens que não lhe saíam da mente. Uma brisa começou a balançar os Amarilios (Sarandis) com formas rítmicas que pareciam dançar ao som do suave vento. Seus sonhos se diluíram como as brumas ao luar ao perceber a realidade. Então se curvou, foi se acostando às pedras como quem vai esperar. Talvez…Itá Tenimbé! (das pedras fez seu leito!).

Ficou muito solitário e de lá nunca mais saiu, pois as imagens que em seus sonhos pairavam eram tão fortes que não conseguia perdê-las em sua mente. Eram muito vivas. Eram de sua Kuñá. Hoje, nas noites de tempestades, ouve-se Jahe’osoró – os lamentos do jovem guerreiro como Yvypora (habitante fantasma da Terra) na espera de sua Kuñá (mulher). Nas noites de lua cheia e águas límpidas ele aparece em forma de Piraitá (peixe-pedra, Cascudo) a deslizar sobre a ponta das pedras. Se olharmos do Morro da Guarita para o Itaponã, nas noites de lua nova, vamos vê-lo descendo do céu para as pedras para sua Jeheká (rebusca da vida) Kuñá! Em certos documentos investigados, há referências a um pequeno grupo que se dirigiu para uma elevação próxima à área, ali se instalaram à espera de que um dia o jovem guerreiro retornasse. Faziam Jahe’opapá (composições poéticas consagradas ao luto) em sua homenagem. Até hoje ainda é encontrado Itaguypé (fragamentos de vasilhas de barro) no Monte Arqueológico, provavelmente do grupo de Karia’y Guatá. Ao percorrermos esse Monte durante o dia, sentimos fluidos de energias com sensação de paz e de equilíbrio.

E na noite? (http://www.itapona.com.br/)

– O Maguari

Garça Maguari (Ardea cocoi): é a maior das garças brasileiras podendo atingir um metro e oitenta centímetros de envergadura. Fora do período reprodutivo, vive solitária e, mesmo nessa época, a maioria mantém-se isolada durante a alimentação. O vôo, em linha reta, com o pescoço e as pernas totalmente esticados, é ritmado com lentas batidas de asas. Pousa nas margens dos rios, lagoas e banhados, oculta pela vegetação, onde captura peixes e anfíbios. Nidifica na parte superior das árvores mais altas e os ovos são chocados e cuidados pelo casal. A plumagem apresenta um contraste do branco do pescoço com o dorso acinzentado e as laterais escuras do ventre. Possui uma listra negra da parte inferior do pescoço, bem como no alto da cabeça. Ao redor dos olhos possui uma coloração azulada e o bico é amarelo. (Pantanal – Guia de Aves – Reserva Particular do Patrimônio Natural – RPPN – Sesc)

“Durante o voo, o maguari e alguns outros pernaltas esticam o pescoço em linha reta. As grandes garças, ao contrário, inclinam o longo pescoço para trás numa belíssima curva, de maneira que a cabeça fica bem próxima das espáduas.
(Theodore Roosevelt)

Tinha guardado na memória o texto de Roosevelt desde que li, pela primeira vez, seu livro ‘Nas selvas do Brasil’ em que ele descreve os passos da Expedição Científica Roosevelt-Rondon, em 1913. O objetivo da expedição, era navegar e mapear o rio da Dúvida, além de coletar exemplares de mamíferos e aves para enriquecer o acervo do Museu Americano de História Natural. Observador arguto, Roosevelt, fez a citação acima que até então eu tinha tido a oportunidade de confirmar ao avistar os maguaris que se afastavam lentamente quando me aproximava de caiaque.

Semana passada, navegando pelo irmão Guaíba, fui surpreendido, quando o atravessava, na altura do canal, entre a ponta da figueira e a vila dos sargentos, com a visão de um enorme maguari voando com o pescoço encurvado como o fazem as demais garças. Acho que ao realizar longos percursos a ave usa o confortável recurso de dobrar o pescoço. O fato é que a afirmação de Roosevelt e a de revistas e sites especializados, que eu tomara como absolutamente verdadeira, fora desmentida numa bela manhã de agosto pelo magnífico e solitário pássaro.

Solicito Publicação

Coronel de Engenharia Hiram Reis e Silva

Professor do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA)

Acadêmico da Academia de História Militar Terrestre do Brasil (AHIMTB)

Presidente da Sociedade de Amigos da Amazônia Brasileira (SAMBRAS)

Site: http://www.amazoniaenossaselva.com.br

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