Métodos não Destrutivos: A guerra eletrônica no abate aos mísseis hipersônicos

E.M.Pinto


Os mísseis hipersônicos, capazes de atingir velocidades superiores a Mach 5 (1,7 km/s) e representam um dos maiores desafios para os sistemas de defesa modernos. A principal preocupação reside na dificuldade de detectar e neutralizar essas ameaças a tempo, dada a sua velocidade extrema e capacidade de efetuarem manobras evasiva em sua fase terminal de voo.

Tabela 1. Principais armas hipersônicas e suas caractaterísticas

Leia também:

Mísseis Hipersônicos: Tecnologia & características

Quando um míssil hipersônico é detectado, o tempo de reação para uma defesa eficaz pode ser insuficiente, especialmente se o míssil estiver a uma distância relativamente curta do alvo. Nesse contexto, soluções embarcadas, como sistemas de interferência ativa (jammers), ganham destaque por sua capacidade de resposta quase instantânea e por não exigirem o lançamento de contramedidas físicas, o que elimina problemas de reabastecimento.

Uma das esperanças para a defesa contra mísseis hipersônicos é a técnica chamada de “interferência por polarizaçãocruzada (cross-polarization jamming), A qual, se baseia em princípios físicos e eletromagnéticos bem estabelecidos, além de observações empíricas provenientes de testes experimentais com mísseis.

A técnica é complexa e exige um aprofundamento sobre os conceitos físicos que permitem a sua viabilidade. Desta forma, este artigo procura esclarecer os pontos essenciais para sua compreensão e para tal precisa-se considerar quatro aspectos fundamentais sobre os mísseis hipersônicos

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A Velocidade

A velocidade de um míssil hipersônico varia conforme a altitude. O número Mach, que representa a razão entre a velocidade do objeto e a velocidade do som, é influenciado pela densidade do ar, portanto, em altitudes elevadas, onde o som se propaga mais lentamente, um míssil a Mach 10 pode ser mais lento do que ao nível do mar.

Por exemplo, ao nível do mar, Mach 10 equivale a aproximadamente 3,4 km/s. Se um míssil for detectado a 35 km de um navio, o tempo de reação pode ser de apenas 10 segundos, exigindo uma resposta extremamente rápida para neutralizar a ameaça ou desviar sua trajetória.

A influência da densidade do ar sobre um objeto em movimento, como um míssil hipersônico, está diretamente relacionada à resistência aerodinâmica e às propriedades da propagação do som na atmosfera. Vamos analisar os principais fatores envolvidos:

Densidade do ar e resistência aerodinâmica

A resistência aerodinâmica (Fd) que um objeto sofre ao se mover em um fluido depende da equação:

F= ½ ρ A Cv2

onde:

Cd é o coeficiente de arrasto (dependente da forma do objeto e do regime de fluxo),

ρ é a densidade do ar,

v é a velocidade do objeto,

A é a área de secção transversal do objeto.

Como a densidade do ar diminui com a altitude, a resistência aerodinâmica também diminui. Isso significa que um míssil experimenta menos força de arrasto em altitudes elevadas, permitindo que mantenha velocidades maiores com menos consumo de energia.

Velocidade do som e número de mach

 A velocidade do som (c) em um meio gasoso é dada pela equação:

C = (ϒ R T)1/2

onde:

  • ϒ é o coeficiente adiabático do ar (aproximadamente 1,4 para o ar seco),
  • R é a constante dos gases para o ar (≈287 J/(kg⋅K)
  • T é a temperatura absoluta do ar em Kelvin.

A velocidade do som diminui com a altitude porque a temperatura do ar também diminui na maior parte da troposfera (até cerca de 11 km). Isso significa que, mesmo que a velocidade absoluta (v) do míssil seja a mesma, o número de Mach (M=v/c) pode ser maior em altitudes elevadas, pois (c) é menor.

 Comparativos de velocidades por altitudes 

 No nível do mar, a temperatura média do ar é cerca de 288 K, resultando em uma velocidade do som ( Cn)de aproximadamente:

Cn ≈  343 m/s

Assim, um míssil viajando a Mach 10 teria uma velocidade (vn)absoluta de:

vn ≈  10 x 343 = 3430 m/s

Já a 30 km de altitude, a temperatura média é cerca de 226 K, reduzindo a velocidade do som para:

C30≈  301m/s

Nesse caso, um míssil a Mach 10 teria uma velocidade absoluta de:

V30≈  10 x 301 = 3010 m/s

Ou seja, a mesma razão Mach resulta em uma velocidade absoluta menor em altitudes elevadas.

As figuras 1 e 2 demonstram os resultados obtidos pela simulação  das velocidades do som e baixa e alta altitudes, para velocidades do som e a Mach 10.

Figura 1  Velocidade do Som vs. Altitude , a imagem demonstra como a velocidade do som diminui com a altitude.

Figura 2 . Velocidade absoluta do míssil a Mach 10 vs. altitude, a imagem  demonstra que um Mach 10 em altitude elevada equivale a uma velocidade menor em relação ao nível do mar.

Desta forma, pode-se entender como a densidade do ar influencia diretamente o movimento de um objeto por meio da resistência aerodinâmica, que é menor em altitudes elevadas, permitindo maior eficiência aerodinâmica.

No entanto, a velocidade do som também diminui com a altitude, fazendo com que um número de Mach fixo corresponda a uma velocidade absoluta menor. Assim, um míssil a Mach 10 em grandes altitudes pode ser mais lento em termos de velocidade absoluta do que um míssil a Mach 10 ao nível do mar.

A Interpretação das Especificações dos Mísseis

Nem sempre um míssil anunciado como hipersônico mantém essa velocidade durante todo o seu voo. Por exemplo, o míssil chinês DF-21, embora seja descrito como um míssil Mach 10, atinge essa velocidade apenas em certas fases do voo. Durante a fase terminal, sua velocidade pode cair para Mach 2, o que ainda é rápido, mas significativamente menor do que a velocidade hipersônica. É preciso entender também que por vezes, as armas com capacidade de manobra também desviam dos alvos assumindo uma trajetória mais longa e sobre efeito da força centripeta, acaba por perder energia no movimento e portarnto perde velocidade.

Isso significa que, em sua aproximação final, o míssil pode se comportar como um míssil supersônico, para o qual já existem contramedidas eficazes. Portanto, a defesa contra mísseis hipersônicos pode, em muitos casos, se assemelhar à defesa contra mísseis supersônicos.

Figura 3.  Simulação dos dados de aproximação de uma arma hipersônica por  tempo& distância limite para abate.

A simulação apresentada no gráfico descreve a trajetória de um míssil hipersônico que, ao ser lançado a uma distância de 320 km do alvo, viaja inicialmente a uma velocidade de Mach 10 (aproximadamente 3,4 km/s). Ao longo de sua trajetória, o míssil executa uma redução constante de velocidade até atingir Mach 5 (1,7 km/s) no momento do impacto com o alvo, decorridos 104 segundos. O gráfico fornece uma representação clara do tempo total de 160 segundos até o impacto, sendo o tempo zero correspondente ao momento em que o míssil atinge seu objetivo.

No gráfico, a linha laranja ilustra o tempo total da trajetória, enquanto a linha amarela representa a distância para o engajamento do alvo, com a marca zero correspondendo ao ponto de impacto. Dentro dessa representação, uma área específica destacada em amarelo demonstra o intervalo de tempo e distância em que um possível abate do míssil por meio de um interceptor convencional poderia ocorrer. Essa região crítica se estende por aproximadamente 88 km antes do impacto, correspondendo a um intervalo temporal médio de 45 segundos, dentro do qual os sistemas de defesa teriam que identificar a ameaça, calcular a resposta e lançar um míssil interceptador.

Considerando que o míssil interceptador possua uma velocidade semelhante, de Mach 5, o tempo disponível para a identificação, travamento e abate da ameaça seria reduzido para menos de 23 segundos. Esse curto intervalo de tempo impõe desafios significativos para os sistemas de defesa, que precisam operar com extrema rapidez e precisão. Apesar dessas dificuldades, abates de armas hipersônicas já foram comprovados em testes e operações reais, demonstrando que essa hipótese não apenas é possível, mas já se mostrou viável em eventos documentados.

Como visto, apesar da possibilidade de abate ocorrer por métods convencionais em fase terminal, há a necessidade de sistemas de defesa avançados, capazes de responder com eficiência a ameaças hipersônicas.

A capacidade de detecção precoce e de resposta automatizada são elementos fundamentais para o sucesso de uma interceptação, considerando o curto tempo disponível e a alta velocidade da ameaça, a disponibildiade de interceptores e radares detectores com sistemas integrados e em tempo real que melhorem a conciência cituacional dos decisores de respostas.

O aquecimento da  superfície do míssil

Em velocidades superiores a Mach 5, o atrito entre o míssil e a atmosfera gera um aquecimento extremo na superfície do veículo, criando uma camada de plasma ao seu redor. Esse plasma é composto por ar ionizado, onde os elétrons não estão mais ligados a átomos individuais, formando um estado da matéria altamente energético. Esse fenômeno físico permite que o míssil viaje praticamente dentro de um “tubo de plasma”, que, devido às suas propriedades eletromagnéticas únicas, atua como uma barreira para a maioria dos sensores embarcados.

Sensores infravermelhos (IR) e de radiofrequência (RF), essenciais para a navegação e o direcionamento do míssil, são incapazes de funcionar adequadamente nesse ambiente, pois o plasma reflete, absorve ou distorce os sinais eletromagnéticos, impedindo a comunicação e a detecção de alvos.

A formação do plasma é um efeito direto das altíssimas velocidades e do atrito atmosférico. Conforme o míssil acelera, a energia cinética é convertida em calor, elevando a temperatura da superfície a milhares de graus Celsius. Esse calor ioniza o ar ao redor, criando uma camada de plasma que envolve o míssil. Essa camada, além de interferir nos sensores, também pode causar danos estruturais ao veículo devido às extremas condições térmicas e de pressão.

Portanto, o míssil enfrenta um dilema: manter a velocidade hipersônica e perder a capacidade de localizar e rastrear alvos, ou reduzir a velocidade para dissipar o plasma e recuperar a funcionalidade dos sensores, mas ao custo de se tornar mais vulnerável a sistemas de defesa.

Atualmente, novas tecnologias estão sendo desenvolvidas para superar esse desafio, como sensores avançados capazes de operar em ambientes de plasma ou sistemas de comunicação que utilizam frequências menos afetadas pela ionização. No entanto, essas soluções ainda estão em estágios iniciais de pesquisa e desenvolvimento.

Por enquanto, a única opção viável para garantir a precisão do míssil é reduzir sua velocidade para abaixo de Mach 5, dissipando assim a camada de plasma. Esse processo, no entanto, não é instantâneo e pode levar entre 15 e 45 segundos, dependendo das condições de voo e do design do míssil.

Opções de “Soft Kill”(Não Destrutivas)

Com o avanço das tecnologias hipersônicas, a defesa contra esse tipo de armamento tornou-se um dos maiores desafios no campo da guerra moderna. Através da utilização de contramedidas eletrônicas, várias estratégias de “soft kill” foram desenvolvidas para neutralizar mísseis hipersônicos sem a necessidade de intercepção física. Entre essas técnicas, a interferência por polarização cruzada tem se destacado como uma solução altamente eficaz para desorientar os sistemas de guia desses mísseis.

As contramedidas eletrônicas empregadas contra mísseis guiados incluem três principais abordagens: chaff, decoys e jammers embarcados. O chaff, composto por nuvens de fios metálicos, pode confundir radares, mas tem limitações, como a necessidade de tempo para dispersão e a capacidade dos radares modernos de distinguir entre os fragmentos e o alvo real. Os decoys, por sua vez, podem enganar sistemas de busca, mas exigem tempo para serem posicionados e podem ser detectados por sensores avançados. Os jammers embarcados são mais eficazes, pois podem reagir quase instantaneamente, criando ilusões eletrônicas que desviam o míssil do alvo real.

Existem três principais abordagens de “soft kill” para neutralizar mísseis hipersônicos que são apresnetados na Tabela 2.

Tabela 2. Métodos soft kill para abate de mísseis hipersônicos, suas vantagens e limitações.

Interferência por polarização cruzada

A interferência por polarização cruzada se destaca como uma técnica inovadora de soft kill. Muitos mísseis empregam antenas do tipo “mirror scan”, onde o refletor da antena se move enquanto o alimentador permanece fixo. Esse design cria uma vulnerabilidade estrutural, pois quebra a simetria da antena e a torna mais suscetível à interferência por polarização cruzada.

Ao transmitir sinais com polarização diferente daquela esperada pelo radar do míssil, sistemas de jamming modernos podem gerar erros na detecção de direção e alcance, desorientando a trajetória do armamento inimigo.

Outro fator crítico é a constante dielétrica do radome, a cobertura protetora da antena do míssil. O radome de um míssil é uma estrutura protetora feita de material dielétrico, que cobre a antena do radar e permite a transmissão e recepção de sinais eletromagnéticos sem causar interferências significativas.

Para saber, um dielétrico é um material isolante que não conduz eletricidade, mas pode ser polarizado em presença de um campo elétrico, reduzindo a atenuação e a distorção das ondas eletromagnéticas. No contexto dos mísseis, o radome deve equilibrar transparência eletromagnética e resistência térmica, já que enfrenta altas temperaturas e pressões aerodinâmicas em voos hipersônicos. Materiais como cerâmicas avançadas (ex.: nitreto de silício e alumina) são utilizados para minimizar a distorção do sinal do radar e resistir ao aquecimento aerodinâmico.

No entanto, a constante dielétrica desses materiais pode variar com a temperatura, o que afeta a precisão do sistema de orientação do míssil e pode torná-lo vulnerável a contramedidas eletrônicas. Portanto, materiais de alta constante dielétrica, necessários para resistir às temperaturas extremas do voo hipersônico, amplificam os efeitos da interferência por polarização cruzada. Estudos indicam que um aumento na constante dielétrica de 3 para 6 pode elevar significativamente o ganho de polarização cruzada, tornando o sistema de guiagem do míssil ainda mais vulnerável a essa técnica.

Entendendo o fenômeno

A constante dielétrica εr  do material do radome de um míssil hipersônico varia ao longo de sua estrutura devido a dois fatores principais que são o “Gradiente de Temperatura”  ou seja, a temperatura na extremidade do radome (ponta) é muito maior do que na base (onde está a antena) e as  “alterações na estrutura do material” que devido ao calor extremo pode modificar a microestrutura do material do radome, afetando sua permissividade elétrica.

Para entender como a distribuição da temperatura no radome do míssil ocorre, considere que em velocidades acima de Mach 5, o aquecimento aerodinâmico gera temperaturas que podem ultrapassar 2000 K na ponta do radome, enquanto nas regiões mais afastadas da extremidade, a temperatura pode ser consideravelmente menor (entre 600 K e 1200 K).

Essa variação térmica causa um gradiente na constante dielétrica, pois a maioria dos materiais cerâmicos utilizados no radome (como nitreto de silício ou alumina reforçada) possuem uma dependência térmica da permissividade dielétrica.

o processo de ablação (é o processo de remoção ou destruição de material de uma superfície devido à ação de calor, fricção, radiação ou outros fatores ) da parede de um radome de alta velocidade, que é afetado por três fatores principais: mudança na estrutura superficial devido à ablação, variação nas propriedades dielétricas do material com a temperatura, e expansão térmica do material. Esses fatores são descritos detalhadamente para explicar como a temperatura afeta o comportamento do radome. Vamos analisar cada um deles:

Mudança na estrutura superficial devido à ablação que resulta em uma remoção ou alteração da camada superficial do radome. Isso pode ser visto como uma redução na espessura do material protetor superficial, que é uma simplificação do processo real, onde o material é consumido devido ao calor.

Mudança nas propriedades dielétricas (constante dielétrica e perda dielétrica) que ocorre com o aumento da temperatura pode afetar as propriedades elétricas do material, alterando sua constante dielétrica e perda dielétrica, o que pode comprometer a performance do radome em termos de transmissão de sinais eletromagnéticos.

A expansão térmica que atua no radome provoca expanção e pode afetar a integridade estrutural e a eficiência do radome.

Distribuição de temperatura no radome

A análise de temperatura no radome considera o comportamento do fluxo de calor e a temperatura em várias zonas da parede do radome. A distribuição de temperatura é dividida em duas componentes: temperatura tangencial e temperatura normal.

Sendo a temperatura tangencial aquela que se aplica  o longo da direção tangencial da superfície do radome. A equação fornecida no texto descreve como a temperatura se distribui entre a superfície interna e a externa ao longo dessa direção. A temperatura máxima e mínima em ambas as superfícies (interna e externa) são indicadas nas equações de (9) e (10), onde as variáveis Ti (x) e Te (x)  representam a distribuição de temperatura nas superfícies interna (i) e externa (e), respectivamente.

A equação é dividida em termos exponenciais, o que indica que o comportamento da temperatura ao longo do comprimento do radome não é linear, possivelmente devido à complexidade da interação entre o calor gerado pela compressão do ar na frente do radome e a transferência de calor para a estrutura do radome.

As paredes do radome do míssil podem ser divididas em três zonas de temperatura, sendo elas:

Zona de baixa temperatura (x = 0 a 0,4): Onde as temperaturas são mais baixas.

Zona de temperatura média (x = 0,4 a 0,7): A temperatura começa a aumentar.

Zona de alta temperatura (x = 0,7 a 1): A temperatura atinge seus valores mais altos.

Esse tipo de análise é crucial para entender como o radome se comporta sob altas velocidades e temperaturas extremas, ajudando a projetar materiais e formas para minimizar a degradação e melhorar a eficiência do radome. Os valores e distribuições de temperatura são importantes porque determinam a performance do radome em relação à resistência ao calor, estabilidade estrutural e manutenção das suas propriedades dielétricas, essenciais para o funcionamento dos sistemas de radar e comunicação.

Figura 4. Distribuição das zonas de temperatura sobre o radome do míssil 

Os números de 0 a 1 mencionados no texto se referem a uma escala relativa que representa diferentes zonas ao longo do comprimento da parede do radome. Essa escala é usada para dividir a parede em três zonas de temperatura, com base na variável xx, que representa a posição ao longo da parede do radome. Aqui está o que esses números significam:

Sendo assim a Zona de baixa temperatura (x = 0 a 0,4) é aquela em que o valor de (x) varia de 0 a 0,4. Isso indica que a região é a mais distanate  (onde o fluxo de ar comprimido é menos intenso)  do nariz do míssil e portanto experimenta temperaturas mais baixas. A transferência de calor do ar ao radome é menos significativa nesta região.

Já a zona de temperatura média (x = 0,4 a 0,7) é aquela cujo valor de (x) varia de 0,4 a 0,7, o que indica uma zona intermediária onde as temperaturas começam a aumentar. A transferência de calor é mais eficiente nessa zona, à medida que o calor se propaga da superfície externa para o interior da parede do radome.

Por último, a zona de alta temperatura (x = 0,7 a 1,0) é aquela mais próxima ao nariz do míssil, onde a temperatura é mais alta. A ablação é mais provável de ocorrer nessa região devido ao calor intenso gerado pela compressão do ar em alta velocidade.

Desta forma, os números de 0 a 1  que são obtidos por cálculos matemáticos complexos e que não são o objeto desta análise, são uma forma de normalizar o comprimento da parede do radome, onde 0 representa a ponta do radome (a região de entrada do ar comprimido) e 1 representa a base (parte mais interna do radome). Esse intervalo ajuda a entender a distribuição de temperatura ao longo do radome em um formato padronizado, facilitando a análise e comparação das diferentes zonas térmicas.

Comportamento da constante dielétrica

A constante dielétrica de um material é uma propriedade que determina a capacidade do material de se polarizar na presença de um campo elétrico, influenciando diretamente seu comportamento em diversas aplicações tecnológicas. Quando se aumenta essa constante, o material ganha maior capacidade de armazenar energia elétrica, o que é vantajoso em dispositivos como capacitores.

Além disso, materiais com alta constante dielétrica atenuam a intensidade do campo elétrico interno, aumentando sua eficiência em armazenar carga e melhorando a propagação de sinais elétricos. Contudo, ao considerar a utilização de um material com maior constante dielétrica como cobertura de radome de míssil, devem ser analisados os efeitos dessa característica no desempenho do sistema.

Figura 5. Relação da temperatura pela variação da constante dielétrica do Si3

No caso dos radomes de mísseis, esta estrutura que protege a antena das condições ambientais adversas, como temperatura e umidade, mantém a integridade das ondas eletromagnéticas para a comunicação e detecção. Se um material a qual esta é composta altera sua constante dielétrica, isto tem como resultado a ocorrencia da interação mais significativa com os sinais de radar. Isso porque o aumento na constante dielétrica pode afetar a propagação das ondas eletromagnéticas, fazendo com que o sinal se atenue mais do que o desejado ou sofra distorções.

Dado que materiais com alta constante dielétrica têm a capacidade de reduzir a intensidade do campo elétrico no interior , esta característica pode diminuir a eficiência das transmissões de radar se o radome não for adequadamente projetado. O material pode interferir na qualidade do sinal transmitido e recebido, comprometendo a capacidade de detecção e precisão do sistema. Além disso, uma constante dielétrica muito alta pode levar ao aumento das perdas de sinal, o que seria contraproducente em um ambiente de alta performance, como no caso de mísseis..

Para entender a interdependencia da temperatura e variação da constante dielétrica dos materiais, considera a equação:

εr (T) =  εr0 +αT

Onde:

εr (T) é a constante dielétrica na temperatura T;

εr0  é a constante dielétrica em temperatura ambiente;

α é um coeficiente de variação térmica (depende do material).

Para materiais comumente usados em radomes hipersônicos como o nitreto de silício e alumina, as constantes dielétricas aletram-se significativamente sob eefeito de altas temperaturas.

Para se ter uma ideia, o Nitreto de Silício (Si3 ) → A constante dielétrica aumenta com a temperatura, podendo ir de

εr ≈ 6.5 a temperatura ambiente para 7,2-7,5 a 2000 K esses valores embora não sejam lineares como representados na Figura 5,  demonstram a contribuição da energia térmica na variação dos parametros físicos decorrentes da constante dielétrica.

Para a Alumina (Al2) → Também apresenta um leve aumento, indo de εr 9.4 para 10,5- 11,0 em altas temperaturas.

A alteração na constante dielétrica ao longo do radome por sua vez, promove dois efeitos críticos, a mudança no índice de refração (n).  O índice de refração  n = (εr )1/2 do material muda com a temperatura, podendo alterar a forma como as ondas eletromagnéticas são transmitidas para a antena do radar. Além disso, o aumento da Polarização Cruzada  ocorre quando a constante dielétrica não é uniforme e ocorre dispersão da onda eletromagnética, aumentando a suscetibilidade à interferência por polarização cruzada.

Como visto, na fase terminal os mísseis precisam desacelerar dissipando o plasma e permitindo que sua antena opere adequadamente. No entanto, essa desaceleração também expõe o míssil à interferência por polarização cruzada, momento no qual os jammers podem ser utilizados para desviá-lo do alvo. Simulações e testes práticos demonstram que essa técnica pode gerar erros angulares suficientemente grandes para fazer o míssil errar completamente seu objetivo ou colidir prematuramente com a superfície.

Ressalta-se que a interferência por polarização cruzada não é apenas uma teoria, ela já está sendo implementada em sistemas modernos de defesa. Empresas como Lockheed Martin Canada e Thales UK desenvolveram jammers navais capazes de explorar essa vulnerabilidade, como os modelos Ramsay Jammer, Raven Jammer e Scorpion 2 Jammer. Além disso, governos estão investindo pesadamente em contramedidas eletrônicas.

O Ministro da Defesa do Canadá, Bill Blair, anunciou recentemente um projeto conjunto com a Austrália, com um orçamento de US$474 milhõesnos próximos cinco anos, para desenvolver soluções de defesa contra mísseis hipersônicos.

Historicamente, as contramedidas de soft kill têm se mostrado mais eficazes do que soluções de hard kill, como mísseis interceptores. Um estudo de 1994 da Escola de Pós-Graduação Naval dos EUA revelou que, em todos os cenários analisados, as medidas de soft kill conseguiram desviar mísseis, enquanto as de hard kill tiveram uma taxa de sucesso significativamente menor. Isso sugere que investir em tecnologias de interferência eletrônica pode ser uma abordagem mais custo-efetiva e confiável para enfrentar ameaças hipersônicas.


Conclusão

A defesa contra mísseis hipersônicos é um desafio complexo, mas não intransponível. Ao entender as limitações físicas e operacionais desses mísseis, como a necessidade de reduzir a velocidade para localizar o alvo e as vulnerabilidades inerentes ao design de suas antenas, é possível desenvolver contramedidas eficazes. A interferência por polarização cruzada emerge como uma solução promissora, capaz de explorar as fraquezas dos sistemas de busca dos mísseis e proporcionar uma defesa rápida e confiável. Em um cenário onde cada segundo conta, a combinação de tecnologia avançada e compreensão dos princípios físicos subjacentes será crucial para garantir a segurança contra essas ameaças de alta velocidade.
A defesa contra mísseis hipersônicos é um desafio complexo, mas a interferência por polarização cruzada emerge como uma solução viável e eficaz. Ao explorar as vulnerabilidades inerentes ao design das antenas e ao uso de materiais cerâmicos nos radomes, é possível neutralizar mísseis hipersônicos sem a necessidade de sistemas de defesa dispendiosos ou de reabastecimento constante. A tecnologia já está disponível, e o próximo passo é integrá-la de forma eficiente aos sistemas de defesa existentes. Com investimentos adequados e uma abordagem objetiva, a interferência por polarização cruzada pode se tornar uma peça-chave na defesa contra mísseis hipersônicos e outras ameaças modernas.


Fonte

  1. Hypersonic Interceptor Aero-Optics Performance – ARC, [Link]
  2. Aerodynamic Heating Effects on Radome Boresight Errors – Johns Hopkins University,[Link]
  3. Naval Surface Warfare: A Cost-Effectiveness Analysis of Hard-Kill Versus Soft-Kill for Ship Self-Defense – Acquisition Research Program,[Link]
  4. Electromagnetic Performance Analysis of Inhomogeneous Radome Walls Considering Temperature and Ablation – MDPI,[Link]
  5. Thermal Insulation Characteristics of High-Temperature Heat Seals for Hypersonic Aeroengines – Journal of Physics,[Link]

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