Resenha: A Expansão da China na África – Parceria ou Dependência?

E.M.Pinto


Acesse ao original da BBC Brasil: Jeremy Howell

O artigo da BBC, escrito por Jeremy Howell, aborda a crescente influência econômica e política da China no continente africano ao longo das últimas duas décadas. Com uma estrtatégia de investimentos bilionários no setore de infraestruturas e uma estratégia comercial agressiva, a China consolidou-se como o maior parceiro econômico da África

Aumento dos investimentos chineses na àfrica 2013-2021.

Desde o início dos anos 2000, a China ampliou maciçamente suas trocas comerciais e investimentos na África. Em 2022, o comércio bilateral alcançou a impressionante marca de US$ 250 bilhões, com os africanos exportando matérias-primas, como petróleo e minérios, e recebendo produtos industrializados.

No mesmo ano, Pequim investiu US$ 5 bilhões em infraestrutura e energia no continente, enquanto empresas chinesas lucraram US$ 40 bilhões com esses projetos. Além disso, mais de 3 mil empresas chinesas estão atualmente em operação na África.

Dados Apresentados
Comércio China-África Em 2022, o comércio bilateral totalizou US$ 250 bilhões (cerca de R$ 1,5 trilhão). A China importou matérias-primas (petróleo e minérios) e exportou produtos industrializados.
Investimentos em 2022 Pequim investiu US$ 5 bilhões (cerca de R$ 30 bilhões), principalmente em transporte, energia e mineração.
Lucros das empresas chinesas Empresas chinesas lucraram US$ 40 bilhões (cerca de R$ 242 bilhões) com projetos no continente africano em 2022.
Número de empresas chinesas Existem cerca de 3 mil empresas chinesas operando na África.
Dívida da África com a China A China detém US$ 134 bilhões da dívida africana, representando cerca de 20% do total da dívida externa do continente.
Mudança de estratégia A China tem reduzido empréstimos e se concentrado em tecnologia, como redes 4G/5G, satélites, painéis solares e veículos elétricos.
Dependência de matérias-primas Alguns empréstimos foram vinculados à exportação de recursos naturais, como petróleo e minérios, resultando no controle de minas em países como o Congo.
Impacto para a população local Projetos trouxeram poucos empregos locais, com empresas chinesas importando mão de obra própria e oferecendo condições de trabalho precárias para africanos.
Diplomacia e política A China utiliza sua influência na África para isolar Taiwan na ONU e consolidar seu papel como defensora do “Sul Global”.
Fórum de Cooperação China-África (Focac) Realizado a cada três anos desde 2003, com participação de 53 Estados africanos, sendo a plataforma principal para a parceria sino-africana.
Projeções futuras Até o final do século, 40% da população mundial estará na África, tornando o continente peça-chave na economia global.

Inicialmente, os esforços concentraram-se na construção de grandes projetos de infraestrutura, como rodovias, ferrovias e portos. Porém, nos últimos anos, a China tem redirecionado sua estratégia, passando a oferecer tecnologias avançadas, como redes 5G, painéis solares e veículos elétricos. Essa transição segue na linha de desenvolvimento da chamada “economia verde”, a principal aposta chinesa no cenário atual.

Comparativo de investimentos EUAxChina na África entre 2003-2022.

Os Empréstimos e o Fardo da Dívida

Embora os investimentos chineses tenham transformado a infraestrutura africana, a dependência de empréstimos gerou sérias preocupações. A China detém US$ 134 bilhões da dívida africana, o que representa cerca de 20% do total do continente. Projetos de baixa rentabilidade, como ferrovias, dificultaram a capacidade de pagamento de países como Angola, Zâmbia e Quênia, que acumulam dívidas bilionárias.

Críticos acusam Pequim de práticas de “diplomacia da armadilha de dívidas”, vinculando empréstimos ao controle de recursos naturais.

Em países como o Congo, concessões de minas foram negociadas em troca de créditos. No entanto, especialistas apontam que governos mais fortes conseguem evitar essas armadilhas, negociando em termos mais favoráveis.

País Dívida com a China (US$ bilhões) PIB (US$ bilhões) % da Dívida com a China em relação ao PIB
Angola 25,00 79,72 31,30%
Etiópia 7,40 111,26 6,70%
Quênia 7,40 95,50 7,70%
República do Congo 7,30 13,30 54,90%
Zâmbia 6,08 25,60 23,80%
Egito 5,21 404,10 1,30%

Fonte: Integrity Magazine

Impactos Locais e Relações Geopolíticas

Impactos Positivos Impactos Negativos
Investimentos em infraestrutura: construção de estradas, ferrovias, portos, e instalações de energia. Alta dependência da África em relação à China, agravando os problemas de dívida externa.
Transferência de alta tecnologia: redes 4G/5G, satélites, painéis solares e veículos elétricos. Vinculação de empréstimos à exportação de matérias-primas, levando ao controle de recursos africanos.
Comércio ampliado: US$ 250 bilhões em trocas comerciais em 2022. Poucos empregos locais gerados, devido à preferência por trabalhadores chineses nos projetos.
Financiamento de projetos rejeitados por bancos ocidentais, como ferrovias e estradas. Dificuldade de pagamento de dívidas, causando estagnação econômica em alguns países.
Redução de isolamento político, com maior envolvimento da África em fóruns internacionais. Percepção de condições de trabalho precárias para os trabalhadores locais nos projetos chineses.
Consolidação de parcerias estratégicas para o futuro econômico global. Dependência da China para financiamento e desenvolvimento, reduzindo autonomia dos países africanos.
Expansão da infraestrutura comercial e logística, fomentando exportações africanas. Redução de investimentos em grandes projetos de infraestrutura devido a riscos de inadimplência.
Apoio político em fóruns internacionais, fortalecendo a posição do continente. Percepção de práticas predatórias, como diplomacia de armadilha de dívidas, em alguns casos.
Para Jeremy Howell, apesar dos investimentos, muitos projetos têm gerado poucos benefícios para a população local. Empresas chinesas costumam importar mão de obra de seu próprio país, limitando empregos para trabalhadores africanos e gerando críticas quanto às condições de trabalho.
estratégia que se reproduziu aqui no Brasil e que apesar do silêncio da mídia incorre em questões claramente desfavoráveis para o país.

no caso brasileiro, a BYD (Build Your Dreams), gigante chinesa do setor de veículos elétricos, iniciou operações no Brasil com a promessa de investimento em tecnologia e geração de empregos. No entanto, o modelo de negócios e a gestão do projeto geraram críticas, especialmente em relação à contratação de funcionários chineses para a fábrica localizada em Campinas, São Paulo. A empresa optou por trazer trabalhadores da China, em vez de investir no treinamento e contratação de profissionais brasileiros, o que gerou um debate sobre os impactos dessa prática na economia local.

As principais críticas ao modelo de contrato incluem a alegada falta de qualificação profissional oferecida aos trabalhadores brasileiros, e a substituição de postos de trabalho que poderiam ser ocupados por brasileiros, com um foco em mão de obra estrangeira.

A justificativa da BYD foi que os profissionais chineses possuíam experiência técnica específica para a implementação da tecnologia avançada, mas muitos analistas questionaram a falta de transparência no processo seletivo. Além disso, o impacto no mercado de trabalho local foi discutido, com críticos argumentando que a empresa estaria “exportando empregos” ao invés de contribuir para a qualificação da força de trabalho brasileira.

Imagens divulgadas pelo MPT mostram as condições de trabalho na construção da fábrica da BYD em Camaçari, na Bahia. Foto: MPT/Divulgação. via Carta Capital

O caso dos trabalhadores da BYD no Brasil ganhou atenção também devido a alegações de condições de trabalho análogas à escravidão. Em 2023, houve denúncias sobre a exploração de trabalhadores chineses contratados para a construção e operação na unidade de Camaçari- Bahia. As acusações envolviam condições precárias, como jornadas excessivas, falta de descanso adequado, alojamentos superlotados e retenção de documentos pelos empregadores, o que dificultava a livre movimentação dos trabalhadores. Esses relatos indicam práticas de controle excessivo, de forma que os funcionários não podiam sair das instalações da empresa ou sequer contactar suas famílias sem supervisão.

A investigação do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e a atuação de entidades como o Ministério Público do Trabalho (MPT) evidenciaram a situação, levando a empresa a ser responsabilizada por práticas de trabalho análogas à escravidão. Embora a BYD tenha negado envolvimento direto com as denúncias e afirmado que estava tomando medidas para corrigir os problemas, as alegações geraram grande repercussão. Este caso é um reflexo das preocupações em relação a grandes empresas estrangeiras que operam no Brasil, especialmente no que diz respeito ao tratamento de trabalhadores, com foco nas práticas que violam os direitos humanos e as normas trabalhistas do país.

O Futuro das Relações Sino-Africanas

O Fórum de Cooperação China-África (FOCAC) tem sido a principal plataforma para fortalecer os laços entre Pequim e os 53 Estados africanos. Segundo analistas, o futuro dessas relações dependerá da capacidade dos países africanos de equilibrar a parceria com a China, garantindo que os benefícios superem os custos econômicos e sociais.

Com 40% da população mundial projetada para residir na África até o final do século, o continente se tornará um ator central na economia global  e a China está determinada a consolidar sua posição como parceira preferencial.

Análise

Os artigos que concordam com a análise destacam a relevância dos investimentos chineses na África como um motor de desenvolvimento econômico.

O artigo do El País (“China busca en África una salida para sus tecnologías limpias”) enfatiza que a China tem contribuído significativamente para a infraestrutura africana e a transição para tecnologias verdes, fornecendo produtos como redes 5G, painéis solares e veículos elétricos. Similarmente, o texto de Le Monde (“Au sommet de la coopération sino-africaine…”) reforça que a China se posiciona como uma aliada estratégica do Sul Global, utilizando a cooperação sino-africana para fortalecer relações econômicas e diplomáticas, especialmente no contexto de organizações internacionais, como a ONU. Ambos os artigos corroboram a visão de que os investimentos chineses, embora guiados por interesses estratégicos, oferecem oportunidades de modernização e crescimento às nações africanas.

Por outro lado, os autores que discordam argumentam que a presença chinesa na África tem aspectos problemáticos. O texto de Le Monde (“Entre la Chine et l’Afrique, la lune de miel est un peu finie”) aponta que os empréstimos e projetos chineses frequentemente criam endividamento insustentável, gerando frustrações em países que não conseguem pagar suas dívidas ou usufruir dos lucros esperados.

Já o artigo da UFSC (“A expansão chinesa na África: comércio, investimentos e fluxos financeiros”) ressalta que a estratégia chinesa, embora economicamente impactante, pode ser considerada predatória, pois prioriza os interesses chineses em detrimento das economias locais, especialmente ao empregar mão de obra chinesa e limitar os empregos para africanos.

Esses pontos discordantes indicam que, embora a China seja uma parceira econômica relevante, há preocupações legítimas sobre os impactos sociais e financeiros de sua abordagem.


Fontes

  1. China, os desafios da dívida e os novos riscos para a África, BBC News Brasil, [ link].
  2. China busca en África una salida para sus tecnologías limpias, El País. [ Link ]
  3. “Au sommet de la coopération sino-africaine, Xi Jinping se pose en défenseur du Sud global,” Le Monde.
    [ Link ]
  4. Entre la Chine et l’Afrique, la lune de miel est un peu finie, Le Monde. [ Link ]
  5. A expansão chinesa na África: comércio, investimentos e fluxos financeiros, Periódicos UFSC.Link ]
    BYD no Brasil: Trabalhadores chineses e críticas ao modelo de negócio, BBC Brasil [ link ].
  6. Fábrica da BYD em Campinas: mão de obra chinesa e os impactos no mercado de trabalho brasileiro, Valor Econômico[ link].
  7. Terceirizada da BYD nega trabalho análogo à escravidão na Bahia, CartaCapital, [ link ]
  8. Investigação sobre condições de trabalho na BYD: Acusações e medidas corretivas, O Globo link].

    Gostou do conteúdo?

     🔗 Acesse agora:

    🌐 Site: planobrazil.com www.planobrazil.com

    📺 Canal: / @blogplanobrasil

     Comunidade PB: Link WhatsApp: https://chat.whatsapp.com/GS6gGodn4lq..

    💛 COLABORE COM O PLANO BRAZIL:

    📲 PIX: 14997751485

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será publicado.