E.M.Pinto
A milícia Houthi, apoiada pelo Irã e atuante como autoridade de fato no norte do Iêmen, intensificou as tensões regionais ao lançar um ataque com drones contra Tel Aviv. Este incidente representou uma significativa mudança em relação às hostilidades anteriores atribuídas ao grupo, demonstrando não apenas capacidades ofensivas aprimoradas, mas também uma intenção deliberada de engajar-se diretamente com Israel. O ataque, que resultou em uma morte e vários feridos entre civis israelenses, destaca o crescente nível de sofisticação tecnológica dos Houthis, provavelmente facilitado pelo apoio iraniano.
A retaliação rápida de Israel envolveu ataques aéreos em Hodeidah dentre outras cidades ealegadamente depósitos de armas e bases protegidas nas montanhas ao norte do Iemen. Hodeidah uma cidade portuária estratégica está sob controle dos Houthis. Ao alvejar depósitos de combustível e instalações energéticas, Israel buscou enfraquecer os ativos estratégicos do grupo, embora essa ação tenha também escalado o conflito, provocando incêndios generalizados e agravando o impacto humanitário.
Esse incidente assinalou uma mudança na estratégia regional e tem como alvo direto o Irã. Sabidamente, o fornecimento de tecnologia avançada aos Houthis sugere uma intenção de ampliar o escopo do conflito, envolvendo ainda mais Israel em operações regionais. Isso se alinha com o objetivo mais amplo de Teerã de desafiar a dominância dos Estados Unidos e de Israel no Oriente Médio. Para aluguns analistas, o ataque destaca o papel central dos Houthis como um procurador estratégico na estratégia iraniana, com suas ações servindo tanto para desviar atenções quanto para exercer pressão sobre os adversários.
Quem são os Houthis?
Os Houthis (também conhecidos como Ansar Allah, ou “Partidários de Deus”) são um grupo político-religioso e movimento rebelde originado no Iêmen. Sua formação e ascensão são oriundas de questões históricas, sociais, religiosas e políticas da região. Os Houthis têm suas raízes na vertente zaydita do islamismo xiita, predominante no norte do Iêmen, especialmente na região montanhosa de Sa’dah. O Zaydismo difere de outras tradições xiitas (como os “doze-imamitas” do Irã) por ser teologicamente mais próximo do sunismo. O zaydismo foi historicamente dominante no Iêmen, e os imãs zayditas governaram grande parte do país por séculos, até a deposição do último imã em 1962, com a criação da República Árabe do Iêmen (Iêmen do Norte).
O movimento Houthi resultou de uma organização religiosa e cultural nas décadas de 1980 e 1990, com o objetivo de proteger a identidade Zaydista que se sentia ameaçada pela crescente influência do islamismo sunita wahabista, promovido pela Arábia Saudita. É nesse contextoq ue Hussein Badreddin al-Houthi, um clérigo e líder influente torna-se o o fundador do movimento moderno. Ele liderou a transformação do grupo em um movimento político e armado na década de 2000.
O grupo entrou em conflito com o governo central do Iêmen em 2004, naquel altura, liderado por Ali Abdullah Saleh, quando Hussein al-Houthi foi morto por forças governamentais. Esse evento marcou o início de uma série de insurgências e consolidou o movimento como uma força rebelde significativa. Pode-se dizer que após a morte de Hussein, a liderança passou para seu irmão, Abdul-Malik al-Houthi, que ainda lidera o grupo.
vale ressaltar que os Houthis não são o Iemen e sim, um grupo político organizado que combate o estado Ienemita e que tenta se impor como representante do o Iemen à revelia dos demais cidadãos Iemenitas.
Os Houthis aproveitaram então a instabilidade política e social no Iêmen, especialmente após a Primavera Árabe em 2011 e a saída de Ali Abdullah Saleh em 2012. Em 2014, eles tomaram a capital, Sana’a, e forçaram o presidente Abd-Rabbu Mansour Hadi a fugir. Já em 2015, quando a Arábia Saudita, liderando uma coalizão de países árabes, lançou uma intervenção militar para restaurar o governo de Hadi, foi ai que o conflito escalonou e ganhou dimensões internacionais. Desde então, o Iêmen se tornou palco de uma guerra civil devastadora, com os Houthis sendo apoiados pelo Irã e enfrentando a oposição da coalizão saudita.
Os Houthis combinam objetivos religiosos, políticos e nacionalistas. Eles se opõem à intervenção estrangeira no Iêmen e denunciam o que percebem como “imperialismo ocidental” e “dominação saudita” ao mesmo passo que aceitam apoio do Irã e Coreia do Norte. O movimento também defende reformas sociais e econômicas, embora suas práticas sejam frequentemente acusadas de autoritarismo e abusos e inação no atendimento às demandas sociais.
O arsenal de mísseis e drones dos Houthis
O arsenal de mísseis balísticos e drones utilizado pelos Houthis é uma combinação de tecnologia desenvolvida localmente e fornecida por aliados, com destaque para o Irã e Coeria do Norte. Esse armamento tem desempenhado um papel central nas operações militares dos Houthis e na guerra civil que assola o Iémen desde 2014.
Os mísseis balísticos, como o Badr-1, Qaher-1 e Burkan-3, têm alcançado distâncias significativas, com alguns modelos alcançando até 1.200 km. Essas armas são capazes de atingir alvos no território saudita e em outras regiões próximas, o que tem gerado preocupações de segurança em países vizinhos e em potências ocidentais.
O alcance e a precisão desses mísseis são aumentados por modificações locais e, possivelmente, pelo apoio técnico recebido de países aliados. O modelo Burkan-3, por exemplo, foi usado em ataques significativos contra a infraestrutura da Arábia Saudita, como instalações petrolíferas e aeroportos, mostrando a capacidade dos Houthis de realizar ataques de longo alcance com grande impacto estratégico.
Além dos mísseis balísticos, os Houthis também têm utilizado uma série de drones (VANTs), como o Samad-3 e o Qasef-2K, que têm alvos de precisão similar aos dos mísseis. Esses drones são capazes de realizar ataques a distâncias que variam entre 150 e 1.500 km, atingindo tanto alvos militares quanto civis e em outras partes da península arábica. A capacidade de lançar ataques múltiplos com drones aumenta a eficácia do arsenal dos Houthis, pois esses dispositivos podem ser difíceis de interceptar devido ao seu perfil de voo baixo e velocidade relativamente alta.
O inventário de armas disponíveis é apresnetado na tabela:
Mísseis Balísticos
Modelo | Alcance Aproximado | País de Origem |
---|---|---|
Badr-1 | 150 km | Iémen/Iran |
Badr-1P | 150 km | Iémen/Iran |
Qaher-1 | 300 km | Iémen/Iran |
Qaher-2M | 500 km | Iémen/Iran |
Burkan-1 | 800 km | Iémen/Iran |
Burkan-2H | 800 km | Iémen/Iran |
Burkan-3 | 1.200 km | Iémen/Iran |
Drones (VANTs)
Modelo | Alcance Aproximado | País de Origem |
---|---|---|
Samad-1 | 150 km | Iémen/Iran |
Samad-2 | 200 km | Iémen/Iran |
Samad-3 | 1.500 km | Iémen/Iran |
Qasef-1 | 150 km | Iémen/Iran |
Qasef-2K | 150 km | Iémen/Iran |
Sammad-4 | 1.500 km | Iémen/Iran |
O apoio do Irã ao grupo Houthi é um fator determinante na evolução desse arsenal, com o país fornecendo não apenas armamentos, mas também treinamento e know-how tecnológico. A presença de tecnologia iraniana, especialmente em mísseis balísticos e drones, tem sido apontada como um elemento de escalada no conflito, complicando ainda mais a situação de segurança no Oriente Médio.
Esse arsenal tem sido usado não apenas contra forças sauditas e seus aliados, mas também para pressionar governos e causar danos à infraestrutura crítica, o que leva a uma maior complexidade na resolução do conflito. O uso de mísseis e drones pelos Houthis, portanto, não é apenas uma demonstração de força militar, mas também uma ferramenta política que busca desestabilizar ainda mais a região e desafiar as potências ocidentais e do Golfo Pérsico.
A ascensão regional dos Houthis
O evento que consagrou a capacidade de atuação regional dos houthis foi o ataque às refinarias sauditas, evento este com implicações significativas para a segurança regional e o mercado global de petróleo. O ataque ocorreu em 14 de setembro de 2019 e teve como alvo instalações da ARAMCO, a gigante estatal de petróleo da Arábia Saudita.
Na ocasião as refinarias de Abqaiq, uma das maiores instalações de processamento de petróleo do mundo e Khurais, um dos maiores campos petrolíferos da Arábia Saudita foram fustigados por 10 drones e mísseis de cruzeiro altamente sofisticados, levantando suspeitas sobre o envolvimento indireto do Irã, que apoia os Houthis no Iêmen.
Essas instalações são cruciais para o setor de energia global, processando cerca de 5% da produção mundial de petróleo. O ataque causou incêndios significativos nas instalações, interrompendo temporariamente cerca de 5,7 milhões de barris por dia da produção saudita, aproximadamente metade da capacidade do país. Essa foi a maior interrupção no fornecimento global de petróleo desde a Guerra do Golfo em 1991.
As consequências deste ataque se fizeram sentir no aumento do preço do petróleo, que subiu mais de 10% nos mercados globais, uma das maiores altas em um único dia. A Arábia Saudita mobilizou esforços para restaurar a produção rapidamente, conseguindo normalizar as operações em semanas.
Porém em resposta, a Arábia Saudita e os Estados Unidos culparam o Irã pelo ataque, citando evidências de que os drones e mísseis foram lançados do norte, não do Iêmen. O Irã negou envolvimento direto, mas continuou a apoiar os Houthis no conflito.
O ataque intensificou as tensões entre Arábia Saudita, Irã e outros atores regionais, agravando a crise no Golfo. Porém, também destacou a vulnerabilidade da infraestrutura crítica saudita e a crescente sofisticação das capacidades militares dos Houthis. A crise aumentou a pressão sobre a Arábia Saudita, que já estava enfrentando críticas por sua campanha militar no Iêmen. A comunidade internacional discutiu a necessidade de uma solução diplomática para o conflito iemenita, mas esforços concretos permanecem limitados.
Em suma, o ataque de 14 de setembro de 2019 mostrou a capacidade dos Houthis de atingir alvos estratégicos em regiões extraterritoriais, refletindo tanto sua crescente força militar quanto as dinâmicas do apoio iraniano. Além disso, evidenciou a complexidade do conflito iemenita e seu impacto no equilíbrio de poder na região. Esse evento destacou a interconexão entre as guerras por procuração no Oriente Médio e as economias globais, com o petróleo se tornando uma peça-chave na estratégia e retaliação geopolítica.
O alinhamento estratégico Irã-Houthis
Uma pergunta recorrente dos leitores é, qual o nível de relacionamento entre os Houthis e o Irã?
Este por muitas vezes é descrito no contexto de uma “guerra por procuração” (proxy war), na qual Teerã utiliza grupos aliados para desafiar adversários regionais, como a Arábia Saudita, e expandir sua influência no Golfo de Aden e no Mar Vermelho. Essas áreas são cruciais tanto para o comércio marítimo global quanto para a segurança energética. Entretanto, é importante notar que essa relação não é livre de tensões.
Embora os Houthis recebam apoio financeiro e militar do Irã, eles mantêm interesses locais que nem sempre coincidem com os objetivos globais ou regionais de Teerã. O movimento Houthi é profundamente enraizado nas demandas internas do Iêmen, incluindo tensões sectárias e disputas tribais, o que significa que suas decisões estratégicas também são influenciadas por contextos locais.
Há ocasiões em queestes dois atores já trocaram farpas e divergiram de opiniões tal como esres enumerados na tabela.
Nº | Evento | Descrição | Ano |
---|---|---|---|
1 | Divergências sobre a liderança | Embora o Irã tenha apoiado os Houthis desde o início, houve disputas internas sobre o papel de líderes religiosos e militares dentro do movimento. | 2015-2016 |
2 | Questões de controle de território | Houve discordâncias sobre quem deveria controlar certas regiões no Iémen, especialmente áreas estratégicas. | 2017 |
3 | Resistência a influências externas | Alguns líderes Houthi demonstraram resistência à crescente influência do Irã, preferindo focar mais nas dinâmicas locais. | 2018 |
4 | Desacordo sobre negociações de paz | Durante as negociações de paz, houve desacordos entre as facções Houthi e o Irã sobre a abordagem de concessões e acordos com a coalizão liderada pela Arábia Saudita. | 2019-2020 |
5 | Conflitos no apoio a grupos aliados | Embora o Irã tenha apoiado os Houthis, houve tensões sobre a aliança com outros grupos xiitas, como o Hezbollah, que teve diferentes abordagens militares e políticas. | 2020 |
6 | Desafios no fornecimento de armas | Em algumas ocasiões, o Irã não conseguiu fornecer as quantidades de armamentos que os Houthis desejavam, o que levou a frustrações. | 2021 |
O Mar Vermelho e Bab al-Mandeb
A capacidade marítima dos Houthis, incluindo a suposta introdução de “armas submarinas”, apresenta um desafio estratégico para o comércio internacional. Conforme argumentado por David Scott em “China’s Calculated Inaction in the Red Sea Crisis”, o estreito de Bab al-Mandeb é um dos gargalos estratégicos mais importantes do mundo, por onde transita cerca de 10% do comércio marítimo global. O controle ou interrupção desse fluxo pode ter repercussões econômicas e políticas globais, exacerbando as tensões entre potências ocidentais e regionais.
Para muitos analistas como Scott, a crescente sofisticação das capacidades militares dos Houthis, “armas submarinas”, colocou em xeque a segurança e a estabilidade do comércio internacional. O estreito de Bab al-Mandeb, posicionado entre a Península Arábica e o Chifre de África, tem sido historicamente um ponto nevrálgico para o fluxo de mercadorias, conectando o Mar Vermelho ao Oceano Índico. Dados de 2018 apontam que cerca de 10% do comércio global atravessava esse corredor natural.
O controle ou mesmo a interrupção parcial desse estreito teriam repercussões de longo alcance. Para potências ocidentais, que dependem da livre circulação de mercadorias e energia, qualquer obstáculo no Bab al-Mandeb representaria não apenas um desafio econômico, mas também uma questão de segurança estratégica. Simultaneamente, atores regionais, como o Irã e a Arábia Saudita, têm interesses concorrentes na área e as tensões e transformam o conflito em um palco de disputas geopolíticas mais amplas.
A história recente tem mostrado como ataques a petroleiros e embarcações comerciais geram ondas de instabilidade nos mercados globais. No caso do Bab al-Mandeb, um ataque bem-sucedido poderia elevar os preços do petróleo, pressionar economias dependentes de importações e intensificar a militarização da região. Os Estados Unidos, que mantêm uma presença naval significativa, e aliados europeus, como a França e o Reino Unido já interviram, intensificando ainda mais as tensões e a promesa feita pelo novo presidente dos Estados Unidos de que vai agir no Iemen ascende velhas fogueiras no já complicado Iemen .
Implicações Regionais
Como antecipado neste artigo, não era segredo a capacidade dos Houthis de possuirem alcance regional, sua crescente capacidade militar impacta ainda mais diretamente na segurança regional após conflagrado o ataque à Tel Aviv.
O ataque a Tel Aviv, por exemplo, não é apenas um marco tecnológico, mas também um sinal de que os Houthis podem operar como um ator regional capaz de influenciar conflitos fora de suas fronteiras imediatas. Essa expansão de alcance não apenas aumentou a pressão sobre os adversários regionais, como a Arábia Saudita e Israel, mas também reconfigurou as alianças locais e internacionais.
O equilíbrio de poder no Oriente Médio e o papel de atores externos, como os Estados Unidos, Rússia, China e a União Europeia, se voltam agora para os Iementas e seus parceiros na região ao mesmo passo que se agrava ainda mais as já complicadas crises humanitárias no Iemen.
Desde 2023, o grupo intensificou os ataques a navios comerciais no Mar Vermelho e no Golfo de Áden, incluindo sequestros e impedimentos de navegação.
A Tabela que segue, apresenta os dados dos incidentes confirmados, detalhando o nome do navio, tipo, carga transportada, bandeira (país), status (afundado, danificado ou sequestrado), arma utilizada (drone, míssil, torpedo ou helicóptero) e data do incidente:
Navio | Tipo | Carga | Bandeira | Status | Arma | Data |
---|---|---|---|---|---|---|
Tutor | Graneleiro | Carvão | Libéria | Afundado | D | 12.06.24 |
Rubymar | Graneleiro | Desconhecida | Reino Unido | Afundado | M | 02.03.24 |
Verbena | Cargueiro | Equipamentos de construção | Palau | Danificado | M | 13.03.24 |
Strinda | Petroquímico | Óleo de palma | Noruega | Danificado | M | 12.12.23 |
Ardmore Encounter | Petroleiro | Desconhecida | Ilhas Marshall | Danificado | M | 13.12.23 |
Maersk Gibraltar | Contêineres | Desconhecida | Dinamarca | Danificado | M | 14.12.23 |
Al-Jasrah | Contêineres | Desconhecida | Libéria | Danificado | P | 15.12.23 |
Swan Atlantic | Químico | Desconhecida | Noruega | Danificado | D | 18.12.23 |
Galaxy Leader | Cargueiro | Desconhecida | Bahamas | Sequestrado | H | 19.12.23 |
Armas= M (Míssil), D (Drone) e P (projétil) H(helicóptero)
Embora os Houthis não sejam tradicionalmente associados à pirataria em moldes clássicos, eles foram acusados de atividades relacionadas como a Interrupção do comércio, usando barcos armados para intimidar e interferir no tráfego marítimo. Extorsão de navios com aplicação detTaxas cobradas de navios que passam por áreas sob controle Houthi, sob o pretexto de “tarifas portuárias”. Por último, a operação clássica de pirataria que se consuma à Captura de embarcações estrangeiras sob alegações de estarem transportando armas ou apoio logístico para a coalizão saudita.
As atividades no Mar Vermelho e ao longo do Chifre da África são áreas críticas para o comércio marítimo global. Essa conexão está relacionada ao controle que eles exercem sobre partes do litoral do Iêmen, bem como ao uso estratégico do estreito de Bab al-Mandeb, uma das rotas marítimas mais movimentadas do mundo. Os Houthis controlam grandes áreas do norte do Iêmen, incluindo portos importantes no Mar Vermelho, como Al-Hudaydah, um dos principais portos do Iêmen, usado tanto para importação de suprimentos humanitários quanto como base para operações militares. Áreas costeiras próximas ao estreito de Bab al-Mandeb, que conecta o Mar Vermelho ao Golfo de Áden.
Esse controle dá aos Houthis a capacidade de monitorar e, potencialmente, interromper o tráfego marítimo estratégico. De fato os ataques aos navios no estreito remotam ao início do conflito iemenita em 2015, os Houthis realizaram o lançamento de mísseis e uso de drones contra navios mercantes e petroleiros no Mar Vermelho, uso de barcos-bomba não tripulados para atacar embarcações sauditas e aliadas e ataques contra embarcações de países que apoiam a coalizão liderada pela Arábia Saudita.
Em Outubro de 2016 o grupo atacou o destróier americano USS Mason, disparando mísseis de cruzeiro contra a embarcação, o ataque foi repelido sem danos, mas demonstrou a audácia e destreza do grupo.
Os confrontos entre Israel e os Houthis que intensificaram-se nos últimos meses, resultaram em ataques mútuos que afetaram tanto infraestruturas militares quanto civis. Especialmente no pasado mês de Dezembro/24 estes ataques foram mais numerosos e audaciosos como demonstra a tabela a seguir.
Data | Operação/Evento | Alvos Atacados | Impactos |
---|---|---|---|
19/12/2024 | Ataque Houthi com mísseis balísticos | Aeroporto Ben Gurion e estação de energia em Israel | Interceptação bem-sucedida; sem danos significativos. |
26/12/2024 | Bombardeio israelense no Iêmen | Aeroporto Internacional de Sanaa e portos controlados pelos Houthis | Três mortos confirmados; danos significativos às infraestruturas. |
30/12/2024 | Novo ataque Houthi com mísseis | Tel Aviv, Israel | Míssil interceptado; sem vítimas relatadas. |
02/01/2025 | Ataque israelense a posições Houthi | Infraestruturas militares no Iêmen | Danos materiais; número de vítimas não confirmado. |
A resposta de Israel
Nunca houve declaração formal de guerra de Israel aos Houhis, o Estado de Israel alega que:
Sobre o pretexto de “defender Gaza”, os militantes Ienemitas atacam Israel sobre ordens e coordenação do governo iraniano.
Tel Aviv já reiterou inúmeras vezes de que seus ataques não passarão impunes e prometeu aos Houthis o mesmo destino que leva aos integrantes do Hesbollah e Hamas. Porém nenham grande resposta havia sido dada ao grupo ienemita até 2024. Porém, após os ataques à Tel Aviv e a base aérea de Nevatim, Israel respondeu com o uso de sua Força Aérea.
A resposta imediata se deu com ataques aéreos direcionados à cidade portuária de Hodeidah, no Iêmen entre outras posições mantidas em sigilo até então. Essa estratégia, amplamente conhecida como “linha vermelha”, busca responder de maneira contundente a qualquer ameaça que possa comprometer sua integridade territorial ou interesses estratégicos. Conforme detalhado por Efraim Inbar em “Israel’s National SecurityIssues and Challenges Since the Yom Kippur War”, essa política tem sido um pilar da defesa israelense, especialmente em cenários de escalada militar.
É nesse momento que os recentes ataques dos Houthis, incluindo o uso de drones e mísseis balísticos, marcaram um novo capítulo nesse confronto. A ofensiva israelense em Hodeidah não apenas visou enfraquecer a infraestrutura militar Houthi, mas também enviar um recado claro a outros atores regionais, como Irã, Hezbollah e Hamas, sobre as consequências de uma escalada direta. O risco, no entanto, está na possível regionalização do conflito, que poderia envolver também o Irã, aumentando ainda mais as tensões no Oriente Médio.
As ações militares resultaram em perdas de vidas e agravaram a crise humanitária no Iêmen, já afetado por anos de conflito. Por seu lado, os ataques no Mar Vermelho e no estreito de Bab al-Mandeb, áreas sob influência Houthi, perturbam rotas comerciais vitais, elevando custos de transporte e seguros.
Porém para alguns analistas como Ori Goldberg, embora Tel Aviv mantenha sua política de “linha vermelha”, a dinâmica atual sugere que o risco de regionalização do conflito é mais elevado do que nunca. A combinação de interesses locais e geopolíticos no Iêmen e em seu entorno faz deste um cenário de atenção global, onde soluções diplomáticas ainda parecem distantes.
Dilemas para os Estados Unidos e seus Aliados
Os EUA, que precisam equacionar a proteção marítima, manutenção de cessar-fogo no Iêmen com a contenção da influência iraniana está cada vez mais envolvido no teatro que se desenha. De acordo com Steven Cook em False Dawn: Protest, Democracy, and Violence in the New Middle East, a política externa americana no Oriente Médio tem sido marcada por contradições, especialmente em relação a conflitos como o do Iêmen, onde interesses estratégicos e humanitários frequentemente entram em choque.
A estratégia da então administração Joe Biden para o oriente médio incluia medidas econômicas e diplomáticas para reduzir o fluxo de armamentos aos Houthis. No entanto, como sugerido por Michael Knights do Cobating Terorism Center (CTC), a falta de uma abordagem unificada entre os aliados regionais dificulta a eficácia dessas políticas.
Já, de acordo com Steven Cook, em seu livro False Dawn: Protest, Democracy, and Violence in the New Middle East (2017), a política externa dos EUA no Oriente Médio tem sido marcada por contradições intrínsecas. Tais contradições são especialmente evidentes no conflito do Iêmen, onde interesses estratégicos, como a segurança energética e o combate ao terrorismo, muitas vezes colidem com considerações humanitárias.
No Iêmen, um dos países mais afetados por uma crise humanitária de dimensões catastróficas, os EUA buscam equilibrar seu apoio à coalizão liderada pela Arábia Saudita com esforços para aliviar o sofrimento civil. A estratégia atual, como relatado por fontes diplomáticas, inclui sanções econômicas e medidas para interromper o fluxo de armamentos para os rebeldes Houthis, amplamente apoiados pelo Irã.
A proteção marítima é outro ponto crucial. O Estreito de Ormuz e o Mar Vermelho permanecem vulneráveis a ataques que ameaçam não apenas o comércio global, mas também a estabilidade regional. Os EUA têm intensificado sua presença naval, mas enfrentam dificuldades para equilibrar a dissuasão militar com a necessidade de evitar uma escalada direta com o Irã.
Por trás dessas ações, está a tentativa de mitigar a influência iraniana, que se expandiu nos últimos anos através de aliados e proxies na região, incluindo o Hezbollah no Líbano e os próprios Houthis no Iêmen. O Irã, por sua vez, utiliza esses canais para pressionar seus adversários, complicando os esforços americanos.
Outro fator que pesa para os EUA é a natural divisão entre aliados como Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e Israel que nem sempre sintonizam-se aos objetivos dos EUA. A história recente demonstra que soluções sustentáveis exigem um equilíbrio delicado entre força militar, diplomacia e compaixão humanitária e isso se tornou uma tarefa que permanece incompleta.
A política externa de trump no oriente médio e suas implicações
Donald J. Trump retornou à presidencial dos EUA e de acordo com várias fontes de notícias, aa sua relação com os Houthis no Iêmen, podem esquentar, isso porque fontes indicam que Trump pretende intensificar as ações contra o grupo após sua posse em 20 de janeiro de 2025.
Dentre várias ações, a administração trump pode reincorporar os Houthis na lista de Organizações Terroristas Estrangeiras do Departamento de Estado, revertendo a decisão de 2021 de removê-los. Além disso, é de esperar um aumento nos ataques aéreos contra posições Houthi, especialmente em resposta a ataques a navios da Marinha dos EUA e ameaças ao comércio global no Mar Vermelho.
Em termos mais amplos, a política externa de Trump no Oriente Médio deve continuar favorecendo aliados tradicionais como Israel e Arábia Saudita, mantendo uma postura firme contra o Irã. Espera-se que ele apoie ações militares contra grupos aliados ao Irã, como o Hamas, o Hezbollah e os próprios Houthis, alinhando-se com as prioridades do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu.
Análise e perspectivas
Estratégicamente, os ataques dos Houthis parecem ser calculados, em vez de impulsivos. Ao provocar Israel, o grupo busca internacionalizar o conflito, mobilizando o sentimento pró-palestino no cenário interno e ganhando apoio político de atores regionais críticos às políticas israelenses. Isso se alinha com a estratégia mais ampla dos Houthis de explorar o descontentamento regional para fortalecer sua posição.
O envolvimento do Irã revela um objetivo geopolítico mais profundo, o de enfraquecer a influência dos EUA e de Israel enquanto reconfiguram o equilíbrio de poder no Oriente Médio. Para Israel, o desafio está em responder de forma decisiva para deter novas agressões, sem se envolver em um conflito prolongado com Teerã e seus aliados.
A situação no Iêmen ressalta as mais variadas formas do exercício de geopolítica contemporânea no Oriente Médio, onde conflitos locais estão intrinsecamente ligados a disputas mais amplas entre potências regionais e globais.
O sucesso de futuras tentativas de paz dependerá da capacidade da comunidade internacional de agir com unidade e determinação, enquanto respeita as dinâmicas internas de uma região marcada por décadas de conflito e instabilidade.
A escalada recente, marcada pelo ataque a Tel Aviv e a resposta israelense acendem os pavios de um novo conflito e ambos os lados se mostram determinados a seguir em frente com seus objetivos.
Enquanto isso, a população iemenita continua a sofrer as consequências devastadoras de um conflito que é, em grande parte, uma luta de poder entre atores externos e grupos internos que controlam frações de um estado devastado pelos conflitos.
Referências
David Scott . China’s Calculated Inaction in the Red Sea Crisis [Link]
Efraim Inbar . Israel’s National SecurityIssues and Challenges Since the Yom Kippur War [Link]
Steven Cook em False Dawn: Protest, Democracy, and Violence in the New Middle East [Link]
Michael Knights . Cobating Terorism Center (CTC) [Link]
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