Coreia do Norte aceita se reunir com o Sul

Primeiro encontro em dois anos debaterá participação de norte-coreanos em Jogos de Inverno e melhora das relações entre os países. Anúncio vem um dia após Seul e Washington concordarem em adiar manobras militares.

Líder norte-coreano Kim Jong-un sinalizou vontade de dialogar com Seul em discurso de Ano Novo

A Coreia do Norte aceitou nesta sexta-feira (05/01) se reunir com representantes da Coreia do Sul na próxima terça, dia 9, para tratar da possível participação de atletas norte-coreanos nos Jogos Olímpicos de Inverno de Pyeongchang, na Coreia do Sul, e também para debater a melhora das relações bilaterais.

O encontro, que será o primeiro desde dezembro de 2015, ocorrerá em Panmunjom, lugarejo localizado na zona desmilitarizada na fronteira entre os dois países.

O presidente da Coreia do Sul, Moon Jae-in, disse que “expectativas excessivamente otimistas são indesejáveis”. “Faremos o nosso melhor para que os Jogos de Pyeongchang sejam os Jogos da paz e para resolver o problema nuclear de forma pacífica”.

Tensões crescentes

As tensões cresceram depois que a Coreia do Norte realizou vários lançamentos de mísseis em 2017, incluindo uma série de mísseis balísticos intercontinentais e seu sexto teste atômico, o mais poderoso até o momento.

A tentativa de reaproximação ocorre depois que o líder norte-coreano, Kim Jong-un, advertiu, em seu discurso de Ano Novo, que possui umbotão nuclear em sua mesa, ao mesmo tempo em que sinalizou vontade de dialogar com Seul, dizendo que Pyongyang poderia enviar uma equipe aos Jogos Olímpicos de Inverno da Coreia do Sul.

Seul respondeu com uma oferta de negociações e marcando uma data. No início desta semana, a linha direta entre os governos foi restaurada, depois de ter estado interrompida por quase dois anos.

O anúncio do encontro bilateral ocorre um dia depois de Coreia do Sul e Estados Unidos informarem que adiarão o início das manobras militares anuais para que não coincidam com os Jogos Olímpicos e Paralímpicos de Pyeongchang, marcados para ocorrer entre 9 de fevereiro e 18 de março.

Seul pedira que Washington considerasse o adiamento dos exercícios para evitar que o regime norte-coreano, que costuma considerar essas manobras um ensaio para invadir seu território, responda realizando um novo teste de armamentos.

Pedido

“Acredito que ajudaria muito para assegurar o sucesso dos Jogos de Inverno de Pyeongchang que o senhor mostrasse a intenção de suspender os exercícios durante o evento”, disse o presidente sul-coreano, Moon Jae-in, a seu homólogo americano, Donald Trump, segundo nota divulgada por Seul.

Trump concordou, então, em adiar as manobras e disse a Moon que pode comunicar a Pyongyang que não haverá “guerra” durante a reunião esportiva.

“Manteremos um estrito contato com os EUA durante o processo de diálogo entre a Coreia do Sul e a Coreia do Norte e temos certeza que esse diálogo ajudará a criar uma atmosfera para o diálogo entre EUA e Coreia do Norte para que o tema nuclear possa ser resolvido”, acrescentou Moon.

Trump assegurou que Washington facilitaria toda a ajuda necessária para que Seul e Pyongyang dialoguem e disse que os Estados Unidos apoiam totalmente o presidente sul-coreano.

Fonte: DW

Análise: Confronto com Coreia do Norte é também choque de duas abordagens

Isolamento ou aproximação? Trump e Shinzo Abe apostam na primeira, enquanto presidente sul-coreano defende a segunda. De certo, só uma coisa: Kim Jong-un não vai mais abrir mão de seu programa nuclear.

Kim Dae-jung ao lado de Kim Jong-il, o pai do atual líder da Coreia do Norte, em tempos de aproximação

O imbróglio nuclear envolvendo a Coreia do Norte é também um embate entre duas abordagens bem distintas para lidar com o país mais isolado do mundo. Uma é a do confronto e isolamento. A outra é a da aproximação.

Três importantes aliados estão hoje divididos nessa questão. Enquanto o presidente dos EUA, Donald Trump, e o primeiro-ministro do Japão, Shinzo Abe, defendem a primeira abordagem, o presidente sul-coreano, Moon Jae-in, no poder desde o início de 2016, é partidário da segunda.

O líder norte-coreano, Kim Jong-un, para quem estratégia geopolítica é algo literalmente vital, sabe disso. E analistas afirmam que a recente oferta de diálogo feita por ele à Coreia do Sul visa sobretudo dividir ainda mais os três aliados, principalmente os EUA e a Coreia do Sul.

Moon é herdeiro de uma tradição: a da chamada Política do Sol, criada e adotada por um de seus antecessores, o presidente Kim Dae-jung. De 1998 a 2007, ela foi a política oficial da Coreia do Sul para a Coreia do Norte e colaborou para a aproximação entre os dois países irmãos. Em 2000, Kim Dae-jung ganhou o Prêmio Nobel da Paz por causa dela.

Moon, um social-liberal, já apoiava o diálogo com a Coreia do Norte mesmo antes de assumir o cargo. Em linhas gerais, pode-se dizer que a aproximação é a política defendida pelos partidos liberais de esquerda na Coreia do Sul e no Japão – e é também a do ex-presidente americano Barack Obama.

Já o outro lado desdenha essa abordagem por completo e afirma que ela só serviu para a Coreia do Norte ganhar tempo – e esse foi usado para avanços no programa nuclear. Sanções e isolamento até que os norte-coreanos mudem de ideia seriam, portanto, a melhor opção.

Só que os norte-coreanos não vão mudar de ideia e renunciar ao que já conquistaram. Eles investiram muito no seu programa nuclear, e a posse de armas nucleares é tida pelo regime como essencial para a sua sobrevivência. Conversações, se vierem a ocorrer, podem até resultar num acordo, mas ele só sai se nele constar o reconhecimento da posse de armas nucleares pela Coreia do Norte.

Kim, segundo dá a entender sua mensagem de Ano Novo, parece estar se preparando para entrar na fase seguinte de uma estratégia de longo prazo: garantida a existência do regime, parte-se para uma certa abertura ao exterior aliada ao crescimento econômico. Os próximos meses vão mostrar se é esse mesmo o plano dele.

Coluna Zeitgeist

Fonte: DW

 

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