FOpEsp – A Investida do Tubarão: Síntese Histórica dos Mergulhadores de Combate da Marinha do Brasil (Parte 1)

Fotografia 1: Equipe de Mergulhadores de Combate (EqMEC) executam simulação de infiltração marítima embarcados em um bote pneumático. (Fonte: Acervo do GRUMEC).

Texto elaborado por Rodney Alfredo Pinto Lisboa.

Por ocasião da Segunda Guerra Mundial, Brasil e EUA estreitaram relações assinando um tratado de cooperação político-militar permitindo, entre outros fatores, que os norte-americanos utilizassem bases navais no litoral brasileiro (Natal, Recife e Salvador) com o objetivo de prover a defesa do Atlântico Sul e oferecer auxílio aéreo para as tropas aliadas que combatiam no Norte da África, Europa e Extremo Oriente. O alinhamento entre as duas nações projetou o Brasil como o mais importante aliado ibero-americano dos EUA, rendendo ao país a concessão de um fundo financeiro (Lend-Lease) para que as FFAA brasileiras adquirissem armamentos de origem norte-americana.

A aliança entre Brasil e EUA sujeitou o Poder Naval brasileiro à influência tática e doutrinária da estratégia marítima norte-americana, criando um vínculo que se estendeu ao longo da Guerra Fria. A atividade em questão foi introduzida na MB a partir desse vínculo, quando, em 1964, quatro marinheiros brasileiros (Capitão-de Corveta Carlos Eduardo do Amaral Serra, Capitão-Tenente Antônio Eduardo Souza Trindade, Primeiro-Sargento José Cavalcante Braga da Silva e Terceiro-Sargento Alberi Lazzari Sobrinho) graduaram-se na Classe-31 do UDT (Underwater Demolition Team Course) ministrado pela Escola Naval Anfíbia localizada na Base Naval Anfíbia de Little Creek, no estado norte-americano da Virginia.

Fotografia 2: Mergulhadores escafandristas (EK), componentes de um grupo de doze militares da Marinha do Brasil (MB), enviados aos EUA em 1964 para participar do exigente UDT Course, que teve apenas quatro brasileiros concluintes. (Fonte: Acervo do GRUMEC).

Retornando ao Brasil em julho de 1964, os quatro egressos da Classe-31 do UDT Course começaram a trabalhar no intuito de disseminar os conhecimentos adquiridos no exterior na tentativa de promover e introduzir a atividade do Mergulho de Combate como uma alternativa viável para a MB. Assim, os MECs formados nos EUA passaram a atuar internamente em operações de apoio aos exercícios de desembarque da Esquadra. No exterior, os MECs compuseram a Unidade de Demolição Tática quando da realização das Operações DRAGÃO e UNITAS, que reúnem diferentes Marinhas nacionais em simulações visando o adestramento das Forças Anfíbias (FAnf).

No início da década de 1970, face às novas conjunturas impostas pela guerra irregular conduzida, sobretudo, no sudeste asiático, manifestas gradativa e esporadicamente em vários conflitos assimétricos travados nas primeiras duas décadas da Guerra Fria, a MB, procurando adequar-se às variantes da guerra não convencional, tomou a iniciativa de criar a Divisão de Mergulhadores de Combate (DivMEC).

Subordinada à Força de Submarinos (ForS) e localizada nas dependências da Base Almirante Castro e Silva (BACS), a DivMEC iniciou suas atividades em uma época na qual o Brasil gozava de relativa estabilidade econômica enquanto enfrentava o período mais rígido do regime militar.

Ainda nos primeiros anos da década de 1970, enquanto se deparavam com a difícil tarefa de elaborar uma doutrina operacional focada na atuação dos MECs em Operações Anfíbias (OpAnf) e no ataque submerso a embarcações, a recém criada DivMEC foi encarregada de realizar o levantamento hidrográfico da costa brasileira a fim de identificar possíveis áreas aptas a comportar um eventual desembarque anfíbio.

No final de 1972, o Capitão-de-Corveta Carlos Eduardo do Amaral Serra, o Capitão-Tenente Theotônio Chagas Toscano de Britto, o Primeiro-Sargento José Cavalcante Braga da Silva, o Segundo-Sargento Ozino Brasilino da Silva, além do Terceiro-Sargento Severino Fernandes Filho, foram enviados para a cidade francesa de Saint-Mandrier (região de Toulon) com o objetivo de participar do 42º Cours de Nageur de Combat (CNC [Curso de Nadadores de Combate]) da Marinha da França no início do ano seguinte.

Após 27 semanas de treinamentos e avaliações que colocaram os conhecimentos adquiridos à prova, os candidatos remanescentes, incluindo os cinco brasileiros, foram devidamente agraciados com seus respectivos brevês.

Fotografia 3: Alunos do 42º Cours de Nageur de Combat (CNC {Curso de Nadadores de Combate]), incluindo militares brasileiros, participam de instrução durante a primeira fase do curso ministrado pela Marinha da França em 1973. (Fonte: Acervo CF [Ref.] Theotônio Chagas Toscano de Britto).

Aproveitando sua estada no continente europeu após concluírem o CNC, os MECs brasileiros auxiliaram a Comissão Naval Brasileira na Europa (CNBE) provendo suporte técnico necessário para o processo de aquisição de equipamentos utilizados nas atividades de mergulho. Esses equipamentos, imprescindíveis para a implementação do MEC no país, seriam disponibilizados para o Centro de Instrução e Adestramento de Submarinos e Mergulho (CIASM), estabelecimento de ensino da MB renomeado em 22 de maio de 1978 como Centro de Instrução e Adestramento Almirante Áttila Monteiro Aché (CIAMA).

Após retornarem ao Brasil, os MECs que haviam estado na França juntaram-se a um oficial e um praça que haviam participado, respectivamente, dos cursos UDT e Explosive Ordnance Disposal (EOD [Desativação de Artefato Explosivo]) nos EUA, colocando suas habilidades a serviço da Esquadra no intuito de desenvolver uma doutrina operacional que adaptava o melhor das filosofias norte-americana (focada principalmente nos procedimentos de guerra ribeirinha) e francesa (que enfatizava as ações de mergulho) às necessidades da MB. A elaboração de uma doutrina nacional de MEC possibilitou a criação do primeiro curso nacional de formação de MECs ministrado pelo CIASM em 1974.

Fotografia 4:Instrutores e alunos da primeira turma de MECs formada em 1974 pelo Centro de Instrução e Adestramento de Submarinos e Mergulho (CIASM) da Marinha do Brasil (MB). (Fonte: Acervo do GRUMEC).

Coube à DivMEC à tarefa de exercitar e aprimorar sua doutrina operacional, atuando com o objetivo de atender à crescente demanda de solicitações oriundas da Esquadra e dos respectivos Distritos Navais (DN), mesmo limitada pelas restrições que lhe eram impostas pela grave crise econômica que comprometia o desenvolvimento nacional. Em 1975, por ocasião da Operação VERITAS VIII, levada a cabo na região de Roosevelt Roads (Estação Naval da Marinha dos EUA situada na cidade de Ceiba em Cuba), a DivMEC teve destacado desempenho participando de exercícios militares em conjunto com o SEAL Team 2.
Os efeitos da conjuntura mundial da década de 1980 para a DivMEC representou o desafio de desenvolver uma doutrina que fosse adequada para enfrentar as ações terroristas, que eventualmente, poderiam colocar a soberania dos Estados em situação de risco. Em resposta a essa nova categoria de ameaça, os MECs brasileiros foram encarregados de instituir procedimentos contra ações de elementos adversos em ambiente marítimo, provendo a fiscalização e segurança das Águas Jurisdicionais Brasileiras, bem como assegurando a proteção de embarcações, terminais portuários e plataformas de exploração de gás e petróleo. Foi a partir da elaboração dessa nova doutrina operacional que surgiram os conceitos que dariam origem aos Destacamentos de Abordagem, que operam em apoio ao Grupos de Visita e Inspeção/Guarnição de Presa (GVI/GP), e ao Grupo Especial de Retomada e Resgate (GERR/MEC), unidade especializada em operações antisequestro e contraterrorista realizadas em ambiente marítimo.

Fonte: FOpEsp (Forças de Operações Especiais)