O eclético grupo de pessoas que Donald Trump está considerando para sua equipe de política externa mostra que o presidente eleito dos Estados Unidos não tem uma visão de mundo definida — pelo menos não aquela que Washington e os aliados da América estavam acostumados a ver. A questão então passa a ser: isso é uma coisa boa ou ruim?
O recém-nomeado assessor de segurança nacional de Trump, o tenente general aposentado Michael Flynn, por exemplo, já ressaltou a necessidade de trabalhar com a Rússia para combater o extremismo islâmico.
Enquanto isso, o candidato republicano à presidência em 2012, Mitt Romney, cujo nome vem sendo cotado para secretário de Estado, certa vez classificou a Rússia de “nosso adversário geopolítico número 1” que luta “pelos piores protagonistas do mundo”.
O ex-general David Petraus, que vem sendo considerado para o cargo de secretário da Defesa, trabalhou a vida toda na área de segurança nacional e foi nomeado chefe da agência de inteligência (CIA) pelo presidente Barack Obama. O ex-prefeito de Nova York Rudolph Giuliani, que vem sendo cotado para secretário de Estado, tem uma experiência menor e menos pontos de vista conhecidos sobre a política externa, e é um dos mais duros críticos do governo Obama.
Em suma, trata-se de uma mistura incomum de pessoas leais a Trump com outras que já evitaram seu grupo. Ela inclui algumas pessoas ligadas ao establishment da política externa e outras que deixam esse mesmo establishment horrorizado.
Há, é claro, alguns temas comuns. O grupo apresenta uma mistura pesada de ex-militares. O general James Mattis, um marine aposentado e ex-comandante supremo das forças armadas americanas no Oriente Médio, é um dos principais candidatos a secretário de Defesa. O grupo também pende em direção àqueles que, como o general Flynn e o deputado federal Mike Pompeo, indicado para comandar a CIA, que defendem uma postura mais dura em relação ao Irã e o combate contra o extremismo islâmico.
É claro que neste momento é difícil saber quais desses candidatos são realmente sérios e quais podem ser apenas uma distração, ventilados publicamente para bajulá-los, ou a seus apoiadores. Também é possível que o presidente Trump, assim como o presidente Obama, possa transformar a Casa Branca no centro das decisões de segurança nacional, diminuindo a importância das autoridades de outras partes do sistema.
Mesmo assim, o que é surpreendente nessa mistura é a diversidade de estilos, pontos de vista e experiências — e a falta de uma posição comum em relação ao mundo e suas muitas ameaças.
Isso poderia sugerir um presidente eleito que carece de uma visão coerente. E isso, por sua vez, poderia lançar as sementes de animosidades e maledicências por assessores muito heterogêneos que tentarão preencher o vácuo.
“Esta poderá ser facilmente a mais dividida e desorganizada equipe de governo em 40 anos”, afirma Stephen Sestanovich, professor da Universidade Columbia, que já ocupou cargos importantes na área de segurança nacional para os dois partidos. “As disputas organizacionais e políticas do começo do governo Carter, do começo do governo Reagan e do começo da administração Clinton foram coisa à toa em comparação.”
Essa visão é reforçada pelo fato de que, enquanto candidato, Trump nunca apresentou uma visão de mundo plenamente formada. Ele se ateve de forma consistente as uns poucos pontos de vista firmes — a renegociação dos acordos comerciais existentes, construção de um muro na fronteira com o México para impedir a entrada de imigrantes ilegais e a adoção de uma atitude mais amigável em relação à Rússia — mas foi muito mais vago em relações a questões sobre o que fazer com o presidente sírio Bashar al-Assad. O candidato Trump foi um nacionalista que pregava a América em primeiro lugar, sem explicar com muitos detalhes o que isso significa para os aliados dos EUA.
Isso deixa poucos sinais de orientação e o resultado é muita ansiedade e suposições no mundo todo. Mas é também uma abordagem que agora lhe dá a máxima flexibilidade na formação de seu governo.
O teste definitivo desse pragmatismo de Trump poderá estar em suas relações com o presidente russo Vladimir Putin. Numa entrevista ao “The Wall Street Journal” após as eleições, Trump disse ter recebido uma carta “maravilhosa” de Putin e deixou claro que quer trabalhar com o líder russo, e não contra ele, especialmente no combate ao Estado Islâmico.
Mas Trump não é o primeiro novo presidente a pensar que pode defender uma causa comum com um líder russo. O presidente George W. Bush disse que olhou Putin nos olhos e “sentiu sua alma”, só para depois vê-lo ampliar seu controle sobre a mídia e o empresariado russos e adotar uma linha dura contra a vizinha Geórgia. A equipe do presidente Obama achou que poderia “reiniciar” as relações com a Rússia, mas acabou tendo de engolir a anexação da Criméia pelo país e a intimidação da Ucrânia.
O sinal de alerta para Trump e sua nova equipe, seja qual for sua composição, é óbvio: estejam preparados para ficarem desapontados quando forem lidar com Vladimir Putin.
GERALD F. SEIB
Foto: Evan Vucci/Associated Prees
Edição: konner@planobrazil.com
Fonte: WSJ
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