Dos males do antiamericanismo

Na última década, fomos capazes de estreitar relações com Cuba, Iraque, Venezuela e Angola – dentre outras nações vanguardistas do cenário político e econômico mundial –, mas não com os Estados Unidos.

No mais emblemático dos casos desse período envolvendo uma eventual parceria com os americanos, fizemos questão de desqualificar o melhor produto, que concorria com preço competitivo.

Os caças F/A-18 Super Hornet, da Boeing, preferidos pelos nossos militares, únicos testados com sucesso em combate, foram, primeiro, preteridos por causa de uma exigência de transferência de tecnologia (depois atendida pela empresa) e posteriormente, na falta de outra desculpa, por um suposto mal-estar provocado pelo vazamento de práticas de espionagem do governo americano no caso WikiLeaks.

Se não é exatamente uma surpresa os governos do PT terem certa ojeriza dos ianques, é interessante perceber que nosso sentimento antiamericano vai além dos simpatizantes das ideias socialistas e afins. Embora não difundido por toda a população, esse sentimento extrapola a classe dos nossos políticos – quase todos autoproclamados de esquerda ou centro-esquerda – e se estende principalmente pelas camadas ditas mais esclarecidas, particularmente entre acadêmicos e “intelectuais” diversos.

Há 20 anos, Alvaro Vargas Llosa, Plinio Mendoza e Carlos Alberto Montaner lançaram o Manual do Perfeito Idiota Latino-Americano, que trata com muita inteligência e ironia das crenças predominantes nesta região do mundo sobre as causas de nossa pobreza e nosso atraso. Nele retratam que nenhum preconceito, ressentimento ou desculpa pelos nossos fracassos é tão difundido quanto o antiamericanismo, dado que por estas bandas os americanos são considerados não apenas como a quintessência dos valores burgueses e do liberalismo, mas também do consumismo e da exploração imperialista dos fracos da Terra. Segundo eles, as origens dessa crença – dos Estados Unidos como fonte primal dos nossos males – se encontram na cultura hispano-católica, na visão econômica nacionalista ou marxista, na história de conflitos armados entre os EUA e os países ao sul e ainda em sentimentos antagônicos de inveja e admiração.

Em nosso caso, seria cabível desprezar o elemento bélico – seguramente nunca entramos num embate com os gringos; mas talvez acrescentar aquele fator de ordem acadêmica, dada a inclinação histórica de boa parte dos nossos professores e doutores – em especial nas universidades públicas – por autores europeus. Principalmente a França, a Alemanha, a Itália e mesmo a Inglaterra sempre foram olhadas – certamente com razão – como fontes inequívocas e legítimas de teorias, conceitos, estudos e análises, sem as reservas não raramente dirigidas aos americanos. Em minha prosaica, embora longa, passagem – de 1980 a 2005 – pela Universidade de São Paulo fui beneficiado pela frequente exposição às ideias e obras de europeus, porém desproporcionais reduzidas vezes aos acadêmicos e pensadores dos Estados Unidos. Ao menos em minha vivência, essa predileção pelos europeus se fazia presente nas aulas ligadas aos mais diversos temas. Para minha sorte e melhor formação, fui orientado por um excepcional professor que não sofre e nunca sofreu desse viés, ele mesmo estudou na californiana Stanford University durante seu doutorado.

Voltando aos dias de hoje, é verdade que a prática se tem imposto ao pensamento antiamericano com significativa força: são centenas de milhares de brasileiros que estudaram e estudam nos EUA, o número de turistas brasileiros por lá é da ordem de mais de 1 milhão/ano, são também cerca de 1 milhão os brasileiros que migraram para lá e a grande maioria dos 85% de conteúdo internacional das TVs por assinatura no País vem dos Estados Unidos, apenas para citar alguns números. Por outro lado, embora ainda uma das oito maiores economias do mundo, o Brasil é destino de apenas 2% das exportações dos EUA (11.ª posição) e apenas 1% da origem das importações americanas (17.ª posição).

A rigor, com nosso antiamericanismo acabamos por perder recursos e oportunidades. Perdemos recursos porque poderíamos intensificar e tornar mais vantajosas as trocas comerciais entre os dois países e também perdemos oportunidades de desenvolvimento de nossa sociedade por deixarmos de admitir que temos o que aprender com eles em inúmeras frentes, como educação, tecnologia, economia, infraestrutura, gestão pública e cidadania.

Ninguém precisa admirar a Associação Nacional do Rifle ou gostar de Donald Trump, mas ignorar a prioritodas as contribuições e os avanços americanos é um total nonsense. Seria importante que, ao menos a partir de agora, tivéssemos uma posição estruturada, institucional, constante e atuante a favor do estreitamento e fortalecimento da relação Brasil-Estados Unidos. Os primeiros sinais da nova fase do Ministério das Relações Exteriores parecem muito promissores. Que a tendência prossiga e independa deste ou daquele titular do Itamaraty.

Para finalizar, vale a pena resgatar uma história que novamente tem que ver com aviões: em 1943 e 1944, Casimiro Montenegro, militar e aviador, fez uma série de visitas ao Massachusetts Institute of Technology, o MIT, com a ideia de desenvolver a Aeronáutica no Brasil. Com a colaboração do chefe do Departamento de Engenharia Aeronáutica do MIT, Richard Habert Smith, concebeu o Instituto de Tecnologia Aeronáutica (ITA), que viria a ser fundado em 1950. Como consequência direta da existência do ITA, e tendo-o como condição sine qua non, surgiu em 1969 a Embraer, das mãos de um grupo de iteanos liderado por Ozires Silva. Passados quase 50 anos, a Embraer é hoje uma das quatro maiores empresas de aviação civil do planeta, na companhia da americana Boeing, do consórcio europeu Airbus e da canadense Bombardier.

Fábio Biazzi

  • Fábio Biazzi – Engenheiro de produção,doutor em engenharia pela USP, diretor executivo e consultor de gestão, é professor de liderança e comportamento organizacional do MBA executivo do Insper.

Edição: konner@planobrazil.com

Fonte: Estadão

25 Comentários

  1. O autor é um exemplo de Fanboy dos EUA. Tds os países que se deram bem com os EUA (ficaram ricos), quais sejam, Japão, Alemanha, Coreia do Sul, Porto Rico, tem bases e militares americanos em seu território. Ninguém fica rico só “negociando” com os EUA, com a exceção de Israel que tem representantes dentro do Congresso americano, mas aí já é assunto para uma análise do povo judeu e como se infiltraram na estrutura de Poder Estadunidense, até porque a capital economica dos EUA foi fundada e é dominada politicamente por judeus até os dias atuais. Só para deixar claro, meu comentario não é uma critica ao povo judeu e sim uma análise da situação americana onde grande parte dos políticos segue essa religião e algumas cidades até mesmo tem feriados judaicos.

  2. O antiamericanismo é antes de mais nada em razão de diversas interferências politico-economicas e sabotagens que o país vem sofrendo desde p início do século passado por parte dos ditos
    irmãos do norte. O resto é lolora para burgueses.

    • “Plinio
      Hoje 17:10

      O antiamericanismo é antes de mais nada em razão de diversas interferências politico-economicas e sabotagens que o país vem sofrendo desde p início do século passado por parte dos ditos”

      ~~

      “Estude o passado, se quiser decifrar o futuro.”

      Confúcio

      tentam subversivamente/maliciosamente associar neste pais o “antiamericanismo” com o marxismo radical mas o “buraco é mais embaixo”…como vc corretamente diz o antiamericanismo é antes de mais nada em razão de diversas interferências político-econômicas e sabotagens que o país vem sofrendo desde o início do século passado…é algo muito mais antigo…que veem de muito mais tempo e que não tem nada a ver com movimento marxista…é HISTÓRICO…historicamente este pais é sabotado ….alvo de incursões e exploração estrangeira….incidentes/eventos como a Guerra de Contestado são exemplos emblemáticos de como e porque o “antiamericanismo” surgiu neste pais…a história é testemunha do passado, luz da verdade, vida da memória, mestra da vida, anunciadora dos tempos antigos….desde o século 19 que esta gente dos eua sondam e cobiçam a Amazônia…

      “Se queres prever o futuro, estuda o passado.”

      Confúcio

    • Aragorn .. partindo desse seu pressuposto então o anti-russo por parte dos americanos e dos europeus ( otanzinha ) que se vê muito por lá deve ser também complexo de inferioridade psicológico … Hahahaha … esse americanófilos de plantão

    • Uma boa utopia seria que todo brasileiro pudesse morar pelo menos um ano nos EUA. E claro, depois um ano em Cuba, ou até na Rússia. Para dar mais consistência e base aos seus pensamentos.

      • Sr Melkor nao faz sentido o k disse. Se nao vejamos.. em França Belgica e UK pk mts nacionais sāo contra politica dos seus paises? Ao ponto cometerem atrocidades? Por as cidades dos EUA serem ricas e evoluidas quer dizer que os EUA e que estao certos? Sua politica externa ser melhor que os outros?da o direito invadir subjugar outros paises?

      • “Melkor
        Hoje 22:27

        Uma boa utopia seria que todo brasileiro pudesse morar pelo menos um ano nos EUA”

        já eu acho que esta gente daqui que faz passeatas/mobilizações na avenida paulista por estrangeiro deveriam passar umas ferias lá na Síria pra ver e sentir na pele como é a Democracia “tipo exportação” desta gente dos eua….

      • Melkor … pelo sua lógica então vc já esteve na Cuba, ou na Russia e com certeza já esteve ou esta nos USA …como disse … HAHAHA … esses americanófilos de plantão são uns pândegos …. HAHAHA …

  3. O sr Biazzi a querer “vender” o Brasil ao EUA. Tal qual Ukrania.
    Essa materia alem de estar repleta de falsidade ė ridicula
    Desde os anos 80 bem antes do PT o Brasil e Angola tem uma relaçāo estreita.
    No caso do F/A 18 o sr esqueceu de mencionar que bem antes da “escolha” os Sukois aqueles que muita gente na FAB falavam a mando e a encomenda sei de quem foram rejeitados.
    Para o sr Biazzi inteligente academicos ė so quem nāo ė “contra a politica dos EUA” sua visāo e parcial
    Para o SR Biazzi o Brasil so pode estreitar relaçao com os EUA pk so com os EUA ė que benefecia?
    O Brasil tem estreitar relaçāo com o que lhe dar e trazer o melhor. Quem trazer crescimento e tecnologia a sua industria civil e militar
    Tirando a Embraer o sr nāo foi capaz de mencionar outros beneficios dessa relaçāo com os EUA?
    Sr Biazzi..por muito que queiram o BRASIL nāo ė a garota de programa de ninguem nem quer ter cafetino.

    • Quando fechamos com o GRIPEN,a Boeing fechou a linha de produção do F18, o Gripen foi realmente uma boa escolha ,mas teríamos que ter os Sukoi, mas aí não precisamos publicar o que pensamos de nossos políticos e militares ,colonizados !!

  4. O autor se esquece que Casemiro Montenegro foi empoderado por Getúlio Vargas que fundou o ITA, A CSN e o Colégio da Fundação Getúlio Vargas em Nova Friburgo/RJ, como compensação pelas mortes de nossos pracinhas na Segunda Grande Guerra.

  5. Bom senhores o sentimento o antiamericano não surgiu de repente, foi um processo em que se foram acumulando os interesses ao longo do tempo. Os norte-americanos em função de seu avanço técnico sempre tiveram a clareza de obter por imposição atingir seus objetivos nem sempre utilizando a abordagem diplomática mais adequada (principalmente após a 2ª Guerra) se por um lado existe no Brasil algum sentimento
    antiamericano , por outro existe uma tendencia maciça (classe média) de se achar que o Rei Midasam (Midas + Tio Sam) é o exemplo a ser seguido em tudo que faz ou toca.
    isso demonstra a incapacidade ao longo dos anos de nossa sociedade em criar soluções próprias, tendo como referência sempre os EUA.

  6. Concordo em alguns pontos com o autor. sim, nosso retrocesso não tem por motivo principal os norte americanos, mas nossa falta de seriedade em gerir nossa política de forma geral.
    Somos um povo que sempre limita seu próprio crescimento, desde a ausência de investimentos em setores chaves como o completo descompromisso em administrar os recursos que possuímos, o que sempre tende a gerar défices e mais défices, os quais nós cobrimos com amputações na segurança, educação e saúde, claro, estes setores não são importantes, pois geram a estabilidade da população lhes dando a estrutura básica para o progresso…faz sentido?
    Somos o povo que sempre chuta o próprio rabo, e no final das contas procuramos um culpado para quem chutou, e nisto culpo a nós mesmos pela falta de seriedade política em defender nossos interesses a qualquer custo.
    A questão dos EUA é simples, é somente questão da ética de Weber pros negócios, onde nós sabemos que de fato os EUA possuem um histórico demoníaco de interferência nos assuntos de outros países, mas se fossemos sérios, educados e avançados, neutralizaríamos a ameaça, e ainda prosperaríamos com a prosperidade de deles, fazendo os dois lados ganharem com acordos.
    Quanto ao F-18 o indivíduo deveria ter calado a boca, o caça era o menos querido na disputa, tendo como principais problemas o congresso norte americano que sempre foi problemático na questão de transferência de tecnologia, questão provada com fatos inegáveis, deixando o caça pra trás. A predileção era pelo poderoso Rafale (porém custoso) e do Gripen de baixo custo ( porém com performance inferior ao Rafale), não sobrou lugar pro Gripen nesta final, a escolha já estava entre estes dois a tempos, já não tinha nada a ver com ser contra ou a favor dos EUA.

  7. O texto relata a visão pessoal do autor, não foi feita uma análise histórica, ele não falou do Big Stick e das inúmeras interferências dos EUA na América Latina e no mundo como um todo ! O fato não é ser ”´antiamericano´,mas sim ser contra a dominação de quem quer que seja !

    • Me parece um pitaco de quem nem mesmo acompanhou o caso e jogou ao vento pra ver se alguém acredita, essa é a minha opinião sobre a parte do texto que cerne ao F-18, sem mais, ele falou besteira.

  8. quer dizer entao que a culpa é toda nossa kkk queria ter um filho assim. sqn.quem escolheu a aeronave gripen ng entao foram os dasisquerda? a fab nao apita nada na propria fab uai?

  9. O problema não é o antiamericanismo e sim o anti-imperialismo, seja ele americano, russo, chines… Queremos um mundo multipolar. Parei de ler quando falou que o F18 era a melhor escolha do FX2 e que o F18 foi colocado de fora por suposta espionagem dos americanos. Suposta? Os americanos resistiram a passagem de tecnologia. No fim, não iriam passar tecnologia suficiente.

    • Aponte um só exemplo de pressão russa contra os nossos interesses ,até apoio ao Conselho de Segurança da ONU nos ofereceram !

  10. O antiamericanismo nada mais é que uma desculpa esfarrapada da esquerda pseudo-populista para justificar o fracasso,a incompetência e a corrupção.

  11. Porque será que o anti americanismo existe? não sem razão, nunca fomos olhados como parceiros mas sim como um local para ser explorados mesma coisa pensam todos os latino americanos diferentemente do Canadá que é anglo saxão. Junta-se o racismo cultural americano junto com os preconceitos dos conservadores protestantes contra nós. Nunca houve realmente por lado dos americanos ter uma integração verdadeira mas sempre teve a sua “boa intenção” patrocinando golpes de Estado e outras coisas mais graves para que esse sentimento se espalhasse por todos os latinos americanos. Não quero dizer contudo que todo americano é de fato ruim, com certeza há muitos bons americanos, geralmente aqueles que não são políticos de Washington.

    • Os EUA nāo tenhem parceiros e sim aliados que sāo controlados a nivel militar e político e económico para que estes não tornem se uma potência capaz de rivalizar com os Estados Unidos. ( ex U.E) Como Paul Wolfowitz diz “aliados para trazer pela trela”

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