Boris MirandaDa BBC
Além de não ter água ou comida, o colombiano Yeffer Sánchez enfrentou perigo de animais e guerrilha nos 23 dias em que esteve perdido na selva.
“Não me mate, eu sou o soldado perdido”, suplicou Yeffer Sánchez ao militar que o encontrou na segunda-feira após 23 dias perdido na floresta no centro da Colômbia.
Assim terminou o suplício que havia começado mais de três semanas antes, no dia 5 de março, quando o soldado do Exército colombiano se deu conta de que estava sozinho e perdido no meio da mata fechada do Estado de Meta.
Na primeira noite, Yeffer pensou que seu pelotão voltaria e o encontraria. Sentiu apenas um pouco de angústia.
Como nada acontecia, ele decidiu se movimentar.
Com o passar dos dias ele se deu conta de que estava andando em círculos apesar das longas caminhadas.
“A mata era muito fechada. Eu andava reto mas sempre voltava para o mesmo ponto. Neste momento me desesperei. Chovia e eu passava todos os dias ensopado”, diz Sánchez, de 26 anos, em entrevista à BBC Mundo.
Nestas condições, com aparentemente tudo adverso, o soldado perdido prometeu a ele mesmo que iria sobreviver para voltar a abraçar sua mãe, “dona Anita”.
Sobreviver
Sánchez estava sozinho, molhado, sem água nem comida, mas tinha sua faca, seu fuzil e o uniforme camuflado.
“Passaram muitas coisas pela minha cabeça nessa hora. Sabia que o Exército estava me procurando e pensava no meu pai, na minha mãe e em Deus, por isso não me descontrolei. Nunca perdi a esperança de voltar”, relata.
Como a mata era muito fechada, ele não conseguia ver mais de alguns metros a sua frente. Também não havia um rio para guiá-lo.
Sánchez tinha dois grandes “inimigos”: os animais selvagens e as tropas das Farc.
É difícil dizer o que aconteceria se ele encontrasse qualquer um deles.
“Sabia que se eu disparasse (a arma) poderiam me encontrar, mas não sabia quem (me encontraria). Por isso atuei para evitar que percebessem que eu estava lá. Me movimentei taticamente. Apliquei o que aprendi em cursos de sobrevivência”, explicou o soldado.
Sánchez se perdeu em uma área conhecida como El Charcón, classificada como zona vermelha devido à forte presença das Farc.
“Vi a guerrilha ao longe e de imediato me escondi”, conta.
Mas os maiores desafios eram repor as forças, se hidratar e matar a fome, que se tornava mais insuportável com o passar dos dias.
“Chegou uma hora em que eu não achava água em lugar nenhum. Foram dias assim. No curso nos ensinaram que há cipós que têm água que serve para hidratação. As folhas de bananeira também servem porque têm água. E às vezes eu encontrava pequenos poços”, diz.
Ele se alimentou com sementes e cascas que encontrava. Tentou sem sucesso beber urina para se hidratar, mas não conseguiu.
E quando a fome ficou insuportável, ele encontrou uma tartaruga e a comeu crua. A proteína e a gordura que ingeriu podem ter salvado sua vida.
As “piores noites”
Jeffer Sánchez gosta de rap e era cantando que conseguia passar as noites.
“Eu cantava baixinho para me animar. Foram as piores noites. Não conseguia dormir pensando no que podia acontecer. A barriga roncava e meu único sonho era que no dia seguinte eu encontrasse a saída ou que alguém me visse”, lembra Sánchez.
E toda manhã repetia o mesmo ritual: acordar para procurar algum alimento, tirar o rifle do pescoço e começar a andar.
Enquanto isso, 500 homens do Comando Específico do Oriente o procuravam por terra e ar.
Panfletos com sua foto foram distribuídos nos municípios próximos e, na rádio, anúncios diziam seu nome e contavam que ele havia se perdido na selva.
Mas passaram semanas e nada.
A desorientação de Sánchez chegou a um ponto em que ele calculava que estava perdido há 17 dias quando, na verdade, eram 23.
E uma manhã houve um “milagre”.
“Tive medo. Não sabia o que fazer. Eles estavam apontando para mim e gritei ‘Não me mate, eu sou o soldado perdido’.”
“Fique calmo. Estamos há 22 dias te procurando sem parar”, respondeu o outro soldado, Carlos Enrique Tunubalá.
Os dois baixaram as armas e se abraçaram.
Dona Anita
Por telefone, Ana Fael escutou a voz de seu filho poucas horas depois de seu resgate.
Não conseguiu segurar o telefone e teve que sentar devido à emoção.
Ela foi informada de que seu filho estava em situação estável, com desidratação e alguns quilos a menos.
Durante algumas semanas, o soldado fará uma dieta leve, até que seu corpo se recupere.
A mãe e os sete irmãos de Sánchez viajaram até a base militar em que ele está, para encontrá-lo.
Separados, ela e o filho contaram que tinham o mesmo sonho para quando tudo aquilo passasse: sentar em uma mesa com dois pratos de sopa de lentilha.
É a especialidade de dona Anita e o prato favorito de Sánchez.
Quando os dois se encontraram, o soldado pediu desculpas à mãe. “Espero que você não tenha se preocupado muito, mãe.”
Fonte: G1
Legal. Esse aí nasceu de novo.
Bisonho