Defesa & Geopolítica

Favoritos à Presidência na Argentina falam em aproximação com Brasil

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Daniel Scioli (esq.) e Mauricio Macri disputarão as próximas eleições presidenciais em outubro.

Eleitores argentinos foram às urnas no domingo para eleger os candidatos que disputarão as eleições presidenciais de outubro no país. Nas primárias, chamadas PASO (Primárias, Abertas, Simultâneas e Obrigatórias), os candidatos que receberam mais votos foram o governista Daniel Scioli, da Frente para a Vitória (FPV) e o opositor Mauricio Macri, da aliança Cambiemos, segundo dados oficiais preliminares.

Com mais de 26% dos votos apurados, Scioli contava com 36,7% e a aliança Cambiemos, de Macri, com 31,28%.

Segundo analistas, a campanha recomeça do zero depois das eleições primárias, cujos resultados indicariam a possibilidade de segundo turno, em novembro.

Para vencer no primeiro turno, o presidenciável deve contar com 45% dos votos ou 40%, com uma diferença de 10% para o segundo colocado. A expectativa é de que estes números não devem ser registrados nas primárias.

A menos de 80 dias para o primeiro turno, no dia 25 de outubro, os dois candidatos à Casa Rosada planejam uma relação “mais fluida” com o Brasil, afirmaram assessores à BBC Brasil.

Durante a campanha, Scioli e Macri mostraram-se simpáticos à maior aproximação com o Brasil. No entanto, Scioli foi mais explícito ao aparecer abraçando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em sua campanha televisiva, com o narrador dizendo: “Ele (Scioli) pode conseguir entendimentos fora e dentro do país”.

Mais diálogo

Negociadores brasileiros reclamam nos bastidores da carência de um diálogo “mais intenso” entre os países, de “medidas unilaterais” do governo argentino – como barreiras comerciais – e da “falta de continuidade” de decisões tomadas por ministros e que não são levadas adiante no nível técnico.

Segundo analistas, a eleição presidencial deverá se polarizar entre Scioli, que é governador da província de Buenos Aires e um aliado fiel do kirchnerismo, e Macri, prefeito de Buenos Aires e um dos principais opositores de Cristina.

Scioli foi vice-presidente no governo Néstor Kirchner (2003-2007) e governa desde 2007 a maior província do país. Neste período, alternou momentos de aproximação e distanciamento do casal Kirchner. Macri é filho de um dos empresários mais ricos da Argentina, presidiu o Boca Juniors, o clube de futebol mais popular do país, de 1995 a 2003.

Assessores de Scioli dizem que ele pretende “intensificar” a relação com o Brasil. Mas afirmam que mudanças em pontos sensíveis, como as barreiras comerciais, seriam “gradativas”.

“Existe total disposição para o diálogo permanente e para a maior aproximação em todas as áreas com o Brasil. Mas há uma questão de assimetrias (entre as duas economias)”, disse um assessor de Scioli.

Mauricio Macri vê o Brasil como uma “prioridade estratégica”, de acordo com assessores.

Em meio ao freio econômico nas duas economias, a relação comercial bilateral registra mais de 20 meses consecutivos de queda, o que torna o desafio de aproximar os dois países ainda maior.

Mauricio Macri, opositor da atual presidente, aposta que maioria do país quer ‘mudança de rumo’.

Na definição de um de seus assessores, Scioli é um político que “não adere ao conflito”. Tal estilo “paciente e ambicioso” costuma ser tema de analistas, empresários e de conversas entre políticos, seja em tom de elogio ou crítica.

Scioli teria até dito a interlocutores que quer aprender português “para ser o primeiro presidente da Argentina a falar o idioma”.

Ele esteve recentemente em São Paulo com o ex-presidente Lula, com quem conversou sobre política, e planeja ser recebido pela presidente Dilma Rousseff, em Brasília.

Ex-campeão de corridas de lanchas de alta velocidade, Scioli perdeu um braço em um acidente em 1989. Casado com uma ex-modelo, ele entrou para a política com apoio do ex-presidente Carlos Menem (1989-1999).

O pré-candidato citou o Brasil também em sua campanha no rádio. Disse, por exemplo, que o modelo da UPA (Unidade de Pronto Atendimento) o inspirou a lançar um sistema semelhante em Buenos Aires.

Daniel Scioli foi escolhido por Cristina Kirchner para concorrer à sua sucessão.

Cristina escolheu Scioli antes das primárias de agosto porque o governador contava com mais apoio popular do que outros possíveis adversários, na avaliação da analista política Mariel Fornoni, da consultoria Management&FIT (MyF).

Fornoni e o analista político Rosendo Fraga, do Centro de Estudos Nova Mayoría, acham que as primárias mostram que a sucessão de Cristina Kirchner ainda está embolada, com eleitorado dividido. “Ainda não existe uma tendência eleitoral definida (para a eleição nacional)”, disse Fraga.

‘Prioridade’

No campo de Mauricio Macri, o discurso também é sobre priorizar o Brasil numa eventual gestão.

“O Brasil é uma prioridade estratégica que vai muito além do comércio”, disse à BBC Brasil o subsecretário de Relações Internacionais e Institucionais do governo da capital argentina, Fulvio Pompeo.

Ele afirma que Macri, caso seja eleito, buscará “esclarecer” mecanismos aplicados hoje e que emperram a relação bilateral, como barreiras comerciais.

“Queremos outra maneira de nos relacionarmos com o Brasil e evitar mais danos à relação bilateral”, disse Pompeo.

Macri, crítico de Cristina, defende que a Argentina esteja com o Brasil “nas discussões internacionais” e “siga no Mercosul”, diz o assessor.

“Queremos resolver estes problemas (como barreiras comerciais). E queremos seguir no Mercosul e com o Brasil, mas trabalhando para que as coisas não fiquem estancadas como agora.”

No entanto, o jornal Valor Econômico informou, na semana passada, que a equipe de Macri fez chegar ao governo brasileiro “mudanças radicais que ele pretende propor nas regras do Mercosul, caso vença as eleições.

O maior giro, segundo a reportagem, seria a ideia de liberar os sócios do bloco para negociação de acordos comerciais bilaterais, diretamente com outros países ou regiões, como a União Europeia, por exemplo.

Queda de barreiras

Hoje a Argentina, presidida por Cristina, é criticada nos bastidores dos governos do Brasil, do Uruguai e do Paraguai por “dificultar”, afirmam negociadores, a aceleração das negociações do acordo com a União Europeia.

No caso das barreiras comerciais criticadas pelo Brasil, o trabalho poderá ficar mais fácil de antemão.

Neste ano, a OMC (Organização Mundial do Comércio) atendeu a um pedido da União Europeia, dos Estados Unidos e do Japão e determinou que a Argentina “desative” as barreiras comerciais, chamadas de DJAIs (Declarações Juradas Antecipadas de Importação).

A medida, segundo afirmou o economista argentino Marcelo Elizondo, da consultoria DNI, afetará também a relação comercial da Argentina com o Brasil.

“O fim da DJAI permitirá que o comércio entre o Brasil e a Argentina tenha maior fluidez. É, sim, o fim desta barreira também para o Brasil”, disse.

Na opinião do analista econômico Dante Sica, da consultoria Abeceb, de Buenos Aires, Brasil e Argentina vivem hoje o “maior distanciamento desde a fundação do Mercosul (em 1991)”. Na sua visão, “falta química entre as presidentes Dilma e Cristina”, o que dificulta a “fluidez do diálogo”.

Para um influente negociador brasileiro, o diálogo permitiu a recente renovação do acordo automotivo – o setor representa mais de 50% do comércio bilateral.

“Mas faltam instituições e o compromisso para que acordos sejam levados adiante.”

Além disso, dizem analistas, ambos países “estão muito voltados para seus próprios problemas internos” e “sem muito tempo para resolver as questões bilaterais”.

Fonte: BBC Brasil

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