Opinião: Nova ordem mundial à moda russa

Na América Latina, Putin vai à final da Copa, à cúpula do Brics e a dois países. Isso é sinal da importância estratégica da região e um aviso à Europa, opina Uta Thofern, chefe do Departamento América Latina da DW.

Uta Thofern é chefe do Departamento América Latina da DW

Para começar, uma rápida visita a Cuba, depois uma breve estada na Argentina, no meio tempo a final da Copa do Mundo no Rio de Janeiro e, coroando a viagem, a cúpula do grupo de países emergentes Brics (Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul), em Fortaleza.

Em Cuba, Vladimir Putin se encontra com o velho revolucionário Fidel Castro, que já há um bom tempo não é visto em público. Em Buenos Aires, estará ao lado da endividada presidente Cristina Kirchner. E por fim, Putin no Brasil. Primeiro, na arquibancada do estádio Maracanã, depois numa troca de ideias com a presidente Dilma Rousseff, que compete pela reeleição. E talvez também pelo papel principal na cúpula do Brics no Brasil – um papel que Putin, com sua espetacular aparição, bem que gostaria de assumir.

A viagem à América Latina do “Rei Sol” russo é bem encenada, e ele vai apreciar as visitas aos países que precisam dele. Um perdão da dívida para Cuba, aliado a uma nova promessa de empréstimo e a um projeto portuário binacional. Apoio a Cristina Kirchner na luta contra o processo dos fundos de investimentos, e projetos energéticos comuns. Ajuda amigável a Dilma Rousseff, para melhorar a balança comercial mútua. E, ao mesmo tempo, a oportunidade de uma aparição conjunta, como representante de uma ordem mundial multipolar. Onde quer que haja um problema, Putin, o salvador, está por perto.

A Rússia cultiva antigas alianças e novas relações de dependência. Na nova ordem mundial imaginada por Putin, a América Latina exerce um papel importante, além de possuir para ele, na qualidade de adversário de uma hegemonia americana, uma atração especial. No início do ano, o primeiro-ministro russo, Dimitri Medvedev, já havia atribuído grande importância à região, declarando abertamente: “A Rússia veio para ficar.” Não se falou de parceria estratégica, mas sim de bases da Marinha russa na América Latina.

Não subestimar a América Latina

O simpático urso russo possui garras e dentes. Mas o puma latino-americano também tem garras, que só se veem quando ele as põe para fora. A América Latina não vai se entregar à Rússia. Mulheres como Dilma Rousseff e a presidente do Chile, Michelle Bachelet, não devem ser subestimadas, e também o apoio argentino à anexação russa da Crimeia foi bem posicionado. Países como o México e o Peru são autoconfiantes o suficiente para não permitirem ingerências em sua política – enquanto o antigo maior aliado da Rússia, a Venezuela, tornou-se o paciente latino-americano. E, não menos importante, a própria Rússia, sob ameaça de sanções, também necessita de apoio.

O flerte russo com a América do Sul é um jogo onde há rivais dignos de serem levados a sério. Há muito a China se aventura na América Latina com investimentos gigantescos, posicionando-se entre os principais compradores de matérias-primas. O recém-eleito primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, representará seu país com nova autoconfiança na cúpula do Brics.

Resta somente a pergunta: por que a Europa, por que a Alemanha se apresentam tão tímidas nessa disputa? Economicamente, a importância da América Latina é indiscutível, as similaridades culturais são grandes: no entanto, a significância política fica muito para trás. A Europa não deve tratar como algo óbvio as tradicionalmente boas relações com o “seu” antigo “Novo Mundo”.

Fonte:DW

15 Comentários

  1. por LUCENA
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    Pode sê que para a Europa agora, aproveitando o seu problema interno e a pré-disposição americana para as negociações com eles, deixem de lado o resto do mundo e a China, Rússia e a Índia os agradecem .
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    Os Europeus e os Americanos querem manter as rédeas da economia global e sabem que com a China e a Russia, não se brinca.

  2. Muito bem posicionada a opinião.
    Nos BRICS, aos meus olhos pelo menos, o Brasil já demonstrou que não mergulha de cabeça numa relação desmedida com nenhum de seus parceiros de grupo, mantém sim uma relação de equivalência e respeito e acredito que manterá assim sempre olhando primeiro para nossos interesses sem permitir desrespeitos a nossa soberania,,como já foi permitido em anos passados por questões de afinidades corruptas e interesses, transformados, de forma retórica, em afinidades ideológicas por grupos da elite nacional. Coisa que transformou muitos de nossos cidadãos em viciados na cultura alienígena desprezando a própria cultura.

    • Qual cultura, Julio ???… antes de desprezar a própria cultura temos que ter uma cultura para desprezar… já tivemos uma alta cultura antes do meado do século passado… fizemos história… hoje, nem cultura temos, que dirá alta cultura… a não ser que vc entenda como cultura o que é produzido pela “Valeska Popozuda” ou por grupelhos que tem a coragem de chamar de samba esse pagodinho xumbrega que tentam nos fazer engolir… SAMBA é CARTOLA !!!… o rock nacional, outrora até interessante já não existe mais… excetuando alguns grandes nomes da pintura contemporânea nacional que fazem sucesso lá fora e alguns ótimos fotógrafos, fica a impressão que não existimos no mapa mundi cultural… qnto a alta cultura literária, então, SOFRÍVEL… já fomos grandes nesse quesito… hoje, amargamos dissabores e vergonhas qndo nos deparamos com nomes como Paulo Coelho e cia… então, precisamos sim, valorizar a nossa cultura, que, aliás, pereceu ainda mais nesses 30 anos de implantação forçada do desconstrutivismo cultural espelhado em Derrida, implementado pela esquerda que nos governa, traduzido em pobreza cultural extrema, indigência mesmo… oxalá tenhamos forças para pugnar e vencer essa luta feroz travada contra engenharias sociais socialistas que nada perdoam e exígem senão o domínio total e irrestrito da sociedade… quem conhece o outro lado do pasto entenderá… quem já se acostumou com a cerca nada entenderá… assim é a nossa vida de gado… eles, os que governam, sabem o que é bom e consomem do melhor da cultura mundial… lek lek lek é pro povão… eles bebem pinga na frente do povão mas na intimidade bebem mesmo é VEUVE CLICQUOT… enquanto não entendermos o real significado do que vem a ser CULTURA, continuaremos a achar que folclore é cultura, e assim fornecemos a coisa que a elite que nos governa mais deseja, nosso total incultura e desconhecimento da realidade dos fatos… saudações…

    • “Coisa que transformou muitos de nossos cidadãos em viciados na cultura alienígena desprezando a própria cultura.”

      Qual própria cultura Julio Brasileiro? Aquela que esta infiltrando o funk às canções tradicionais das festas juninas?

  3. Lendo esse texto está claro :

    Eu amo quem me Ama,
    Quem não está por mim está contra mim,
    Quem comigo não ajunta, espalha.

    O espaço perdido pelo ocidente após 1982 junto aos corações latino americanos está sendo ocupado com maestria pelos Brics .
    E pior, a agressividade ocidental para conosco, com a Estrela da Morte, vai aumentar.

    Jogo de xadrez é especialidade russa mesmo.

    Mas vamos falar outra verdade , que gatona é essa mulher, pelo menos nessa foto.

    • stadeu,

      As relações comerciais entre países não assumem posições tão unilaterais como você acredita… Dinheiro normalmente não tem ideologia, e relações comerciais são pautadas principalmente pelo lucro mútuo. Essa é uma verdade absoluta no mundo globalizado de hoje, ainda mais levando-se em conta a multipolaridade que se apresenta, com tantos atores econômicos em projeção… Por tanto, as relações comerciais podem adquirir tons bem mais “ambivalentes”, por assim dizer… Veja o exemplo de EUA e China. Não concordam em tudo, mas mantem uma relação comercial forte porque precisam…

      O único país latino que realmente perdeu espaço nas relações com o mundo após 1982 foi a Argentina, iniciando uma campanha militar que jamais teve condições reais de ganhar, e com isso perdendo verdadeiras oportunidades de inserção nos grandes mercados globais. Boa parte da condição atual daquele país é devida a sua desastrada atuação nos anos 80, que destroçaram seus esforços diplomáticos levados a efeito ao longo das décadas anteriores, comprometendo todas as relações futuras. Não fossem as decisões erradas, poderiam hoje ter até o controle conjunto do arquipélago que disputam. E assim como o Reino Unido cedeu Hong Kong a China, não seria ilógico prever que o controle das Falklands se tornasse argentino, assim que os mesmos se tornassem uma economia forte e organizada. Contudo, graças as posturas atuais, iniciadas nos anos 80, esse esforço pode ter sido comprometido por décadas ainda por vir…

  4. O porque da timidez européia se explica na atual bagunça politica ( no sentido da fraqueza e incerteza inspiradas por suas instituições ) e econômica da América do Sul, notadamente Venezuela e Argentina; dois atores principais que perderam os rumos de suas economias faz tempo… Exceção feita a Brasil, Chile, México e Peru, os demais países latinos não estão bastante organizados ao ponto de sustentar uma relação comercial vigorosa.

    Contudo, é errado acreditar que os europeus não estão ativos… Em termos econômicos, ainda investem pesado na América Latina; principalmente no Brasil e no México. Eles sabem perfeitamente que esses países, cedo ou tarde, serão parte da tábua da salvação para suas economias, e uma relação econômica sólida se torna imprescindível…

  5. Aproveitando o vacuo deixado pelos Americanos , putin banca o vendedor de sonhos (diga-se armas ), existe uma tendencia de disputa por influencia na america do sul, despistadamente os players vao dando as cartas ,aproveitam das falhas americanas, o ponto forte de russos e chineses eque els sabem explorar o desejo de alto-afirmaçao da america latina , agem como estelionatarios ,primeiro ganham a confiança , depois criam a dependencia , agem diferente dos americanos ,porem o objetivo eh o mesmo ,tirar vantagem dos subintelectuais ,pode parecer ateh algo monstruoso mas na AL abunda tonhos-tonhos-da-lua ,kkkkkk

  6. Eu achei o artigo bem fraquinho. Quase uma mea-culpa para justificar a inação europeia (no particular a alemã), frente as ações da diplomacia russa.

    De fato a articulista está remoendo um problema com o qual a Europa não tem a mínima noção de como lidar: a perda de poder de influência relativo europeu sobre o resto do mundo. Depois de mais de 500 anos se utilizando de maior força político-econômico-militar para determinar os destinos do mundo, neste momento ela não é capaz de resolver nem o problema próximo que é estabilizar a Ucrânia, aonde seu papel de coadjuvante menor fica claro frente as ações de EUA e Rússia. E fica evidente também que a União Europeia, criada para, principalmente, sustentar uma posição de força pela ação conjunta dos países, de fato não está entregando o que promete. Na questão ucraniana chega a ser irrelevante sua participação (bom lembrar do “fuck UE…” dito pela assessora especial norte-americana Victoria Nuland quanto ao que ela pensava sobre a participação da UE no processo político interno ucraniano).

    A América Latina é, nesse momento, o grupo mais estável no mundo sob o ponto de vista político-econômico. Mesmo com governos de diferentes matizes ideológicas, está conseguindo a muito custo manter esta estabilidade e produzir algum crescimento econômico e social sem depender de mais nada além de si mesma.

    Então o problema não são os avanços comerciais com a China; não são as ofensivas diplomáticas da Rússia; não é a interação através do BRICS. É a forma como a Europa esta tendo de estabelecer relações com a América Latina que mudou. Várias empresas europeias e norte-americanas estão instaladas aqui de fato, mas a forma como atuam e mesmo sua liberdade de ação é muito mais restrita do que a poucas décadas atrás. Se tomarmos o Brasil como exemplo, a exigência de contrapartidas e nacionalização da maior parte dos componentes industriais produzidos aqui seriam coisa impensável até pouco tempo atrás, mas foram condições impostas e aceitas porque, por pior que fosse para a Europa, ela depende mais do que nunca das divisas enviadas pelas multinacionais instaladas por aqui e que chegaram a mais de U$D 30 bilhões no ano passado. Não é valor a ser desprezado. Por outro lado significa também que os países desenvolvidos da Europa (e junto toda a União Europeia), não possuem mais poder definitivo de influência no comércio internacional.

    A Europa, queiram ou não, está com problemas para se adaptar a sua nova condição dentro da estrutura multipolar que se avizinha no século XXI, com menos poder e influência do que jamais teve.

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