Huntington, ISIS e o Choque de Civilizações.

O avanço dos fundamentalistas do Estado Islâmico no Iraque e no Levante e a recente declaração de um califado em uma região que compreende territórios do Iraque e da Síria trouxeram de volta as preocupações do mundo ocidental com o fantasma do radicalismo islâmico.  E de quebra ressuscitou as advertências do teórico das Relações Internacionais Samuel Huntington sobre o Choque de Civilizações.
Segundo a teoria proposta por Huntington, havia o iminente risco de um choque entre as oito civilizações, classificadas como Ocidental, Islâmica, Budista Confuciana, Africana, Xintoísta Nipônica, Eslavo-Ortodoxa, Hindu e Latino-Americana, e tal conflito se daria no período pós-Guerra Fria. O conflito entre essas culturas tão distintas seria inevitável por conta das diferenças entre essas civilizações, principalmente no que diz respeitos aos valores particulares de cada uma. Huntington aponta uma divergência particularmente profunda entre a Ocidental e a Islâmica. É nesse contexto que se insere o califado proposto pelo ISIS.
Fazendo a ressalva de que o conflito ideológico ainda persiste, como no caso da a Coréia do Norte desafiando os Estados Unidos cabe a reflexão de que mesmo os conflitos ideológicos se dão na esteira de conflitos de ordem moral e cultural.

É claro que o choque de civilizações não se restringe ao mundo Islâmico, ele também acontece em outras esferas. A Ucrânia tenta se livrar das garras da Rússia Eurasiana de Vladimir Putin e se alinhar ao Continente Europeu, a Nigéria se curva cada vez mais as pretensões do jihaddistas do Boko Haram, os governos de esquerda da América Latina abrem mão da democracia em prol de uma união bolivariana comandada por Fidel e Maduro. O choque se dá em varias instâncias.

Quando escreveu o artigo que originou o livro, Huntington bateu de frene com os pressupostos idealistas que pregavam uma sociedade global que superaria todos os seus conflitos e deixaria para trás um passado de guerras e divergências politicas, religiosas e ideológicas por meio da cooperação entre as nações. Edward Said disse que a tese de Hutington era uma versão “reciclada da Guerra Fria”, e John Esposito tentou desacreditar o teórico afirmando que com o fim do conflito entre os dois blcos, haveria quem procurasse por novos demônios. Francis Fukuyama, por exemplo, chegou até a pregar “o fim da história”. Para o teórico nipo-americano, o avanço do comercio, da cooperação internacional e do capitalismo aliados ao fracasso das economias socialistas e dos regimes totalitários levaria o mundo a um período de paz e integração baseadas nas noções do neoliberalismo. A verdade é que embora seja acusado de proclamar a superioridade ocidental, Samuel. Hutington soube como poucos, reconhecer e defender o legado dessa civilização para a humanidade. Se os idealistas e liberais levassem a sério a obra de gente como Aleksander Dugin e Eduardo Galeano, saberiam que sempre haverá que despreze os valores culturais do Ocidente. Como diria certo musico brasileiro: “Sabe de nada inocente”!
É evidente que em um mundo tão plural existem profundas diferenças de civilização e de valores entre os povos. A Religião, a Politica e as Ideologias diversas são pensamentos universalistas e como tal se opõe ao que é diferente. No caso de minorias como os jihaddistas e eurasianos, a intolerância contra o pensamento divergente chega a níveis extremos como a tentativa de dominação e não aceitação da existência do outro.
As pretensões do ISIS reforçam a tese de Huntington. O califado desejado pelo grupo e exposto na mídia nos últimos dias mostra um território que não se limita ao mundo árabe: ele vai até o Mediterrâneo, englobando Roma, o centro do cristianismo e provavelmente o resto do mundo.  E não para por ai: Abu Bakr al-Bagdadi, o recém-aclamado “califa” apareceu pela primeira vez em publico no dia 5 conclamando os militantes a prestarem lealdade e total obediência na luta contra o lixo ocidental, seus pecados e as democracia. O líder disse “Se Deus quiser, vamos tomar Roma e o mundo inteiro”. A prova que alguns analistas liberais e idealistas queriam de que o choque envolve a diferença de valores das civilizações esta aí.
O que difere o califado do Isis das outras agendas jihaddistas é justamente o alcance de suas pretensões e o fato de serem mais radicais do que todos os outros grupos. Começaram a agir como uma espécie de filial da Al-Qaeda e foram depois expulsos da organização. É isso mesmo: os rebeldes que hoje conquistam o Iraque desocupado pelos americanos são considerados extremistas pela Al-Qaeda, como eu havia dito aqui. E não é só isso: a interpretação da sharia proposta pelo grupo consegue não só alarmar o Ocidente como desperta profundas divergências entre o mundo muçulmano.
Segundo a tradição, o califado é a única forma de governo legitimamente reconhecida pelo Al Corão e representa a unidade do mundo islâmico. O califa se trata por tanto de um sucessor da autoridade politica e religiosa do profeta Maomé, de acordo com a Encyclopedia of Islam and the Muslim World.
Embora se diferenciem dos ocidentais pelo pouco apreço a democracia e ao Estado de Direito, e ainda que se julguem moralmente superiores; o povo árabe sofre das mesmas idiossincrasias comuns a todos os homens. Assim como o militante comunista que sempre se vê em uma posição de destaque em uma eventual vitória da Revolução e nunca como uma formiga operaria, cada vertente islâmica também reivindica para si o papel de legitima representante do Islã e sucessora da autoridade exercida por Maomé. Sendo assim os xiitas consideram que o califa deve ser proveniente da família Ahl al-Bayt, a família de Maomé. Os sunitas por outro lado entendem que deve ser eleito dentre os membros da tribo dos quraysh.
O que está sendo levado a cabo no Iraque e na Síria pode ser tecnicamente inviável se considerarmos as diversas forças politicas envolvidas. É quase certo que tanto Irã, Síria e Turquia quanto os países ocidentais e Rússia e China vão frear o grupo. Ocorre que a dor de cabeça que darão ao mundo é simplesmente algo fora de controle. Sabe-se, por exemplo, que vários europeus convertidos ao islamismo estão colaborando com o ISIS. Esse contingente de homens pode facilmente ser utilizado como massa de manobra em eventuais ataques terroristas ao Ocidente, além de atuarem como agentes nos territórios reivindicados pelo califado.
Por outro lado é justamente esse evento que promove alianças improváveis, como uma possível ação militar conjunta entre Ira e Estados Unidos, ou a ação conjunta de países como Israel, Síria, Iraque, Arábia Saudita, Turquia e Síria contra os grupos rebeldes. Pelo visto a ocasião faz o ladrão e o aliado. E tudo isso culpa da cegueira pacifista que acometeu os Estados Unidos por conta da Guerra do Iraque. Os republicanos de George Bush, sempre pessimistas e adeptos de uma visão realista das Relações Internacionais, entendiam que a ocupação no Iraque deveria durar até pelo menos, que a neutralização dos grupos fundamentalistas fosse concluída. Os democratas de Obama e da imprensa mainstream por outro lado, acreditavam piamente em “outro mundo possível”. Tanto que o presidente anunciou a desocupação do Iraque como uma das grandes realizações de seu governo, como foi dito nesse outro texto. Depois de entregar o comando militar do Iraque para as autoridades locais, será obrigado a voltar para a região junto a um dos países que mais contesta os Estados Unidos e seus valores: o Irã dos Aiatolás. Se os críticos liberais e da esquerda diziam que os Estados Unidos saíram humilhados do Iraque, é porque não imaginavam que as tropas americanas passariam pelo vexame de ter que voltar para corrigir um trabalho malfeito.  Huntington tinha mesmo razão.

14 Comentários

  1. CREEEEEEEDO!

    Que amontoado de bobagens. E, pra variar, vem de um desses sites que mal e porcamente conseguem explicar Fukuyama, quanto mais Huntington que, só para deixar a coisa bem clara, fala em choque de civilizações mais para mostrar a supremacia de uma suposta civilização ocidental-caucasiana-cristã sobre o resto do planeta. Não há nada de novo no que ele fala pois prega o que muitos europeus já falavam no final do século XIX, usando a proto-ciência como argumento: o homem branco é superior a todos os outros porque sua ciência é única.

    Mas eu recomendo fortemente a leitura do dito cujo. Principalmente para constatar que, em se tratando de cinismo acadêmico, ninguém supera a turma neocon da tinquetanquelândia e da aiviligue.

    A propósito, essa turma toda citada nos primeiros parágrafos é de doer a alma. São todos neocon. Todos escreveram teses completamente refutadas no meio acadêmico, mas como estão apoiados sob patrocínio de grandes grupos lobistas e de mídia continuam aparecendo como referência, coisa que não são.

    Ainda lembro o dia em que li pela primeira vez (a uns 20 anos) o livro banbanban do Fukuyama, criado a partir de uma artigo que ele transformou em tese: O fim da história e o último homem.

    Todo mundo caiu de pau frente o absurdo da tese sobre o fim da história sendo resultado do fim do socialismo soviético como consequência do triunfo do capitalismo. Até a maioria dos conservadores capitalistas xiou na época, o que o deixou em uma saia justa. Para mim o que irritou mais foi, já nas páginas iniciais do livro, ele dizer que “não fui eu que disse que a história havia acabado, mas Hegel (filósofo alemão)”. De tanta raiva com a afirmação e com a forma como ele tentou se esquivar do que havia escrito com todas as letras joguei o livro longe, que acabou se esfacelando. Pior pra mim pois era livro de uma biblioteca e tive de pagar um novo exemplar (rsrsrs).

    Huntington vai pelo mesmo caminho de Fukuyama. Cria um conceito absurdo (choque de civilizações) para justificar um “ponto de vista”, jamais uma tese. Não é a toa que estes dois trabalharam no governo Reagan, o que já diz muito sobre seus objetivos.

    • O texto tinha que incluir o Arnaldo Jabor também, kkkkkk, realmente texto lastimável e xenófobo !

      • Ou incluir também o guru de todos os jabores tupiniquins: Olavo de Carvalho.

        Para quem não o conhece de uma passada no site “Midia Sem Mascara”.

      • RobertoCR eu iria citar ele( Olavo de Carvalho) também mas,ai eu já estaria entrando no campo do exoterismo, da astrologia, da pornografia, estaria fazendo dessa matéria uma verdadeira anedota !

    • o mundo esta se reagrupando sim e um dia o bicho pega isso esta escrito nas estrelas rsrs

      mas o texto falar que isso aconteceu por causa do pacifismo americano rsrsrs eles pegam um texto e introduz seu pensamento nele é isso que fizeram aqui

      muitos que escrevem livros não chegam nem perto da realidade verdadeira

    • Perfeito, esse artigo pode ser resumido em poucos tópicos:

      -“Ocidentais” são intrinsecamente superiores;
      -Só “ocidentais” sabem o que é democracia, e o modelo deles é o único correto e viável;
      -Islâmicos são todos radicais e devem ser extirpados;
      -A Rússia é a fonte de todo o mal da humanidade e deve ser isolada, pois está sempre intrinsecamente errada;
      -Todos no planeta devem adotar a cultura, política e economia “ocidental” se quiserem saírem do barbarismo e se tornarem civilizados;

      Mais desonestidade intelectual do que isso impossível. Piada pronta, pior é ter que ler o jênio se referindo a suposta sociedade ocidental como sendo algo uniforme e coeso. Como se todos adotassem o mesmo modelo econômico, todos tivessem a mesma cultura…

      Agora essa da suposta citação do Hegel foi de fuder mesmo…

      • “-Ocidentais” são intrinsecamente superiores;
        -Só “ocidentais” sabem o que é democracia, e o modelo deles é o único correto e viável;
        -Islâmicos são todos radicais e devem ser extirpados;
        -A Rússia é a fonte de todo o mal da humanidade e deve ser isolada, pois está sempre intrinsecamente errada;
        -Todos no planeta devem adotar a cultura, política e economia “ocidental” se quiserem saírem do barbarismo e se tornarem civilizados;”…

        Vc fez o resumo da ópera, Senna… pena que entendeu mas não compreendeu… isso são FATOS, gostemos ou não… se vc, que nasceu ocidental, não gosta de ser ocidental, então que viva no oriente, pois acredito eu que deva ser muito frustrante para vc viver em uma cultura alheia a seus valores… há bons lugares para morar no mundo islâmico… se eu gostasse de viver no islamismo escolheria o norte da África… há belos lugares por lá para se viver como na idade média…

      • “…pior é ter que ler o jênio se referindo a suposta sociedade ocidental como sendo algo uniforme e coeso.”

        Bem lembrado.

    • Um texto cheio de remendos ,um michidao requentado , o esforço para emplacar o tal choque de civilizaçoes chega ser constrangedor , parece titulo de filme trash ,esse eu passei !

    • O texto diz que os republicanos de George Bush por serem mais pessimistas queriam prolongar a ocupacao do Iraque ate destruirem os fundamentalistas islamicos. Falso. George Bush iniciou o processo que levaria a retirada das tgropas norte americans. Obamas executou o

      • Obamas executou o que havia sido planejado durante a administracao de Bush. Nao se esqueca que muita gente neoconservadora que faziam parte da administracao de Bush Jr, continuaram em seu postos quando Obamas assumiu a presidencia.

    • Robeerto CR, Nao entendi sua reacao de raiva quando leu o que Fukuyama, disse que foi Hegel quem disse que a historia havia acabado. Para Hegel, se nao me engano o fim da historia seria realizada na monarquia constitucional da Prussia. Mas antes o fim, a meta, o objetivo da historia estaria sendo realizado por Napoleao em 1807. Os principios politico filosoficos da revolucao francesa era a realizacao da filosofia da historia, e em 1830, esses principios coincidiam com os principios politicos que formava a base da constituicao monarquica da Prussia.Para Fukuyama, se nao me engano, Esses principios politicos filosoficos de Hegel, agora se realiozaram na democracia liberal do mundo ocidental. A diferenca entre Hegel e Fukuyama, seria enquanto Hegel diz que a guerra continuara sendo uma necessidade, apos a historia encontrou sua realizacao, para Fukuy o mundo entraria entrando no periodo da paz perpetua de Kant.Nao vejo Fukuyama como neoconservador, ainda que serviu com eles na administracao de Reagan ,Mas Reagan prendeu alguns neoconservadores. Vejo Fukuyama como um liberal, enquanto Samuel Huntington, pode ser considerado um neoconservador. O primeiro trabalha com uma serie de filosofos que eu considero progressista, Kant, Hegel, via Kojeve, Marx. obviamente ele tambem utiliza Nietzche enquanto, o segundo, opera a partir de filosofos reacionarios como Spengler, e imperialistas como Marx Weber e outros. Mas no todo, na medida que estes dois autores, embora reacionarios, , seguem uma linha historicista na explicao de suas teorias politicas, eu prefiro le-los, do que ler, esses pensadores que sao influenciados pelos filosofos estruturalistas e desconstrucionistas. Os descendentes de Heideger, ,Derridas, Michel Foucaut e Gilles Deleuze.

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