O famoso historiador e especialista americano em assuntos da Rússia, Stephen Cohen, se juntou ao coro dos muito observadores, jornalistas e políticos para criticar Washington em sua postura de um “cego” apoio a Kiev. Ao participar do programa de TV “Democracy Now!”, Cohen destacou que o referendo pela independência das regiões de Donetsk e Lugansk, realizado no final de semana passado no Sudeste da Ucrânia, é tão legítimo quanto o próprio governo da Ucrânia, que chegou ao poder em consequência de um golpe apoiado pelo movimento Maidan.
Cohen afirmou: “O atual governo ucraniano pode ou não ser interpretado como legítimo, mas é 100% apoiado por Washington e Bruxelas. Foi exatamente este governo que enviou suas tropas com 10 a 15 mil soldados para o Sudeste da Ucrânia, e, apesar de não parecer muito, elas dispunham de blindados, tanques, artilharia pesada e helicópteros. Ao mesmo tempo, em Odessa, 40 pessoas foram queimadas vivas.”
Para Cohen, o maior insulto por parte do governo dos Estados Unidos frente a este terrível acontecimento foi que, ao invés de ter ao menos lamentado a perda de vidas, a Casa Branca declarou que Kiev tem todo o direito de restaurar a lei e a ordem no país.
O especialista americano então indaga: “Se em Odessa e em Mariupol foi cometido um crime de guerra que nada teve a ver com os Estados Unidos, por que foi que Washington saudou este ato?” E completa: “O primeiro-ministro interino da Ucrânia, Arseni Yatsenyuk, é o responsável pelo envio de tropas blindadas para o Sudeste da Ucrânia, uma operação chamada por Kiev de ‘antiterrorista’ Mas onde foi que eles viram o tal terrorismo?”
Cohen destacou que, “apesar de a política norte-americana sempre ter apontado para o fato de Putin ter atacado a Ucrânia e iniciado toda essa confusão, esta justificativa não procede”. Segundo ele, “tudo começou quando os Estados Unidos e a Europa obrigaram a Ucrânia a escolher entre a União Europeia e a União Eurasiática”.
Nas palavras do historiador, “daí surgiram as inquietações que levaram a isso tudo. Angela Merkel e Vladimir Putin propuseram a ideia de uma mesa-redonda, que incluiria tanto o Leste e o Oeste da Ucrânia quanto Kiev, ou seja, todas as forças conflitantes do país. Putin anunciou a retirada das tropas russas das fronteiras ucranianas, mas Washington recebeu essa notícia com descrença. Tanto Putin quanto a Alemanha – o país mais poderoso da Europa – e a União Europeia querem ver um diálogo no interior da Ucrânia, mas Washington se mantém calado sobre o assunto”.
Cohen comentou igualmente a declaração do ex-secretário de Estado americano, Henry Kissinger, que no início desta semana escandalizou a imprensa dizendo ser improvável que Putin tivesse planejado um acirramento do conflito na Ucrânia.
Segundo o historiador, além de Kissinger encontrar e conversar com Putin pessoalmente, duas vezes por ano, ele costuma visitar a Europa e, em particular, a Alemanha, e, portanto, compreende bem o que está acontecendo e tem motivos de sobra para pronunciar-se a favor do diálogo.
Cohen alega que as eleições presidenciais de 25 de maio na Ucrânia são convenientes aos Estados Unidos no sentido de agregar certa legitimidade ao Parlamento interino de Kiev. Mas indaga: “Que eleições podem ser realizadas na Ucrânia oriental, onde tanques enviados por Kiev estão em conflito com as cidades da região?”
Fechando a sua participação no “Democracy Now!”, o historiador americano Stephen Cohen resumiu: “Caso sejam realizadas, as eleições presidenciais na Ucrânia serão um passo a mais em direção à cisão daquele país, e Putin não tem nada a ver com isso. Culpar a Rússia pelos atuais acontecimentos na Ucrânia é praticamente ridículo. Putin não almejava uma crise ucraniana. O que ele quer é a desescalada e a estabilização da situação.”
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