Quais sanções teme o Kremlin?

“Estamos analisando uma série de medidas econômicas e diplomáticas que permitirão isolar a Rússia e terão um impacto negativo sobre a sua economia e posição no mundo”, declarou o presidente dos EUA, Barack Obama. Uma fonte próxima ao secretário de Estado dos EUA, John Kerry, disse que as sanções são “uma questão de dias”.

A retórica dos líderes e diplomatas europeus é um pouco mais branda, não fosse o grau de interdependência muito maior. Mesmo assim, os Estados membros da União Europeia chegaram a um acordo sobre os termos a serem usados contra a Rússia e, se aprovados por ministros de Relações Exteriores da UE na próxima segunda-feira, serão as primeiras sanções do bloco europeu à Rússia desde o final da Guerra Fria.

Os diplomatas russos parecem confiantes de que o caso não chegará a medidas severas. Entre as medidas mais suaves figuram o possível boicote à cúpula do G8 em Sôtchi, em junho, e a exclusão da Rússia do grupo, bem como o fim das consultas sobre a assinatura do acordo de livre comércio com os Estados Unidos. A cooperação militar com EUA e Canadá também foi interrompida.

Além disso, na quinta-feira passada (6), o Departamento de Estado dos EUA introduziu restrições de visto em relação a uma série de funcionários governamentais e pessoas privadas da Rússia e Ucrânia, cujas ações estejam a ameaçar a integridade da Ucrânia. No início de março, os ministros das Relações Exteriores da União Europeia sugeriram estacionar as conversações sobre a simplificação do regime de vistos com a Rússia.

Mas a perspectiva de sanções econômicas é o ponto de maior preocupação para o Kremlin. Segundo o presidente da subcomissão para os Assuntos Europeus no Senado norte-americano, Chris Murphy, estão sendo empreendidas medidas contra bancos russos que poderão vir a congelar os ativos de instituições estatais russas e investidores privados.

“Os alvos poderão ser contas bancárias e bens dos funcionários russos colocados em estruturas offshore”, diz o chefe do departamento da prática fiscal e do desenvolvimento internacional dos grupos KSK, Dmítri Malichev. “O mais provável é aumentar a taxa de juros sobre os empréstimos estrangeiros para os mutuários russos.”

Possíveis cenários

Os políticos ocidentais mais radicais também indicaram outras possibilidades. Uma delas é repetir o cenário iraniano e introduzir um embargo às importações do petróleo russo. As sanções dos EUA e da UE sobre o Irã paralisaram por vários anos a interação deste país com o Ocidente, e hoje os iranianos sofrem com alta inflação (31,5%) e desemprego (13,4%), além de queda ininterrupta do PIB (1,3% em 2013).

A Europa, que não seria capaz de reorientar instantaneamente a política energética que tem com a Rússia para outros fornecedores, poderá recorrer justamente ao Irã, cujas reservas de gás são as segunda maiores do mundo. Sob o novo presidente Hassan Rouhani, o governo iraniano está empenhado em normalizar as relações com o Ocidente e, pela maior proximidade das jazidas com a Europa, o custo para construção de gasodutos é muito mais baixo do que da Rússia.

Outra opção são as exportações do GNL norte-americano para a Europa, que atualmente estão juridicamente restringidas. Mas, mesmo que o embargo seja realmente imposto, a construção de terminais de GNL é lenta e as primeiras entregas não começariam antes de 2015.

Diante do cenário negativo, o assessor presidencial Serguêi Glaziev declarou que “se as sanções forem aplicadas em relação às estruturas estatais, seremos obrigados a reconhecer a impossibilidade de retorno dos empréstimos que foram dados às estruturas russas por parte dos bancos norte-americanos”. Isso poderá afetar negativamente as condições para concessão de empréstimos a empresas russas e aumentar a taxa do seguro de riscos comerciais.

Publicado originalmente pelo jornal Kommersant

 

Fonte: Gazeta Russa

6 Comentários

  1. Sabemos que em mundo globalizado, sanções econômicas são terríveis para um país, seja ele qual for, e dada a interação russa com a UE, se essas sanções forem realmente levadas a sério, poderão prejudicar a Rússia a longo prazo. Mas devemos pensar em alguns pontos já citados por mim em outras matérias, que possivelmente impediriam os EUA de ratificarem tais sanções: o acordo entre Nasa e Roscosmos, que traz grandes vantagens sobre custos, que os EUA deixam de ter com o envio de aeronaves ao espaço; equilíbrio geopolítico no Oriente médio e Ásia, onde, como retaliação, a Rússia poderia usar sua influência para disseminar desacordos com os EUA por parte de seus aliados,e ainda fomentar o afastamento destes do Ocidente; a UE depende hoje, de grande parte das fontes energéticas russas, e interromper o fornecimento de tais fontes levaria a Europa a uma crise durante pelo menos, um ano; apesar de desacreditar nesta possibilidade (pois não é peculiar aos russos) poderia haver o retorno de embarcações militares de grande porte nas ilhas de disputa com o Japão, e pior, a venda de armamento a Coréia do norte, isso sim, seria um problema sem tamanho para os EUA, que já se vê com a faca na garganta com a situação da China no Mar Amarelo.
    Meus caros, o prejuízo é amplo porém é para ambas as partes, e não se pode imaginar as consequências onde isso levaria. A Rússia não errou em sua postura política e intervencionista na Ucrânia (em favor dos que os apoiam na região, claro).
    A pergunta final que paira sobre nós, e creio que até mesmo no senado norte americano é…”A Ucrânia vale esse prejuízo todo?”
    saudações.

    • Excelente comentário!

      Só acrescento a frase do embaixador russo, Sergei Lavrov:

      “Medidas precipitadas e imprudentes capazes de causar danos às relações russo-americanas, particularmente…sanções, inevitavelmente atingiriam os Estados Unidos como um bumerangue”

  2. Uma boa queda de braços e suas consequências, ie, às represálias às ações da Crimeia…+ , como observador, noto q à UE está reticente a aplicar sanções contra Ivan, o gatilho do gás faz medo e pode levar a inúmeros protestos….tem mt água p correr .Quem viver verá.Sds.

  3. Para entender a crise na Ucrânia, da qual a Crimeia é sintoma…É preciso lembrar de Zbigniew Brzezinski, papa da linha de ação geopolítica estadunidense nos últimos 30 anos:

    “Na concepção de Brzezinski, vencer não significava mais a capacidade de derrotar militarmente um adversário, algo inviável na era nuclear. Mas sim, seria a capacidade de prevalecer contra um adversário em uma paciente luta de longo prazo.”
    (MELLO, Leonel Itaussu (1999). “Quem tem medo de Geopolítica”?)

    Esta modalidade de guerra prolongada e camuflada tem sido implantada contra a Rússia desde antes da queda da URSS, com a implantação das guerrilhas mujahidins dos talibãs, em operação da CIA no Afeganistão para desestabilizar a URSS. E prosseguiu após a queda da antiga URSS, agora contra a ressurgida Rússia…

    A Chechenia e Georgia foram partes desta estratégia “Brzezinskiana” de cerco, enfraquecimento e desestruturação, ou em palavras populares e exatas: “IR COMENDO PELAS BEIRADAS” !

    Nos últimos 4 ou 5 anos houve uma aceleração nesta guerra, Líbia, Síria e Ucrânia estão dentro deste pacote…

    Separatismo, terrorismo e fanatismo islâmico foram e continuam sendo amplamente utilizados nesta estratégia.. E agora, por que não? Adotaram até os nazistas ucrânianos como instrumentos nesta guerra “Brzezinskiana” contra a Rússia.

    “A batalha pela Ucrânia foi planejado em 1997,ou mais cedo…

    Desde o colapso da União Soviética em 1991, os EUA têm adotado a estratégia de cercar a Rússia, como aconteceu com outros inimigos percebidos, como a China e o Irã.

    Em 1997, o ex-conselheiro de política externa de Obama, o conselheiro de segurança nacional do presidente Jimmy Carter – Zbigniew Brzezinski – escreveu um livro chamado “O Grande Tabuleiro de xadrez” argumentando que os EUA tinham que assumir o controle da Ucrânia (assim como o Azerbaijão, Coréia do Sul, Turquia e Irã ) porque eram “extremamente importantes pivôs geopolíticos”.

    Quanto Ucrânia, Brzezinski disse:

    “…Ucrânia, um espaço novo e importante no tabuleiro da Eurásia, é um pivô geopolítica porque sua própria existência como um país independente ajuda a transformar a Rússia. Sem a Ucrânia, a Rússia deixa de ser um império eurasiático”.”

    E a Crimeia é o ponto estratégico mais importante dentro do território desta Ucrânia surgida em 1991.

    Por isto, os russos não podem ficar de braços cruzados assistindo a tomada da Ucrânia por golpistas títeres do EUA e estão dispostos a pagar qualquer preço que eventuais sanções possam provocar.

    Ainda mais que estão com a razão: É o povo da Crimeia quem está decidindo pela reintegração ou não com a Rússia…

  4. Complementando os ótimos argumentos do ARC e do Alvez80, segue link do documentário “Why we did it”, exibido na semana passada e produzido pela rede de televisão dos EUA MSNBC, em que se apresentam o “porque” da invasão do Iraque em 2003 (planejado desde 1989), mas não a Coréia do Norte ou o Irã. Os motivos são os mesmos que estão sendo usados agora contra a estabilização da Ucrânia: controle do sistema energético.

    http://www.youtube.com/watch?v=w0uHumA2Lkc

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