A Ameaça Emergente dos Mísseis de Cruzeiro Biológicos

bioSugestão: Blue Eyes

Coronel Rex R. Kiziah, USAF*

A proliferação simultânea de sistemas de lançamento de mísseis de cruzeiro e a capacidade de produção de BTW [guerra biológica e por toxinas] talvez represente uma séria ameaça estratégica no futuro.

Jonathan B. Tucker
“The Future of Biological Warfare”

Entre 16 de janeiro e 2 de fevereiro de 1991, os Estados Unidos demonstraram claramente ao mundo a eficácia estratégica e operacional dos mísseis de cruzeiro, quando navios de superfície e submarinos da Marinha dos Estados Unidos no Golfo Pérsico, Mar Vermelho e Mediterrâneo Oriental, lançaram 288 mísseis Tomahawk de ataque ao solo (TLAM) e a Força Aérea dos Estados Unidos empregou 39 mísseis de cruzeiro convencionais, lançados do ar (CALCM), contra alvos “estratégicos” no Iraque. Esses ataques tinham como alvos quartéis-generais de comando e controle, complexos de geração de energia, instalações de armas de destruição em massa (WMD) e indústrias de produção de petróleo e de refino.1 Embora haja desacordo entre fontes do Departamento de Defesa (DOD) e analistas externos quanto ao grau de êxito desses ataques de mísseis de cruzeiro de ataque ao solo (LACM), existe um consenso de que os LACM revelaram-se sistemas de armas muito eficazes. Como se diz no Conduct of the Persian Gulf Conflict: Final Report to Congress, do DOD, “a idéia de mísseis de cruzeiro – englobando uma plataforma não-tripulada de baixo grau de detectabilidade capaz de atacar com precisão a grandes distâncias – ficou validada como instrumento novo significativo para futuros conflitos”.2

Desde a Operação Tempestade no Deserto, os LACM tornaram-se peças centrais das operações de ataque das Forças Armadas dos Estados Unidos. Nossos líderes valorizam os LACM por sua capacidade de penetrar defesas aéreas inimigas, atacar com grande alcance (mais de mil milhas desde a plataforma de lançamento do TLAM) e, o que é mais importante, fazer tudo isso sem colocar em risco vidas de soldados americanos. É crescente o número de combatentes operacionais que consideram os LACM a definitiva “arma inteligente”. O resto do mundo também observou e aprendeu. Considerando-se cerca de uma década de uso preeminente, bem sucedido e crescente desses sistemas de armas – junto com a proliferação das tecnologias que permitem realizá-lo, como navegação e direção de precisão, motores turbojato e turboélice eficientes e compactos e materiais compósitos de baixo grau de detectabilidade – não deve representar surpresa que os países, em todo o mundo, desejem mísseis de cruzeiro e busquem ativamente adquirir a sua tecnologia, especialmente nas versões de ataque ao solo.3

Não é apenas por seu longo alcance, capacidade e ataque de precisão e ogivas convencionais de alto-explosivo que as nações valorizam os LACM, mas, também, por seu potencial de lançar cargas úteis de agentes de guerra química e biológica (CBW). O progresso nas tecnologias de uso dual, como navegação por satélites (o Global Positioning System [GPS] dos Estados Unidos e o Sistema Global de Satélite de Navegação Russo [GLONASS]) e nos motores turboélice altamente eficientes e reduzidos usados em aeronaves, permite que as nações ocidentais aperfeiçoem seu armamento de precisão, de longo alcance. Contudo, também permitem que países menos desenvolvidos superem a lacuna tecnológica e comecem a inserir esse tipo de armamento em seus arsenais, a um custo relativamente reduzido de acordo com padrões históricos, comparado com outros sistemas de armas como as aeronaves modernas e mísseis balísticos. Além disso, depois de anos de esforços determinados, que se intensificaram recentemente, os Estados Unidos têm procurado obter sistemas de mísseis de teatro de operações e de defesa antiaérea para contraporem-se a aeronaves de adversários potenciais e a mísseis balísticos cada vez mais sofisticados. Em conseqüência, os competidores buscam adquirir e desenvolver LACM difíceis de se detectar e combater, para manterem e, possivelmente, aprimorarem suas capacidades de dissuadir e de enfrentar os Estados Unidos e seus aliados.

Tornou-se claro que esses desenvolvimentos chamaram a atenção de funcionários governamentais, planejadores de defesa e analistas de inteligência. O Dr. Ramesh Thakur, vice-reitor da Universidade das Nações Unidas, em Tóquio, e autor de numerosos artigos a respeito de proliferação e controle de armas, argumenta que “para países em desenvolvimento e degenerados, o balanço de custo, acessibilidade, letalidade, complexidade e exigências operacionais está levando a uma transição de preferência de mísseis balísticos para mísseis de cruzeiro”.4 De maneira mais específica, em um discurso na National Defense University Foundation, em abril de 1999, Donald Rumsfeld, agora secretário de defesa, declarou que “os Estados Unidos devem esperar que estados como o Irã, o Iraque e a Coréia do Norte adquiram ou desenvolvam mísseis de cruzeiro em poucos anos no futuro”.5 O relatório não-classificado do National Intelligence Council Foreign Missile Developments and the Ballistic Missile Threat to the United States through 2015 (setembro de 1999) faz eco a essa avaliação: “esperamos assistir à aquisição de LACM por parte de numerosos países, para fazerem face a exigências militares regionais”.6 Desse modo, as tendências indicam que os mísseis de cruzeiro talvez representem, em longo prazo, maior ameaça aos interesses dos Estados Unidos e à estabilidade global do que os mísseis balísticos.

Mísseis de cruzeiro de ataque
ao solo: informações básicas

Uma descrição abrangente de um míssil de cruzeiro inclui as seguintes características: é uma aeronave não-tripulada configurada como arma anti-superfície destinada a chocar-se contra um alvo de superfície (terra ou mar) pré-selecionado, ou explodir sobre ele; um meio integral de autopropulsão sustentada e sistema de guiagem de precisão (geralmente autônomo, mas com a possibilidade de exigir comandos externos limitados de operador humano); superfícies aerodinâmicas que geram sustentação para manter o vôo do míssil; e obtenção autônoma de uma fase de vôo de cruzeiro, sustentada em nível predeterminado em termos de sobrevôo de terra ou água.7 Desse modo, os mísseis de cruzeiro representam um subconjunto dos veículos aéreos armados não-tripulados (UAV) ou armas de emprego a partir de grandes distâncias dos alvos colimados.

É costumeiro que os mísseis de cruzeiro sejam categorizados de acordo com a missão pretendida e com o modo de lançamento, em vez de com base no alcance máximo, que é o esquema de classificação para os mísseis balísticos. As duas categorias mais amplas são mísseis de cruzeiro antinavio (ASCM) e LACM.8 Por outro lado, os ASCM – atualmente nos arsenais militares de 73 países – são os mísseis de cruzeiro mais amplamente desdobrados9 e representam a arma naval mais importante que muitos desses países possuem: “o poder de combate que os ASCM fornecem tornou possível para países de Terceiro Mundo manterem forças navais relativamente poderosas que se valem de barcos-patrulha ou pequenas corvetas armadas de mísseis, comparativamente pouco dispendiosas”.10 Os ASCM foram planejados para atacarem pequenos alvos, como navios no mar, com alcances relativamente longos (até cerca de 500 km) e, assim, na fase final de sua trajetória são guiados com elevada precisão até o navio por meio de sistemas específicos que incluem direção por radar ativo e semiativo, por uso de ondas emitidas pelo radar do alvo, por imagens infravermelhas (IR), ou identificadas por sistema televisivo, ou, ainda, pelas próprias ondas de interferência eletromagnética emitidas pelo inimigo.11

Os LACM, por outro lado, foram planejados para atacar alvos baseados no solo, móveis ou fixos. Os componentes básicos incluem a estrutura, o sistema de propulsão, o sistema de navegação e direção e a ogiva. Basicamente, a estrutura do LACM é uma estrutura de aeronave/míssil cilíndrica, alongada, construída de metais e compósitos, com asas curtas e lemes de direção. O sistema de propulsão (foguete ou motor turbofan) localiza-se na extremidade posterior; o sistema de direção e navegação localiza-se na parte anterior e o combustível e a ogiva costumam estar localizados na parte central.12 A guiagem do LACM ocorre em três fases: lançamento, trajetória de cruzeiro e fase final da trajetória. Durante o lançamento, o míssil recebe informação inicial de guiagem de seu sistema inercial de navegação (INS) de bordo. Na fase de cruzeiro, um sistema de navegação por comparação do perfil do terreno sobrevoado com base em informações radar (TERCOM) e/ou um sistema de navegação por satélites, tais como o GPS ou o GLONASS, corrigem os erros de precisão inerentes ao sistema inercial.13 Ao penetrar na área do alvo, o sistema de direção final, que usa um ou mais sistemas de navegação, GPS/GLONASS, TERCOM, além de mapas digitais mais precisos; de um sistema de comparação de cenários [DSMAC], ou ainda, de um identificador de alvos que emprega sensor ótico ou radar, conduz o míssil até o ponto de impacto desejado.14 Os alcances de missão dos LACM atualmente nos arsenais militares em todo o mundo variam de 50 a mais de 3 mil quilômetros, e a maior parte dos mísseis voam a elevadas velocidades subsônicas.

Proliferação das tecnologias
de mísseis de cruzeiro

A eliminação de barreiras tecnológicas substanciais que impediam que países de Terceiro Mundo produzissem LACM precisos coincidiu com o desempenho surpreendente dos TLAM dos Estados Unidos durante a Guerra do Golfo Pérsico de 1991. Até o final da década de 1980, os LACM precisos exigiam tecnologias sofisticadas de guiagem e navegação – INS, TERCOM e DSMAC complexos, precisos e independentes – controlados por meio do Regime de Controle de Tecnologia de Mísseis e, assim, disponíveis a apenas alguns países, como os Estados Unidos, o Reino Unido, a União Soviética e a França.15 Na década de 1990, tecnologias críticas capacitadoras tornaram-se disponíveis comercialmente, permitindo, desse modo, que os estados começassem a buscar programas viáveis de aquisição de LACM. Essas tecnologias incluíam as tecnologias de navegação e guiagem de precisão, imageamento de alta resolução por satélite e sistemas sofisticados de informações geográficas (GIS), motores turbofan de grande eficiência e pequeno volume, combustíveis mais eficientes, além de materiais compósitos de baixa reflexão a ondas eletromagnéticas.

A disponibilidade comercial de informação precisa de navegação por satélite permitiu que os países do Terceiro Mundo contornassem cerca de 15 anos de pesquisa e desenvolvimento de LACM de longo alcance razoavelmente precisos. Receptores GPS de baixo custo podem aprimorar sistemas INS relativamente imprecisos e amplamente disponíveis, para conseguir a precisão navegacional de dispendiosos sistemas INS bastante precisos e independentes, que anteriormente só eram produzidos para as aeronaves comerciais do Ocidente.16 Receptores GPS, GPS diferenciais (DGPS) e GLONASS podem ser incorporados a todas as fases de guiagem do vôo do LACM. Usadas em combinação, essas tecnologias permitem que as nações que buscam competir militarmente na arena internacional desenvolvam LACM relativamente pouco dispendiosos que podem lançar suas cargas úteis até dentro de poucos metros do alvo planejado. Os sistemas comerciais DGPS estão disponíveis em todo o mundo e podem aumentar, por uma ordem de grandeza, a precisão dos fornecidos pelo sistema GPS (o sinal de GPS disponível para todos os usuários e que fornece precisão de cerca de 30 metros [m]). 17 Além disso, o GLONASS usado em conjunção com o GPS aumenta a robustez e aperfeiçoa os sistemas de guiagem.

As tecnologias de guiagem GPS, DGPS e GLONASS fornecem suficiente precisão aos LACM para o lançamento tanto de cargas úteis convencionais quanto nucleares, biológicas e químicas (NBQ), sem a necessidade de sistemas do tipo TERCOM ou DSMAC, que exigem requintados mapas digitais. Contudo, países em desenvolvimento talvez desejem desenvolver um LACM que vôe a altitudes muito baixas, enquanto maximiza o mascaramento do terreno a fim de aumentar a capacidade de sobrevivência e a penetração nas defesas antiaéreas. Esses perfis de vôos de baixa altitude exigem capacidade de mapeamento digital que, até recentemente, era demasiadamente dispendiosa para a maior parte das nações em desenvolvimento. Agora essas capacidades estão disponíveis comercialmente dentro de limites razoáveis. Os adversários potenciais podem comprar imageamento por satélite com resolução de um metro, acrescentar informação posicional de precisão GPS/DGPS por meio de GIS e produzir mapas digitais tridimensionais de elevada precisão.18

Combustíveis de crescente eficiência, bem como motores turboélice e turbojato disponíveis no mercado internacional fornecem a países com menos recursos a capacidade de colocar em campo mísseis de cruzeiro com alcance de pelo menos 1.000 km.19 Além disso, estruturas, materiais e recobrimentos capazes de absorver emissões de radar, disponíveis comercialmente, junto com técnicas de supressão de IR, podem reduzir em muito a assinatura dos mísseis de cruzeiro. Competidores potenciais que combinem essas tecnologias com LACM complicam de maneira significativa os cenários de defesa antiaérea regional para os Estados Unidos e seus aliados.

Além da acessibilidade às tecnologias descritas acima, muitas características vantajosas dos LACM como sistemas de arma motivam que países menos desenvolvidos, com limitados recursos fiscais, os adquiram ou desenvolvam como parte de uma força de ataque equilibrada que inclua aeronaves de combate, mísseis balísticos e mísseis de cruzeiro. Um traço particularmente desejável é seu porte reduzido, comparado com as aeronaves e mísseis balísticos. Os LACM são facilmente desdobráveis em uma grande variedade de plataformas – navios, submarinos e aeronaves – bem como pequenos lançadores, móveis ou fixos. Esta flexibilidade traduz-se em acrescida capacidade de sobrevivência antes do lançamento. Diferentemente das aeronaves de combate, os LACM não são restritos a operarem a partir de aeródromos vulneráveis, suscetíveis a ataques preventivos. Também, o fato de que, no solo, os LACM são muito mais fáceis de se ocultar das forças adversárias e mais móveis do que os mísseis balísticos aprimora ainda mais a capacidade que tem um estado inimigo de conduzir lançamentos do tipo “fogo e manobra”, como os que os iraquianos executaram com grande êxito durante a Guerra do Golfo Pérsico, a despeito das intensas operações de “caça aos Scuds” conduzidas pelas forças da coalizão.

Por volta de 2005-10, estados modestamente equipados poderiam produzir LACM com alcance de 500 a 700 km (8,5m de comprimento, diâmetro de 8m e envergadura de 2,4 m), que caberiam em um contêiner padrão de 12m junto com um pequeno elevador construído para lançamento do LACM diretamente desde o próprio contêiner.20 Com alcance de 500 a 700 km, permite que um adversário desdobre LACM desse tipo baseados em navios para atacarem a maior parte dos centros fundamentais, em termos de população e indústria, da Europa e da América do Norte, permanecendo, todavia, fora dos limites de 200 milhas de águas territoriais. Tal ameaça apresenta difíceis desafios de monitoramento, tanto para a comunidade de inteligência quanto para a comunidade de defesa. Escreve Dennis Gormley que “revendo a NIE [National Intelligence Estimate] 95-19, o ‘Painel Gates’ não-governamental . . . concluiu que não estava sendo dada atenção sequer aproximada do necessário à possibilidade de mísseis de cruzeiro de ataque ao solo serem lançados de navios dentro de diversas centenas de quilômetros do território dos Estados Unidos”.21 Talvez como resposta a esta crítica, a avaliação não-classificada de inteligência nacional, da Comunidade de Inteligência, de setembro de 1999, a respeito da ameaça de mísseis balísticos aos Estados Unidos para o ano 2015, tenha declarado que “um vaso de superfície comercial equipado, dissimuladamente, para lançar mísseis de cruzeiro, seria uma alternativa plausível para uma plataforma de lançamento avançada. Esse método forneceria uma plataforma grande e potencialmente despercebida para lançar o míssil de cruzeiro, ao mesmo tempo que forneceria algum disfarce para que se negasse o lançamento.”22

Em decorrência do seu pequeno tamanho, um LACM possui baixas assinaturas, tanto visual quanto infravermelha e radar, o que se traduz em um aumento de sua probabilidade de sobreviver às defesas inimigas. A baixa reflexão radar propiciada por seu perfil (que, em sua trajetória de ataque, apresenta uma reduzida área transversal ao sentido de propagação das ondas emitidas pelos radares (RCS) do sistema de defesa inimigo), torna difícil sua detecção, identificação, rastreamento e engajamento, especialmente se comparado às aeronaves de combate convencionais existentes nos arsenais de estados degenerados. Para complicar o problema da defesa antiaérea, a aplicação de materiais de baixa detectabilidade pode tornar o LACM ainda mais difícil de se detectar. O tratamento mais simples seria aplicar à superfície da estrutura do míssil recobrimentos capazes de absorver sinais radar e incorporar um cone de redução de IR em torno do motor. A estrutura também poderia ser construída com polímeros capazes de absorver sinais radar e compósitos não-metálicos que refletiriam de maneira mínima a energia de radar. Finalmente, os engenheiros poderiam designar a forma, a estrutura, a composição e a integração de subcomponentes do LACM de modo a torná-lo intrinsecamente stealth. É evidente que esta opção exigiria altíssima habilidade técnica.

O impacto da detectabilidade reduzida pode ser espetacular, porque diminui o alcance máximo de detecção pelas defesas antimísseis, resultando em tempo mínimo de interceptação. Por exemplo, uma aeronave de caça convencional, como o F-4, tem uma RCS de cerca de 6m2, e o bombardeiro B-2, muito maior, mas de baixa detectabilidade, que incorporou tecnologias stealth avançadas em seu desenho, apresenta uma RCS de apenas 0,75m2.23 Um míssil de cruzeiro típico com características semelhantes às de um UAV, tem uma RCS da ordem de 1m2; o ALCM Tomahawk, projetado na década de 1970 e usando as tecnologias de baixa detectabilidade bastante simples que eram então disponíveis, tem uma RCS de menos de 0,05m2. O sistema de radar do sistema aerotransportado de alerta e controle (AWACS) foi desenhado para detectar aeronaves com RCS de 7m2 em um alcance de pelo menos 370 km e mísseis de cruzeiro caracteristicamente desprovidos de stealth com um alcance de pelo menos 227 km; contudo, mísseis de cruzeiro stealth poderiam aproximar-se a até 108 km das defesas antiaéreas antes de serem detectados. Se esses mísseis se deslocas-sem a uma velocidade de 805 km/h (500 milhas/h) as defesas antiaéreas teriam apenas 8 minutos para engajar e destruir o míssil stealth e 17 minutos para o míssil não-stealth. Além disso, o LACM de baixa detectabilidade pode ser difícil de se engajar e destruir, mesmo se detectado. Segundo Seth Carus, um analista soviético, os mísseis de cruzeiro com RCS de 0,1m2 ou menores são difíceis de serem rastreados por radares de controle de lançamento de mísseis superfíciear (SAM).24 Conseqüentemente, ainda que uma bateria de mísseis SAM venha a detectar o míssil, pode ocorrer que o plote do alvo não seja suficientemente forte para que a interceptação seja realizada. Pode ocorrer, ainda, que os equipamentos de rastreamento de emissões infravermelhas (IR) não detectem os LACM, devido ao seu discreto perfil, e os mísseis SAM (IR) não consigam interceptálos. Para dificultar ainda mais o engajamento, o LACM poderia empregar contramedidas relativamente simples como engodos e chaff.

O LACM também pode evitar detecção seguindo uma trajetória programada de vôo em que o míssil se aproxime do alvo a altitudes extremamente baixas, mesclando-se com a interferência de solo, ao mesmo tempo que tira vantagem do mascaramento do terreno. As tecnologias que permitem vôos em navegação a baixa altura (NBA) – tais como radar altímetro, guiagem de precisão e navegação por satélite, controle de vôo computadorizado, imagens por satélite de alta resolução e mapeamento digitalizado do terreno por meio de GIS sofisticado, estão-se tornando crescentemente disponíveis em fontes comerciais, com custos aceitáveis. Essas tecnologias permitem que LACM de longo alcance sigam trajetórias longas e sinuosas até o alvo, minimizando ou eliminando, desta maneira, sua exposição ao sistema de defesa antiaérea.

Outro meio de derrota de defesas antiaéreas facultado pela flexibilidade operacional dos LACM envolve o lançamento simultâneo e de várias direções de múltiplos mísseis contra o alvo, sobrecarregando, assim, as defesas antiaéreas, em seus pontos mais fracos. Os adversários também poderiam lançar tanto mísseis balísticos quanto mísseis de cruzeiro para chegarem simultaneamente ao alvo selecionado. As características diferentes desses dois mísseis ao se aproximarem – a trajetória balística supersônica de alta altitude dos mísseis balísticos e o vôo subsônico de baixa altitude dos mísseis de cruzeiro – poderiam sobrecarregar a capacidade até dos sistemas de defesa antiaérea mais sofisticados. Um oficial da Junta de Chefes de Estado-Maior, entrevistado por um repórter da Aviation Week and Space Technology, comentou que “um adversário sofisticado talvez fosse capaz de disparar 20 ou 30 mísseis balísticos de emprego no campo de batalha [do tipo Scud], seguidos por aeronaves que surgissem repentinamente para lançar ondas de mísseis de cruzeiro. O problema resultante para os defensores dos Estados Unidos seria espetacular em termos de complexidade”.25 De maneira semelhante, um antigo planejador de alta hierarquia da Tempestade no Deserto observou que, “durante a Tempestade no Deserto, se os iraquianos tivessem sido capazes de lançar pelo menos um míssil de cruzeiro por dia com [uma precisão de] dois quarteirões, contra o complexo de edificações do nosso quartelgeneral em Riad [Arábia Saudita], teríamos permanecido inoperantes durante metade do nosso tempo disponível”.26 Para complicar ainda mais a situação dos defensores, o atacante poderia programar os ataques dos LACM de modo que coincidissem com o retorno das aeronaves defensoras. Como disse um oficial de alta hierarquia do Joint Theater Air and Missile Defense Office, do Pentágono, “o desafio dos mísseis balísticos é atingilos . . . o dos mísseis de cruzeiro é descobrir se são amigos ou não”.27

Possibilitada pela crescente disponibilidade comercial dos avanços em tecnologias fundamentais para todos os componentes do LACM – estrutura, propulsão, guiagem e navegação e ogiva – os atributos combinados de precisão e alcance dos LACM excedem agora os dos sistemas de mísseis balísticos, com um custo muitíssimo menor por sistema de armas. Por exemplo, os LACM podem ser desenvolvidos com ogivas e alcances similares aos dos mísseis balísticos, substancialmente mais complexos, mas por menos da metade do custo e com pelo menos 10 vezes a precisão de lançamento da ogiva (10-100 metros de erro circular provável [ECP] comparado com 1.000 a 2.000 metros de ECP).28 Conduzindo ogivas diferentes, um LACM dá aos estados competidores mais opções, em termos de eficácia em relação ao custo, para um ataque em profundidade a alvos fortemente defendidos, como aeródromos, portos, área de reunião, concentrações de tropas, área de desembarque anfíbio, centros logísticos e nós de comando, controle, comunicações e inteligência. Sendo a precisão dos LACM significativamente melhor que a de mísseis balísticos de alcance similar, a probabilidade de destruir ou danificar o alvo é muito maior. Além disso, o alcance de um LACM é ampliado pelo alcance de sua plataforma de lançamento, dandolhe, assim, o potencial para atacar alvos muito além do alcance de sistemas comparáveis de mísseis balísticos.

As características examinadas acima tornam os LACM idealmente adequados para disseminar agentes de guerra biológica (BW). Como seria o caso para a disseminação por aeronaves, um LACM subsônico, usando um borrifador de aerossol embutido nas asas e dotado de sensores meteorológicos de bordo em conjunção com computador de guiagem e controle, poderia alterar seu perfil de vôo e lançar os agentes BW em uma trajetória linear adequada à topografia, às condições micrometeorológicas e ao tamanho do alvo, maximizando, assim, a resultante área letal da carga útil de BW. A vantagem de se empregar um LACM para lançar agentes BW, por oposição a uma aeronave, é que não envolve riscos para o piloto; a desvantagem é a de não poder contar com a capacidade de improvisação que um piloto poderia empregar.

Gormley argumenta que “as áreas letais para determinada quantidade de CBW, e isto é um cálculo muito conservador, são de pelo menos 10 vezes a de um programa de lançamento por mísseis balísticos. Essa opinião reflete os resultados de grande atividade de modelagem e simulação.”29 Na simulação de Gormley, um desenho ótimo de distribuição de agentes CBW por meio do emprego de submunições foi suposto para o lançamento de mísseis balísticos. Para o lançamento por LACM, tanto as distribuições de pior hipótese quanto as de melhor hipótese foram tomadas na média, para comparação. O aumento da área de letalidade, no caso de carga de CBW lançada por LACM, pode ser atribuída primordialmente à estabilidade aerodinâmica do LACM e à capacidade de lançar o agente CBW como fonte em uma trajetória linear. É interessante observar que os Estados Unidos investigaram o uso de mísseis de cruzeiro Snarck para o lançamento de cargas úteis de agentes BW e de guerra química (CW), desde 1952, e destinaram fundos a projetos de desenvolvimento de sistemas de disseminação para mísseis de cruzeiro e aeronaves de controle remoto, no começo de década de 1960.30

Além de conseguirem disseminação de agentes BW de eficácia significativamente maior, o lançamento por LACM subsônicos representa um desafio técnico menor do que o lançamento por mísseis balísticos supersônicos. Há consideráveis dificuldades técnicas para armazenar agentes BW dentro da ogiva de um míssil balístico e garantir que o agente sobreviva e seja disseminado como aerossol na altitude correta acima do solo.31 A velocidade de reentrada é tão grande durante a fase de descida da trajetória do míssil balístico que é difícil distribuir o agente como nuvem difusa ou com a precisão necessária para garantir disseminação na camada de inversão da atmosfera. Também, as elevadas tensões mecânicas e térmicas geradas durante o lançamento, a reentrada e a liberação do agente podem degradar a qualidade do agente BW. Os testes conduzidos pelos Estados Unidos mostraram que, sem um armazenamento adequado, menos de 5% da carga útil de agentes BW permanece viável após o vôo e a disseminação por um míssil balístico.

Alguns outros aspectos operacionais podem tornar os LACM atraentes do ponto de vista econômico e militar para nações em desenvolvimento, se quiserem estabelecer capacidades de ataque dentro de seus recursos muito limitados de defesa. Comparados com aeronaves e mísseis balísticos, os LACM exigem menos infraestrutura de apoio e têm custos inferiores de operação e manutenção. O fato de poderem ser mantidos em tubos os torna significativamente mais fáceis de serem submetidos a manutenção e operados em ambientes inóspitos. Além disso, o fato de serem não-tripulados elimina a necessidade de dispendioso treinamento de piloto e equipagem.

Os adversários potenciais têm numerosas razões para buscarem WMD e seus meios de lançamento. A motivação mais forte pode ser que, para muitas nações, depois da Guerra Fria, as WMD são os únicos instrumentos que favorecem uma posição de poder estratégico. Freqüentemente, são os meios mais realistas para realizarem as três ações que os adversários desejam realizar: dissuadir, restringir e prejudicar os Estados Unidos – o que não podem fazer com as forças convencionais de que dispõem. Durante a Guerra do Golfo Pérsico, os Estados Unidos demonstraram ao mundo que tinham desenvolvido uma superioridade arrasadora em força militar convencional contra qualquer outra nação. Embora, desde a guerra, o orçamento de defesa dos Estados Unidos tenha diminuído significativamente, a mesma coisa aconteceu com os orçamentos dos outros países, e nenhum país parece estar estreitando a lacuna que o separa da superioridade dos Estados Unidos. Atualmente, o orçamento de defesa dos Estados Unidos é mais do que o triplo de qualquer nação potencialmente hostil, e mais do que os gastos militares conjuntos da Rússia, China, Irã, Iraque, Coréia do Norte e Cuba.32 Como observa Richard Betts, diretor dos estudos de segurança nacional no Council on Foreign Relations, “não há evidência de que o nível de profissionalismo militar daqueles países esteja crescendo a uma taxa que os tornasse competitivos, mesmo se gastassem muito mais com suas forças”.33 Os estados hostis e competidores potenciais simplesmente não podem, atualmente ou em futuro previsível, enfrentar os Estados Unidos com êxito em termos de forças armadas convencionais. Muitos países estão plenamente conscientes dessa situação e vêem WMD e seus veículos de lançamento como meios eficazes de desafiar assimetricamente o poder militar convencional arrasador dos Estados Unidos. Em essência, as WMD podem ser aquilo que vai igualar países mais fracos às forças convencionais maiores e mais adiantadas dos Estados Unidos e seus aliados.

WMD combinadas com sistemas de lançamento que são empregados fora do alcance das armas inimigas fornecem a países menos desenvolvidos opções políticas e militares qualitativamente superiores e, todavia, menos dispendiosas, para dissuadir, restringir e prejudicar os Estados Unidos, por comparação com estratégias que se valham de forças convencionais avançadas, cujo preço é proibitivo. Em outras palavras, WMD e sistemas de lançamento de longo alcance permitem que países alcancem objetivos regionais estratégicos “baratos”. As nações degeneradas vêem WMD como meios pouco dispendiosos de coagir seus vizinhos, dissuadir intervenção externa, dissuadir outras ameaças de WMD e agressões contra seus interesses e – se for necessário – atacar diretamente os Estados Unidos e seus aliados.

A generalizada proliferação de tecnologias capacitadoras e dos próprios sistemas de armas, juntamente com as ineficazes barreiras pós-Guerra-Fria a essa proliferação, está permitindo que as nações degeneradas adquiram WMD e sistemas associados de lançamento a custos convenientes. Na arena nuclear, a Índia e o Paquistão são os principais exemplos de como estados determinados buscarão e obterão WMD, independentemente de tratados, acordos e sanções internacionais criados para impedir a aquisição deles. De maneira semelhante, o Iraque surpreendeu a comunidade internacional com a amplitude de seus programas em todas as áreas de WMD – armas NBQ e sistemas de lançamento como mísseis balísticos, aeronaves e UAV. Esses programas continuaram, a despeito das barrreiras à proliferação anteriores à Guerra do Golfo Pérsico, aos ataques concentrados durante a guerra, a abrangentes sanções internacionais e a um grau sem precedentes de intrusão da Comissão Especial das Nações Unidas (UNSCOM) no Iraque, tudo isto orientado no sentido de destruir as capacidades WMD do Iraque. A abundância dos países que estão dispostos a fornecer assistência – oferecendo WMD e sistemas de lançamento para compra direta e fornecendo componentes e tecnologia para produção no país cliente – exacerba ainda mais o problema da proliferação. Os países mais notórios são China, Coréia do Norte e Rússia, todos eles auxiliando as nações proliferadoras em seus esforços de desenvolver arsenais de WMD.

A erosão de inibições quanto ao uso de WMD estimula ainda mais os estados em desenvolvimento a adquirirem WMD e diver-sos sistemas de lançamento. Em particular, o Iraque demonstrou claramente sua disposição de usar WMD no campo de batalha. Ao longo da Guerra Irã-Iraque de 1980-83, o Iraque empregou agentes CW contra soldados iranianos. Em 1983, o Iraque lançou pelo menos 33 mísseis Scud contra alvos iranianos, e acredita-se que tenha empregado gás mostarda em alguns dos mísseis lançados contra forças iranianas. Durante o último ano da guerra, em março-abril de 1988, o Iraque atacou o Teerã com 200 mísseis Scud, fazendo com que aproximadamente da quarta parte à metade dos residentes na cidade fugissem, temendo que um dos Scuds estivesse armado com ogivas de gás venenoso.34 Esses e outros ataques iraquianos de WMD deixaram uma impressão permanente nos líderes iranianos e em sua maneira de ver a eficácia e a aceitabilidade internacional das WMD.

As WMD também aparecem de maneira preeminente na Guerra do Golfo Pérsico, quando o Iraque desdobrou Scuds modificados armados com cargas úteis de CW e BW junto com outras grandes quantidades de agentes CW. Cerca de 25 Scuds estavam armados com agentes BW, inclusive dez com antraz.35 O regime iraquiano também manteve uma aeronave em um abrigo fortificado equipada com tanques de borrifamento exclusivamente para dispersar agentes BW. Se os iraquianos tivessem empregado essa arma no primeiro dia da guerra de superfície, estimam analistas do Gabinete do Secretário de Defesa que mais de 76.000 dos 320.000 soldados da coalizão no sudeste da cidade do Kuwait teriam morrido, se não tivessem sido vacinados contra antraz. Aparentemente, as ameaças de retaliação nuclear dos Estados Unidos e de Israel dissuadiram os iraquianos de lançarem ataques de WMD contra forças da coalizão.

Entretanto, a credibilidade da dissuasão punitiva dos Estados Unidos contra WMD por meio da ameaça de uso de retaliação nuclear, historicamente bem sucedida, pode estar em declínio. Betts fornece uma rápida resposta à pergunta bastante relevante e interessante: usariam os Estados Unidos efetivamente armas nucleares contra um país ou um grupo que tivesse matado diversos milhares de americanos com substâncias químicas letais? É difícil imaginar que o tabu pós-Nagasaki fosse rompido nessa situação.36 Que aconteceria se o Iraque tivesse usado agentes BW para matar 76.000 soldados no começo da Guerra do Golfo? Tratando adicionalmente da credibilidade da dissuassão nuclear dos Estados Unidos, Gormley e Scott McMahon, especialistas na área de proliferação de WMD e sistemas de lançamento, observam que

isto parece ter convencido Saddam Hussein a não usar suas armas químicas ou biológicas em 1991. Há, porém, razões para acreditar que futuras ameaças de retaliação nuclear nem dissuadirão ataques de NBQ nem tranquilizarão suficientemente aliados regionais para que eles permitam o uso ocidental de suas bases, quando estiverem sob ameaça de um ataque NBQ. Oficiais de alta hierarquia dos Estados Unidos, por exemplo, declararam que não concordariam com a retaliação nuclear em quaisquer circunstâncias, mesmo se armas NBQ fossem usadas contra os Estados Unidos. Embora esses comentários não sejam oficiais, ao serem conjugados com o término dos testes nucleares e a eliminação virtual do planejamento nuclear, torna-se perceptível que a dissuasão nuclear se está tornando rapidamente uma opção antes existencial que prática.37

Outra questão com o exercício da dissuasão para impedir o uso de WMD é que essa dissuasão vale-se de retaliação, e para retaliação exige-se o reconhecimento de quem lançou o ataque. Combinar uma WMD – como um agente BW, que cria dificuldades intrínsecas para identificar a fonte da moléstia resultante – com um sistema de lançamento como um LACM de longo alcance, que pode ser programado para voar em trajetórias sinuosas até o alvo, pode fornecer a um adversário um método de ataque que lhe permita fugir da identificação, eliminando, assim, qualquer tentativa de retaliação.

O prestígio nacional também influencia um país a adquirir WMD e sistemas de lançamento associados. Robert Gates, antigo diretor da Agência Central de Inteligência, observa que “estas armas respresentam símbolos de sofisticação técnica e proeza militar – e adquirir armas poderosas tornou-se a marca de aceitação como potência mundial”.38 De maneira semelhante, referindo-se especificamente aos meios de lançamento de WMD, Willis Stanley e Keith Payne comentam que ” alguns regimes no mundo em desenvolvimento vêem uma força de mísseis como um talismã que lhes conferirá respeito internacional e os guiará para a companhia das grandes potências”.39 Por causa desse efeito simbólico, países como China, Paquistão e outros concentraram-se em adquirir mísseis balísticos. A eficácia demonstrada dos TLAM dos Estados Unidos durante a Guerra do Golfo Pérsico talvez tenha elevado o prestígio dos LACM em relação ao dos mísseis balísticos. Como observa Richard Speir, consultor do Carnegie Non-Proliferation Project, “na Guerra do Golfo os Estados Unidos usaram 3 vezes mais mísseis de cruzeiro do que os iraquianos usaram mísseis balísticos, e nossos mísseis de cruzeiro tiveram um efeito militar bastante evidente.”40

Uma comunidade cada vez maior de especialistas está vendo a proliferação de armas biológicas com crescente preocupação. Pode-se exprimir uma das principais razões dessa tendência por uma ligeira modificação de uma frase coloquial: as armas biológicas “pagam com mais estragos a grana e esforço que custam”. Como observa Betts, as armas biológicas combinam o máximo de letalidade com a facilidade de dispor-se delas. As armas nucleares produzem destruição em massa, mas são extremamente difíceis e dispendiosas para serem adquiridas. Armas químicas são muito mais fáceis de serem adquiridas, mas têm limitada capacidade de destruição. As armas biológicas têm as “melhores” qualidades de ambas (tabela 1).41 (Deve-se notar que as armas biológicas são as que mais proximamente se assemelham a uma categoria especial de arma nuclear, chamada “bomba de nêutrons”. Causam danos às pessoas, não aos bens, com efeitos letais contra organismos vivos.

Tabela 1
Comparação de armas NBQ

         

Eficácia

   
 

Pessoal Protegido

Pessoal Desprotegido

Tipo

Tecnologia

Custo

Assinatura

Tático

Nível Estratégico

Tático

Nível Estratégico

Biológicas

+

+

++

Químicas

+

+

+

++

+

Nucleares

++

++

++

++

++

++

++

++ Muito Alta

+ Alta

– Baixa

Fonte: Lester C. Caudle, “The Biological Warfare Threat”, em Medical Aspects of Chemical and Biological Warfare, ed. Frederick R. Sidel, Ernest T. Takafuj, e David R. Franz (Washington D.C.: Office of the Surgeon General at TMM Publications, 1997), 459.

Um certo número de agentes patogênicos (bactérias e vírus) e toxinas são geralmente eficazes agentes de BW (Tabela 2). Edward Eitzen, pesquisador do US Army Medical Research Institute of Infections Diseases, observa que, em condições atmosféricas adequadas, mísseis de cruzeiro equipados para liberar antraz poderiam cobrir uma área comparável ao impacto letal de uma arma nuclear de arrebentamento no solo.42 De modo mais rigoroso, o Congressional Office of Technology Assessment levou a efeito um estudo, em 1993, que investiga a dispersão, por avião, de 100 kg de antraz como nuvem de aerossol sobre Washington D.C., em noite tranqüila e de céu limpo. O estudo mostrou que poderiam resultar de 1 a 3 milhões de mortes – trezentas vezes o número de mortes que ocorreriam no caso de uma liberação de dez vezes mais gás sarin em condições semelhantes.43 Um estudo da World Health Organization, em 1970, concluiu que um ataque BW a uma grande cidade (5 milhões de habitantes) em um país economicamente bem desenvolvido como os Estados Unidos, usando-se 50 kg de antraz dispersos desde um único avião, em condições favoráveis, poderia ser levado mais de 20 km pelo vento, com potencial de matar até 100.000 pessoas, incapacitando outras 250.000.44 Além disso, os cientistas das Forças Armadas dos Estados Unidos verificaram a ordem de grandeza dos efeitos da liberação de agentes BW contra populações urbanas estimada por estes estudos, realizando investigações de efeitos de combate no Campo de Provas de Dugway Proving Ground, Utá.45 Assim, após comparar a capacidade de destruição das WMD na base de análise peso a peso, descobriu-se que os agentes BW são intrinsecamente mais letais do que os agentes CW que afetam o sistema nervoso e que os sistemas de armas biológicas podem fornecer cobertura mais ampla por libra de carga útil do que as armas CW.46

Tabela 2
Agentes BW candidatos a utilização como arma

Moléstia Agente causador

Tempo de Incubação
(Dias)

Baixas
(%)

Antraz Bacillus anthracis 1-5 80
Praga Yersinia pestis 1-5 90
Tularemia Francisella tularensis 10-14 5-20
Cólera Vibrião da cólera 2-5 25-50
Encefalite Venezuelana Vírus VEE 2-5 <1
Febre Q Coxiella burnetii 12-21 <1
Botulismo Toxina do clostridium botulinum 3 30
Enterotoximia estafilocócica Enterotoxina de Estafilococo tipo B 1-6 <1
Múltiplos órgãos Micotoxina tricotecênica Depende da dose  

Fonte: The Biological and Chemical Warfare Threat (Washington, D.C.: US Government Printing Office, 1999), 2.

Além de serem extremamente letais e oferecerem alternativas factíveis às armas nucleares como arsenal estratégico, as armas biológicas são atraentes do ponto de vista técnico e econômico, ou, como descreve Betts, fáceis de serem conseguidas em comparação com as armas químicas nucleares. O custo para implementar um programa de BW é muito menor do que o custo de programas comparáveis de armas químicas nucleares. As estimativas são de US$2 a US$10 bilhões para um programa de armas nucleares, dezenas de milhões para um programa químico e menos de US$10 milhões para um programa de BW.47 A atratividade das armas biológicas é acrescida porque quase todos os materiais, tecnologia e equipamentos exigidos para um programa modesto de agente BW são de uso dual e podem ser obtidos para aquisição imediata em uma pluralidade amplamente disponível de empresas legítimas. Além disso, as habilidades técnicas necessárias para iniciar e levar a efeito um programa de produção de agentes BW ofensivos são compatíveis com a de microbiologistas em nível de pós-graduação, que receberam treinamento avançado aos milhares em algumas das melhores universidades ocidentais e agora estão disponíveis pelo mundo.48

A barreira técnica mais significativa a ser superada na obtenção de armas biológicas envolve a transformação dos agentes BW em arma. O passo inicial para transformação em arma inclui (1) disseminar eficazmente o agente BW para um efeito máximo (em termos de cobertura de área e letalidade ou incapacitação); (2) manter a viabilidade e a virulência do agente; e (3) selecionar o sistema e condições adequados para o lançamento.49 Os agentes BW devem ser disseminados como nuvem de aerossol, para a máxima capacidade de infectar por meio da inalação, através dos pulmões, e para a dispersão geográfica máxima sobre a população alvo. Obter o tamanho correto da partícula de aerossol é extremamente importante. Carus, um especialista internacionalmente reconhecido e fértil autor a respeito de questões de proliferação, observa que os agentes BW, quando transformados em aerossol em tamanho errado, podem tornar um ataque de BW completamente ineficaz.50 O tamanho ideal da partícula vai de 1 a 5 mícrons de diâmetro. Um aerossol formado nessa ordem de grandeza é estável e pode ser levado pelo vento para longas distâncias sem significativa perda de partículas do agente BW. Também, de 1 a 5 mícrons é o tamanho ideal para retenção nos pulmões. Partículas menores que 1 mícron são facilmente exaladas e as maiores do que 5 mícrons são filtradas pelas passagens respiratórias superiores e incapazes de alcançar o nível inferior dos pulmões.

Os agentes BW podem ser produzidos e transformados em aerossol sob a forma de líquido ou de pó. A forma líquida é mais fácil de se produzir, mas tem uma vida relativamente curta na prateleira. A maior parte dos agentes líquidos de BW só pode ser armazenada por 3 a 6 meses (sob refrigeração) e pode ser de difícil transformação em aerossol. Borrifadores comerciais podem ser modificados para disseminar agentes BW líquidos, mas existem questões não-triviais de obstrução dos bicos do borrifador e destruição do agente durante o processo de borrifamento.51 Tanto a vida sob armazenamento quanto as limitações de borrifamento podem ser superadas por produzirem-se agentes BW em forma seca, pelo uso da liofilização (rápido congelamento e subseqüente desidratação em vácuo elevado) e pela trituração das partículas para formarem um pó do tamanho apropriado; os esporos de antraz produzidos deste modo podem ser armazenados por diversos anos.52 Contudo, a produção de agentes BW secos é extremamente perigosa e exige um equipamento mais especializado e maiores capacidades técnicas.

Seja na forma líquida, seja na forma seca, as pessoas que querem transformar os agentes BW em armas precisam superar condições ambientais que destróem ou reduzem a virulência dos agentes. A taxa de desintegração biológica depende de diversos fatores que incluem radiação ultravioleta, temperatura, umidade e poluição do ar.53 As condições atmosféricas ótimas para um ataque de BW ocorreriam em uma noite fria e de céu limpo, com umidade relativa maior que 70%. A camada de inversão (o colchão estável de ar fresco acima do solo frio) impediria a mistura vertical da nuvem de aerossol mantendo, assim, o agente BW próximo ao solo, para ser inalado. A transformação de agentes BW em arma apresenta numerosos desafios. Não obstante, do ponto de vista da proliferação, é importante notar que há mais de 40 anos o US Army Chemical Corps superou esses desafios e fez demonstrações com êxito, levando a efeito provas sobre amplas áreas e conseguindo disseminação eficaz de agentes biológicos.54

Por causa dos baixos custos que se associam com a condução e criação de um programa de armas biológicas e pela natureza dual da pesquisa e equipamentos em BW, um programa BW pode florescer clandestinamente sob o disfarce de pesquisa legítima. Este aspecto singular dos programas de armas biológicas pode torná-las particularmente atraentes para nações degeneradas. Não existem assinaturas que não sejam ambíguas para detectar facilmente se trata-se de um programa concentrado em pesquisa biométrica legítima a respeito de moléstias altamente contagiosas ou se as pesquisas destinam-se a produzir agentes BW para propósitos militares ofensivos. A ausência de provisões de verificação na Convenção de Armas Biológicas e de Toxinas aumenta a dificuldade de se detectar programas de BW clandestinos e contrapor-se a eles. Como mostra a situação do Iraque, detectar e compreender a extensão de um programa BW clandestino é extremamente difícil. Em janeiro de 1999, oficiais da UNSCOM apresentaram um relatório ao Conselho de Segurança da ONU sumarizando oito anos de extensas investigações e destruições dos programas iraquianos de armas químicas e biológicas. Mesmo com essas inspeções intensas e poderosas, os funcionários da UNSCOM agora acreditam que o Iraque, mediante esforços bem coordenados de ocultação e de simulação, talvez tenha produzido outro agente BW, embora não identificado até agora, em instalações de produção que não foram localizadas nem descritas.55

Na perspectiva de um agressor, outra vantagem das armas biológicas sobre as armas químicas ou nucleares é que, atualmente, não existem instrumentos de detecção confiáveis que forneçam um alerta antecipado de um ataque BW, permitindo, assim, uma probabilidade maior de grande número de baixas por arma. Além disso, associado com a demora no aparecimento de sintomas de um ataque BW e com o fato de que esses sintomas poderiam ser facilmente atribuíveis ao surgimento natural de uma moléstia, as armas biológicas fornecem potencialmente ao país que as empregar possibilidades plausíveis de negar a autoria. Assim, o agressor pode usar armas biológicas como precursor de um ataque militar convencional para desorganizar e enfraquecer as forças alvos de um adversário superior em termos convencionais, com reduzido risco de retaliação e condenação por parte do país atacado e da comunidade internacional. Seria possível identificar um grande surgimento de antraz, por exemplo, como um ataque quase certo de BW, já que episódios assim raramente acontecem, se é que chegam a acontecer na natureza. Contudo, o surgimento de uma doença comum encontrada regularmente numa determinada região do mundo poderia possivelmente ser inicialmente visto como um acontecimento natural.

Conclusão

Da perspectiva de um competidor que enfrentasse o poder militar convencional formidável dos Estados Unidos, um LACM equipado com uma carga útil de agente BW poderia representar um sistema de armas politicamente atraente, eficaz em relação ao custo e de utilidade militar. Politicamente, a simples ameaça de utilizar um sistema com uma carga útil de 120kg de antraz contra uma importante cidade dos Estados Unidos ou aliada poderia dissuadir os Estados Unidos de envolver-se na agressão do adversário contra um vizinho, ou em sua reinvidicação de hegemonia regional. Militarmente, um sistema de lançamento assim, especialmente se equipado com as tecnologias de baixa detectabilidade e contramedidas simples de fase final, como chaff e engodos, teriam alta probabilidade de penetrar as defesas antiaéreas e lançar sua carga útil com precisão, causando, assim, grande número de baixas. Esses sistemas de armas são de custo conveniente, especialmente se comparados a mísseis balísticos e aeronaves de combate convencionais de alcance semelhante. Sendo assim, estados menos desenvolvidos com recursos limitados de defesa poderiam comprar um número relativamente grande de LACM e usálos para complicar o problema de defesa antiaérea dos Estados Unidos e de seus aliados.

Com o surgimento de tecnologias capacitadoras disponíveis comercialmente para navegação e guiagem de precisão, planejamento sofisticado de missão, propulsão de baixo peso e alta eficiência e penetração de defesa antiaérea, o desenvolvimento de sistemas de mísseis de cruzeiro biológicos está agora ao alcance de muitos adversários potenciais. Estados como o Irã, Iraque, Coréia do Norte têm demonstrado persistentemente a vontade de adquirir sistemas de armas que permitirão essa alavancagem estratégica contra os Estados Unidos e seus aliados. Tais nações adotam estratégias de múltipla aquisição, que têm o potencial de fornecerlhes LACM altamente capazes. Estas estratégias incluem a compra direta de LACM avançados de vários países, inclusive França, Rússia e China; o desenvolvimento no próprio território, com ou sem assistência externa; e o desenvolvimento de um LACM altamente capaz por meio da conversão tecnicamente mais rápida e de custo relativamente baixo de um ASCM, como o Sadsack HY-4 chinês. Considerando-se essas condições de proliferação, que claramente favorecem estados adversários, é altamente provável que, em 2005, um ou mais desses competidores possua um sistema de armas de cruzeiro biológicas com um alcance de 500 a 1.000 km, capaz de lançamento eficaz de agente BW contra operações militares dos Estados Unidos e aliados em conflitos armados pelo mundo, ou contra alvos civis e militares dentro dos Estados Unidos e países aliados.

Tão perturbador quanto isto é que essas capacidades tenham a probabilidade de surgir com pouco alerta, se é que algum. O relatório de 1999 do National Intelligence Council, Foreign Missile Developments and the Ballistic Missile Threat to the United States through 2015 estabelece que

uma concepção semelhante ao sistema de lançamento de mísseis balísticos baseados no mar seria o lançamento de mísseis de cruzeiro a partir de plataformas adiantadas. Este método capacitaria um país a usar mísseis de cruzeiro adquiridos com propósitos regionais para atacar alvos nos Estados Unidos. Também consideramos que talvez não sejamos capazes de dar algum alerta, se é que isto é possível, a respeito de um míssil balístico em base avançada ou . . . ameaça de LACM aos Estados Unidos. Além disso, o desenvolvimento dos LACM pode valer-se de tecnologias de uso dual.56

Avaliar, prever e rastrear a proliferação de LACM estrategicamente significativos é difícil para a comunidade de inteligência. George Tenet, diretor da Central Intelligence Agency, testemunhou diante da Comissão de Inteligência do Senado que os serviços de inteligência dos Estados Unidos talvez fossem incapazes de impedir a proliferação do conhecimento especializado e de tecnologias NBQ. Também afirmou que, agora mais do que nunca, “arriscamonos a uma surpresa substancial”.57 Se acrescentarmos a essas avaliações que nos chamam à realidade o perturbador conhecimento de que alguns estados usarão WMD e que os Estados Unidos e seus aliados não têm probabilidade de dissuadir esse uso, poderemos nos conscientizar da necessidade de desenvolver estruturas estratégicas, operacionais e táticas para nos contrapormos ao aparecimento da ameaça dos mísseis de cruzeiro biológicos.

Notas

1. Humphry Crum Ewing et al., Cruise Missiles: Precision and Countermeasures, Bailrigg Memorandum no. 10 (Lancaster, United Kingdom: Centre for Defence and International Security Studies, 1995), 60.

2. Department of Defense, Conduct of the Persian Gulf Conflict: Final Report to Congress, vol. 1 (Washington, D.C.: US Government Printing Office, April 1992), 244.

3. Kori Schake, “Rogue States and Proliferation: How Serious Is the Threat?” in Strategic Assessment 1999: Priorities for a Turbulent World, org. Hans Binnendijk et al. (Washington, D.C.: US Government Printing Office, June 1999), 220. Os Estados Unidos identificaram o Irã, o Iraque, a Líbia, a Coréia do Norte e a Síria como nações degeneradas capazes de promover proliferação de BW e acreditam que eles sejam patrocinadores de terrorismo. Não existe uma definição única e universalmente aceita de nações degeneradas. A administração Clinton definia esses estados como “estados recalcitrantes e fora da lei que não apenas decidem manterem-se fora da família [das democracias] mas, também, ata-cam seus valores básicos”. Veja-se Anthony Lake, “Confronting Backlash States,” Foreign Affairs 73, no. 2 (March/April 1994): 45–46. Algumas das características das nações degeneradas são sua busca agressiva de meios não-convencionais de ameaçarem interesses americanos e internacionais, não se conformarem com as normas de comportamento internacional (e não serem facilmente persuadidas a fazê-lo) e tender ao patrocínio do terrorismo.

4. Ramesh Thakur, “Arms Control, Disarmament and Non-Proliferation: A Political Perspective,” em Arms Control in the Asia-Pacific Region, org. Jeffrey A. Larsen e Thomas D. Miller (Washington, D.C.: US Government Printing Office, August 1999), 43.

5. “Iran, Other Rogue Regimes Developing Cruise Missiles,” May 1999, acessado na Internet, 1 de fevereiro de 2000, em http://www.ourjerusalem.com/documents/ febmay99/0412docs.htm.

6. National Intelligence Council, Foreign Missile Developments and the Ballistic Missile Threat to the United States through 2015, September 1999, acessado na Internet, 21 de janeiro de 2000, em http://www.uscon sulate.org.hk/uscn/others/1999/0909.htm.

7. Em Joint Publication 1-02, Department of Defense Dictionary of Military and Associated Terms, 12 April 2001 (as amended through 25 September 2002), acessado na Internet, 22 de janeiro de 2003, em http://www.dtic. mil/doctrine/jel/new_pubs/jp1_02.pdf. O míssil de cruzeiro é definido como “um míssil guiado cuja maior porção da trajetória de vôo até o alvo é conduzida a velocidade aproximadamente constante, depende da reação dinâmica do ar para sustentação e de forças de propulsão para equilibrar o arrasto. O míssil guiado é um veículo não-tripulado que se move acima da superfície da Terra, cuja trajetória ou rota de vôo é capaz de ser alterada por um mecanismo interno ou externo”.

8. National Air Intelligence Center, Ballistic and Cruise Missile Threat, NAIC-1031-0985-99 (Dayton, Ohio: Wright-Patterson Air Force Base, April 1999), 6.

9. Centre for Defence and International Security Studies, “Cruise Missile Capabilities: An Assessment,” acessado na Internet, 1 de fevereiro de 2000, em http:// www.cdiss.com/tabanaly.htm.

10. W. Seth Carus, Cruise Missile Proliferation in the 1990s (Westport, Conn.: Praeger, 1992), 15.

11. Ibid.

12. Marshall Brain, “How Cruise Missiles Work,” acessado na internet, 21 de setembro de 1999, em http:// www.howstuffworks.com/cruise-missile.htm.

13. Ewing et al., 49 e 51. INS usa giroscópios e acelerômetros para detectar mudanças na velocidade e na direção do LACM que, então, podem ser usadas para computar alterações nas posições relativas. Embora um sistema de guiagem INS tenha a vantagem de ser à prova de bloqueio, os giroscópios têm imprecisões intrínsecas que resultam em crescente erro de posição (chamado deriva) à medida que aumenta o tempo de vôo do LACM. Por exemplo, a deriva de INS dos TLAM dos Estados Unidos é de 900 metros por hora. Com velocidade de cruzeiro de 900 km/h, a falta de correção do INS do TLAM resultaria em um erro de posição de 1,8 km em relação ao alvo atacado, em um alcance de 1.600 km. Assim, para atacar alvos com longo alcance, o INS do LACM precisa ser suplementado por outros sistemas de guiagem, como o GPS ou o TERCOM. O TERCOM corrige qualquer INS com ajustes periódicos, usando aspectos do terreno sobre o qual o LACM voa (que precisam ser áreas com topografias distintas). Para conseguir isto, o sistema TERCOM usa um computador de bordo, no qual estão armazenados mapas do terreno relevante, obtidos por imagens de satélite de alta resolução, junto com um altímetro radar. O computador correlaciona os dados recebidos das leituras do altímetro com os dados de elevação dos mapas armazenados. Então, o sistema calcula as alterações necessárias para colocar o LACM no curso e fornece essa informação ao piloto automático do míssil.

14. O DSMC (Digital Scene Matching Correlator) consiste em uma técnica de comparação de mapas bidimensionais, empregando um sensor a bordo do míssil, para obter uma seqüência de imagens do solo sobrevoado. Estas imagens são continuamente recebidas durante o vôo e comparadas com as imagens de um mapa, que contém a rota planejada, cujos dados foram previamente inseridos no computador de navegação do míssil. Estas comparações permitem uma permanente correção da rota até o ponto de início da fase final, denominada fase de aquisição do alvo. Em suma, pode-se dizer que o DSMC resume-se em uma complexa tecnologia que contribui consideravelmente para aumentar a precisão do míssil de cruzeiro em sua fase final.

15. Este regime foi criado em 1987 pelos governos do G-7: Canadá, França, Itália, Japão, Reino Unido, Estados Unidos e Alemanha Ocidental. É um acordo informal e voluntário de controle de exportações, com orientações que proíbem a venda ou transferência de certas categorias de mísseis de cruzeiro ou balísticos e da tecnologia relacionada com eles. O regime surgiu dos receios mútuos das nações do G-7 de que estados degenerados adquirissem mísseis ofensivos para usar como plataformas de lançamento de WMD. Atualmente, 32 países são membros.

16. K. Scott McMahon e Dennis M. Gormley, Controlling the Spread of Land-Attack Cruise Missiles, AISC Papers, no. 7 (Marina del Rey, Calif.: American Institute for Strategic Cooperation (AISC), January 1995), 22.

17. O DGPS (Differential Global Positioning System) consiste em um método de correção de dados fornecidos pelo Sistema GPS, que permite a um sistema de armas dispor de indicações de coordenadas (de qualquer posição geográfica) com precisão extremamente elevada. Sua concepção pode ser resumida da seguinte forma: um receptor GPS é colocado em um determinado local X, cuidadosamente selecionado na superfície do solo, cuja posição geográfica tenha sido previamente determinada com maior precisão. A seguir, tanto o receptor GPS (colocado em X), quanto um segundo receptor DGPS (colocado em um sistema de armas – como um míssil de cruzeiro) são sintonizados para receber os mesmos sinais GPS, transmitidos por um mesmo conjunto de satélites. Os erros destes sinais são determinados através da comparação entre a posição já conhecida de X e a posição obtida pelo receptor GPS em X. Os parâmetros de correção para os erros encontrados são então calculados, transmitidos ao receptor do DGPS e armazenados em sua memória, permitindo, assim, que grande parte dos erros nos sinais GPS veham a ser corrigidos. A técnica usada pelo DGPS permite dar aos sistemas de armas a capacidade de identificar posições, através de coordenadas, com um grau de acurácia que restringe a probabilidade de erros a distâncias de apenas 1 a 5 metros.

18. “IKONOS Satellite Launches into Space,” acessado na Internet, 1 de outubro de 1999, em http:// www.spaceimage.com/newsroom/releases/1999/inorbit.htm. Space Imaging é uma empresa dos Estados Unidos que lançou com êxito o satélite IKONOS em 24 de setembro de 1999. Este é o primeiro satélite de fornecimento de imagens comerciais de sua espécie, recolhendo simultaneamente imagens pancromáticas de um metro de resolução e imagens multiespectrais de quatro metros de resolução. Space Imaging está agora vendendo e distribuindo imagens. Muitos outros satélites de imageamento comerciais, dos Estados Unidos e estrangeiros, que fornecem imagens com 1 metro de resolução, estão com lançamento planejado para 2000, 2001, 2002 e assim por diante. Veja-se também McMahon e Gormley, 24.

19. McMahon e Gormley, 25.

20. Dennis Gormley e Richard Speier, “Cruise Missile Proliferation: Threat, Policy, and Defenses” (presentation to the Carnegie Endowment for International Peace Proliferation Roundtable, 9 October 1998), acessado na Internet, 21 de setembro de 1999, em http://www.ceip. org/programs/npp/cruise4.htm.

21. Dennis M. Gormley, “Hedging against the Cruise-Missile Threat,” Survival, spring 1998, 92–111, acessado na Internet, 21 de setembro de 1999, em http://www. ceip.org/programs/npp/gormley%20survival.htm.

22. National Intelligence Council, Foreign Missile Developments.

23. Ewing et al., 50.

24. Carus, 22.

25. David A. Fulghum, “Stealth, Cheap Technology Complicate Defense Schemes,” Aviation Week and Space Technology 147, no. 2 (14 July 1997): 47.

26. Ibid.

27. Bryan Bender, “Cruise Control,” Jane’s Defence Weekly 30, no. 3 (22 July 1998): 21.

28. Dennis M. Gormley, “Remarks from a Panel on the Missile Proliferation Threat at the Conference on Nuclear Non-Proliferation: Enhancing the Tools of the Trade,” 9–10 June 1997, Washington, D.C., acessado na Internet, 29 de setembro de 1999, em http://www.ceip. org/programs/npp/np9715gohtm. Veja-se também McMahon e Gormley, 14–18, Amy Truesdell, “Cruise Missiles: The Discriminating Weapon of Choice?” Jane’s Intelligence Review, February 1997, 87–90, e Carus, 69 and 83.

29. Gormley e Speier.

30. Carus, 25.

31. Militarily Critical Technologies List (MCTL) Part II: Weapons of Mass Destruction Technologies, Section I—Means of Delivery Technology, September 1998, II-1-2, acessado na Internet, 10 de setembro de 1999, em http://www.fas. org/irp/threat/mctl98-2/p2sec01.pdf.

32. Richard K. Betts, “The New Threat of Mass Destruction,” Foreign Affairs 77, no. 1 (January/February 1998): 28. Veja-se também Eugene Gholz, Daryl G. Press e Harvey M. Sapolsky, “Come Home America: The Strategy of Restraint in the Face of Temptation,” International Security 21, no. 4 (spring 1997): 7.

33. Betts, 27.

34. Efraim Karsh, “Rational Ruthlessness: Non-Conventional and Missile Warfare in the Iran-Iraq War,” em Non-Conventional-Weapons Proliferation in the Middle East, org. Efraim Karsh, Martin S. Navias e Philip Sabin (New York: Oxford University Press, 1993), 36–42.

35. Robin Ranger e David Wiencek, The Devil’s Brews II: Weapons of Mass Destruction and International Security, Bailrigg Memorandum no. 17 (Lancaster, United Kingdom: Centre for Defence and International Security Studies, 1997), 16.

36. Betts, 31.

37. Dennis M. Gormley e K. Scott McMahon, “Counterforce: The Neglected Pillar of Theater Missile Defense,” acessado na Internet, 29 de setembro de 1999, em http://www.cdiss.org/colsep1.htm.

38. House Committee on Armed Services, Countering the Chemical and Biological Weapons Threat in the Post-Soviet World, Special Inquiry into the Chemical and Biological Threat, Report to the Congress (Washington, D.C.: US Government Printing Office, 23 February 1993), 4.

39. Willis Stanley e Keith Payne, “Chapter II. Missile Proliferation: Threat and U.S. Response,” Comparative Strategy 16, no. 2 (1997): 135.

40. Gormley e Speier.

41. Betts, 32.

42. Edward M. Eitzen, “Use of Biological Weapons,” em Medical Aspects of Chemical and Biological Warfare, org. Frederick R. Sidell, Ernest T. Takafuj e David R. Franz (Washington, D.C.: Office of the Surgeon General at TMM Publications, 1997), 446.

43. US Congress, Office of Technology Assessment, Proliferation of Weapons of Mass Destruction: Assessing the Risks, OTA-ISC-559 (Washington, D.C.: US Government Printing Office, August 1993), 54.

44. World Health Organization Group of Consultants, Health Aspects of Chemical and Biological Weapons (Geneva, Switzerland: World Health Organization, 1970), 98–99.

45. Lester C. Caudle, “The Biological Warfare Threat,” em Medical Aspects of Chemical and Biological Warfare, 437–50.

46. Agentes biológicos são agentes que se reproduzem (bactérias ou vírus) ou materiais que não se reproduzem (toxinas ou proteínas ou peptídios fisiologicamente ativos) que podem ser produzidos por organismos vivos. A natureza de reproduzir-se e a extrema capacidade de infectar em doses baixas de agentes patogênicos como o Bacilus anthracis (organismo que causa o antraz) e o Yersinia pestis (organismo que causa a peste), tornouos, peso a peso, mais mortais que os agentes de CW que atacam o sistema nervoso. Além disso, toxinas como as enterotoxinas estafilocócicas e a toxina do botulismo são extraordinariamente tóxicas – 1.000 a 10 mil vezes mais tóxicas do que os clássicos agentes que atacam o sistema nervoso. Para informações adicionais veja-se The Biological and Chemical Warfare Threat (Washington, D.C.: US Government Printing Office, 1999), 1–23, Frederick R. Sidell e David R. Franz, “Overview: Defense against the Effects of Chemical and Biological Warfare Agents,” em Medical Aspects of Chemical and Biological Warfare, 1–7, e Eitzen, 437–50.

47. Caudle, 458. Veja-se também Lord Lyell, “Chemical and Biological Weapons: The Poor Man’s Bomb,” 4 October 1996, acessado na Internet, 11 May 2000, em http://www.pgs.ca/pages/cw/cw980327.htm. Lyell declara que “uma avaliação mais específica sugere que o desenvolvimento de armas biológicas custaria menos que US$100.000, exigiria 5 biólogos e levaria apenas algumas semanas usando equipamento que já se encontra facilmente disponível.

48. The Biological and Chemical Warfare Threat, 1.

49. Jonathan B. Tucker, “The Future of Biological Warfare,” em The Proliferation of Advanced Weaponry: Technology, Motivations, and Responses, org. W. Thomas Wander e Eric H. Arnett (Washington, D.C.: American Association for the Advancement of Science, 1992), 67.

50. W. Seth Carus, Bioterrorism and Biocrimes: The Illicit Use of Biological Agents in the 20th Century (Washington, D.C.: Center for Counterproliferation Research, National Defense University, August 1998 [March 1999 revision]), 25.

51. Carus, Bioterrorism and Biocrimes, 24.

52. Tucker, 67.

53. Carus, Bioterrorism and Biocrimes, 25.

54. Ibid., 26.

55. Milton Leitenberg, “Deadly Unknowns about Iraq’s Biological Weapons Program,” 9 February 2000, acessado na internet, 14 de fevereiro de 2000, em http:// www.isis-online.org/publications/iraq/leitenberg.html.

56. National Intelligence Council, Foreign Missile Developments.

57. Judith Miller, “U.S. Intelligence: Flying Blind in a Dangerous World,” New York Times, 6 February 2000, D5.


Colaborador

O Coronel Rex R. Kiziah (Academia da USAF; Mestrado em Estudos Estratégicos, Air War College; Doutorado, University of Texas at Austin) é vice-diretor do Gabinete do Programa de Sistemas de Superioridade Espacial, Centro de Sistemas de Mísseis e Espaciais, El Segundo, Califórnia. Serviu anteriormente como chefe tanto da Divisão de Apoio ao Combate quanto na Divisão Conjunta de Superioridade Aérea, bem como na Divisão de Defesa Aérea de Teatro, Diretoria de Programas de Poder Global, Gabinete do Assistente do Secretário da Força Aérea para Aquisição, Washington, D.C., representante do comandante do Laboratório de Pesquisa da Força Aérea, subgerente de programa do Programa de Apoio à Contraproliferação e assistente especial de pesquisa e tecnologia, Gabinete do Assistente do Secretário de Defesa (Programas Nucleares, Químicos e Biológicos de Defesa), Gabinete do Secretário de Defesa, Washington, D.C., professor adjunto de Física, Academia da USAF, e chefe de seção e oficial de pesquisa de feixe de partículas neutrais, Laboratório de Armamento da Força Aérea. O Cel Kiziah tem os seguintes cursos: Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais (SOS), Escola de Comando e Estado-Maior (ACSC), ambas da USAF, Escola de Oficial de Estado-Maior Conjunto e de Coalizão, bem como Air War College, este também da USAF.

As opiniões expressas ou insinuadas nesta revista pertencem aos seus respectivos autores e não representam, necessariamente, as do Departamento de Defesa, da Força Aérea, da Universidade do Ar ou de quaisquer outros órgãos ou departamentos do governo norte-americano.

Fonte: Airpower

5 Comentários

    • O povo brasileiro tem preguiça de ler qualquer texto com mais de cinco parágrafos… rsrsrsrsrs…

  1. Realmente. Uma linha análise muito lógica e muito bem estruturada.
    Como consequência, dá até par pensar que, hoje, até mesmo um meteorito, poderia não ser um meteorito.
    Abraços.

  2. Este tem mais de 40 e vou sair preparado pra bombardear algo com agente biologico rsrsrs

    O problema são as duas vertentes. O que é mais humano?… Atirar e dar um fim rápido e indolor ao inimigo, ou aplicar uma destas moléstias.. e fazê-lo sentir as agrurias da carne porém com alguma relativa chance de salvar-se?…

    Poderia o vencedor oferecer pós rendição um antídoto à população-alvo.

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