Irmandade Muçulmana vive o maior desafio de sua história

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Tariq Saleh

Desde sua fundação, em 1928, a Irmandade Muçulmana passou por diversas lutas por sua sobrevivência em meio ao cenários políticos conturbados do Egito e da região do Oriente Médio. Falando ao Terra, analistas descrevem que o movimento islâmico mais antigo do mundo árabe passa por mais uma batalha por sua existência após a derrubada de seu membro Mohamed Mursi como presidente do Egito.

Segundo eles, as opções do grupo passam também pela reação das lideranças políticas e militares frente à Irmandade – marginalizá-la e levar seus membros mais extremistas à violência, ou integrar o movimento à sociedade e a um futuro processo de reconciliação nacional.

Além disso, dizem os analistas, claramente rejeitada por uma boa parcela da sociedade egípcia, a Irmandade deverá repensar suas políticas e se reinventar caso queira sobreviver a esta nova etapa do árduo caminho democrático pelo qual o Egito vem passando desde a derrubada do regime de Hosni Mubarak, em 2011.

“Por mais de oito décadas, o Egito viu confrontos entre a Irmandade Muçulmana e regimes seculares, em que a maioria dos egípcios se mantiveram como espectadores. Mas agora, uma vez no poder, a Irmandade se viu em choque contra uma vasta parcela da população do Egito, que foi às ruas em peso para exigir a saída de Mursi e anunciar categoricamente a rejeição à ideologia do movimento islâmico”, disse Ahmed Abdel-Hafeez, analista do Centro Al Ahram para Estudos Estratégicos do Cairo.

Segundo ele, os amplos protestos contra Mursi não foram apenas baseados no desempenho ruim da economia, falta de serviços e combustíveis e cortes de energia, mas também na rejeição às tentativas da Irmandade Muçulmana, na visão do povo mais secular, de transformar o Egito em um Estado islâmico.

Caso se mantenha na velha ideologia, já testada e fracassada, o movimento corre o risco de cair no ostracismo

Ahmed Abdel-Hafeez analista do Centro Al Ahram para Estudos Estratégicos do Cairo

“Com essa rejeição plenamente demonstrada nas ruas e cujo resultado foi a intervenção militar para retirar Mursi do poder, a Irmandade certamente passará por reformas. Caso se mantenha na velha ideologia, já testada e fracassada, o movimento corre um riscod e cair no ostracismo”, completou Abdel-Hafeez.

Mas ele alerta, no entanto, que militares e lideranças políticas não devem marginalizar a Irmandade, já que possuem uma base de apoiadores muito forte entre a população egípcia. “Essas vozes não podem ser ignoradas, sob o risco de cometerem o mesmo erro de Mursi, de Não ouvir o outro lado”.

Os protestos que exigiam a saída de Mursi do poder no último domingo, dia 30, se estenderam durante a semana, levando as Forças Armadas do Egito a dar uma prazo de 48 horas para que oposição e governo chegassem a um acordo para pôr fim à crise. Sem uma solução, os militares anunciaram a deposição de Mursi, suspenderam a Constituição, a formação de um governo provisório e a nomeação de um juiz da Corte Constitucional para presidir o país de forma temporária.

Violência e rixas internas

Marginalizada e condenada à ilegalidade pelos governos de Gamal Abdel Nasser, Anwar al Sadat e Hosni Mubarak, a Irmandade Muçulmana passou por diversos momentos de perseguição e prisões sistemáticas de seus seguidores nos seus 85 anos de existência.

Em alguns desses momentos, o movimento usou de violência como resposta à sua marginalização, como ataques contra estrangeiros e alvos do governo nos anos 80 e 90.
Segundo Fahmy Salem, analista político do Centro de Estudos para Democracia do Cairo, a possibilidade da Irmandade apelar para a violência como resposta aos resultados desta semana no Egito é real, mas deixará seu futuro mais complicado.

Se o movimento optar pela violência, enfrentará não apenas uma forte reação do exército e uma proibição de suas atividades públicas, mas provavelmente sofrerá represálias de cidadãos comuns

Fahmy Salem analista político do Centro de Estudos para Democracia do Cairo

“Se o movimento optar pela violência, enfrentará não apenas uma forte reação do exército e uma proibição de suas atividades públicas, mas provavelmente sofrerá represálias de cidadãos comuns que não tolerariam suas tentativas de impor suas visões islâmicas no público em geral”, explicou Salem.

Após o comunicado da destituição de Mursi do poder, o presidente e vários líderes da Irmandade Muçulmana e de seu braço político, o partido Liberdade e Justiça, foram presos pelas forças de segurança.
De acordo com o professor de Ciência Política da Universidade do Cairo, Nevine Mosaad, a prisão de líderes da Irmandade é um erro das autoridades e que poderia levar à sua marginalização, o que “não seria benéfico para o Egito”.

No entanto, segundo ele, o movimento deve passar por profundas reformas depois da perda do poder e a prisão de alguns de seus principais líderes. “A Irmandade provavelmente passará por divisões internas e rixas entre seus membros ativistas mais jovens, que há muito tempo queriam um grupo mais aberto e democrático para o mundo externo, e a elite mais velha e conservadora, devota de uma ideologia que a maioria dos egípcios mostrou claramente que rejeita com apenas um ano de Mursi no poder”, enfatizou Mosaad ao Terra.

União

Mesmo sob repressão de governos anteriores, a Irmandade aumentou sua influência junto às massas, especialmente entre as parcelas mais pobres da população. Agora, segundo o colunista político Khalil Al-Anani, do diário Al Ahram, a Irmandade também enfretará um dilema de como lidar com sua imagem  e manter-se unida após os erros e políticas falhas ao longo de um ano no poder.

“A deposição de Mursi poderá fragmentar a Irmandade e criar discussões internas sobre a quem culpar pelos fracassos, podendo levar jovens membros a abandonar o grupo. Por isso, uma das lutas do movimento será a de manter suas fileiras unidas e intactas”, escreveu Al-Anani em sua coluna no jornal egípcio.

Entretanto, o colunista não acredita que a Irmandade Muçulmana optará pela violência como no modelo seguido pelos islamistas na Argélia, no anos 90, quando os militares anularam os resultados da eleição ganha pelos partidos islâmicos, o que levou a anos de uma sangrenta guerra civil.

“Acho improvável que aconteça no Egito o que se passou na Argélia por várias razões: a deposição de Mursi não se deu primeiramente porque ele era um islamista, mas porque seu grupo falhou em liderar o país durante o período pós-revolução. Além disso, a Irmandade não tem um apoio de todos os islamistas, como por exemplo o partido Nour, dos salafistas, que se juntou à oposição pedindo antecipação de eleição presidencial”, escreveu ele.

A Irmandade Muçulmana já passou por diversos desafios desde sua fundação e sobreviveu. Certamente, este é o maior de todos, mas ninguém pode duvidar de sua força dentro da sociedade egípcia

Fahmy Salem analista político do Centro de Estudos para Democracia do Cairo

Al-Anani também citou que “outros grupos islâmicos mais conservadores mostravam-se insatisfeitos com Mursi por ele não ter decretado a Sharia (lei islâmica) no país e por ter posições ideológicas fracas, na visão deles.”

A Irmandade, segundo os analistas ouvidos, está em um posição de isolamento, porém, são unânimes em salientar que o movimento não pode ser subestimado. “a Irmandade Muçulmana já passou por diversos desafios desde sua fundação e sobreviveu. Certamente, este é o maior de todos, mas ninguém pode duvidar de sua força dentro da sociedade egípcia”, alertou o analista Fahmy Saleh.

 

Fonte: Terra

5 Comentários

  1. Belo texto de desinformação e PsyOp!

    Manter o povo nas ruas oferece tantas possibilidades de manipulação…E são o álibi perfeito para golpes!

    Trechos de texto de MK Bhadrakumar:
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    “Mursi ofereceu, como concessões políticas, segundo o jornal The Guardian:

    Formar um governo nacional com representação de todos os partidos;
    Formar uma comissão neutra, para alterar a Constituição;
    Convocar um Conselho Constitucional para apressar a legislação sobre eleições parlamentares; e Um novo Procurador Geral (que já partiu).

    Além disso, Mursi deixou fortemente sugerido que, se lhe apresentassem um plano para realizar um referendum sobre sua presidência, seria aceito. Pois nada disso impressionou o general Abdul Fattah al-Sisi, comandante do Exército Egípcio. O xis da questão é que Sisi já tomara todas as decisões, depois de receber sinal verde de Washington para prosseguir com um golpe “suave”. ”

    “Sabe-se agora que ninguém menos que o Secretário de Defesa dos EUA Chuck Hagel, esteve em contato com Sisi, de Washington. O Pentágono foi forçado a admitir que Hagel telefonou a Sisi semana passada, mas recusa-se a divulgar detalhes da conversação”

    Significa que o famoso ultimatum dado pelo Exército Egípcio a Mursi na 2ª-feira aconteceu, sim, depois de conversa entre Hagel e Sisi. A explicação de Sisi é que o Exército rejeitara a oferta feita por Mursi, de um governo de unidade e reconciliação nacional, alegando que o povo estava pedindo ajuda.

    Simultaneamente, houve outros sinais eloquentes. Os britânicos recusaram-se a condenar o golpe no Egito. William Hague, secretário de Relações Exteriores disse que:

    “A chance de um futuro democrático foi duramente conquistada pelo povo egípcio há dois anos e meio. Mas, com olhos no futuro, conclamamos todos os partidos a mostrar capacidade de visão e de liderança para renovar a transição democrática no Egito.”

    O presidente Barack Obama evitou cuidadosamente a palavra “golpe”, ao comentar os eventos no Egito. Pela lei dos EUA, se se tratasse de “golpe”, toda a ajuda norte-americana ao Egito teria de ser suspensa. A declaração da Casa Branca exibiu tom defensivo, extremamente cauteloso, evitando qualquer condenação aos militares egípcios e, na direção oposta, conclamando a Junta a agir com bom-senso e completar a transição até um governo democraticamente eleito.

    Os EUA planejam aumentar a ajuda aos militares egípcios, para influenciar as políticas da Junta. A declaração da Casa Branca reconhece explicitamente que, em última análise, as políticas dos EUA baseiam-se em “valores e interesses partilhados”.

    Bem feitas as contas finais, contudo, Israel é a potência regional mais afetada pelas mudanças no Egito. A volta da liderança militar no Cairo trabalha a favor dos interesses de segurança de Israel. O estado egípcio olhará mais para dentro, no futuro próximo, buscando uma nova identidade, empreitada eivada de todos os tipos de incertezas. Dito em outros termos, o alinhamento regional nascente Egito-Qatar-Turquia, do qual a liderança do Hamás começou a ocupar-se ultimamente, desintegrou-se do dia para a noite; e isso deixa o grupo militante vulnerável à pressão dos israelenses…

    Quanto, afinal, ao governo Obama, teve de voltar atrás no flerte com os Irmãos egípcios (e com o islamismo), que Israel e seus apoiadores nos EUA buscavam insistentemente. Em resumo: Israel é o grande vencedor individual.

  2. “As eleições de maio de 2012, que elegeram Mursi, de fato, foram as primeiras em 60 anos.

    Aos que não conhecem bem a história do Egito, desde que Gamal Abdel Nasser destituiu a monarquia do rei Farouk em 1952, em 60 anos apenas ele e mais dois generais egípcios governaram o país :

    Foi Anuar El Sadat, de 1970 até 1979, quando foi assassinado, e Hosni Mubarak, de 1979 até 2011, quando foi destituído e o Exército assumiu o comando do país por um ano e meio. ”

    (Lejeune Mirhan)
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    Mursi, 1º presidente eleito em mais de 60 anos , durou cerca de 1 ano…

  3. no egito pode acontecer uma guerra civil pois a maioria tinha escolhido essa irmandade .depois do golpe a violência entre os grupos esta aumentando ,mais um pais que depois das manifestações ate agora não teve melhora alguma todos os países que tiveram essa primavera dos canhoes ,nenhum melhorou ,ao contrario so piorou a vida de todos
    e ainda tem um perrecos que querem que o brasil siga o mesmo destino.

  4. Sou a favor de países laicos, com espaço para todos os credos. Torço para que as lideranças da Irmandade Muçulmana evitem o conflito e o desejo de impor sua religião aos demais. Novas eleições virão.

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