“O mundo não quer que os americanos o tornem feliz”

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Escritor alemão Ulricht Schacht

Irina Popova

As relações internacionais da atualidade continuam a se basear nos princípios da política real ou, mais propriamente, na lei do mais forte. O escândalo sobre a vigilância eletrônica realizada em todo o mundo pelos serviços secretos dos EUA provou, mais uma vez, a política dos “duplos critérios” que Washington leva a cabo já há muitos anos.

Numa entrevista exclusiva à Voz da Rússia, o escritor alemão Ulricht Schacht sublinhou que a atual ordem mundial deve ser alterada: o papel principal deve ser devolvido aos Estados nacionais e os cidadãos devem voltar a ter o direito de decidir a vida do seu país.

– Os serviços secretos norte-americanos tanto vigiavam os usuários comuns da Internet, como os diplomatas europeus. O que é que esse escândalo revelou, para além disso?

Ele revelou que as tecnologias modernas possuem grandes capacidades e podem ameaçar qualquer pessoa, onde quer que ela esteja e o que quer que esteja fazendo. Temos de negociar a nível internacional as limitações da expansão das tecnologias e das tendências totalitárias que elas podem permitir atingir. Nos EUA, isso vai muito para além da luta declarada ao terrorismo. É evidente que isso também abrange a espionagem industrial. Tem de se demonstrar claramente aos Estados Unidos que a política dos duplos critérios é inadmissível. É preciso contrariar os americanos a nível internacional para que eles próprios se comecem a orientar pelos critérios cujo cumprimento eles exigem a todo o resto do mundo.

– É do conhecimento geral que os serviços secretos sempre foram muito ativos na Internet. Agora os políticos fazem de conta que estão surpreendidos e chocados. Eles não estarão como que jogando para a plateia?

Isso é a “esquizofrenia prática” da política moderna. Claro que muitos políticos, tanto alemães, como dos outros países da UE, sabiam que existiam essas possibilidades. Mas agora eles fingem que foram ingênuos e que não sabiam de nada. Por isso, hoje é importante o papel de pessoas como Snowden, as quais, possuindo informação interna, têm a coragem de relatar os fatos dessa vigilância descontrolada. Nós temos de tomar isso em consideração.

– Hoje, os EUA podem se dar ao luxo de não ter em consideração as normas do direito internacional. Será possível recuperar, de alguma maneira, o papel dominante do direito internacional?

Isso é sempre uma questão de soberania. Mas os norte-americanos são conhecidos por não se orientarem pelas normas internacionais na sua política. Os EUA, estando convencidos do seu domínio global, se permitem desrespeitar quaisquer normas ou leis. Penso que primeiro é necessário restaurar, a nível das consciências e a um nível internacional, restaurar o papel principal do Estado nacional, que é um território relativamente pequeno em que a população tem o controle desse território e que o pode defender. Entretanto, o capitalismo orientado para o lucro é totalitário e tenta criar uma “sociedade mundial única” e perseguir os seus próprios interesses econômicos. O desenvolvimento do comércio mundial não deve ser feito em prejuízo das soberanias nacionais. Eu sou a favor do aumento do papel dos Estados nacionais na política internacional, do reforço das suas estruturas, assim como das normas do direito internacional associadas a isso. É inadmissível que a filosofia intervencionista moderna continue a diluir e a minar o direito internacional. Os Estados Unidos têm de perceber que o mundo não quer que os americanos o tornem feliz.

– Será que esta história irá influenciar as relações políticas dos EUA com a UE? Pois a Europa é demasiada dependente dos EUA para realizar quaisquer passos reais.

Estão decorrendo neste momento conversações para a criação de uma zona de comércio livre transatlântica que não me parece trazer quaisquer benefícios para os europeus comuns. Se trata apenas de os Estados Unidos receberem um novo mercado. As elites políticas da Europa acreditam em algo como uma “sociedade civil mundial” e uma “política interna mundial”. Nós não estamos assistindo apenas a uma política de alianças, mas a uma política ideológica. Eu considero isso como muito perigoso. Quem acredita que “os estados estão obsoletos” e “o mundo se está unindo” é tudo o que se quiser, menos um democrata.

 

Fonte: Voz da Rússia

5 Comentários

    • “Por isso, hoje é importante o papel de pessoas como Snowden, as quais, possuindo informação interna, têm a coragem de relatar os fatos dessa vigilância descontrolada.”
      ———————————-

      E não é só pessoas como Snowden que são perseguidas hoje no EUA, qualquer um que conteste certos interesses poderosos será perseguido, o caso abaixo é só um exemplo de uma pessoa mais conhecida, más existem muitos outros…

      Cineasta americana indicada ao Oscar é perseguida em aeroportos por criticar Washington

      | Desde o 11 de setembro, leis de exceção dão carta branca para agentes bisbilhotarem bagagens e confiscarem bens |

      Após os atentados terroristas de setembro de 2001, o governo dos Estados Unidos criou uma serie de leis que autorizam a intromissão do Estado na vida privada dos cidadãos. Desde então, é cada vez maior o número de norte-americanos que viajam ao exterior e que ao retornar são detidos nos aeroportos, onde têm suas bagagens revistadas, e o conteúdo de computadores e celulares – e-mails, textos, vídeos e fotografias – é checado e copiado.

      E não há a quem reclamar. As leis de exceção autorizam os funcionários do Departamento de Segurança Interna (DHS, na sigla em inglês) a fazer vistorias, mesmo sem autorização judicial, e o cidadão não tem qualquer possibilidade de pedir explicações. Ou seja, é como se desde o 11 de setembro a quarta emenda – que garante os direitos à intimidade e privacidade – tivesse desaparecido da Constituição norte-americana.

      Para piorar, essa diretriz de segurança muitas vezes acaba sendo usada contra pessoas críticas à política externa norte-americana. É o caso da cineasta Laura Poitras, indicada ao Oscar e ao Emmy por seus documentários sobre o Iraque e o Afeganistão. Ela é autora do longa My Country, My Country, filmado em 2005, no qual relata o impacto emocional que a guerra teve tanto em iraquianos como nos soldados norte-americanos…

      Texto completo:

      http://operamundi.uol.com.br/conteudo/noticias/21418/cineasta+americana+indicada+ao+oscar+e+perseguida+em+aeroportos+por+criticar+washington.shtml

  1. desta forma é bom ñ ser feliz… os americanos pensão que são donos do mundo, mais eles tem de se conscientizar que eles ~m estão acima do bem e do mal!!

    • Donos do mundo, eu não diria, mas do ocidente capitalista, sim… penso que para nós, melhor seria um caminho alternativo independente, seja de uma ideologia capitalista insanamente aplicada ou de uma relativa comunização (economia fascista de estado ou capitalista de estado) da economia nacional… em ambas, os feudos detentores dos meios de produção tendem a dominar o mercado e impedir a livre iniciativa, base econômica das modernas democracias… o inverso, ou seja, a estatização dos meios de produção também não é o caminho melhor… ficamos com a velha e boa liberdade de mercado, com regulamentação antitruste rígida e severa… esse seria a melhor opção para nós… assim poderíamos desenvolver nossas indústrias competitivamente, barrando a concorrência desleal vinda de fora e caminhando paralelamente aos dois polos ideológicos que atualmente dominam o mundo: o capitalismo de estado chinês e os grandes conglomerados metacapitalistas americanos e europeus…

  2. Eu sempre advoguei a ideia de que os Estados nacionais não morreram, para essa tal de globalização! Porque afinal era, como é, só um engodo para os países hegemônicos venderem seus peixes (mercadorias), sem barreiras!O governo americano sabe de muitas coisas acerca do mundo e do futuro imediato da humanidade que não sabemos, e sabem por intermédio das civilizações superiores, além da terra, com as quais eles mantém contato!Temos que tomar cuidado com esse pais, está utilizando-se de praticas nazista como se fosse pílulas de democracia! O mundo que se cuide!

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