O poder paralelo que se tornou pilar da revolução

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Militares ocupam postos importantes no governo e sustentam regime

José Casado

Enviado especial

CARACAS Na tarde da última quinta-feira, o diretor nacional de Inteligência dos Estados Unidos, James Clapper, apresentou ao Congresso, em Washington, uma previsão sobre as eleições presidenciais na Venezuela. “Espera-se que ganhe Nicolás Maduro e, provavelmente, ele continuará no caminho tradicional de Chávez”, disse Clapper, com a concordância dos diretores da CIA, da Agência de Inteligência de Defesa.

Em Caracas, o candidato Maduro ensaiava para o comício de encerramento da campanha – pouco habituado ao palanque, suas dificuldades de dicção acabam acentuadas pelo tom de voz grave, quase gutural. Ele recebeu a notícia, saiu satisfeito, saudou a multidão vestida de vermelho no centro da cidade e anunciou em discurso:

– Vou reestruturar tudo, para acabar com a ineficiência e a corrupção. E vou militarizar para proteger o povo, a começar pelo setor elétrico.

país tem 300 comandantes

Assim, as Forças Armadas ganharam o controle de uma nova área de negócios do Estado venezuelano: a geração e distribuição de eletricidade.

O poder na Venezuela está assentado sobre dois pilares – o petróleo e os militares. Hugo Chávez fatiou entre civis e generais o controle do caixa da estatal PDVSA, provedora de US$ 9 a cada US$ 10 exportados pelo país. As Forças Armadas continuam um enigma a ser decifrado tanto pelos herdeiros do chavismo, hoje liderados pelo candidato Nicolás Maduro, quanto pelos adversários, comandados pelo candidato Henrique Capriles.

– Vivemos uma situação de flagrante instabilidade – diz Rocío San Miguel, presidente da organização não governamental Controle Cidadão, especializada em Defesa.

– Na Força Armada Nacional Bolivariana não há chavismo sem Chávez – acrescenta. – Maduro pode ser o sucessor político, mas não é o sucessor militar. O desafio aqui é conduzir os militares de volta ao seu papel constitucional.

São 73,7 mil profissionais em armas, informa o Ministério do Poder Popular para a Defesa. Para controlar os quartéis, Chávez produziu um número recorde de comandantes: são 300 generais, almirantes e brigadeiros (o Brasil, por exemplo, sustenta 150 para uma tropa de 190 mil). Significa que há um general para cada grupo de 250 soldados. E quase todos só devem passar à reserva em 2020 – deteriam o comando pelos próximos sete anos.

Entre eles e a tropa existem oito mil oficiais – todos à espera de uma promoção ao generalato. Embaixo estão mais 27,5 mil oficiais técnicos.

Na vida real, apenas 80 generais-comandantes têm controle efetivo do poder de fogo, dominando as áreas mais estratégicas da caserna. Cada vez mais divididos, eles são beneficiários da política de altos salários, mas permanecem à margem de outros núcleos do poder militar, como ministérios.

militares loteiam governo

Um em cada três ministros venezuelanos é militar. Além da Defesa, dominam áreas diversas como Gestão, Justiça, Saúde, Transportes, Alimentação e Bancos Públicos. Cada ministério é um trampolim político: 50% dos 24 governadores estaduais são militares.

Esse peso específico dos militares na política venezuelana tem origem num passado de sucessivos golpes de Estado. Um deles, frustrado em 1992, aplainou a rota do protagonista anistiado Hugo Chávez para a Presidência em eleições regulares. Em 2002, o próprio Chávez viu-se vítima de um golpe. Recuperou o poder com apoio de grupos civis organizados.

milícias no modelo cubanO

Quando voltou ao Palácio de Miraflores, Chávez se dispôs a exorcizar o fantasma da traição nos quartéis. Plasmou o modelo cubano e criou uma força paramilitar: as milícias.

Na contabilidade do Ministério da Defesa, elas abrigam exatos 875.018 alistados, isto é, dez vezes mais que o contingente de profissionais em armas (há incredulidade sobre o número, mas é o dado oficial). O universo de milicianos chavistas é amplo, por qualquer medida. A Universidade Nacional das Forças Armadas, por exemplo, anunciou o treinamento de 13 mil durante este ano. Os militares veem as milícias com desconfiança, acentuada pela presença de instrutores estrangeiros, todos cubanos.

Chávez deixou uma estrutura de poder complexa, com vários núcleos de autodefesa. O último é totalmente integrado por oficiais cubanos, escolhidos pelos irmãos Raúl e Fidel Castro. O número é incerto, mas é visível sua prevalência no comando de todas a agências venezuelanas de inteligência, inclusive as militares, além do poder absoluto sobre órgãos de segurança da Presidência da República.

Meses atrás, em dezembro de 2011, a agência Stratfor Strategic Forecasting Inc., dos EUA, mobilizou equipes de analistas para decifrar mistérios desse pilar do poder venezuelano. A operação foi coordenada a partir de Austin, no Texas, pela diretora de análises Reva Bhalla. Sua correspondência destacou-se em meio a cinco milhões de e-mails internos da empresa, divulgados recentemente pela organização WikiLeaks.

Neles, Bhalla reportava o ritmo das conversas com integrantes da cúpula militar em Caracas. “Eles têm desfrutado da boa vida. Gostam das mulheres, muitas delas. Adoram a bebida…” – ela escreveu na segunda-feira 5 de dezembro de 2011, três dias depois que Hugo Chávez anunciara a “cura definitiva” do câncer que o matou no mês passado.

Acrescentou: “São fáceis de subornar. O importante para eles é manter seus atuais estilos de vida. Estamos vendo muitos desses militares da elite se aproximarem, tratando de se protegerem num cenário pós-Chávez. E essa é a razão pela qual assistimos a Chávez investindo muito tempo e dinheiro no desenvolvimento de uma milícia – sua melhor apólice de seguro. Quanto maior o potencial de problemas que uma milícia possa criar nas ruas, maior é a probabilidade de que a elite militar fique inibida de atuar contra ele ou contra seu potencial sucessor.”

quartéis são cortejadoS

Passados 15 meses, o cenário pós-Chávez é de instabilidade. Reconhecendo isso, Nicolás Maduro e Henrique Capriles cortejaram os quartéis na reta final da campanha presidencial.

– Vocês são a maior garantia do futuro da pátria – repetia Maduro nos comícios.

– Mantenham a institucionalidade, mantenham a institucionalidade – insistia Capriles em discursos.

A herança militar de Chávez é uma caixa-preta para o futuro presidente venezuelano, não importa quem ganhe nas urnas hoje.

Fonte: O Globo via CCOMSEX

4 Comentários

  1. Pra felicidade dos venezuelanos o chaves morreu!No Brasil tem muito gente que deveria seguir o mesmo destino, só assim poderemos sonhar com um futuro para o nosso pais!Populismo de Estado é tão nocivo quanto é o comunismo pros cubanos e coreanos! A livre iniciativa de mercado centrada em valores eticos, somado a democracia, ainda é o melhor caminho para os povos do mundo! Ainda bem que temos na nossa sociedade uma classe media e mesmo uma elite culta e endinheirada (por que não?), que estabelecem socialmente um equilibrio, e que não nos deixa cair em esparelas politicas ou social semelhante a venezuelana!

  2. primeiramente a venezuela é uma democracia ,segundo nao vejo mau algum em ter militares comandando pastas e ministerios, tanto civis quanto militares fazem parte do povo ,essa divisao aqui no brasil fazendo castas ,fazendo com que alguns achem que uns sao melhores que outros sendo que sao tudo povo esse é o maior erro ,dividir para conquistar sempre usaram isso no brasil
    venezuela antes do hugo chaves ,os brasileiros nao sabiam nem aonde ficava ,o comercio entre os dois paises era ridiculo ,hoje o comercio é forte ,com uma balança bem mais favoravel para o brasil
    quem nao esta gostando mesmo é os estados unidos a metropole que so gostava que a venezuela fizesse comercio com eles , e depois eles revendiam as mercadorias venezuelanas para os outros paises latinos .

  3. Na Venezuela ocorre o mesmo que em todo o mundo uma elite confrontando a outra e o povo, como sempre, manipulado no meio!

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