Política externa da nova classe

Por Matias Spektor –  ensina relações internacionais na FGV. É autor de “Kissinger e o Brasil e de Azeredo da Silveira: um depoimento”. Trabalhou para as Nações Unidas antes de completar seu doutorado na Universidade de Oxford, no Reino Unido. Foi pesquisador visitante no Council on Foreign Relations (Estados Unidos) e assina uma coluna no “International Herald Tribune”.

A nova classe trabalhadora brasileira transformou a vida pública no país. Responsável pelo dinamismo da economia, atraiu para sua órbita os interesses do capital industrial e financeiro. Maioria absoluta da população, passou a ditar os termos da competição eleitoral.

A trajetória ascendente dessa nova classe pressiona todas as políticas públicas, e a política externa não é uma exceção.

Por isso, a diplomacia precisa adaptar-se à nova tendência. No passado, ela serviu a banqueiros e grandes exportadores da Primeira República; ao projeto de modernização conservadora do Estado Novo; à industrialização nos anos cinquentas; ao autoritarismo anticomunista nos sessentas; à marcha forçada do nacional-desenvolvimentismo nos setentas; e, nos oitentas, à gestão do endividamento externo e da abertura política.

Com Fernando Henrique e Lula, normalizou as relações com o mundo, assegurou a sobrevida do Plano Real, pôs o país no mapa geopolítico e começou a internacionalizar o capitalismo brasileiro.

Agora, a política externa é pressionada para atender a um novo imperativo –os interesses da massa de cidadãos recém incorporada ao espaço da política e do mercado.

O que pode fazer a diplomacia por operadores de telemarketing, maquinistas, feirantes, empregadas domésticas, motoristas ou pequenos produtores rurais país afora?

Muito. Trata-se de debelar os obstáculos externos que dificultam o pertencimento desses brasileiros a uma nova classe social em expansão. A lista de exemplos é vasta. Inclui medidas como a adoção de práticas comerciais para o benefício do consumidor de baixa renda. A proteção consular a quem deixa o país temporariamente em busca de oportunidades. A redução de empecilhos para o jovem que, munido de Bolsa Família e ProUni, sonha em estudar no estrangeiro pelo Ciências Sem Fronteiras.

Nenhuma dessas áreas exige a reinvenção da roda e há indícios de que a política externa já pende nessa direção há algum tempo. Basta lembrar de como a universalização do acesso a remédios virou emblema nacional, levando nossos agentes diplomáticos a uma batalha global pelo licenciamento compulsório de patentes da indústria farmacêutica. Exemplos como esse serão cada vez mais comuns.

Hoje, contudo, as iniciativas existentes ainda são poucas e não estão unificadas sob um conceito estratégico comum. Ainda não constituem um projeto.

O governo que fizer os ajustes necessários poderá atuar à frente de seu tempo, inaugurando pela primeira vez uma estratégia internacional a serviço daqueles que batalham por uma vida mais digna e são maioria no país.

Uma política externa assim orientada buscará acelerar o processo de redução de assimetrias entre ricos e pobres, nossa mais perversa característica. A desigualdade, com toda sua injustiça e violência, é hoje o fator que mais limita nosso poder, prestígio e influência no mundo.

Organizar a política externa nesses termos não será fácil nem livre de conflitos. Não é necessário ser marxista para entender que o crescimento de uma classe colide com os interesses de outra. Ou para ver que o preconceito de classe ainda impregna as instituições, o debate público e até mesmo aquilo que nossa imaginação considera possível.

Mas a nova tendência está dada e veio para ficar. Maior e melhor desafio diplomático não há.

Fonte: Folha de S.Paulo

12 Comentários

  1. è tudo lindo do ponto de vista “dinheiro no bolso”…mas não vejo muitos dessa classe C buscar por conhecimento, talvez este estágio demore ou seja combustível para os filhos da nova classe C…mas fico estarrecido da maneira como os políticos usam isso como fator eleitoral, já que eles não fizeram quase nada, foi sim mérito desse povo GUERREIRO, que levanta 4 da manha para ir trabalhar, pega 4hrs de trânsito porque o governo não oferece meio de transporte descente, e volta pra casa meia-noite para tentar recobrar as forças. Maldito seja esses governantes covardes que estrupam o cidadão brasileiro com sobre taxas, impostos em cascata e corrupção da soberania…PARABÉNS somente ao povo BRASILEIRO…e aqui pra vocês traidores da nação _|_

  2. Bacana demais.
    Leiam o livro citado. Azeredo da Silveira (Silveirinha), nosso chanceler na época do Kissinger ajudou demais nossa diplomacia. Foi um grande nome, talvez um dos últimos na área, até então.

  3. Muito bom…. Parcialmente Gosto desta subida de classe do Brasil… mas só em parte… pois… Normalmente a educação não sobe junto… Apenas o dinheiro… mas na hora o cara continua fazendo xixi no poste… falando aos berros… metendo a mão na comida… enfim!

  4. Porque citar FERNANDO HENRIQUE CARDOSO????? Só na Folha de SP, mesmo!!! Esse Ex-Presidente TUCANO deveria estar PRESO!!! Vem por aí a CPI da PRIVATARIA, o PLANO BRASIL não vai falar nada??????????

  5. É isso mesmo Ronin! Só mesmo nessa tal folha, adepta do jornalismo do esgoto pra conferir a FHC algum crédito por tudo de engradecedor que tem acontecido ao Brasil.

    O plano real foi uma operação do governo Itamar Franco, e surrupiado pelos demotucanalhas expertos, tiradores de sapatos em Aeroportos internacionais.

    Patrocinadores da privataria, onde membros do próprio governo foram flagrados admitindo que estavam no limite da irresponsabilidade.

    Mas essa mídiazinha capenga e cheia das futricagens e baixarias em geral, teimam em tentar a qualquer custo, creditar a esse pessoal, algum mérito pela situação atual do país. Logicamente que, somente quando se trata de fatos positivos, porque os negativos, esses são sempre atribuídos ao tal sapo barbudo.

    Jornalismo de esgoto virou moda.

  6. Eu ganhando salário mínimo, td os técnicos particulares ganha, no máximo R$1200,oo….isso é ser classe merdia?!?…Estou abaixo disto, sou então classe “D”? existe?!sds.

  7. Só te lembrando ALEXANDRE que o PIB do governo Dilma é o pior dos ultimos 30 anos proporcionalmente… só se o povo for besta de votar em quem é conivente com corrupto e mal administrador…

  8. Quase 90% de bestas Blue Eyes e eu no meio satisfeito demais da conta, agora os 10% de inteligentes estão insatisfeitos e começam a criar dados como PIB proporcional, essa é ótima. Sabe como eu analiso o PIB? Nas dezenas ou até mesmo centenas de pacientes que entram no meu consultório podendo pagar, atendo da classe A até a classe D, e lhe digo que é grande o acesso das classes menos favorecidas, isso se chama poder de compra ou distribuição de renda, para mim é o que vale.Abcs.

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