Opinião Econômica: Indústria

Opinião Econômica – É a indústria…

Por Delfim Neto – Economista, ex-deputado federal e ex-ministro da Fazenda, do Planejamento e da Agricultura

Em relação à política industrial (Brasil Maior), acreditamos que é razoável exigir cuidado sobre como executá-la num ambiente globalizado em que os produtos devem ser “mundiais” e cada país tenta criar uma plataforma de exportação. O que não é razoável é condenar, “a priori”, qualquer política industrial apoiada na “teoria do equilíbrio geral”, da qual não se pode extrair conclusões normativas.

Há um estado de guerra econômica entre três parceiros importantes, os EUA, a eurolândia e a China. Cada um deles, usa como arma políticas industriais explícitas ou veladas, apoiadas na manipulação de suas taxas de cambio.

Os EUA e a eurolândia utilizam suas políticas monetárias, e a China surfa uma espécie de “dollar standard”, arbitrando a fixação de sua taxa à americana. Isso acabará num massacre do setor industrial dos países emergentes pela consequente tendência à valorização das suas moedas.

Quem ainda tem dúvida sobre o estado de guerra não deve deixar de ler o capítulo referente à política industrial dos EUA, contido no “State of the Union Address”, que, todos os anos, o presidente americano apresenta ao Congresso no fim de janeiro.

“Pense – nos diz ele nas preliminares – na América que está ao nosso alcance. Um país que lidera o mundo na educação do seu povo. Uma América que atrai uma nova geração de indústrias de alta tecnologia e empregos bem remunerados. Num futuro no qual nós estaremos no controle de nossa própria energia, de nossa segurança, de nossa prosperidade e (sic) relativamente independentes das instabilidades do mundo. Uma economia construída para ficar, onde o trabalho duro vale o sacrifício e a responsabilidade é recompensada.”

E continua: “Essa nova América começa com o setor industrial… Apostamos nos trabalhadores americanos. Apostamos na sua engenhosidade. Nesta noite, nossa indústria automobilística está de volta. Podemos trazer de volta também os empregos que foram exportados (para a China)”.

A seguir explica como vai fazê-lo: 1º) modificar o sistema tributário que estimula a fuga industrial; 2º) aumentar os impostos das multinacionais que produzem no exterior; 3º) reduzir a tributação do setor de alta tecnologia; 4º) investigar as práticas comerciais de países como a China e 5º) reafirmar o projeto, que vai muito bem, de dobrar as exportações nos próximos cinco anos.

A mensagem é simples: “É tempo de pararmos de beneficiar quem produz no exterior e exporta emprego e de estimular os que criam emprego aqui na América”. Não importa a avaliação dos economistas sobre esse programa. O que interessa é o que Obama vai fazer com ele…

Fonte: Folha de São Paulo via Jornal do Comércio

Exportando indústrias

Por Nivaldo Cordeiro

A coluna do ex-ministro Delfim Netto na edição de ontem (8) da Folha de São Paulo (É a indústria…) me levou a meditar sobre a nova divisão internacional do trabalho, que se configurou a partir das últimas décadas do século passado com a entrada da China como grande produtor mundial. Até então este país tinha papel marginal e era voltado para seu próprio mercado interno.

Desde então a China passou a ser o endereço das empresas dedicadas à indústria de transformação. Eu próprio, nos anos oitenta, militava na indústria de brinquedos e vi praticamente toda a indústria nacional naufragar. Mal se sabia que a quebradeira do setor não era episódica e não se devia apenas à crise que então grassava no país. A mudança era estrutural e a China acabou por ter o quase monopólio da fabricação de brinquedos.

Outros setores seguiram o exemplo. Parte da indústria do EUA, no primeiro momento, mas de todo o mundo no momento seguinte, transferiu-se para a China. Nossa própria indústria foi para lá deslocada.  Como entender o processo? Em primeiro lugar, houve a vontade da estrutura política da China de se integrar ao mercado mundial, no famoso dito de Deng Xiaoping “Um país, dois sistemas”. Um arremedo de capitalismo vitoriano foi por lá implantado, sem qualquer modernização das relações políticas, integralmente controladas pelo Partido Comunista.

Em segundo lugar, a China ofertou como diferencial uma reserva inesgotável de mão de obra barata e um sistema tributário bastante favorável em comparação com o Ocidente. A indústria de transformação, em regra estruturada no formato de mão de obra intensiva, encontrou ali um local favorável para se desenvolver. Boa parte da prosperidade que se verificou no momento subsequente se deveu à incorporação desse enorme contingente de pessoas à economia mundial.

Em terceiro, a fronteira econômica de expansão no Ocidente estava determinada pelo binômio informática/telecomunicações. O setor de serviços expandiu-se enormemente. Dessa forma, a indústria de transformação deslocou-se para a China sem que impactos estruturais maiores fossem verificados nos países que perderam indústrias de transformação.

O Ocidente pôde assim manter sua estrutura social democrata, convivendo com custo muito mais elevado da mão de obra, que ganha mais e trabalha menos em relação aos chineses, absorvendo os frutos do acréscimo de produtividade daquele país. Os preços baixos do Oriente semearam a prosperidade.

Um último fator foi bastante favorável ao Brasil, produtor que é de comida e matérias primas. A incorporação da China ao mercado mundial demandou intensamente nesses mercados, melhorando preços de forma permanente. O Brasil portanto foi duplamente beneficiado, seja pela revolução tecnológica, seja pela ampliação de seus mercados tradicionais. A perda do setor de indústria de transformação quase não foi sentida.

Delfim Netto sempre raciocina, no artigo, como formulador de política industrial, do que foi useiro e vezeiro quando de sua passagem pelo poder. Ocorre que as relações estruturais dos mercados se sobrepõem e por vezes esmagam a vontade do governante. É inútil e extemporâneo tentar reimplantar indústrias que se transferiram para o Oriente. Elas só voltarão se o modelo social democrata for extinto, o que parece estar sendo ensaiado na Europa. Para concorrer com a China só com mão de obra barata e mercado desregulamentado, ou seja, com o desmonte do chamado “Estado de bem estar social”. E com baixa tributação. Isso não vai acontecer aqui, ao menos em um horizonte de tempo discernível. Logo, essa divisão internacional do trabalho se manterá pelos próximos anos. A China é a dona da indústria de transformação por razões estruturais.

Fonte: MídiaSemMáscara

19 Comentários

  1. Se o governo brasileiro ao longo das décadas incentivassem as pequenas empresas que tentaram se desenvolver, ao invés de isentar as multinacionais, teríamos grandes empresas de pontas genuinamente nacionais. Mas no Brasil, com a falta de patriotismo, incentivo e visão estratégica por parte dos políticos, a engrenagem sempre girou ao contrário do desenvolvimento brasileiro.

  2. Delfim Netto sempre arguto e cáustico. O termo Eurolandia é espetacular.
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    Discordo do autor quanto a não se possível reimplantar indústrias exportadas.
    Apliquem-se aos produtos chineses as mesmas exigencias dos produtos aqui fabricados, que os preços se modificarão enormemente.
    O lixo continuará sendo importado, mas o essencial terá preços condizentes e suportáveis pela nossa indústria.

  3. É muito fácil fazer o Brasil crescer 10%aa,como a China.Eu tenho esse projeto em mente. Basicamente,é passarmos a copiar o modelo oriental, mas para isso vamos ter que mudar o nosso sistema político, que é populista e corrupto. Vamos ter que escolher os políticos a dedo pelo critério de competência a nível empresarial. Os melhores empresários e professores universitários do país (e mais honestos e patriotas), seriam aproveitados para criar um novo modelo econômico, além de gerenciá-lo. A nossa justiça é cara e ineficiente; as nossas leis são burocratizantes e engessam a nação; as nossas escolas não ensinam os jovens a pensar criativamente, etc. Eu poderia citar aqui uns 100 itens importantes,mas não é lugar adequado.

  4. Vamos ao resumo… Que importa atrair capital que só aparece aqui para levar os juros sem deixar nada além de inflação? O problema do Brasil é que temos uma blindagem natural. Somos produtores de alimentos e grandes exportadores. Não há como isso mudar. SEMPRE teremos grandes receitas de matérias primas e, pior, nosso setor de serviço é quase todo voltado para a agropecuária e é de altíssima tecnologia. Logo, por quê se indispor com “parceiros” tão poderosos e “estratégicos” se podemos ficar no muro? Sabem porque Lula tem câncer de faringe? Porque falou demais… É gente… Aqui se fala, aqui se paga. Se a moda pega, Brasília vai ser a maior colônia de leprosos do planeta. Bom… Não a maior, mas uma das bem grandes. []´s

  5. para desespero dos comunista de carteirinha o que se vê é a China de sempre altamente burocratizada e explorando sua mão de obra gigantesca onde estão os sindicatos em defesa dos direitos dos trabalhadores
    BOM na China que direitos

  6. Ainda bem que o texto esclarecedor não foi indicação minha… as viuvas do muro não poderão taxar o texto de direitista so pela minha presença… rsrsrsrsrs… agora, se fosse um texticulo do Noam Chomsky, Pepe Escobar e outros esquerdistas, seriam exaltados como perfeitos, otimos, realistas, o supra-sumo da verdade universal… durma-se com uma turba dessas… rsrsrsrsrsr…

  7. A perdas no Brasil quase não foram sentidas, porque de fato perdemos muito pouco de nossa industria para a China, a maior parte dela ainda permanece em solo brasileiro. E isso se deve porque ainda temos capacidade de competição, afinal, nossos salários não são iguais aos do G7. Além disso, uma parte da industria de transformação depende das matérias primas e de nosso mercado interno, e não irá se mudar para nenhum outro lugar, porque não compensa. É precisamos parar de importar análises sistêmicas que não são válidas para nossa realidade. O G7 vive outra realidade, diferente da nossa.

  8. Brilhante o artigo do Prof. Delfin Neto. O Brasil deve implementar aqui,com urgência, os 5 princípios citados
    pelo Sr. Obama para reerguer a economia Americana.
    E com urgência,pois estamos ficando para trás,distraidos
    com o “lixo” que a Mídia incute na cabeça do Povo Brasileiro.

  9. O Brasil não está desindustrializado não… Ao contrário da Europa.

    Temos nossa versão tupiniquim do Buy American.

    Além de não nos apoiarmos na venda de títulos para pagar o “bem estar social” (que aqui está mais para “bem mínimo”).

    Os EUA e UE vão ter que rodar a bolsinha para trazer as empresas de volta… kkkk!!!

    A base de crescimento dos países desenvolvidos era o consumo, ao contrário dos emergentes, que é a produção.

  10. Ao contrário de pensar em tirar direitos (primeira coisa que os endinheirados de verdade pensam), deveriam combater a escravidão e trebalho infantil que ocorre na Ásia… E excluir essas empresas.

  11. Brasil – são poucos os recursos para tantas prioridaes, sair gastando nossos impostos tendo como objetivo atender demandas partidárias e manutenção do que já existe, seremos sempre um país do futuro. A materia acima chama atenção para políticas economicas baseadas no que está acontecendo e irá acontecer. O brasil esta atravessando um momento histórico na economia, devemos aproveitar a maré favorável, estabelecer uma politica estratégica baseada em programa de governo, estabelecer metas focadas em áreas que nos torne uma nação lider mundial – somos capazes em energia/agricultura, fazer o mundo saber que somos os melhores e imbativeis-SOBERANOS, esse papo de ser o melhor em tudo, não funciona. SEJAMOS OS MELHORES no quisito ENERGIA/ALIMENTO e seremos respeitados.

  12. Nivaldo Cordeiro diz …”e inutil tentar reimplantar idustrias que se transferiram para o Oriente. Elas so voltarao se o modelo social democrata for extinto, o que parece estar sendo ensaiado na Europa…” Escrevi sobre isso muitas vezes em minhas contribuicao para o Plano Brasil. Na ultima vez, dias atras, repeti, que o processo de esta ocorrendo um processo de desindustrializacao no Brasil e Mexico, porque a mao de obra nesses dois paises e muito cara quando comparada com aquela da China e outros paises asiaticos. Um contribuinte, Manolo, mandou eu calar a boca. Outro diz que toquei na ferida. Nivaldo Cordeiro escreve de um ponto de vista de quem defende o sistema capitalista. Para um capitalista investir dinheiro em um projeto, seja la qual for, ele tem que esta seguro que ele vai obter um bom lucro como retorno, senao ele simplesmente deixa o dinheiro no banco ou vai fazer especulacao financeira. O modelo social democrata, do qual o PT e um exponente, depende do apoio dos setores populares e este apoio so e dado se o povo con segue alguma coisa em troca. Sexta basica, educacao de graca, servico medico que nao custa muito caro, se nao for de graca, aumento no salario minimo e mais direitos sindicais faz parte daquilo que as classes populares demandam em troca de seu apoio aos partidos social democrata. Mas tudo isso, faz com que os gastos publicos aumentam e dai a necessidade de maior taxa de imposto que como consequencia aumenta os precos das mercadorias, que as tornas menos competitivas no mercado. Os capitalistas somente aceitam a social democracia no poder quando estao com as costas na parede e nao tem alternativas a nao serem fazer concessao, esperando obter um espaco, para uma outra contra ofensiva no futuro. Lula assumindo o poder, como esquerdista, social democrata, homem do povo, ex operario e lider sindical, foi capaz de faZER concessao ao Fundo de Garantia que Henrique Cardozo, nao teve condicao de faze-la. O mesmo ocorreu com o direito do funcionarios publicos aposentados. Na Inglaterra, os Conservadores na decada de 1980 e comeco de 1990, desejavam mas nem ousaram propor o abandono de universidade gratis para a populacao estudantil. Os trabalhistas, isto e social democratas, conseguiram impor esse corte. Houve protexto, mas os estudante ingles hoje tem que pagar seu ensino universitario. Na Europa e nos Estados Unidos desde 1970 esse modelo social democrata esta esgotado. Dai a ofensiva da direita. Mas somente apos o agravamento da crise em 1987, a ofensivsa burguesa esta mais radical. Eles nao tem outra alternativa, mas atacar os direitos do Ben Estar Social adquirido pela classe operaria apos a segunda guerra mundial. Dai o crescimento de organizacoes facista de extrema direita. Dai o crescimento do militarismo, o retorno do imperialismo barbartico do final do seculo XIX. O problema para a classe operaria, e que se permitem que o patronato imponham essa politica neo-liberal de eliminar os ultimos vestigios do modelo social democrata, e que nao ha garantia que ela vai se beneficiar de um possivel recuperacao, novo crescimento da economia capitalista. Razao simples, se todos paises imporem essas medidas draconianas implicita no artigo de Nivaldo Cordeiro, havera imiseracao geral no mundo, uma porcentagem muito alta da populacao nao vai ser capaz de comprar/consumir o que esta sendo produzido, ainda que por precos baixos. Uma burguesia nacional usara o protecionismo para proteger seu mercado, desvalorizacao da moeda, etc. Mas outras burguesias nacionais farao o mesmo, dai o acirramento das guerras comerciais. Existe tambem a opcao imperialista, conseguir conquistar pais ricos em minerios e boas terras para agricultura, fazer a populacao desses paises trabalhares semiescravo, para esses imperialistas, permitindo esses aumentar o padrao de vida de seus habitantes. Tudo isso envolve guerras. Opcao para a classe operaria, nao creio. Repito, o que disse muitas vezes, Socialismo ou Barbarismo, Fascisma/ Direita extrema nacionalista ou comunismo.

  13. Realmente,duas matérias ótimas Blue.
    O que vi ao ler:
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    Delfim deixa claro que sim, existe uma guerra economica entre as grandes potencias, e acredito que ela tende a se intensificar.
    Delfim não taria justificando a posição da Presidente na defesa da indústria nacional como aconteceu com o aumento do IPI sobre carros importados, que atingiu principalmente China, Coreia do Sul e agora a renegociação do tratado com o México???
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    O texto do Nivaldo é interresante AJ, na medida que põe em dúvida a capacidade das nações de competir com os chineses na indústria de mão de obra intensiva ( e daqui a uns dez/15 anos com produtos de alta tecnologia ).
    Ele da como alternativa o desmantalamento do estado como provedor do bem estar social subsidiado.
    O NÓ: – se Obama quer tentar competir com a China então começou mal, quando buscar ampliar o atendimento aos menos privilegiados.
    Diminuir o orçamento militar é uma das saídas, – mas será aceita pela sociedade, acostumada a ser a TOP na área de defesa a longas decadas???
    Saudações

  14. Paulo Rick / Edu Simões, vou lhes dar 2 exemplos do que é desindustrialização:
    – há 50 anos, a Indústria Romi, gigante brasileiro dos tornos, vendia tornos para os EUA;
    – há 40 anos, a Indústria Romi, gigante brasileiro dos tornos, vendia tornos para a China;
    – agora, nós compramos tornos da China. Vender para os EUA, nem pensar;
    – há 20 anos, possuíamos uma indústria de balanças de ponta, a Filizola. Nessa época, juntou-se a ela a Toledo. Continuamos produzindo essas balanças, do mesmo tamanho etc. Só que internamente as placas não são mais produzidas aqui. Vêm de fora, da China. A Filizola, mais de 100 anos, só não quebrou porque transferiu a fábrica de SP para MT, e usou as antigas instalações para se capitalizar. A Toledo está um pouquinho melhor.
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    Harry, o problema dos EUA é que são muito mais desenvolvidos que nós, a mão-de-obra já está em outro patamar, não dá mesmo para eles tentar reverter o processo para a fabricação de coisas mais simples. Para nós ainda dá, para certos setores, mas já começou a “engargalar”. Quanto custa um engenheiro brasileiro versus um engenheiro chines?
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    Se os produtos chineses tiverem que comprovar ou atender certas exigencias imputadas aos similares aqui fabricados, a coisa muda de figura. Vejam o exemplo dos brinquedos, que deu uma sobrevida boa a Estrela. Vejam o exemplo dos tecidos, dos sapatos, das confecções.

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