Brics não ameaçam hegemonia dos EUA, diz ‘pai’ da teoria do neoliberalismo

Rogerio Wassermann

Da BBC Brasil em Londres

Dez anos após a criação do acrônimo Bric, os países do grupo não formam um bloco coeso e não são capazes de criar uma aliança para ameaçar a hegemonia dos Estados Unidos no mundo, na avaliação de um dos mais importantes teóricos das relações internacionais.

Joseph S. Nye Jr., atual professor emérito da escola de governo da Universidade Harvard, nos Estados Unidos, é o co-fundador da teoria do neoliberalismo e criador do conceito de “soft power”, que define a capacidade de um país atingir seus objetivos por meio da influência de seus valores, cultura e política, em lugar do uso da força militar.

Para ele, os países do grupo são capazes de rivalizar pontualmente com os Estados Unidos de maneira individual, como no caso da crescente influência brasileira sobre a América Latina, mas não representam um contraponto real aos americanos como um bloco, por conta das diferenças de interesses entre seus membros.

“Se a questão é se eles podem criar uma aliança contra os Estados Unidos, um bloco coeso, a resposta é não”, disse ele em entrevista à BBC Brasil.

O acrônimo Bric foi criado há dez anos pelo britânico Jim O’Neill, então economista-chefe do banco Goldman Sachs, incluindo Brasil, Rússia, Índia e China, os quatro gigantes com crescimento econômico acelerado. Posteriormente, o grupo foi institucionalizado pelos países, com a entrada posterior da África do Sul (o “s” acrescentado ao final do acrônimo), neste ano.

Nye, que foi secretário-assistente de Defesa no governo Bill Clinton, vê a Rússia como uma peça anômala no grupo, por ser “uma força em decadência, não emergente”, e afirma que Brasil e Índia têm mais capacidade de exercer “soft power” do que a China, a maior economia e maior força militar do grupo, por serem países democráticos.

Para ele, os Brics não vão acabar, mas terão um papel limitado como “uma organização frouxa para coordenação diplomática”.

Leia a seguir a entrevista concedida por Nye à BBC Brasil, por telefone:

BBC Brasil – Os Brics podem representar uma grande força política global?

Líderes dos BRIC durante reunião de cúpula do G8 em Hokkaido, no Japão, em 2008Criado por economista, BRICS vêm se institucionalizando desde 2008

Joseph S. Nye Jr. – Não creio que possam ser uma grande força como uma organização coesa. Os interesses dos países são bem diferentes entre eles quando analisamos os detalhes.

Acho que individualmente, a China, a Índia e o Brasil terão papéis muito importantes. Já a Rússia não creio que realmente pertença a esse grupo. A Rússia é uma força em decadência, não uma força emergente.

BBC Brasil – E individualmente, eles são capazes de rivalizar com os Estados Unidos em termos de dominação mundial?

Nye – O papel da China do leste da Ásia é comumente visto como um desafio à presença americana no Mar do Sul da China. Se olharmos para o Brasil, o país quer ter sua própria influência sobre a América do Sul, para contrapor à influência dos Estados Unidos.

Mas se a questão é se eles podem criar uma aliança contra os Estados Unidos, um bloco coeso, a resposta é não.

Há diferenças muito profundas, por exemplo, nos interesses da Índia e da China. A Índia está muito contente em ter boas relações com os Estados Unidos para conter o poder crescente da China.

BBC Brasil – Pode haver algum outro grupo de países emergentes que poderiam criar um grupo coeso para se contrapor aos Estados Unidos?

Nye – Depende do que considerarmos por desafiar. Se falarmos em um grupo de países capazes de se unir na Organização das Nações Unidas para evitar a aprovação de uma resolução apoiada pelos Estados Unidos, claro. Isso já acontece hoje.

Mas se formos para o outro extremo, será que um grupo de países poderia formar uma aliança militar para rivalizar com o poderio americano? Os Estados Unidos representam quase metade dos gastos militares mundiais. É difícil conceber qualquer outro grupo de países que possam ser capazes até mesmo de chegar perto do tipo de gastos militares necessários para rivalizar militarmente com os Estados Unidos.

Então, novamente, depende do que consideramos desafio. Em um sentido, isso já existe, mas em outro sentido isso não parece muito provável.

Reunião de cúpula dos BRICS em abril, na ChinaFalta de coesão entre os BRICS são empecilho para consolidação como contraponto aos EUA, diz Nye

BBC Brasil – Os Brics são capazes de transformar o aumento da importância econômica em soft power?

Nye – Muitos desses países já dispõem de soft power e estão interessados em aumentá-lo. O Brasil tem soft power, que vem de sua cultura e seu sucesso crescente. A Índia tem a indústria de cinema de Bollywood, que é bastante impressionante.

Na China, o presidente Hu Jintao já disse que o país deveria aumentar seu soft power. O governo chinês está investindo bilhões de dólares para isso.

Mas o Brasil tem uma vantagem, como tem a Índia, de ser democrático, e portanto ser capaz de usar sua sociedade civil para gerar soft power.

A China tem o problema de ser autocrática, o que significa que quando eles tentam aumentar seu soft power, eles normalmente tentam fazer de sua própria maneira.

Um bom exemplo disso foi quando prenderam Liu Xiaobo e o impediram de ir à cerimônia de entrega do Prêmio Nobel da Paz. Então todos viram a cena pela televisão no mundo todo da cadeira vazia em Oslo. Mas isso tira soft power, em vez de construí-lo.

BBC Brasil – A atual crise na União Europeia pode criar um vazio no balanço global de forças que possa ser preenchido pelas nações emergentes?

Nye – Acho que os países emergentes aumentarão sua influência independentemente do que acontecer com o euro. Países como a China, a Índia e o Brasil vão aumentar sua parcela do produto mundial se o euro se mantiver ou não. Mas particularmente, se o euro entrar em colapso, o primeiro efeito disso seria provavelmente o fortalecimento do dólar, não do yuan ou de qualquer outra moeda de país emergente.

O colapso do euro, se acontecer, provavelmente vai fazer com que os investidores, em busca de um refúgio seguro, se voltem ainda mais para o dólar do que para moedas de países emergentes.

Reunião de líderes dos BRICS durante cúpula do G20 em Cannes, em novembroPara Nye, BRICS devem se manter como ‘organização frouxa para coordenação diplomática’

BBC Brasil – Que futuro o sr. vê para os Brics?

Nye – Acho que há um futuro para os Brics como uma organização frouxa para coordenação diplomática. Há algumas questões sobre as quais é conveniente para eles se sentarem juntos para conversar sobre a coordenação de uma posição.

Mas o problema que eu vejo com os Brics é que ao ir além desse nível, você vê que há interesses bem diferentes entre os países.

Por exemplo, o Brasil e a China tem visões diferentes sobre o valor do yuan (a moeda chinesa). O Brasil está descontente com a política chinesa de manter sua moeda desvalorizada. O país não gosta de falar muito sobre isso, porque não quer destruir o clima das reuniões dos Brics. Mas há uma diferença clara de interesses aí.

BBC Brasil – O sr. acredita que essas tensões internas entre os países, como também no caso das demandas de Índia e China por um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU, possam levar ao desmantelamento do grupo?

Nye – Não acho que ele possa acabar, porque é conveniente para alguns fins diplomáticos. Mas seu exemplo do Conselho de Segurança parece ser um bom exemplo do porquê o grupo não deve se desenvolver além disso.

Fonte: BBC Brasil

11 Comentários

  1. O dito é verdade, mesmo que eu não goste. O Brics, nada mais é que um grupo procurando espaço, mas quando um alcança abandona os demias, estão juntos por conveniência, não estão comprometidos, apenas envolvidos.

  2. Não sei por que ainda perguntaram pro véio…os EUA já estão caindo…a China e a Russia juntas fazem o que querem.
    Os estrategistas americanos estão numa situação que nunca viram antes a REBELIÃO dos explorados.
    É tanto pais se livrando dos tentáculos politicos/economicos dos EUA que vão acabar sofrendo uma implosão já que a população vai receber um baque só.

  3. “Rogerio Wassermann Da BBC Brasil em Londres”
    Harram… Tenho que fazer o que agora?!.. Duas palavras desta primeira frase já botam em cheque muita coisa dita nesta ‘entrevista’.

  4. o que a Rússia e a China acham do Brasil e Índia no Conselho Permanente de Segurança da Onu? Nessas horas eles nem se lembram dos Brics….

  5. JÁ OS FALCÕES NÃO PENSAM ASSIM,Sr.Joseph S. Nye Jr
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    Foi bem coerente as sua idéias com relação aos BRICS,e notem que o cidadão nem tocou no nome do S,a África do Sul seria outro exemplo da força da China no bloco,ela o S,é o apêndice dos chinês e nada mais.
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    Contudo nem todos na casa branca pensa como o senhor Joseph S. Nye Jr,já o atual secretário da Defesa,o Sr. Panetta,pensa que o BRICS,é sim uma ameaça aos EUA.
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    Washington aponta os Países BRICS como “uma Ameaça à Segurança Nacional”.
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    O secretário da Defesa Panetta incitou Washington a proteger o planeta contra tentativas desses países de arruinar a estabilidade global.
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    Os países BRICS, onde se incluem o Brasil, a Rússia, a Índia e a China, foram listados entre os que se põem como uma ameaça à segurança nacional dos Estados Unidos junto com o terrorismo, os ciber ataques e os programas nucleares do Irã e da Coréia Norte.
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    O secretário da Defesa Leon Panetta incitou Washington a proteger o planeta contra tentativas desses países de arruinar a estabilidade global.
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    Mas para o fato de que Leon Panetta não é o único oficial dos E.U.A. da parte superior a fazer recentemente este tipo de indicação, seu relatório poderia ser considerado até agora um outro movimento dos “falcões” de Washington.
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    Ainda mais desde que as relações dos E.U.A. com os russos foram caracterizadas enquanto uma restauração e os dois países se moveram distante da retórica da guerra fria.
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    No entanto, a Secretária de Estado Hillary Clinton disse há alguns dias que os E.U.A. são o líder e outros países são seguidores.
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    Essa é a mesma razão por que Washington muitas vezes vê uma ameaça onde não há ninguém, disse o Diretor do Centro de Pesquisa Social e Política Vlaimdir Yevseev em uma entrevista a um correspondente do “Voz da Rússia”.
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    (….)

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    (*)fonte:Igor Levkov
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    http://dinamicaglobal.blogspot.com/2011/09/brasil-russia-india-china-e.html
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  6. foi correto nesse ponto: Quem ameaça os EUA é sua enorme e impagável DÍVIDA! E a maçonaria que controla seu Banco Central Privado – FED .
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    errou nesse ponto : Os Brics não ameaçam os EUA ainda…E nada impede que a união desses países aumente ao ponto de se tornarem um bloco efetivo…Ele tá mais é “torcendo” contra do que prevendo algo..rs

  7. Ésse é um verdadeiro vendedor. Vende a viagem de que os USA será sempre a Roma moderna. Faz questã de esquecer que tal como a Roma antiga se extinguiu, a Roma moderna já mostra fadiga de material.

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