ROTA: UM CAMINHO SEM CURVA NA DIREÇÃO DO TENENTE-CORONEL TELHADA

Aposentadoria após 36 mortes e 80 elogios

POR MARCELO GODOY

Ele sabe que tem sangue nas mãos. “Mas não tenho o sangue de nenhum inocente.” A cada frase, o tenente-coronel Paulo Adriano Lopes Telhada cria uma polêmica. Há muito tempo ele é assim. O riso fácil, o carisma com a tropa e a mesma forma de cumprimentar: “A paz de Deus, irmão”. O homem que tem 29 processos por homicídio – 36 mortes em ação – e 80 elogios em sua ficha se diz um soldado de Cristo.

Quando entrou para a polícia, em 1979, o jovem sabia que um dia poderia ser obrigado a usar sua arma. E matar. Procurou o ancião da Congregação Cristã do Brasil e contou sua preocupação. “A porta que Deus abre, ninguém fecha. E a porta que Ele fecha, ninguém abre.” Trinta e três anos depois, o irmão Paulo – como é conhecido na igreja onde toca clarinete nos cultos – tem certeza de que a Palavra se concretizou.

Telhada deixou a Academia do Barro Branco na turma de 1983. Em sua memória, há muitas datas. Ele chegou à Rota em 23 de junho de 1986 depois que, em patrulhamento, sua equipe matou dois bandidos, prendeu outros dois e soltou 11 reféns na zona oeste de São Paulo. O batalhão tinha apenas três carros e convivia com uma falta crônica de oficiais – aqueles que tinham fama de matar bandido haviam sido transferidos durante o governo de Franco Montoro (1983-1987).

Bastou um dia para ele ir para a rua atrás de criminosos. Não demoraria para ficar conhecido. “Sou um para-raio. Tudo acontece comigo.” É o que parece. Sua memória ainda se lembra do dia 30 de setembro de 1988, seu primeiro tiroteio na Rota. Um ladrão roubou um táxi. “Ele reagiu e morreu.”

As histórias de Telhada são sempre assim. Por isso a Justiça decidiu arquivar 19 de seus casos e absolvê-lo nos demais. “Não mereço essa fama. Não sou pistoleiro.” Os casos se sucederam. Foram sete em 1989, cinco em 1990. A fama aumentou. Seu nome aparecia nos jornais, como em 17 de agosto de 1990, quando um bandido acertou o seu braço esquerdo na zona norte. Nos dois anos seguintes, mais nove mortes.

À medida que sua fama crescia, a PM ganhava um problema: o que fazer com Telhada? Decidiram retirá-lo da Rota. Era 10 de abril de 1992. “Fui transferido 28 vezes.” O oficial teve outras punições mais explícitas. Foi preso oito vezes por descumprir regulamento. “Não há policial de rua que nunca tenha sido preso.” E colecionou elogios, promoções e medalhas – é o único oficial vivo a ter a Cruz de Mérito Pessoal de Ouro.

Ele já era capitão quando foi baleado pela segunda vez. O comandante da Rota conta que tudo ocorreu embaixo do Viaduto Pompeia, na zona oeste, onde deu de cara com um ladrão. “Não atirei. Não sabia se era um bandido ou se era um mendigo. Segurei o cano de sua arma e ele o da minha. Rolamos no chão.” De repente, o disparo. “Acertou a minha mão. Ele se assustou e eu atirei quatro vezes.” O homem morreu. Telhada quase perdeu o movimento da mão direita.

O tempo curou sua ferida antes da próxima data: 24 de janeiro de 1996, dia de uma experiência mística. Telhada e o soldado Gomes estavam na Avenida Doutor Arnaldo, na zona oeste, quando o rádio da PM alertou sobre a fuga de quatro ladrões em um Kadett. “Subimos no canteiro central. Quando descemos, estávamos do lado deles.” Um dos bandidos desceu e atirou. “Eu pensei: ‘Ele não vai escapar’.” Telhada correu. “Eu olhava para o lado e via o Gomes.” O oficial acertou o ladrão e o levou para o Hospital das Clínicas.

Vídeo:

“Quando cheguei, vi o Gomes baleado e perguntei: ‘Quando isso ocorreu se você estava ao meu lado o tempo todo?’ E ele me respondeu: ‘Capitão, eu não dei um passo. Fui baleado quando saí do carro. Se o senhor me viu, não era eu. Era um anjo que estava do seu lado.’ A Bíblia diz que o Senhor acampa seus anjos ao redor daquele que Ele ama. Naquele dia, um anjo do Senhor estava ao meu lado.”

A PM decidiu afastá-lo das ruas. Na época, era obrigatório o tratamento psicológico para quem se envolvia em tiroteios. Ouviu então de um coronel: “Telhada, você é um homem perigoso. Onde você chega, a tropa fica ouriçada e começa a trabalhar.” Foram anos difíceis. Quase foi expulso da PM em 2004, acusado de fazer bico como segurança do apresentador Gugu Liberato. “Sempre fiz bico, mas não sou ladrão nem vagabundo.”

Era maio de 2009. Fazia 17 anos que o tenente-coronel, hoje com 50 anos, havia deixado a Rota. Sua fama não impediu que Antonio Ferreira Pinto, recém-empossado na Secretaria da Segurança Pública, fizesse sua mais arriscada aposta: pôr Telhada no comando da Rota. “Você pode elevar ou acabar com nosso comando. Depende de sua atitude”, disse Ferreira Pinto. Nesses dois anos e meio, a Rota se transformou no principal instrumento de combate ao crime organizado no Estado. “Foi um grande acerto”, conclui o secretário.

Atentado. Novas polêmicas surgiram, como as que cercam o atentado contra ele, em 2010 – bandidos dispararam 11 vezes e erraram -, e as denúncias de abuso na morte de seis ladrões de caixa eletrônico, em agosto. Mas ele se diz em paz. “Não convivo com fantasmas. Quem gosta de matar tem de se tratar. Tive ótimos policiais que acabaram vendo fantasmas, acabaram na sarjeta, na bebida.”

Telhada vive os últimos dias no quartel do qual vai se despedir por força de lei no dia 18 – vai ser a última data da sua carreira. Antes, recebeu o filho, o tenente Rafael Telhada, de 25 anos, no batalhão – o jovem já esteve em dois tiroteios com morte. “Vou lançar um livro sobre a Rota e, talvez, entrar para a política”, conta. E acrescenta: “Quem critica a polícia ou não a conhece ou tem medo de ser preso.” Telhada sorri. Diz que vai sentir saudade. “Adoro isso aqui.” / COLABOROU WILLIAM CARDOSO

Fonte: Estadão

30 Comentários

  1. ROTA impore respeito…. Aqui em santos pega bandidinho, mete porrada e deve ter uns que eles apagam…. mas e porrada na certa em maconheiro e bandidinho

  2. heheheh e la vamos nois .. ROTAxBOPE..mais deixo aqui meu respeito ao Tenente-Coronel ‘Telhada’ (o pq n .essa historia da ate pra virar um filme e muito bom por sinal)… um Heroi ..mas so mais um ..entre tantos outros desconhecidos ..q tentam a todo custo garantir a lei e a ordem nesse País …uma guerra travada no dia a dia q esta longe do fim

  3. uma frase muito conhecida em SP, ” CABE A DEUS JUGAR OS CRIMINOSOS, E MARGINAIS DO GLORIOSO ESTADO DE SÃO PAULO, E CABE AOS POLICIAIS DA ROTA MARCAR O ENCONTRO !! rsrsrs

  4. parabens tenente-coronel Paulo Adriano Lopes Telhada , vc, assim como muitos outros no nosso pais merecem o nosso respeito.

  5. Falam em 36 mortes, mas ninguem se pergunta quantas vidas foram salvas por esse homem? Pensem em quantas vítimas esses 36 marginais fariam nas suas “carreiras” de bandidos.

    Quando os bons se omitem o mal triunfa. Graças a deus temos a ROTA.

  6. Depois que o Brizola avacalhou a PM no Rio, proibindo de abordar duro etc., a coisa degringolou.
    Agora está entrando nos eixos.
    E com o Telhada na Rota, pode-se dizer para os bandidos que “o gato subiu no telhado”.

  7. Tambem dou meus parabens,ser cristão não impede de ser policial,não impede de cer soldado,é uma peofição honrosa e dificel,desde que haja com justiça e com a conciencia limpa assim todo policial fosse cristão onesto.

  8. Com esse Tenente, e a ROTA aqui no ” Espírito Santo “… as coisas estariam melhores com certeza !!! Ouço estórias incríveis da ROTA, de um vizinho meu… em que o pai pertenceu à ROTA…( obviamente SP )… sds.

  9. SD Motta disse:
    24/11/2011 às 08:15
    .
    Perfeito!
    Assino embaixo.
    ..
    Ten. Cel Telhada, exemplo de policial dedicado que faz a tropa tabalhar. Só espero que a ROTA tenha a frente outro oficial da mesma estirpe, e que o executivo apóie e dê respaldo às ações do Batalhão.
    ..
    P.S.
    Em breve as viuvinhas “duzdireitúduzmanú” vão dar o ar da graça e começar a denegrir o excelente serviço prestado ao povo de São Paulo pelos Boinas Pretas.

  10. Meus parabéns Telhada o nosso país precisa de homens como você que encara o perigo de frente, com plena certeza vai deixar saudades na ROTA e o seu sucessor desejo uma boa sorte e um bom trabalho.

  11. Infelizmente no Brasil o sistema só funciona para punir pessoas inocentes, policiais que estão cumprindo seu dever. Nao vemos direitos humanos quando um poilicial e morto, só aparecem quando morre bandido. Nosso sistema penal e completamente defasado Nao dando conta de punir bandidos e deixando brechas para que criminosos continuem nas ruas. Os salários de policiais Nao se faz digno de pessoas que arriscam a vida todos os dias para proteger o cidadão. E ainda quando fazem bicos sao repreendidos.
    Na verdade o que precisamos e de mais “Telhadas” nas ruas já que o “Estado” Nao consegue cumprir seu papel de proteger o cidadão, fazendo cumprir a lei. Afinal que adianta o policial prender e o sistema soltar? O principal motivo que leva ao crime e justamente a impunidade.

  12. Acho que a ignorância no momento da abordagem veta qualquer razão de ambas as partes.
    Precisa ser sensato e cortez mas energético quando é para ser. Dificilmente processos cairão no colo. Mas como em o filme ‘os reis da rua’ e tambem em ‘stallone cobra’, na conjuntura atual de tanta injustiça velada, muitas vezes sair de linha aqui é alí acaba sendo necessário.
    A tecnologia poderia ajudar desenvolvendo um gravador de som e audio individual para cada policial( não sairia muito caro pensando nas existentes a venda, e no desperdício de dinheiro que é cometido muitas vezes), e que começasse a gravar a partir do instante que o sensor dectasse decibeis compatíveis com a de um tiro, ou quando um click eletronico fosse acionado quando o spray de pimenta ou taser fosse usado. Pelo menos ja ajudaria quanto à relação a processos envolvendo arma de fogo, sprays de pimenta e armas de choque.

  13. Conheci o Ten. Cel. Telhada pessoalmente em uma ocorrência de roubo a banco, no banco santander. É incrível como ele fala a linguagem da tropa. Nossos comandantes não se sentem parte da tropa, é só observar que eles fazem questão em serem diferentes de nós que trabalhamos nas ruas, sangramos e morremos todos os dias. vestem-se diferentes, enquanto nós usamos um tipo de cobertura eles usam outra (bibico). sentem-se agentes políticos, apenas preocupados com suas carreiras e em comandar uma sub-prefeitura quando passarem para a reserva. Quanto ao Ten. Cel. Telhada ele veste-se igual sua tropa, fala a mesma língua que sua tropa. Nunca trabalhei na Rota, nunca quis trabalhar na Rota, porém, admiro o Batalhão e principalmente o Cel. Telhada, esse sabe o significado da palavra COMANDANTE/COMANDAR (MANDAR JUNTO). Fica uma lacuna na Polícia Paulista. Espero sinceramente que não entre para a política, tem tudo para ser um péssimo político.

  14. isso é o verdadeiro soldado…apesar de todo esse curriculum e experiência,olhem a simplicidade com quem ele narra os fatos e historias do seu dia a dia…e em momento algum se ouve ele c vangloriar de qualquer fato narrado..muito pelo contrário,afirma com todas as palavras quem tem muito medo.
    ao sr coronel telhada os meus mais sinceros agradecimentos como pessoa e como cidadão do estado de são paulo…muito obrigado e parabéns pela excelente carreira.

  15. Um bom oficial, mas ( não por culpa dele ) o fato dele estar envolvido em tantas morte indica o grande problema que é a segurança pública num dos países mais violentos do Mundo. Se o Telhada tivesse opção colocaria escolas..

Comentários não permitidos.