O xadrez chinês

http://watermarked.cutcaster.com/cutcaster-photo-100668282-Chinese-Chess.jpgJosé Luís Fiori : professor titular e coordenador do Programa de Pós-Graduação em Economia Política Internacional da UFRJ.


No dia 21 de outubro de 2011, o presidente Barack Obama anunciou o fim da “guerra da América no Iraque”, e a retirada definitiva das tropas americanas do território árabe. E tudo indica que não foi uma decisão isolada do governo Obama, devendo ser somada a outras iniciativas muito importantes, como a de negociar com as forças talibãs do Afeganistão, distanciar-se do radicalismo israelita, apoiar a mudança dos governos aliados do norte da África, aceitar uma nova safra de governos islâmicos moderados, em quase todo o “Grande Médio Oriente”, e finalmente, reconhecer, de forma implícita, a participação do Irã, neste redesenho político regional.


Em tudo isso é possível identificar traços de derrota e de vitória americana, mas talvez o mais importante seja duas mudanças estratégicas de largo fôlego, que estão sendo sinalizadas pela nova posição dos americanos: a primeira, na administração do poder global dos EUA, que passa a ser mais “imperial” e “terceirizada”; e a segunda, nas suas prioridades, que passam a ser a Ásia, e a disputa pela hegemonia do Pacífico Sul. Numa tentativa de recuperar, em pleno voo, o tempo perdido pelos EUA durante a “guerra global ao terrorismo” do presidente George W. Bush.


Uma década em que a China se expandiu vertiginosamente e ocupou posições cada vez mais importantes dentro do tabuleiro econômico e geopolítico asiático, enquanto os EUA permaneciam atolados no seu “Grande Médio Oriente”. Esta mudança de prioridade, entretanto, não significa que haja consenso dentro do establishment americano, sobre a forma de enfrentar o “desafio chinês”. Pelo contrário, existe uma divisão irreconciliável entre duas posições opostas.


De um lado se colocam os democratas e os republicanos que pensam como Henry Kissinger, e consideram que a expansão chinesa pode ser benéfica para o mundo, e para os interesses americanos, se os EUA souberem construir uma parceria estratégica com a China, administrando divergências e conflitos de interesse, evitando um enfrentamento frontal, e compartindo, no longo prazo, a supremacia regional, com os chineses. No lado oposto, se posicionam os que compartem a convicção do cientista político John Mearsheimer, de que “uma China rica será inevitavelmente um estado agressivo e determinado a conquistar a hegemonia regional”. Concluindo junto com ele que os EUA deve se antecipar, bloqueando os interesses chineses e estabelecendo alianças militares com todos os concorrentes regionais da China.


Na prática, entretanto, o caminho vem sendo construído longe dos dois extremos, através de negociações e respostas pragmáticas, mais ou menos agressivas, segundo as circunstâncias. Desde 2009, pelo menos, o governo chinês vem defendendo sua soberania sobre o “Mar do Sul da China”, de forma cada vez mais assertiva, considerando-o parte do seu “core interest”, em conflito com o Vietnã, Filipinas, Malásia, Taiwan e Brunei.

Recentemente, os governos do Vietnã e das Filipinas denunciaram uma ” séria violação das leis internacionais” por parte da China, na sua disputa pelas ilhas Paracel e Spartly, e ambos governos fizeram acenos explícitos em favor de uma presença militar mais ativa dos EUA, na região. Por outro lado, a secretária de estado, Hillary Clinton, declarou no Vietnã, em 2010, que o mesmo “Mar do Sul da China”, “faz parte do interesse nacional dos EUA”, e que os EUA se sentem no direito e dever de participar de qualquer conflito e negociação regional, em franco desafio à posição chinesa.


Essa disputa deve seguir e se aprofundar, com o aumento geométrico da importância econômica regional da China e com o fortalecimento contínuo do Comando Pacífico dos EUA, que já é o seu comando regional mais poderoso. Além disto, deve-se incluir nesta competição, a participação de outros estados poderosos, como é o caso do Japão, Índia, Rússia e também do Vietnã. E o que se deve prever é um aumento contínuo do poder militar dos EUA, simultâneo com o crescimento da dependência econômica de toda a região, com relação ao desenvolvimento chinês. E o que é mais paradoxal, é que a própria relação econômica siamesa entre a China e os EUA deve aumentar junto com a sua disputa regional, configurando um quadro e um desafio de enorme complexidade.


Nesse contexto, o mais provável é que a disputa e os próprios conflitos se prolonguem e se repitam, por muito tempo, e com um alto grau permanente de incerteza. Como se fosse numa partida de wei gi, o jogo chinês em que a regra básica (como no caso do go japonês) é a do “cerco contínuo”, e da “coexistência combativa”, com os adversários, sem que existam jamais vitórias nem vitoriosos definitivos. Uma espécie de jogo de xadrez, sem xeque-mate.

Fonte: Valor Econômico

10 Comentários

  1. Excelente texto do Professor Fiori.
    Sintetizou o contido em diversas matérias publicadas no blog, mostrou 2 possíveis alternativas e 2 jogos – wei gi chines e o go japonês, que refletem o grande jogo na região – o cerco contínuo e a coexistencia combativa.
    Espetacular.

  2. quem diria? vietnan se estranhado com a china e choramingando para os EUA por baixo dos pano rsrsrs, isso serve para mostrar que em relações internacionais não existem amigos mas sim intereces, e que a geopolitica mundial muda com o passar das decadas, o inimigo de hoje e o aliado de amanhã, o que devemos e sermos nacionalistas e defender os intereces de nossa nação e não ficar tietando o pais dos outros, (” ai eu torço p/ china, eu torço pros eua, eu torço pra fulano, ciclano e mau” )

  3. Acho que os americanos estão preocupados com a Coreia do Norte (nuclear), que poderá invadir a Coreia do Sul. Os chineses hoje merecem respeito, pois sabem eliminar o mal de seu país, executando assassinos e políticos corruptos. A China é a referência mundial de moralidade, organização e produção. O nosso país, lamentavelmente ainda não conseguiu prender os seus políticos corruptos, executar os seus assassinos, e governa ainda para banqueiros e especuladores financeiros. Até quando vamos ter que suportar isso ?

  4. os americanos não podem ficar sem um bode expiatorio,se resolverem atacar a china tem a coreia do norte como bode expiatorio,nunca ficam sem um troxa e o pior é que a coreia do norte gosta pois o idiota do ditador se axa o maximo,sera que cai este ditador tambem,esta em estinção ésta especie de governo,passou um vento forte no oriente derubou alguns outros estão caindo e um mataram moreu como um mendingo saindo do esgoto,que coisa em.

  5. UM texto excelente,merece um comentario a altura,futurologia despeitada vira piada .Um reposicionamento de prioridades fara muito bem aos EUA,a China ao contrario do antigo projeto de imperio sovietico ,tem condiçoes de assumir um posicionamento racional sobre os futuros vasalos chineses,desta forma o oba oba de povos com culturas presas ao seculo onze ficara relegado as latrinas !A bipolaridade fara bem aos dois imperios,e pra variar o resto continuara preso a lendas mitologicas ,alimentando-se de odio e utopias primitivos!

  6. atacar a china e a coreia do norte…isso nao vai acontecer…la o buraco e mais em baixo…la nao e iraque e afganistao nao…..o ditador la faz o que muitos no mundo nao tem coragem….dizer nao aos americanos …e ainda avisao se me atacar a resposta sera sem piedade……..assita o video…….. http://www.youtube.com/watch?v=1z_ubqOlZ2k

  7. AINDA SOBRE XADREZ
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    O grande xadrez sírio
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    No Oriente Médio, não há ironia sem megadose de arsênico. O governo de Bashar al-Assad, na Síria, põe fim ao estado de emergência vigente há 48 anos, exatamente no momento em que o país vive real estado de emergência. No mesmo dia, um jornal do regime,Tishrin, declara que “a mais sublime forma de liberdade é a segurança da pátria
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    (*)Por Pepe Escobar, Asia Times | Tradução: Vila Vudu
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    “(….)O regime já interceptou vários caminhões carregados de armas contrabandeadas do Iraque. Ricos sunitas do Golfo já ofereceram e garantem apoio financeiro.
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    E, aspecto crucialmente importante, as armas aparecerão no confronto também por motivos associados à Fraternidade Muçulmana, porque governos regionais como Turquia e Líbano não querem o fim do governo de Assad.
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    Entendem que privilegiar a Fraternidade Muçulmana, e inclusive outros grupos jihadistas, é receita para o caos.
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    Quanto a alguma R2P (“responsabilidade de proteger”) que levasse a ONU a criar zona aérea de exclusão sobre a Síria, esqueçam.
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    Diferente da Líbia, a Síria não tem petróleo nem fundo soberano milionário cobiçados.(…)”
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    “(…)Os sauditas wahhabistas, que têm muita influência sobre a Fraternidade Muçulmana síria, tiveram ativa participação na incitação do povo de Daraa e de Homs.
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    O sofrimento dos pobres com a seca prolongada explica muita coisa. Damasco esqueceu a região. Mas esses sofrimentos reais foram significativamente instrumentalizados.(…)”

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    FONTE:http://www.outraspalavras.net/2011/04/27/o-grande-xadrez-sirio/

  8. Hoje em dia na política internacional tem ocorrido tanta coisa à curto prazo,impensável a 3 ou 4 anos atrás,que fica difícil de imaginar o que poderá ocorrer daqui 5 ou 6 anos naquela região da Ásia.Na área militar,a China deverá aumentar drasticamente o seu poderio militar,mas com um diferencial,ela terá poucos aliados na região,por enquanto a Coréia do norte cujo regime já dá sinal de um certo temor por depender tanto dos chineses.Por outro lado há uma imensa relação de países da região que temem o poderio chinês.O Japão,Coréia do sul e Taiwan,tem grandes projetos militares em andamento e deverão aumentar bastante os seus arsenais que já não são pequenos.Na região do sudeste asiático,Vietnã,Malásia,Filipinas,Tailândia,Cingapura,Camboja,Laos,Brunei,Indonésia e mais ao sul a Austrália e Nova Zelândia,estão comprando e produzindo grandes quantidades de armamentos,e isso deverá aumentar muito mais daqui pra frente de acordo com a capacidade econômica de cada um.Todos se sentem ameaçados pelo DRAGÃO e aí poderá ser criada uma grande aliança militar entre esses países.Essa região deve se tornar a maior compradora de armas do mundo.Em poder de fogo convencional entre China e esses países todos, deverá haver um equilíbrio embora os chineses sozinhos deverão possuir o maior arsenal de guerra convencional do mundo.Por outro lado,o TIO SAM,que já tem deslocado muitas unidades militares para região,deverá aumentar o seu poderio na Ásia mais do que qualquer parte do mundo,para isso já tem grandes projetos especificamente pra quela região.Tudo indica que a corrida às armas está começando e será muito longa.AINDA BEM QUE ISSO É LONGE DE NÓS.

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