Paquistão vaza nome de diretor da CIA em Islamabad

iG São Paulo

Postura é vista como retaliação à operação americana que matou Bin Laden em território paquistanês, sem ciência das autoridades locais.

Pela segunda vez em cinco meses, autoridades paquistanesas irritaram a Agência Central de Inteligência americana, CIA, ao vazar para a mídia local a identidade do chefe da agência americana em Islamabad. De acordo com o jornal americano The New York Times, que cita oficiais americanos, a ação representa a tentativa de complicar o trabalho da espionagem americana depois da operação que matou Osama Bin Laden, que não contou com cooperação ou ciência da inteligência paquistanesa.

Foto: AP Ampliar

Bin Laden aparece em imagem retirada de vídeo sem data

O vazamento reflete o tom das relações entre a CIA e o serviço de inteligência paquistanês (ISI), que não vão bem. Além disso, segundo o New York Times, parece ter a intenção de mostrar a “campanha” por parte do governo paquistanês em colocar obstáculos aos interesses americanos no país vizinho ao Afeganistão.

A inteligência paquistanesa informou o nome do chefe da CIA ao The Nation, jornal conservador paquistanês de pequena circulação, pró-governo. O nome de Mark Carlton, que apareceu na versão impressa do veículo, estava escrito errado, mas com grafia muito próxima da correta.

De acordo com oficiais ouvidos pelo New York Times, em dezembro o ISI já havia revelado o nome de Jonathan Banks, ex-diretor da CIA no país, mas também soletrara da maneira errada. Como resultado, o chefe da agência de inteligência americana teria sido obrigado a deixar o país, ao receber ameaças de morte. O atual diretor da CIA em Islamabad, no entanto, diz não ter intenção de deixar o Paquistão.

Viúvas

Em meio à turbulenta relação entre Washington e Islamabad, nesta segunda-feira, um oficial americano informou que os EUA terão acesso às três mulheres de Bin Laden, que estavam sob custódia do Paquistão desde a operação que matou o terrorista. A Casa Branca disse estar muito interessada em entrevistar as mulheres, a fim de obter informações sobre a vida de Bin Laden dentro do esconderijo.

O primeiro-ministro do Paquistão, Yousuf Raza Gilani, anunciou ainda que o Exército investigará como o líder da Al-Qaeda, Osama bin Laden, escondeu-se durante anos em seu país sem ser detectado. “Estamos decididos a averiguar essa questão a fundo, esclarecer como, quando e o porquê da presença de Osama bin Laden em Abbottabad (a cidade onde foi morto na madrugada da segunda-feira – 2 de maio – pelas forças especiais dos EUA). Por isso abrimos essa investigação”, afirmou Gillani.

Gilani fez o anúncio durante um discurso perante o Parlamento, uma semana depois de uma operação dos Seals da Marinha americana na cidade de Abbottabad ter matado o terrorista. Para o premiê paquistanês, a morte de Bin Laden foi justa.

Em seu pronunciamento, ele rejeitou e classificou como “absurdas” alegações de que as autoridades paquistanesas foram incompetentes na busca por Bin Laden ou cúmplices em escondê-lo, expressando total confiança nas Forças Armadas paquistanesas e na agência de inteligência do país.

Segundo Gilani, seu país está determinado a lutar contra o terrorismo, recordando que a Al-Qaeda não nasceu no Paquistão. Gilani disse que a missão do governo é eliminar o terrorismo. “Nós não convidamos a Al-Qaeda para dentro do Paquistão”, afirmou o premiê.

O primeiro-ministro afirmou também que ações unilaterais como a realizada pelos Estados Unidos na semana passada trazem o risco de graves consequências. Segundo Gilani, o Paquistão reserva para si o direito de proteger a sua soberania. De acordo com o premiê, o serviço de inteligência paquistanês (ISI), acusado de colaborar com a Al-Qaeda, é um “bem nacional” e tem a total confiança do governo do Paquistão.

As declarações foram feitas no mesmo dia em que o ministro paquistanês do Interior, Rehman Malik, afirmou em entrevista ao canal Al-Arabiya que foi informado sobre a operação americana contra Bin Laden 15 minutos depois do início. “Fui informado da operação 15 minutos depois do início, mas não acreditava que esse era o objetivo”, declarou o ministro.

Entrevista de Obama

O Paquistão está sendo cada vez mais pressionado pelos EUA para que explique como foi possível que o líder da Al-Qaeda vivesse por tanto tempo – cinco anos – a poucos metros da sede da Academia Militar do país.

Foto: Reprodução/CBS

O presidente americano, durante a entrevista à rede americana CBS

Em entrevista ao programa “60 Minutes” da CBS News, divulgada no domingo, o presidente americano, Barack Obama, disse que o Paquistão ainda deve explicações sobre se suas autoridades sabiam do paradeiro do líder da Al-Qaeda.

Segundo Obama, Bin Laden devia ter “algum tipo de rede de apoio” no Paquistão, mas acrescentou que não sabe se membros do governo paquistanês estariam envolvidos nessa rede. “Não sabemos se podem ter sido algumas pessoas dentro ou fora do governo. Isso é algo que temos de investigar e, mais especialmente, que o governo paquistanês deve investigar”, disse.

“Já o comunicamos (o governo paquistanês) e eles nos disseram que têm profundo interesse em conhecer que tipo de rede de apoio Bin Laden pôde ter tido”, destacou o presidente americano. “Mas essas são questões que não vamos poder responder em três ou quatro dias. Levaremos um tempo para poder aproveitar o material de inteligência que conseguimos obter”, explicou.

O presidente dos EUA também afirmou que qualquer um que duvidar que os Estados Unidos deveriam ter matado Bin Laden precisa ter sua cabeça examinada. Uma semana depois que a equipe secreta americana matou Bin Laden em seu refúgio no Paquistão, Obama proclamou o sucesso da operação e rejeitou ideias de que o líder da Al-Qaeda, que estaria desarmado, deveria ter sido capturado vivo. Bin Laden teve o que merecia, disse Obama.

“Apesar de estar muito nervoso sobre todo o processo, a única coisa pela qual não perdi meu sono foi a possibilidade de matar Bin Laden”, disse Obama. “A justiça foi feita. E acho que qualquer um que duvide que o responsável pelo assassinato em massa em território americano não merecia o que aconteceu com ele, precisa ter sua cabeça examinada”, afirmou.

Segundo o presidente dos Estados Unidos, a captura Bin Laden – chamado por ele de “nosso homem” – era mais importante do que os riscos da operação. A morte do líder terrorista foi confirmada pela Al-Qaeda na sexta-feira.

A operação, disse, representou os 40 minutos mais longos de sua vida – a exceção, disse, foi a época em que sua filha Malia ficou doente com uma meningite, quando era criança.

Obama admitiu que a operação “teria tido significativas consequências” se Osama não tivesse sido encontrado. Ele disse que avaliou a “chance (de capturar Bin Laden) no momento de aprová-la em 55%”. “No final do dia, ainda era uma situação de 55% para 45%. Quero dizer, não podíamos dizer definitivamente que Bin Laden estava lá”, explicou Obama em sua primeira entrevista após a morte do líder da Al-Qaeda.

Segundo o presidente, com a morte de Osama, os EUA têm agora a oportunidade de desferir um “golpe fatal” na Al-Qaeda. Isso porque, segundo ele, informações foram apreendidas na casa onde o terrorista se escondia, no Paquistão.

Dados sobre a rede terrorista estão sendo extraídas de computadores, discos rígidos e dispositivos de armazenamento coletados na casa do extremista, explicou Obama.

“Isso não significa que vamos derrotar o terrorismo”, afirmou. “Isso não significa que a Al-Qaeda não tenha se espalhado para outras partes do mundo onde temos de realizar operações. Mas significa que temos uma chance, acho, de realmente desferir um golpe fatal nessa organização, se seguirmos agressivamente nos próximos meses.”

Há cerca de quatro anos, serviços de inteligência dos EUA identificam mensageiro de confiança de Bin Laden, a partir de pistas dadas por prisioneiros de Guantánamo
Foto: Arte iG

Há cerca de quatro anos, serviços de inteligência dos EUA identificam mensageiro de confiança de Bin Laden, a partir de pistas dadas por prisioneiros de Guantánamo

  • Há cerca de quatro anos, serviços de inteligência dos EUA identificam mensageiro de confiança de Bin Laden, a partir de pistas dadas por prisioneiros de Guantánamo
  • Após dois anos, serviços de inteligência definem área de atuação do mensageiro e, em agosto de 2010, localizam mansão de Abbottabad
  • Em setembro, relatórios da CIA determinam que havia uma 'forte possibilidade' de que Bin Laden estivesse escondido na mansão
  • Em março, Obama dá início a reuniões que definem detalhes da operação. No dia 29, autoriza o ataque
  • No domingo (1º de maio), unidade de elite do Exército americano ataca a mansão a partir de helicópteros
  • Bin Laden resiste à prisão e é morto com um tiro na cabeça. Outros três homens e uma mulher são mortos

“Estamos, obviamente, colocando tudo o que temos em análises e avaliando todas as informações”, disse. “E prevemos que podem nos levar a outros terroristas que estamos procurando há um longo tempo, outros alvos de grande valor.”

Também de acordo com o presidente, as autoridades americanas podem aprender potencialmente sobre conspirações já existentes, como a Al-Qaeda operava e seus métodos de comunicação.

“E agora temos a oportunidade, ainda não terminamos, mas temos a oportunidade, acho, de realmente e finalmente derrotar pelo menos a Al-Qaeda na região fronteiriça entre o Paquistão e o Afeganistão.”

Ele elogiou também os integrantes do Seal, da Marinha, comando que realizou a operação.
“É um breu completo, eles estão tirando paredes, portas falsas, recebendo tiros, eles mataram Bin Laden, e ainda tiveram a presença de espírito de reunir um monte de material de Bin Laden, que será um tesouro de informações”, afirmou.

Jim Messina, responsável pela campanha de Obama à reeleição em 2012, enviou um email para uma gigantesca quantidade de destinatários no domingo pedindo aos simpatizantes do presidente para assistirem à entrevista.

Pressão sobre o Paquistão

Em outra entrevista, o conselheiro de segurança nacional americano Tom Donilon, disse que o Paquistão precisa investigar e saber como o líder da Al-Qaeda viveu por quase seis anos tão perto da capital do país, Islamabad, em uma casa, cujo bairro abriga uma academia de polícia.

À rede de TV americana NBC, Donilon disse não ter visto prova alguma de que o governo paquistanês soubesse de pistas do terrorista. Ele acrescentou também que o governo americano quer interrogar as três viúvas de Bin Laden, que estão sob custódia no Paquistão. Com a morte de Bin Laden, aumentaram as especulações de que o novo líder da rede Al-Qaeda poderia ser o vice, Ayman al-Zawahiri. Mas, de acordo com Donilon, o egípcio não “chega nem perto de ser o líder que Osama Bin Laden foi”.

O embaixador do Paquistão nos EUA, Hussain Haqqani, assegurou, também no domingo, que “rolarão cabeças” de funcionários do alto escalão paquistaneses, após a divulgação da notícia de que Bin Laden se escondia no Paquistão. “Cabeças rolarão assim que a investigação terminar”, declarou à rede de TV americana CNN. “Se essas cabeças rolarem por uma incompetência, informaremos aos Estados Unidos, e se for descoberta, Deus nos livre, uma cumplicidade, haverá tolerância zero”, prometeu.

À frente do comando das forças militares americanas no Afeganistão, o general David Petraeus disse que a morte de Bin Laden pode diminuir a influência da Al-Qaeda no Taleban afegão. Em entrevista à Associates Press, o futuro diretor da agência de inteligência americana (CIA) alertou, no entanto, que o país no sul da Ásia ainda é um potencial refúgio para terroristas de grupos internacionais, sendo a Al-Qaeda apenas um deles.

Comando

De acordo com o governo paquistanês, Bin Laden era uma figura ativa no comando da rede extremista, e o esconderijo onde esteve em Abbottabad era um centro de comando e controle, segundo o serviço secreto americano. De acordo com os EUA, ao contrário do que se acreditava, o terrorista não tinha uma vida nômade nos últimos anos e estava profundamente envolvido nas tomadas de decisão da Al-Qaeda.

“Esse complexo em Abbottabad era um centro ativo de comando e controle para o líder da Al-Qaeda e está claro (…) que ele não era apenas um pensador estratégico do grupo”, disse um oficial que não quis se identificar a jornalistas durante uma entrevista no Pentágono, em Washington. Ele era ativo no planejamento operacional e na tomada de decisões táticas”, acrescentou.

Antes da morte de Bin Laden na semana passada, os EUA haviam sugerido que ele vivia em fuga e era apenas um símbolo para a Al-Qaeda.

Vídeos

No sábado, o Pentágono divulgou vídeos caseiros de Bin Laden, apreendidos no esconderijo de Abbottabad, onde ele foi morto na semana passada. As gravações, obtidas pelos Seals da Marinha americana, mostram o terrorista assistindo a si mesmo em reportagem televisiva, assim como preparando mensagem em vídeo para os Estados Unidos.

Camisetas com Bin Laden viram souvenir nos EUA

No total, cinco vídeos foram divulgados. Em um deles, feito em outubro ou novembro de 2010, o ex-líder da Al-Qaeda veste uma espécie de chapéu branco e uma túnica branca, enquanto fala diretamente para a câmera, no mesmo estilo dos pronunciamentos em vídeo anteriores do líder da rede extremista. Não há áudio no vídeo, mas oficiais do Pentágono disseram se tratar de uma mensagem endereçada aos EUA.

Em uma entrevista coletiva em Washington, o Pentágono também divulgou um vídeo de propaganda gravado por Bin Laden. Em um outro vídeo, Bin Laden aparece assistindo a um programa sobre ele mesmo em um canal de televisão árabe, sentado no chão de uma sala e enrolado no que parece ser um cobertor ou casaco. A barba do líder da Al-Qaeda parece muito mais grisalha neste vídeo do que nos vídeos de propaganda da rede.

Não há nada nos vídeos divulgados neste sábado que identifique que Bin Laden está no esconderijo onde foi morto em Abbottabad, no Paquistão. A divulgação das imagens, no entanto, é parte de um esforço do governo americano para convencer os céticos que Bin Laden foi realmente morto na operação da semana passada.

No material encontrado no complexo em Abbottabad, estariam também cartas pessoais de Bin Laden a outros membros da rede.

*Com Reuters, AP, BBC, AFP e EFE

Fonte: Último Segundo

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