Patriota cobra ‘engajamento’ dos EUA em reforma do Conselho de Segurança

João Fellet

Da BBC Brasil em São Paulo

Às vésperas da primeira visita do presidente Barack Obama ao Brasil, o ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, disse esperar que “os Estados Unidos permaneçam engajados em uma reforma do Conselho de Segurança da ONU que preveja a inclusão de novos membros permanentes do mundo em desenvolvimento, como o Brasil, a Índia e outros”.

“Já não é razoável nem justificável convivermos com um Conselho de Segurança que parece refletir mais um mundo do século 20 que um do século 21”, disse Patriota, em entrevista à BBC Brasil por telefone, durante viagem à China, na última sexta-feira.

Na entrevista, o chanceler afirmou ainda que o governo brasileiro se solidariza com os protestos no mundo árabe e que qualquer decisão sobre intervenções militares na Líbia ou em outros países da região devem ser tomadas no âmbito do Conselho de Segurança.

Leia os principais trechos da entrevista.

BBC Brasil: Nos últimos anos, o Brasil decidiu se abster em votações do Conselho de Segurança da ONU sobre violações de direitos humanos, como numa resolução contra o Sudão pela violência em Darfur, em 2005. Na semana passada, porém, o Brasil votou a favor de uma resolução contra a Líbia. A posição da diplomacia brasileira quanto a direitos humanos mudou neste governo?

Antonio Patriota: Direitos humanos são uma prioridade importante para o Brasil. Primeiro, e mais importante, o Brasil busca melhorar a situação dos cidadãos brasileiros internamente, e com isso o governo do presidente Lula esteve extremamente engajado, inclusive com a criação da secretaria de Direitos Humanos, a secretaria para promover a igualdade de raças e uma secretaria para promover igualdade de gêneros.

Quando se lida com sua situação interna, sua posição internacional tende a ser mais respeitada e votar a favor ou se abster deve ser visto como manifestação dentro de contextos.

Uma situação que nos preocupa muito é a divisão Norte-Sul em algumas deliberações sobre direitos humanos. Se há uma polarização muito aguda ao tratar algum assunto, em que o norte parece prover todas as respostas e o sul é tratado só como o receptor do conselho, às vezes o Brasil tenta agir como uma ponte, para unir os dois lados, e abstenções podem ser justificadas nesse contexto.

Mais recentemente, no Conselho de Segurança e no Conselho de Direitos Humanos, houve resoluções adotadas por consenso. O Brasil é muito frequentemente um país que tenta superar divisões, construindo consensos, então ficamos satisfeitos que resoluções sobre a Líbia nesses dois órgãos da ONU tiveram um amplo apoio e foram aprovadas não só por países do norte, mas também por países na região onde a Líbia está situada. Isso dá à comunidade internacional uma voz muito mais forte na situação.

BBC Brasil: O Brasil, desde o governo Lula, tem ampliado as relações comerciais e diplomáticas com o mundo árabe. Qual a posição do Brasil em relação à revolta em curso na região?

Patriota: O Brasil não pode deixar de se solidarizar com manifestações que são motivadas por aspirações com as quais nos identificamos. Os manifestantes desejam maior participação no destino de seus países, maior participação política, maiores oportunidades para suas economias, maiores oportunidades de emprego, dignidade, soberania. São objetivos que merecem todo o nosso apoio.

O Brasil tem estendido sua mão ao mundo árabe de maneira bilateral com relações com vários países, mas também através de novas coalizões e novas iniciativas como a chamada Aspa, a cúpula América do Sul – Países Árabes, iniciada em 2005 em Brasília.

Foi uma forma de aproximarmos duas regiões que têm objetivos comuns, que inclusive dialogam através da história pela presença na América do Sul de numerosos e significativos segmentos de imigrantes de origem árabe.

Desejamos que essas manifestações evoluam de forma pacífica. Acho que se existe crise, também existe oportunidade. Existe oportunidade, por exemplo, para trabalharmos pelo estabelecimento de uma zona livre de armas nucleares no Oriente Médio, para melhorarmos o respeito aos direitos humanos – agora a Líbia foi suspensa do Conselho de Direitos Humanos, e essa não é uma decisão que não deve ser tomada como superficial, ela envolve uma postura muito forte do conselho em seu conjunto em favor dos direitos humanos na região e na Líbia.

BBC Brasil: Há sinais de que o Brasil e os Estados Unidos estão mais próximos desde a posse da presidente Dilma Rousseff, como a afirmação dela de que pretende aprofundar as relações com o governo americano e o alinhamento nessa votação recente na ONU sobre a Líbia. A importância dos EUA para a diplomacia brasileira aumentou?

Patriota: Como ex-embaixador em Washington, considero que os Estados Unidos e o Brasil não estavam distantes durante o governo Lula. Pelo contrário, houve um número grande de novas iniciativas, tanto na área de biocombustíveis como na área da promoção da igualdade racial, de gêneros, entre outros.

O comércio bilateral chegou a um recorde pouco antes da crise econômica de 2008, atingindo a cifra de US$ 53 bilhões nos dois sentidos. Aumentaram os investimentos brasileiros nos Estados Unidos, foram criados também mecanismos que aproximaram os empresariados dos dois países, de modo que o que está acontecendo é uma evolução natural.

Agora com a visita próxima do presidente Barack Obama, gostaríamos de elevar o nível da relação em algumas áreas de interesse especial para o Brasil, como ciência e tecnologia, e continuar trabalhando em mecanismos existentes para aprofundar nosso diálogo – um diálogo político também, que é extremamente importante, com os Estados Unidos permanecendo a principal economia e a principal potência mundial.

Não sei se concordaria com sua descrição sobre um alinhamento do Brasil com os Estados Unidos na última resolução. Como comentei antes, a resolução foi adotada por consenso, de modo que o mundo inteiro está alinhado em torno de uma certa visão para o encaminhamento da situação na Líbia.

BBC Brasil: Em visita à Índia em 2010, o presidente Obama apoiou a criação de uma cadeira permanente no Conselho de Segurança para aquele país. O governo brasileiro espera que ele faça o mesmo durante a primeira visita dele ao Brasil, neste mês?

Patriota: Há poucos dias estive em Washington, para conversas no Conselho de Segurança Nacional e no Departamento de Estado. Nós conversamos sobre a reforma do Conselho de Segurança e a mesma pergunta foi feita à secretária de Estado, Hillary Clinton. Ela disse que admira – acho que essa foi a palavra que ela usou – a contribuição do Brasil à promoção da paz e segurança internacional.

Existe, por exemplo, um respeito muito grande pelo trabalho que o Brasil tem desempenhado no Haiti, como líder das tropas da ONU naquele país, de modo que esperamos que os Estados Unidos permaneçam engajados numa reforma do Conselho de Segurança da ONU que preveja a inclusão de novos membros permanentes do mundo em desenvolvimento, como o Brasil, a Índia e outros, também da África, e que possamos dentro de um prazo relativamente breve introduzir maior legitimidade, maior representatividade nesse órgão, na medida em que o mundo está vivendo mudanças aceleradas na sua governança global.

Já não é razoável nem justificável convivermos com um Conselho de Segurança que parece refletir mais um mundo do século 20 que de um século 21.

Fonte: BBC Brasil

11 Comentários

  1. A Argentina irá aceitar ?
    Podemos revezar com os argentinos.
    A Índia poderá revezar com o Paquistão.
    Irã poderá revezar com Israel.
    Itália poderá revezar com a Espanha.
    Alemanha poderá revezar com o Japão.
    E por aí vai …

  2. Concordo com o Patriota quando ele disse que:
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    (…) “Já não é razoável nem justificável convivermos com um Conselho de Segurança que parece refletir mais um mundo do século 20 que um do século 21”, disse Patriota, em entrevista à BBC Brasil por telefone, durante viagem à China, na última sexta-feira (…) “

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    A moribunda ONU, perdeu a sua representatividade desde que os EUA, invadiram o Iraque sem o apoio dela; sem falar das peripécias da Rússia e da China, que não ficam atrás dos americanos, em termo de safadeza.

  3. Chega ser patético ver o ministro falar de direitos humanos e EUA,direitos humanos e ONU! todos sabemos que esses órgãos sempre souberam do regime líbio, tunisiano,etc.SABEM DO REGIME SAUDITA !e fecham os olhos!
    queria ressaltar o nobre empenho dos brasileiros no Haití,mas essa atuação é muito pouco para nos credenciar ao CS.
    Por último digo ao ministro que ao contrario do que ele diz, o EUA não estão engajados na reestruturação do CS.

  4. O Brasil precisa para com a postura de bom moço.
    Razoável e nem justificável , isso não existe em relações internacionais, entre paises.
    Voce só pode EXIGIR o RAZOAVEL E O JUSTIFICAVEL se tiver um capacidade – Economica – potilica e antes de tudo MILITAR para sustentar o que chama de razoável e justo.
    A relação de apoio do Brasil para os paises que devem entrar no C.Segurança só pode se justificar por estar o Brasil reivindicando a Cadeira.
    Todos os paises que estão no Conselho de Segurança, com excesão a China (que eu saiba) já se pronunciaram sobre a ingenuidade do Brasil com sua politica internacional em determinados assuntos.
    Ao Contrario da India nos Forças Armadas esta fragilizada e não temos a Bomba Atomica, nossas fronteiras estão escancaradas para o narcotraficantes e contrabando.
    Temos que mudar essa realidade.
    Acho que a medida que o Brasil fortalece suas instutuições, suas forças armadas e sua economia nossa atitude devera mudar de forma mais e mais significativa na mesma proporção que passem a nos olhar com outros olhos.
    Abs

  5. Existe um ditado castrense que diz: “nunca peça aquilo que não possa tomar”. O Brasil busca uma responsabilidade que não poderá bancar (Membro do C.S.) Nenhum País consegue ser potência mundial sem poderio bélico. Meu Deus, será que todos nós vemos isso e só nossos líderes não?

  6. Entendi agora porque o Brasil se aproximou mais dos Yanks, o dito patriota serviu como embaixador la e vai vender a soberania nacional pra eles.
    Outra coisa de me chamou a atenção foi que Patriota usou o trabalho das FAs no Haiti para justificar o pleito pela cadeira de segurança da ONU, mas não iveste nas FAs deixando-as sucateadas, como pode querer se comparar com a India, país que mantem um alto investimento nas FAs? Do jeito que vai, veremos a India na cadeira e nós chupando dedo. É só ver o relatório do MD sobre nossas forças, sucateadas e com 50% das maquinas parada. ACORDA PATRIOTA!!!!
    CAMPANHA “JOBIM PRESIDENTE 2015”.ABS…

  7. Isto é piada? Brasil com a defesa sucateada e cada presidente com uma postura ideológica diferente? Os EUA podem não ser os mesmos mas não são burros. Se o peso ecônomico ascendente do Brasil fosse o único fator que contasse… aí… talvez.

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