A nova diplomacia do Brasil

Dilma troca o comando do Itamaraty, ataca o Irã e sinaliza como conduzirá a política externa

Claudio Dantas Sequeira

Na tarde do sábado 25 de novembro, a presidente eleita Dilma Rousseff retornou o telefonema de Marco Au­rélio Garcia. O assessor internacional da Presidência estava a caminho de Georgetown, na Guiana, para participar da cúpula da União das Nações Sul-Americanas, na qual seria indicado o novo secretário-geral. Sondado para o posto, Garcia precisava do aval de Dilma para entrar na disputa oficialmente. A presidente, no entanto, pediu que a decisão fosse adiada e marcou um encontro na Granja do Torto para dali a uma semana. Numa caminhada pelos jardins da residência oficial na quinta-feira 2, Dilma comunicou a Garcia que não iria liberá-lo para o órgão multilateral. “Quero você no meu governo”, disse. Em seguida, comentou que nomearia o embaixador Antonio Patriota ministro das Relações Exteriores e revelou sua diretriz para a diplomacia nos próximos quatro anos. “Vamos dar lastro para o que o presidente Lula criou”, disse.
A conversa entre Dilma e Garcia se deu poucos dias após a presidente eleita ter afirmado que discordava da posição do Brasil em relação ao Irã. Para ela, o País não deveria ter se abstido na votação do Conselho de Segurança da ONU que condenava o país asiático pela prática do apedrejamento. “Não posso concordar com uma prática medieval como essa, discordo da posição do Brasil”, disse Dilma, em uma entrevista ao jornal americano “The Washington Post”.

O convite a Garcia para permanecer no cargo que ocupa há quase uma década mostra que a divergência no caso iraniano se resume a uma questão isolada. Dilma, ao contrário de Lula, defende princípios, mas está disposta a manter as linhas mestras da política externa adotada por Lula e, por isso, decidiu turbinar a Assessoria Internacional da Presidência. Sua meta é pelo menos duplicar o staff do gabinete e ampliar suas atribuições. Já pediu a Garcia que produza dossiês sobre as relações do Brasil com seus principais parceiros e sugestões de consolidação dos grupos e fóruns criados na última década. Dilma quer que a diplomacia brasileira funcione como uma espécie de indutor no processo de institucionalização desses diversos organismos que têm muita pompa no nome e pouca estrutura operacional e burocrática. Na visão da presidente eleita, entidades como a Unasul, os Brics, o Mercosul e mesmo grupos de menor expressão, como o Ibas, carecem de uma estrutura própria e não podem ficar relegados apenas aos raros encontros entre os presidentes e ministros das Relações Exteriores dos países que os compõem.

No caso da Unasul, há um projeto de constituição de uma série de coordenações para impulsionar os entendimentos nas áreas de energia e infraestrutura, nos temas ligados ao Conselho de Defesa Sul-Americano, ao Conselho de Combate às Drogas e na articulação das políticas educacionais e de saúde. “Resolver esses gargalos da integração depende em grande medida de um fortalecimento institucional”, justifica Garcia. Outra proposta, que já está na mesa de Dilma, prevê a criação de uma Alta Autoridade no Mercosul. Na prática, esse organismo funcionaria como um comitê executivo do bloco, com presidente e demais integrantes de um alto escalão responsável por gerir e implementar as decisões tomadas pelos países-membros. Ao dar mais autonomia funcional ao bloco, a região segue o modelo europeu. Para a presidente eleita, segundo Garcia, “não se pode pensar que os problemas da integração serão resolvidos exclusivamente por uma reunião semestral de ministros.”

Esse entendimento será aplicado para outras iniciativas em processo de consolidação como o G 20, que deu voz às potências emergentes e pôs uma pá de cal no G 8. Se depender do Brasil, os BRICs também deverão deixar de ser apenas uma sigla. Já há uma iniciativa de estímulo do comércio em moeda comum em contraponto ao dólar. Também ganharão musculatura institucional o Ibas, fórum que reúne Índia e América do Sul, e o diálogo entre a América do Sul e os países árabes, lançado na cúpula de Brasília em 2005.
Em termos gerais, o que se espera é o aprofundamento do que já vem sendo feito. “Não há razões para achar que a diplomacia de Dilma será diferente da atual. Não vejo nenhuma chance de grandes guinadas”, avalia o cientista político Gilberto Sarfati, da FGV. Segundo ele, seguem na pauta do Itamaraty a aproximação Sul-Sul, a construção de laços com outros países em desenvolvimento, a consolidação do Brasil como um jogador global de peso e a busca por um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU. Questões como as negociações da Rodada Doha devem ficar em suspenso, por causa da crise cambial e do protecionismo crescente. “Alguma novidade pode surgir na relação com os EUA, já que o presidente Barack Obama deve se dedicar mais à diplomacia para melhorar sua imagem nos EUA”, afirma Sarfati.

Dentro do Itamaraty, a pergunta que vem tirando o sono dos diplomatas é se a Assessoria Internacional – leia-se Marco Aurélio Garcia – com mais poder criará problemas para o futuro chanceler Antonio Patriota. Tudo indica que não. Patriota e Garcia se conhecem desde o início do governo Lula e trabalharam juntos em crises como a de Honduras e do Haiti. Aliás, desde o primeiro mandato o ministro Celso Amorim decidiu preparar o pupilo para sucedê-lo ou pelo menos para assumir maiores responsabilidades. Patriota compartilha das visões de mundo que aproximaram Amorim de Garcia. A diferença é que o futuro chanceler, com 54 anos, é de uma geração posterior à de Amorim e Garcia, e, portanto, não se prende ao velho embate quase dogmático entre Norte e Sul. Adepto das novas tecnologias, não desgruda do telefone BlackBerry e costuma se comunicar diretamente com seus pares em outros países. “Um dia desses ele queria falar com o subsecretário americano, William Burns. Pegou o celular e ligou”, relata um assessor.

Pesam a favor de Patriota seu refinamento intelectual e a memória acurada, além de rara habilidade política. Interlocutores mais próximos comentam, inclusive, que o embaixador consegue transitar sem constrangimento tanto no governo como na oposição. “Ele é sobretudo um operador”, afirma um diplomata próximo. Espera-se, portanto, que a combinação entre a experiência de Garcia e a jovialidade de Patriota dê um perfil mais ágil e eficiente para a diplomacia no governo Dilma Rousseff.

ISTOÉ – O que muda na política externa com Dilma?
Marco Aurélio Garcia – Bem, o Lula tinha um lado meio imprevisível na sua intervenção internacional e que causava resultados surpreendentes. É o efeito Garrincha. Dava um drible que deixava as pessoas meio estarrecidas. A Dilma vai ter uma conduta menos intuitiva, mais racional. Vai amarrar e institucionalizar as coisas.

ISTOÉ – A nomeação de Antonio Patriota sinaliza uma reaproximação com os EUA?
Garcia – Antes de tudo, significa que o Itamaraty é um grande celeiro de funcionários com capacidade de condução da política externa. O Antonio é um diplomata jovem, com um portfólio respeitável. Sobre os EUA, gostaríamos de ter uma interlocução mais forte, sim. Se isso não ocorreu com Lula não foi porque o Celso Amorim é antiamericano, mas por questões objetivas. Os EUA descuidaram da região.

ISTOÉ – O que pode mudar, então?
Garcia – De nossa parte, queremos debater a relação bilateral, temas continentais e mundiais. Só que a relação com os EUA não pode ocorrer em detrimento da política externa como um todo. Não vamos abandonar a política de aproximação com a França, por exemplo,
só por que isso incomoda Washington.

ISTOÉ – Dilma Rousseff criticou a abstenção brasileira sobre violações de direitos humanos no Irã. Haverá mudança nessa relação?
Garcia – A abstenção respondeu a uma posição histórica do Itamaraty, que se recusa a individualizar essas violações publicamente. Mas não somos indiferentes. Em gestões discretas, conseguimos libertar a professora Clotilde Reiss e um dos alpinistas americanos. Nossa aproximação com o Irã não é uma aliança, mas uma ação conjunta para obtermos um acordo no âmbito da Aiea. É preciso entender que ninguém bebeu demais e resolveu se meter ali. Detectamos uma zona de alto risco e propusemos uma alternativa.

Fonte: REVISTA ISTO É, via NOTIMP

26 Comentários

  1. Não fiquem estarrecidos apenas compreendam,quando se elegem e estão no poder mudam e sempre tendem ao mais conveniente enesse joguinho de lindas palavras e faz de conta o que se realmente produtivo se efetivou em melhoria para o povo heim ou o Brasil é so o palacio do planalto e o resto da nação apenas as abelhinhas que guarnecem e produzem a geleia real para a Rainha?

  2. Recebo “IstoÉ” em casa todo sábado de manha de maneira que já havia lido a materia. Como sempre, essa revista sofre de miopia. O escopo geral, não bate com a entrevista e as respostas de Marco Aurélio Garcia, a quem conheço pessoalmente de longa data do IFCH da Unicamp e do próprio PT. A posição da política externa não vai mudar com a troca de Celso Amorim por Antonio Patriota, esta é a verdade, até porque ela tem sido exitosa para o país até o presente em termos econômicos e geopoliticos. O que a Dilma deixou claro, e também Marco Aurelio, é que se trata agora de garantir os lastros fundantes das ações desempenhandas pelo Itamarati nos últimos 8 anos. Como tudo na vida é evolutivo todo processo politico externo do também precisa estar sempre se aperfeiçoando.

  3. Vamos ver…
    Espero que o Pragmatismo e Capacidade de Analise de Dilma superem a Improvisacao e Dogmatismo Ideologico nas relacoes internacionais do Governo anterior.
    So o tempo e acoes concretas vao dizer.

  4. achei muito interessante tb esta materia, o melhor que o brasil faz é se aproximar da frança ja que esta “quer” ou parece que quer ter uma aliança estrategicamente forte com o brasil, ja sobre os estados unidos , acho que o brasil so deve ter uma aproximaçao com esse pais se realmente houver um interesse de aliança , e nao o interesse de “sugar tudo”, e isso so depende deles para que se torne real.
    tb nao acho que a politica externa brasileira vai mudar muito , talvez haja um pouco de aproximaçao com os EUA , mas acho que nao vai ser nada “alarmante”.
    sds a todos.

  5. a verdade é que a politica externa que os americanos querem ter com o brasil , é aqulea politica de “coleira de cahorro”, onde o brasil nao iria ser verdadeiramente um “global player” e sim apoiar as anbiçoes americanas para com o mundo , (nao seriamos “livres” e nem teriamos talvez o poder de questionar), a visao americana de ainda achar que a america latina é o seu quintal, o fara que caia cada ano que passa (e nao so a america latina né).
    sds a todos.

  6. veremos o que fara com Venezuela ..Bolivia ..Cuba..
    manter um canal direto com os EUA é acima de tudo uma questão de inteligencia diplomatica..
    Qto. ao Irã .. ainda acho que vai ter ‘voo’ de Arpia ..ops..F22..rsrs.. por lá.

  7. Eu gostaria de perguntar ao autor da matéria, qual a mudança nas relações exteriores em relação Dilma e Lula, o que a Dilma disse sobre apedrejamento qualquer um diria, até mesmo o Lula, e eu duvido que o Brasil deixe de negociar com o Irã, pois hoje, graças ao Lula não precisamos mais pedir permissão para os EUA para negociar economicamente e politicamente com países do oriente médio, o que a Dilma quer fazer vai deixar os americanos mais irritados ainda, se, como disse a reportagem, implementar ações concretas em relação ao BRIC, IBAS e UNASUL no sentido de caminhar para uma nova moeda, pois o dólar não é mais tão confiável assim, a imprensa tenta levar para a ideologia, mas o que vale mesmo é o pragmatismo econômico, abraço a todos.

  8. Qual é a Política Externa do Brasil ? Não sei …
    Vamos apoiar os países ditadores e que vendem drogas e armas de guerra para o nosso país ?
    O Irã não é tão mau assim, pois matam os seus políticos corruptos, que nem os chineses.
    O Brasil precisa acabar com o conchavo político, pois isso é corrupção disfarçada. Estamos muito distantes ainda da verdadeira democracia.
    Gostaria que o regime político brasileiro fosse semelhante ao da China, pois é o mais decente desse planeta. Político ficou rico com a corrupção, morre com tiro na nuca. O Irã também está de parabéns nesse aspecto.

  9. O Brasil caminha no caminho tortuoso que é mais pré-americando doque pró-americano, as intenções do Lula de fica a favor do Irã, séra invertida no próximo gorverno é sua sucessora pensa diferente é se aproxima mais dos yankes pode reverter varios quadros, inclusive a pressão sobre os caças do programa FX-2 vai aumentar a favor do F-18, se contiuar assim o Yankes vão por um Break no Brasil é vamos ficar com tecnologias necessarias.

  10. Só queria deixar claro que nao sou a favor de aproximações ‘tão próximas’ de com os EUA.
    É só estudar os fatos.

  11. O cara que fez a manchete, alguns dos comentaristas… não leram o texto?
    Não vai mudar nada. A linha é de continuidade.
    E tem que continuar mesmo, do jeito que era não dá.

  12. Existe um circulo de pessoas que nesta reta final de governo ainda tentam manchar a biografia do Lula, tentando passar a ideia de que o presidente só não impos uma mordaça a imprensa por causa dos defensores da liberdade ( O Estadão, a Globo, a Folha, He, He,).
    ======================================================
    O mesmo circulo enxerga o que só existe no seu imaginario, a de que Dilma rasgou sua biografia, será o novo FHC, o Serra de saia, tudo para senti uma identidade com a Presidente eleita, afinal ela é uma deles, letrada, de boa origem enquanto o Barbudo tem hábitos desprezíveis, é um semianalfabeto do qual tem um presidente com o qual não se identificam, são oito anos de isolamento e dor, como doeu.
    ========================================================
    A inveja se não mata, corroi o cidadão.
    Abs

  13. É lamentavel ver que alguns colegas ae em cima não dêem devida atenção para o texto é digo é repito esse governo vai ser mais ainda pré-americano doque pró-americano vamos sim sair de perto do Irã é apoiar mais o Tio Sam isso é verdade porque Dilma ta agradando o Barack Obama, é so ver as atitudes dela, tirou nosso ilustre Celson Amorin fez mais para o oriente médio doque o para o Brasil é defendeu o Irã com unhas é dentes, se isso não é verdade porque ela descontinuou com nosso Ministros de Relações esteriores é vai colocar um de agrado dos Yankes, Marcos Aurelio Garcia, amigo de Fidel ajudou a funda o FORO de São Paulo que nesse ano foi revelado que vem apoiando as Far’s só um cego não ver a verdade.
    Olhem ae ultima novidades desse cara sem moral com o povo brasileiro http://www.youtube.com/watch?v=FZxkveucV2c ainda tem gente que diz que to errado.

  14. NILO…Se voce deixar sua ideologia e amor de ladinho e olhar com imparcialidade veras que nunca antes na historia desse pais se roubou tanto e se continuara roubando por mais 4 anos ou talvez ate oito…Gosto do Lula ,votei nele e votarei de novo.Sei que ele é uma pessoa especial e ele não é problema,o problema são as ratzanas que infestam a republica e ainda mais as ratazanas do PT.E sendo assim se eles antes criticavam a tudo e a todos apontavam e quando se fizeram situação,porque não podem ser criticados?

  15. Maluquinho e desde quando disse que não se podia criticar o governo Lula.
    Critica é diferente de campanha feita por certo circulo
    de pessoas de imputar ao LULA O DNA DA CENSURA.
    acho que esse video será bem ilustrativo sobre o que estou a falar:
    http://www.andrenogaroto.com.br/index.php
    Sobre o Lula, espero que va e não volte, isso seria um sinal inequivoco de maturidade da politica brasileira.
    Abs

  16. Maluquinho me da um nome de um politico que não roubo e lhe digo quem o faz por ele.

    “Se voce deixar sua ideologia e amor de ladinho…..”
    agradecido pela critica, He, He, He,
    Abs

Comentários não permitidos.