Até que ponto a libra esterlina – um motivo de orgulho dos britânicos – é segura?

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Carsten Volkery
Em Londres (Reino Unido)
UOL

Sugestão: Gérsio Mutti

Primeiro foi o euro; agora a libra esterlina. A moeda britânica está sofrendo uma pressão maciça à medida que especuladores apostam que a dívida nacional do Reino Unido em breve sairá de controle. Assim como Atenas, Londres também tem os seus problemas – mas os britânicos não contam com nenhum parceiro da zona do euro para ajudá-los.

Schadenfreude pode ser uma palavra alemã, mas o seu significado nunca foi um conceito estranho no Reino Unido – especialmente nos últimos meses, quando os britânicos têm observado os problemas e atribulações amargados pela moeda comum europeia, o euro. Os problemas relativos a orçamentos e dívidas enfrentados por Grécia, Portugal, Itália, Irlanda e Espanha só reforçaram a convicção de que permanecer fora da zona do euro foi a decisão acertada. Ao contrário de Berlim, Londres não está sofrendo pressões para socorrer Atenas.

Mas nos últimos dias os especuladores não têm escolhido como alvo apenas o euro. A libra esterlina, também, tornou-se um alvo favorito – o que mostra aos britânicos o quanto a sua moeda também pode ser vulnerável. No início desta semana, a libra caiu para o seu patamar mais baixo dos últimos dez meses, ficando cotada a apenas US$ 1,4781 (R$ 2,65). Depois disso a moeda britânica ensaiou uma mini-recuperação, chegando a US$ 1,50 (R$ 2,68) na quarta-feira (03/03). Mas é improvável que a pressão do mercado sobre a libra desapareça da noite para o dia.

Alarme nos mercados

O motivo mais imediato para a recente queda da libra foram pesquisas políticas que indicaram que uma vitória dos conservadores nas eleições gerais (que provavelmente ocorrerão no início de maio) pode não estar assegurada. Os mercados ficaram alarmados por temerem que uma eleição muito disputada possa fazer com que seja difícil para o parlamento aprovar um pacote rígido de medidas para a contenção de gastos.

Tais preocupações de ordem política são temporárias. Ao se considerar como funciona o sistema eleitoral britânico, uma vitória conservadora continua sendo improvável – e tampouco se sabe se um governo com minoria parlamentar seria incapaz de limitar os gastos.

Entretanto, algo mais permanente são os indicadores econômicos fundamentais que estão se transformando no calcanhar de Aquiles da libra esterlina – problemas relativos a dívida e déficits que alimentam a queda da moeda britânica desde outubro de 2008.

Os problemas começam pelo tamanho do déficit orçamentário do país. Com um déficit orçamentário neste ano equivalente a 13% do produto interno bruto – o da Grécia é de 12,7% -, o Reino Unido é, até o momento, o campeão de déficit dentre os Estados que compõe o G-20. Até agora o Reino Unido foi capaz de evitar uma crise no estilo de Atenas principalmente devido ao fato de que a sua economia é bem mais flexível e competitiva do que a da Grécia. Além do mais, a maioria das pessoas ainda acredita que o país é capaz de reduzir a sua dívida sem ajuda externa. E, ao contrário do que ocorre no caso da Grécia, que está se deparando com a necessidade de refinanciar imediatamente uma dívida de 20 bilhões de euros (R$ 49 bilhões), a maior parte da dívida britânica só vencerá daqui a 14 anos.

Perdendo a paciência

Mas os financiadores internacionais estão começando a perder a paciência. Desde o início do ano, a parcela de investidores estrangeiros em títulos britânicos caiu de 35% para 29%. Os retornos financeiros dos títulos de dez anos, um indicador do risco associado a esses papeis, subiram para mais de 4% – o que é quase um ponto percentual acima da referência alemã. O número de apostas em uma queda ainda maior da libra esterlina feitas na Bolsa Mercantil de Chicago disparou recentemente. Os números refletem o ceticismo crescente do mercado.

Nos últimos meses, os britânicos observaram com orgulho as vantagens de um país ter a sua própria moeda em meio à crise. Devido à desvalorização da libra esterlina, as exportações ficaram mais baratas e os investimentos no país tornaram-se mais atraentes. A economia doméstica também se beneficiou. É previsto um crescimento de cerca de 1% no primeiro trimestre de 2010 – o primeiro desde 2008.

A desvalorização da libra também possibilitou que o Banco da Inglaterra interviesse em grande estilo, mantendo baixas as taxas de juros de forma que houvesse dinheiro barato disponível tanto para o governo quanto para os consumidores. Taxas de juros de hipotecas atraentes também contribuíram para reativar o mercado imobiliário, o que, por sua vez, melhorou o estado de espírito geral dos britânicos.

Disfarçando a crise

Porém, o problema com essas políticas monetárias é que elas disfarçam a verdadeira dimensão da crise. Os títulos mais recentes emitidos pelo governo britânico foram integralmente subscritos porque o Banco da Inglaterra comprou a maioria deles. Isso pode fazer com que o governo seja capaz de financiar o seu déficit sob condições favoráveis, mas há o risco de que a medida ameace a confiança dos mercados.

A dívida dos consumidores de produtos de massa no Reino Unidos também foi camuflada de forma similar. Com uma dívida pessoal média de 170% da renda anual, os domicílios britânicos estão ainda mais endividados do que os norte-americanos. E taxas de juros mantidas artificialmente baixas pelo Banco da Inglaterra ainda estão alimentando essa bolha. Cedo ou tarde, um aumento das taxas de juros é inevitável – e em tal momento a demanda doméstica poderia despencar.

Se o Reino Unido tivesse ingressado na zona do euro quando esta foi criada, pelo menos alguns destes excessos poderiam ter sido prevenidos. As diretrizes de política fiscal da moeda comum teriam garantido isso. O déficit anual médio dos países da zona do euro é, atualmente, de apenas 6%. O Reino Unido poderia também ter se ocultado por trás da reputação dos membros mais sólidos da zona do euro, assim como os gregos estão fazendo agora. Porém, como país relativamente pequeno que tem a sua própria moeda, o Reino Unido está mais vulnerável.

A moeda continua fraca

Mas no Reino Unido ainda prevalece a opinião de que a situação do país ficará melhor se ele permanecer sozinho. A esperança de uma reversão do quadro econômico está sendo alimentada por uma série de indicadores econômicos positivos. Na quarta-feira, o Índice Markit Service, que mede o grau de otimismo dos provedores de serviços britânicos, subiu ao seu patamar mais alto nos últimos dois anos. Ele também contribuiu para uma revalorização da libra.

Mas, mesmo assim, a moeda britânica continua fraca. E, embora seja improvável que a esta altura as agências de classificação rebaixem o nível de confiança para crédito do Reino Unido, tal possibilidade não pode ser descartada. Em maio de 2009, o Stardard and Poor’s reduziu a sua classificação dos títulos britânicos de estáveis para “previsão negativa”. Se o Reino Unido perdesse de fato a sua classificação AAA, isso poderia ter consequências desastrosas para a libra esterlina. E nada poderia conter os especuladores.

Fonte: Uol/BOL

2 Comentários

  1. Modo Engraçado [ligado]

    “mas os britânicos não contam com nenhum parceiro da zona do euro para ajudá-los.”

    É isso que da empinar o nariz encima dos vizinhos e se fazer de boazuda. Não dando valor a boa vizinhança e ignorando a União Européia.

    Modo Engraçado [desligado]

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