Fabrícia Peixoto
Da BBC Brasil em Brasília
O governo brasileiro quer que o encontro desta quarta-feira com a secretária de Estado americana, Hillary Clinton, seja reflexo de um “maior protagonismo” brasileiro não apenas na América Latina, mas também em questões internacionais, na avaliação de uma fonte do Palácio do Planalto.
Para reforçar esse objetivo, a diplomacia brasileira deverá levar para a reunião uma agenda que inclui sobretudo temas de interesse global, como o programa nuclear do Irã, mudanças climáticas e projetos de desenvolvimento para o Haiti e países africanos.
De acordo com essa mesma fonte do governo, a ideia não é a de reforçar “embates” com os Estados Unidos, mas de tornar o Brasil um interlocutor “permanente e de peso” no debate internacional.
“Os dois lados querem uma agenda positiva. Mas isso não quer dizer que o governo brasileiro abrirá mão de certas posições”, disse a fonte.
Na tentativa de distender a relação entre Brasil e Estados Unidos, que vem sendo marcada por uma série de atritos, os dois governos discutem a possibilidade de que os encontros bilaterais sejam mais frequentes.
Segundo o Itamaraty, o chanceler Celso Amorim e a secretária Clinton deverão firmar um compromisso de encontros regulares, uma vez ao ano – nos moldes já adotados entre Estados Unidos e China.
Cobrança
De acordo com um representante do Itamaraty, o discurso brasileiro durante a conversa não será “exatamente de cobrança”.
“É mais correto falarmos em posições. O Brasil vai aproveitar o encontro para reforçar sua posição em certos temas, alguns em acordo com os Estados Unidos, outros nem tanto”, diz o diplomata.
A aplicação de sanções econômicas ao Irã, um dos principais pontos de divergência entre os dois países, está “no topo” da agenda do encontro – mas segundo o Itamaraty, outros temas também interessam ao governo brasileiro.
Um exemplo é a discussão sobre mudanças climáticas no pós-Copenhague. Na semana passada, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva criticou os países que, durante o encontro na Dinamarca, tentaram “culpar” a China pelo fracasso das negociações sobre o clima.
A avaliação do Palácio do Planalto é de que faltou “empenho” dos Estados Unidos na busca por um consenso – e que essa posição “não mudou”.
Segundo o Itamaraty, o governo brasileiro também “não deixará” de abordar a necessidade de se reformar as Nações Unidas, especialmente o Conselho de Segurança.
O recente agravamento da disputa entre Argentina e Grã-Bretanha sobre as Ilhas Malvinas “deu mais fôlego” a esse debate, de acordo com um diplomata. “É uma reivindicação antiga, mas é prioridade. Por isso o tema tem de estar presente”, diz.
‘Resistência’
Para o professor do Departamento de História da Universidade de Brown, James Green, os Estados Unidos têm tido “certa resistência” em aceitar o papel “inovador” que o Brasil vem adotando em sua política externa.
“O governo americano não tem aceitado esse novo papel, que não é exatamente o do embate automático, mas também não é totalmente alinhado aos Estados Unidos”, diz o professor, que há cerca de 30 anos se dedica a pesquisar o Brasil.
Em sua opinião, a diplomacia brasileira tem “suas falhas” – entre elas o fato de não criticar regimes autoritários como o do Irã e de Cuba. Mas segundo Brown, “não se pode negar que o Brasil está construindo um novo caminho”.
Ainda na avaliação do historiador americano, a influência brasileira em temas internacionais, como no caso do Irã ou na recuperação do Haiti, “não é circunstancial”.
“É claro que o momento favorece a diplomacia brasileira, já que o país está, ainda que de forma provisória, no Conselho de Segurança da ONU”, diz.
“Mas esse fato só complementa uma estratégia maior, de fazer do Brasil um ator mais audaz no cenário internacional”, acrescenta.