Acesso ao espaço e soberania nacional

Presidente da Agência Espacial Brasileira (AEB)

Carlos Ganen

A capacidade de lançar satélites artificiais ao espaço é um dos fatores de fortalecimento da soberania nacional. Para entender a razão, é útil lembrarmos o caso do lançador europeu Ariane, que é lançado da Guiana Francesa, vizinha do Brasil. Sua história começa no início dos anos 1970, quando a Europa tinha duas organizações espaciais: a Organização Europeia de Pesquisas Espaciais (Esro) e a Organização Europeia de Desenvolvimento de Lançadores (Eldo). Essa última já havia sofrido 11 falhas de lançamento com seu foguete, o Europa, quando os países membros da Eldo decidiram que o projeto todo era um fracasso e seria descontinuado, frustrando o ideal europeu de se tornar independente dos Estados Unidos. Era a época da guerra fria e somente a União Soviética e os EUA detinham capacidade de lançamento de satélites.

Mas um fato importante fez a Europa mudar de ideia. Os EUA decidiram não permitir o lançamento de satélites europeus de comunicação, a não ser com severas restrições sobre como eles seriam utilizados. Na verdade, estava em jogo o interesse de proteger a indústria americana e impedir o desenvolvimento de uma indústria europeia de fabricação de satélites de comunicações. Assim, em 1973, as duas agências desapareceram para dar lugar à Agência Espacial Europeia (ESA), que aprovou a criação da empresa Arianespace, na França, onde começou o desenvolvimento do foguete Ariane.

Em 1978, o novo foguete foi lançado com sucesso a partir do centro de lançamentos europeu de Kourou, na Guiana Francesa. Aliás, cabe notar que a escolha de Kourou deveu-se à sua posição próxima da linha do equador, com o oceano a leste. Essa posição permite lançamento sobre o mar (mais seguro), aproveitando ainda a rotação da Terra, que dá velocidade adicional ao foguete. Em 1980, a Arianespace tornou-se a primeira empresa comercial de lançamento de satélites — hoje é a maior delas.

Essa história nos faz refletir sobre a nossa própria situação. Sabemos fazer satélites, como os de coleta de dados, SCD 1 e 2, ou os Sino-Brasileiros de Recursos Terrestres (Cbers), desenvolvidos em cooperação com a China. Temos um centro de lançamentos em Alcântara, no Maranhão, com condições até melhores que Kourou, por estar mais próximo da linha do equador. Também fazemos veículos de sondagem, como o excelente VSB-30, e estamos desenvolvendo nosso próprio Veículo Lançador de Satélites, o VLS. Entretanto, enquanto ele não estiver pronto e a tecnologia plenamente dominada, vamos continuar dependendo de lançadores estrangeiros e estar sujeitos a qualquer tipo de restrição, seja comercial, como a Europa sofreu, seja política.

Não estamos mais na guerra fria, mas a lógica Leste-Oeste que prevalecia naquela época, baseada em ideologias, deu lugar a uma separação Norte-Sul, em que as barreiras comerciais e o cerceamento tecnológico são ingredientes preponderantes. Daí a importância do tema para o nosso Programa Nacional de Atividades Espaciais (Pnae), sob coordenação da Agência Espacial Brasileira, vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT).

O desenvolvimento autóctone das tecnologias necessárias, levado a cabo pelos executores do Pnae, o Instituto Nacional de Atividades Espaciais (Inpe) e o Comando Geral de Tecnologia Aeroespacial (CTA), além da manutenção e atualização dos Centros de Lançamento de Alcântara (CLA) e da Barreira do Inferno (clbi), em Natal (RN), são prioridades do programa. Além disso, como parte da política externa brasileira, começamos a estabelecer ou renovar parcerias estratégicas com outros países, entre os quais a França e a Rússia. Em um mundo em que o poder está cada vez mais fragmentado, essas alianças permitirão projetos conjuntos dentro de um quadro de proteção e salvaguarda mútua da propriedade intelectual.

Como solução intermediária e ao mesmo tempo grande oportunidade de negócio, o Brasil estabeleceu, em 2004, um tratado com a Ucrânia. Eles têm o foguete Cyclone-4, e nós, a melhor localização para lançamentos do mundo. Foi criada então a empresa binacional Alcantara-Cyclone Space (ACS), responsável pela comercialização dos lançamentos no mercado mundial. Com isso teremos, em curto prazo, maior grau de autonomia no acesso ao espaço e uma fonte de recursos para o programa espacial, vinda dos lucros da ACS.

No passado se dizia que dominar os mares era dominar o mundo. Hoje, até por força de tratados internacionais, como o Tratado da Lua e dos Corpos Celestes, não se pode dominar o espaço, pois ele pertence a toda a humanidade. Mas a plena capacidade de acesso e, consequentemente, de participar dos benefícios de se colocar em órbita satélites que servirão para comunicações, meteorologia, observação da Terra e posicionamento, por exemplo, ainda é privilégio de poucos. Dessa capacidade e de recursos estáveis e permanentes depende o nosso poder de decidir quando e o que colocar no espaço. E isso é soberania.

Foguete é lançado na Barreira do Inferno

Primeira operação após intervalo de dois anos foi considerada bem-sucedida

Filipe Mamede

Dos altos-falantes sai a ordem para o lançamento. Dez segundos de contagem regressiva. O foguete de 3m de comprimento segue em direção ao céu numa velocidade de mais de 4 mil km/h, quase quatro vezes a velocidade do som. Além dos 160 militares envolvidos na operação, entre engenheiros, técnicos e operadores de radar, cerca de 60 alunos de uma escola de Parnamirim mantiveram os olhos vidrados no lançamento.

Entre eles, Eliezer Nóbrega, sete anos. Pela primeira no Centro de Lançamento da Barreira do Inferno (CLBI), o garoto não economizava nas perguntas. Estava atento à tudo e trouxe uma câmera para registrar a tarde diferente fora da sala de aula. “Achei ótimo o passeio e tenho certeza que essa vai ser uma experiência única, por isso eu não podia esquecer minha máquina digital. Quero mostrar as fotos para os meus amigos e para os meus pais”, disse Eliezer.

Com um tempo de voo estimado em cerca de 5 minutos, o Foguete Básico de Lançamento (FTB), de mono-estágio, não guiado, alcançou mais de 30km de altura caindo em alto mar a mais de 16km da costa. “O nosso evento foi um total sucesso. Desde o início da operação até seu lançamento, tudo saiu dentro do previsto. Ele cumpriu todos os objetivos e agora estamos nos preparando para o lançamento de amanhã (hoje), que será o último dessa campanha”, explica o Tenente Coronel-Aviador Ricardo Rodrigues Rangel, coordenador geral da operação.

Experimentos

Nesse voo, os FTBs já estão preparados para disponibilizar 5kg de carga útil para experimentos tecnológicos, além de instrumentos para acompanhamento das estações de telemidas, preparando, assim, as equipagens para os próximos lançamentos. “Esse FTB tem um valor estimando em R$ 60 mil e, para 2010, estamos prevendo uma média de cinco lançamentos como esse, que tem como objetivo desenvolver e certificar foguetes instrumentados para treinamento da Barreira do Inferno e do Centro de Lançamento de Alcântara, no Maranhão”, informa o Tenente Rangel.

Fonte: NOTIMP

1 Comentário

  1. Eu me pergunto pq está demora em lançar o VLS…é nossa independência militar, e mostrar q podemos sim levar a guerra ao território do (s ) inimigos…o foguete de agora e o missil de amanhã.

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