Turquia caminha rumo à autocracia

Erdogan suspendeu Convenção Europeia de Direitos Humanos e cogita até restabelecer pena de morte. Com interesses, maioria dos membros da UE evita conflito, mas medo de que uma ditadura esteja emergindo em Ancara cresce.

A repressão desencadeada após a tentativa de golpe na Turquia elevou receios na União Europeia (UE) de que o governo Recep Tayyip Erdogan possa estar adotando um caminho autocrático, o que dificultaria ainda mais as já complicadas relações entre Ancara e Bruxelas.

A Turquia é um importante vizinho da UE e negocia seu ingresso no bloco desde 2005 – ainda que as conversas estejam praticamente estagnadas atualmente. É, além disso, um país considerado fundamental na resolução da crise migratória, por abrigar mais de 2 milhões de refugiados sírios.

Observadores veem uma mudança gradual no governo Erdogan. Desde o início das negociações, as normas europeias – de liberdade de expressão à política de concorrência – eram tidas como referência em Ancara.

Mas agora, afirma o diplomata Marc Pierini – ex-embaixador da União Europeia na Turquia –, aos olhos de Erdogan o bloco é apenas um obstáculo no caminho para um regime presidencialista autoritário.

Desde o golpe, por exemplo, apoiadores de Erdogan vêm pedindo o restabelecimento da pena de morte, que a Turquia baniu na década passada justamente como parte de seus esforços para ingressar na União Europeia. O presidente deixou a possibilidade em aberto.

A chefe da diplomacia europeia, Federica Mogherini, deixou claro que a reintrodução da pena de morte na Turquia significaria o fim das conversações. Nesta quinta-feira, o governo turco anunciou a suspensão da Convenção Europeia de Direitos Humanos durante o estado de emergência, decretado por três meses.

O comissário para Negociações de Ampliação da UE, Johannes Hahn, afirmou que, para ele, a “grande limpeza” nas instituições executada por Erdogan foi planejada. Desde que parte das Forças Armadas tentou tomar o poder, em 15 de julho, cerca de 10 mil detenções foram realizadas no país. E milhares de integrantes do Judiciário, do funcionalismo público e das universidades foram afastados. Hahn afirma que a lista de alvos já deveria estar há muito tempo na gaveta, argumentando que nenhum governo poderia reagir de forma tão rápida.

Acordos ameaçados

Eurodeputados conservadores dizem que as negociações sobre a adesão à UE são a única possibilidade de exercer alguma influência na Turquia e defendem sua continuação. Já os representantes do Partido Verde e do partido A Esquerda pedem o rompimento das conversações.

Até o final de setembro já terão sido desembolsados 2 bilhões de euros para projetos de ajuda no âmbito do acordo migratório, e o dinheiro, segundo a Comissão Europeia, é revertido diretamente em favor dos refugiados sírios na Turquia. No total, 3 bilhões de euros foram prometidos, e Bruxelas quer manter o acordo. Até agora, não há indícios de que a Turquia não vá cumprir com suas obrigações.

Porém, é discutível como o acordo vai prosseguir a partir de agora. O comissário europeu Günther Oettinger já descartou para este ano o fim do visto para cidadãos turcos ingressarem nos países da União Europeia – uma das condições para o cumprimento do pacto sobre refugiados. Porém, Erdogan diz que, se o fim do visto não sair do papel, não há acordo.

No Parlamento Europeu, um acordo sobre a questão é tido como improvável, dadas as diferenças entres as forças majoritárias. A eurodeputada social-democrata holandesa Kati Piri trata os obstáculos como insuperáveis.

Alguns conservadores ainda tentam salvar o pacto, mas até o democrata-cristão alemão Elmar Brok, correligionário da chanceler federal Angela Merkel, já alertou para o perigo de uma “putinização” da Turquia. Ele disse esperar que a reunião agendada entre Erdogan e Putin não se torne um “festival dos autocratas”.

Para analistas, a adesão ao bloco deixou de ser um objetivo estratégico em Ancara. No entanto, Pierini acredita que o presidente turco vai cumprir o acordo sobre refugiados – mas desde que ele esteja de alguma forma se beneficiando dele.

O ex-embaixador considera que os inúmeros apelos europeus para que se respeite o Estado de Direito são inúteis. Em primeiro lugar, porque o golpe foi quase bem-sucedido e, por isso, desencadeou uma cadeia de represálias. E, em segundo, “porque o golpe frustrado ofereceu uma oportunidade de ouro para o presidente fortalecer seu poder”.

Isso poderia também significar novas eleições – e uma conseguinte maioria de dois terços no Parlamento para adotar uma nova Constituição. “A democracia e a aproximação com o Ocidente podem ser as primeiras vítimas do golpe”, afirma Pierini.

Vizinhos se preparam para instabilidade

Enquanto a maioria dos governos europeus se limitou, até agora, a expressar suas preocupações com diferentes intensidades, a Bulgária – vizinha da Turquia – reforçou as patrulhas de fronteira e desencorajou seus cidadãos a viajarem para o país.

As tensões aumentam também na Grécia: os oito oficiais turcos que fugiram após o golpe fracassado foram, por motivos de segurança, transladados para o interior do país, até que haja uma decisão sobre o pedido de asilo.

Na quarta-feira, a notícia de que supostos navios turcos estavam nas proximidades da ilha grega de Simi suscitaram preocupações. E a solução do problema referente à ilha de Chipre – dividida entre uma parte grega e outra turca há mais de 40 anos – que parecia estar tão perto, agora aparenta estar mais distante.

Em suma, Atenas tem receio da volta das tensões das últimas décadas com Ancara, principalmente sobre a questão dos refugiados.

Edição/Imagem: Plano Brasil

Fonte: DW

11 Comentários

  1. Pelos padrões históricos de expurgos em golpes militares na Turquia, Erdogan está sendo até muito moderado…

    ——

    Depois do golpe militar de 1980 na Turquia, (e nesta época, sua população correspondia à metade da atual população turca), o número de detidos, demitidos, condenados e executados veio em escala muito, muito maior:

    650 mil pessoas foram presas.

    1,683 milhão de pessoas entraram para uma lista negra.

    230 mil pessoas foram julgadas em 210 mil processos judiciais.

    7 mil pessoas foram acusadas de crimes capitais.

    517 pessoas foram condenadas à morte.
    —–

    Más como era golpe e repressão promovidos por fieis à Washington, não houve choro nem indignação nas grandes mídias ocidentais.

    O velho padrão midiático de dois pesos e duas medidas na hora de calar ou escandalizar…

  2. Recadinho aos esquerdistas que apoiam a aproximação turco-russa:

    “Vocês odeiam a cultura tradicional (e tudo o que ela representa) visto que ela freia os vossos apetites depravados, coloca rédeas nos vossos impulsos, e responsabiliza-vos com base num certo padrão. Vocês esforçam-se para recompensar a escória, os corruptos e os vis.”…”Não iremos debater com vocês; iremos tomar seus lugares.” Quintus Curtius…

    AGORA É A HORA… O MOMENTO É JÁ !!!… quem lê entenda…

    • O que você está ameaçando, GENEROSO PATRIOTA? Golpe de estado no Brasil ou Terceira Guerra?

      Se for golpe de Estado no Brasil, ele já aconteceu, só que sem os militares. Usaram a imprensa, a PF e o Judiciário.

      Se for Terceira Guerra, espere até 2017. Obama não quer no governo dele, a Hillary vai querer. Se for o Trump, capaz da Guerra não acontecer.

      Então, tenha paciência e espere até 2017 tá? aí você vai poder provar a sua teoria da superioridade americana.

      • Não se trata de teoria… É FATO… aguardemos com paciência… vou abrir meu scotch e esperar pela improvável queda americana… on the rocks… 🙂

  3. A população turca foi para rua para evitar um golpe defendendo a democracia .. parece que não teve jeito .. terminou tendo uma ditadura ..como disse aqui .. más cedo ou mais tarde .. todo tipo de golpe seja lá como ele for .. os seus integrante golpistas …. vai mostra para que veio para a população.
    .
    Há diversos tipos de bandeira falsas para se promover um golpe .. no caso da Turquia foi uma golpe em cima de outro golpe .. conheço um lugar que se fez um golpe em nome do “moralismo” .. para acabar com a corrupção no governo (Eis a bandeira falsa ) ..HAHAHAH… ai nesse caso .. esse tipo de golpe chamasse .. pega trouxa ..HAHAHAHAH ..a corrupção ….ficou pior do antes naquele lugar . HAHAHAH .
    .
    Com certeza .. rsrs … o próximo passo .. será inibir os movimentos sociais democráticos ..tudo em nome da ” segurança nacional” ( a bandeira falsa ) ..como se quer fazer , mais ou menos … o marginal do Erdogan …. oportunamente, utilizando a situação .. criada ou induzida ou seja lá como ocorreu a origem do golpe.na Turquia
    .
    Pelo que se percebe … no andar da carruagem turca ..será igual como ocorreu com o 11 de setembro lá nos EUA e também nos atentados terroristas na Europa; como por exemplo, na França e Inglaterra ..
    .
    Como eu disse ..Um golpe criado ou induzidos ou seja lá como for .. sempre vem a verdade das motivações dos golpistas para a população que geralmente vai pagar pelo pato .. lembrem-se.. Da oportunidade , se aproveita o ladrão …., que só vem para MATAR,ROUBAR e DESTRUIR …

    • Como sempre voce faz uma analise distorcida dos fatos. Vou refazer sua sentença baseado na realidade:A população turca foi para rua para evitar um golpe que tentou defender a democracia .. parece que não teve jeito .. terminou tendo uma ditadura ..Azar deles se querem viver sobre o cabresto de uma autocracia islâmica!

    • Lucena, tudo isso é verdade, concordo com tudo. Mas a Turquia é um aliado que a Rússia, ameaçada pela guerra, não pode ignorar.

      Não se trata de aliar-se a um crápula, trata-se de apenas ter que negociar e fazer um acordo com ele.

      Infelizmente, na vida, precisamos, quer a gente queira ou não, negociar com esse tipo de gente – dependendo da situação.

      Sei que é difícil para nós, cidadãos de bem, engolir essas coisas. Eu já teria feito um monte de lambanças, se estivesse no lugar do Putin: teria invadido a Ucrânia para acabar com aquela festa nazista lá, não teria a paciência que o Putin tem.

      Imagine se você fosse obrigado a viver numa favela do Rio, cercada por traficantes. Cedo ou tarde, algum tipo de entendimento você teria que tomar com eles.

      A Turquia faz fronteira com a Rússia e ela tem que negociar com quem estiver no poder lá.

      É difícil para você, que tem um coração puro, entender. Mas é necessário. Afinal, estamos falando de guerra – e guerra termonuclear.

    • Lucena que me desculpe a franquza mas a populacao turca nao foi as ruas para defender a democracia. A populacao turca estavam nas Mesquitas, o golpe ocorreu numa Sexta Feira a noite,quando todos os mulssumanos nao secularizados vao rezar. Endorgan mandou as mensagens para o pessoal sair as ruas e enfrentar os militares para os clericos lerem e fazer as agitacoes CONCLAMANDO O POVO LUTAR.. ESSES CLERICOS MULSSUMANOS PODEM SER TUDO MAS DEMOCRATAS ELES NAO SAO. O POVO MULSSUMANOS FORAM AS RUAS PORQUE ELES ODEIAM IS MILITARES, ELES SABEM O QUE FOI A HISTORIA TURCA QUANDO OS MILITARES CONTROLAVAM TURQUIA OPERANDO COM OS BABAS, ISTO E MAFIA TURCA. que forcaram o regime secular, o regime nao religioso ao povo turco, ABRINDO AS PORTAS DA TURQUIA AS PENETRACOES CULTURAIS DO OCIDENTE, A COCA COLA, AO BIQUINE, MINISAIA, ao ROCK&rROLL, ENFIM AO REGIME HEDONISTAS OCIDENTAL QUE EMBORA OLAVO DE CARVALHO DIZ SER COISAS DA ESCOLA DE FRANKFURT E DE GRAMSCI, FOI CRIACAO DA SOCIEDADE CAPITALISTA SOB A HEGEMONIA NORTE AMERICANA. QUE FOI FORCADA ESTABELECER A SOCIEDADE DE CONSUMO DE MASSA PARA SOBReVIVER. TUDO ISSO E ANATEMA NAO SO AOS CLERICOS MAS A TODOS MULSSUMANOS QUE INDA SAO FIEIS AO KORAN.

  4. Deve ter gostado do jeito Putin de governar um país. Pensando bem esta certo o comentário do colega Generoso Patriota em outro post referente a Turquia…que se danem!

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