O Exército e a Escola da Guerra no século XXI: o legado de Castello Branco e de Meira Matto

 

No atual processo de transformação do Exército Brasileiro (EB), o “Plano Estratégico do Exército (2016-2019)” prevê que a Força, até 2022, alcançará uma “nova doutrina”, empregando produtos de defesa tecnologicamente avançados e reunindo profissionais capacitados e motivados ao enfrentamento dos desafios deste novo século, para, assim, respaldar as decisões do País no cenário internacional.

No que tange à educação, o plano tem por objetivo “Implantar um novo e efetivo Sistema de Educação e Cultura”, observando, com ênfase, as seguintes ações: desenvolver a cultura da inovação e da transformação, incrementar a pesquisa científica nos estabelecimentos de ensino, ampliar o intercâmbio com o meio acadêmico e conduzir a capacitação do profissional militar de acordo com as competências necessárias. No que se refere à integração, o plano apresenta o objetivo de “Ampliar a integração do Exército com a Sociedade”, promovendo as ações de elevar o nível de interação da Força com a sociedade, com ênfase nos formadores de opinião; fomentar, com as instituições civis, a pesquisa na área de defesa, entre outras.

Na consecução desses objetivos, “pensar” o Exército torna-se aspecto primordial e, inevitavelmente, reforça a missão da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME), que se insere na Diretoria de Educação Superior Militar (DESMil), no âmbito do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx). Fundada em 1905, a então Escola de Estado-Maior foi a célula “mater” da ECEME.

Desde a criação, a Escola emulou as influências das doutrinas militares – alemã, francesa e americana -, até avançar à gênese de uma doutrina autóctone, alavancada pela visão do Marechal Humberto Castello Branco e forjada no âmbito das operações da Força Expedicionária Brasileira (FEB), na Campanha da Itália, durante a 2ª Guerra Mundial, atenta ao fato de que: “Ao chefe militar não cabe ter medo de ideias novas. É preciso, isto sim, não perder tempo, implementá-las e realizá-las até o fim”.

Assim, a partir de 1955, já sob a denominação atual, as missões da ECEME têm se voltado a forjar líderes e chefes militares, formar o oficial de Estado-Maior e o assessor de alto nível, com capacidade de produzir conhecimento e pensar o Exército do futuro.

Inserida no “Processo de Transformação” corrente, a Escola da Guerra expande o seu potencial, exercendo o papel de interface estratégica, contribuindo para a construção de um novo Sistema de Educação e Cultura e para a ampliação da integração do Exército com a sociedade, tendo em vista as demandas do Sistema de Doutrina Militar Terrestre.

Para tanto, a partir de 2014, a ECEME implementou proposta pedagógica assentada no ensino por competências, promovendo a sinergia e a contextualização do conhecimento em prol de uma educação integral. Além disso, avançou na abordagem interdisciplinar do fenômeno da guerra, ao promover uma triangulação metodológica, integrando o consagrado “Método do Processo de Planejamento” (relacionado à resolução de problemas militares), o “Método baseado na Taxonomia de Bloom” (relativo à solução de questões teóricas por nível de desempenho) e o “Método Científico” (aplicado à pesquisa científica) (Nunes; Ramos; Morgado; Gonçalves, 2017).

No que se refere à integração do Exército com a Sociedade, a ECEME tem promovido o diálogo entre civis e militares, por meio do fomento à pesquisa científica, com ênfase na conscientização da sociedade acerca da relevância da temática da Segurança & Defesa. Nesse sentido, em 2001, a Escola implantou o seu próprio programa de pós-graduação. A seguir, em 2002, as Ciências Militares foram inseridas na gama das ciências estudadas no País, integradas à Grande Área do Conhecimento da Defesa e homologadas pelo Ministério da Educação.

Em 2010, o Brasil passou a contar com uma Política de Ensino de Defesa, que instigou iniciativas para difundir a Defesa no meio acadêmico, promover a equivalência de cursos nos sistemas de ensino civil e militar e ampliar o intercâmbio entre instituições de ensino. Pari passu, o Exército iniciou o seu Processo de Transformação, considerando “Educação e Cultura” como um dos aspectos estruturantes. No mesmo ano, a Portaria n.º 734, do Comandante do EB, conceituou as Ciências Militares como o “sistema de conhecimentos relativos à arte bélica, obtido mediante pesquisa científica, práticas na esfera militar, experiência e observação dos fenômenos das guerras e dos conflitos, valendo-se da metodologia própria do ensino superior militar”.

Com destaque, em 2012, foi criado o Instituto Meira Mattos (IMM), cujo nome evidencia a simbiose de um General que foi soldado e cientista, testado no âmbito da campanha da FEB, na 2ª Grande Guerra, e titulado Doutor em Ciências Políticas pela Universidade Mackenzie de São Paulo. Como parte da estrutura da ECEME, o IMM viabiliza a ligação da Escola com as instituições de ensino superior e com os centros de estudos estratégicos, dentro e fora do Brasil. O seu propósito é coordenar e desenvolver a pesquisa científica, fortalecendo a pós-graduação e o estudo das Ciências Militares e da Segurança & Defesa, e criando a oportunidade, integradora, da pós-graduação para civis e militares.

Nesse contexto, em 2013, o Mestrado Acadêmico em Ciências Militares da ECEME, à luz da avaliação na área de Ciência Política e Relações Internacionais, foi recomendado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e, a seguir, aprovado pelo MEC, garantindo a nota três. Em 2015, com o avanço do programa de pós-graduação, deu-se a apresentação da proposta do doutorado e, a seguir, em 2016, o Doutorado em Ciências Militares, que foi aprovado com a nota quatro, amparando a expedição de diplomas reconhecidos pelo MEC e a oferta do curso para toda sociedade (Cunha; Migon, 2018).

Síntese do legado de Castello Branco e de Meira Mattos, o Instituto Meira Mattos é a estrutura da ECEME que “constrói uma ponte” com o meio acadêmico e com os centros de estudos estratégicos. Dessa forma, o IMM contribui para pensar e transformar o Exército, conforme os desafios hodiernos, colimando civis e militares, sob a égide de uma educação integral que avança o “pensar” da Segurança & Defesa. Portanto, a ECEME promove a sinergia do conhecimento factual, doutrinário e científico, contribuindo com a efetividade do Sistema de Educação e Cultura do Exército e com a constante integração da Força com a Sociedade para, em última instância, transbordar dividendos, na forma de militares e civis habilitados a pensar a Segurança e a Defesa do Brasil.

REFERÊNCIAS
_______. 2010. Exército Brasileiro. Portaria do Comandante do Exército nº 734 de 19 de agosto de 2010. Conceitua Ciências Militares, estabelece sua finalidade e delimita o escopo de seu estudo. Boletim do Exército nº 34, 27 ago., 95 pp. Brasília, DF.

_______. 2014. Exército Brasileiro. Doutrina Militar Terrestre (EB20-MF-10.102). Portaria nº 003-EME, de 2 de janeiro de 2014. Brasília, DF.

_______. 2017. Exército Brasileiro. Plano Estratégico do Exército 2016-2019. Portaria nº 1.042, de 18 de agosto de 2017. Brasília, DF.

CUNHA, Rafael Soares Pinheiro da; MIGON, Eduardo Xavier Ferreira Glaser. 2018. Ensino de pós‑graduação no Brasil: as Ciências Militares. Revista Brasileira de Estudos de Defesa, v. 4, n. 1.

NUNES, Richard Fernandez Nunes; RAMOS, Carlos Eduardo De Franciscis; MORGADO, Flávio Roberto Bezerra Morgado; GONÇALVES, Rogério Amorim. 2017. ECEME – A Escola “dos Métodos”. Do ensino integral à educação integrada. A Defesa Nacional. Revista de Assuntos Militares e Estudo de Problemas Brasileiros, n. 834, out./dez.

Fonte: EBlog

6 Comentários

  1. Muito estranho que com toda essa realidade de mestrados e até doutorados atuais sobre Defesa, e de todos os ensinamentos sobre nossa inoperabilidade (brasileiros pegos de calças curtas = molecada) na WWII, onde só não fomos totalmente humilhados pelos alemães porque os americanos vieram nos socorrer, até hoje não temos, ao menos, AAA de respeito.
    E que seja preconizada (será teses de doutores em Defesa?) defesa de guerrilha, para uma das maiores economias do planeta.
    Assim, se depois de todo esse blá blá blá discente e docente lá em 2022 o exército ainda não tiver baterias de mísseis de média e alta altitude e alcance, e emissores de Laser de alta potência para defesa de ponto, para AAA, em nossos principais pontos estratégicos do país, saberemos que sim, isso é só BLÁ BLÁ BLÁ cheio de sofismas e dialética para uma Defesa inócua.
    Pois, agora, em 2018 nosso exército, já com todas as lições pós WWII, e inclusive do que ocorreu na Criméia recentemente, INCRIVELMENTE, não possui um único míssil de longo alcance, sequer de médio alcance de 1000km. Capazes de manter um inimigo longe de nosso território.

    A tal doutrina guerrilheira, usando o atual equipamento de curtíssimo alcance, é atacar o inimigo, mas com ele já aqui dentro das fronteiras.
    Porém, mesmo assim, como?
    Se os nossos únicos adversários bélicos são as grandes potências (qualquer ser racional sabe disso) as quais não teriam dúvidas de simplesmente incinerar o nosso matagal tropical por vários quilômetros ao redor de suas cabeças de ponte para evitar qualquer ação de guerrilha. Fora os modernos sensores, de radar, infravermelhos, sônicos, de presença denunciando qualquer elemento de tropa inimiga próximo.
    Essa doutrina de guerrilha, é a maior cascata que existe, e na qual o exército se segura, para tentar compensar sua fraqueza.
    Doutrina fruto de qual análise cheia de furos não dá para saber…
    Pois, vejamos as FARC, elas conseguiram vencer o exército terceiro mundista colombiano? Nunca.
    Desde quando então que conseguiríamos expulsar uma poderosa força, usando táticas mais do que manjadas de guerrilha?
    Outra… Essa nossa doutrina estudada de defesa com guerrilha, ridícula, ficaria eternamente enfronhada dentro da floresta equatorial da amazônia, e o resto do país seria defendido com o quê?
    Brasília no Cerrado Central, com o QG do exército, seria ocupada em um dia apenas, seria apenas o tempo das tropas invasoras chegarem até ela, e já simbolicamente dizerem para o resto do país: “Sua capital já está ocupada, é nossa.”
    Por acaso existe alguma mata equatorial de milhares de quilômetros de área para guerrilheiros brazucas se esconderem ao redor de Brasília?
    E mesmo que exista alguma mata, esse mato seria é todo incinerado e pronto.
    Pois a realidade é que precisamos de um exército com armas capazes de enfrentar as do inimigo de igual para igual, ao menos isto, e o resto que está presentemente no exército não passa de doutrina e armamento para derrota.

    Conclusão curta e grossa, para realmente defender nossa soberania, valendo doutorado:
    Nosso exército precisa ter dezenas de milhares de drones divididos em várias especialidades, mísseis de médio e longo alcance, AAA de média e alta altitude e alcance, armas de energia dirigida, vários satélites espiões de imageamento e de comunicações seguras e lançados por nós.

  2. Interessante, que mesmo uma Força não tendo o que precisa, tenha consciência disto, e seus principais integrantes digam ao público o que seria necessário.

    A Marinha do Brasil vem a vários anos afirmando que precisa de submarinos nucleares, e de NAes, ao menos dois, para fechar o Atlântico Sul contra algum agressor estrangeiro que venha pelo mar.

    Já o Exército, chamais li algo de sua parte afirmando que precisa de tais e tais equipamentos de real poder de dissuasão, para manter qualquer inimigo bem longe do Brasil.
    Ou alguém sabe que alguma vez algum oficial do exército veio a público declarar que nosso Exército precisa ter mísseis de longo alcance etc?

    Ponto para nossa Marinha. Sabe o que realmente pode lhe dar força. Expõem à opinião pública. E está indo atrás.

  3. A nova doutrina sera: “como ser e continuar sendo totalmente subservientes a USARMY”.
    Esses “estudiosos” do exército ainda não entenderam que enquanto estiverem “alinhados” com os USA, dominado por ditaduras “dasdereita” e pela paranoia anti-comunista (que acusam todos os que não se rendem aos USA de comunistas) as F.A. não terão vez.
    Tem que separar Defesa de política, pois não importa qual partido esteja no poder as F.A. continuam com a mesma função (defesa da Pátria contra ameaças externas). Se comparar em termos mundias talvez cheguem a conclusão que os paises que tem as F.A. mais fortes e aparelhadas são aqueles que mantem uma certa independência da política dos norte-americanos. Aos USA não interessam que as F.A de outros países sejam poderosas.

    • Quanta besteira , um comentário equivocado , dislexo, o anti-americanismo idiotizado fica evidente , mas se lembrarmos que lixo como este Chico abundam por aí , todos amantes de uma independência política dos EUA , mas desejosos de uma dependência política de Cuba ao estilo venefavela , kkkkk, vagabundos verbofezando .

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