ENGESA EE-11 URUTU para uso Policial – Outro Marco Histórico

EE-11 M5 Urutu da Guarda Nacional da Tunísia

Hoje, 28 de março de 2018, o Exército Brasileiro, dando continuidade às ações da Intervenção Federal na Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro, está entregando a título de empréstimo, três blindados sobre rodas 6×6 Engesa EE-11 Urutu, os quais serão empregados pelo Batalhão de Operações Policiais Especiais – BOPE, além de mais dois blindados 4×4 Paramount Maverick e um 4×2 Caveirão TCT (Tecnologia em Carrocerias de Transporte Blindados Indústria e Comércio de Carrocerias e açambas Ltda) montado sobre um chassi FORD Cargo 815MU pertencente à Coordenadoria de Recursos Especiais –CORE, da Polícia Civil, sendo estes três últimos recuperados por empresa privada em parceria com o Exército, trazendo-os de volta à ativa.
A novidade para nós será o emprego do EE-11 Urutu como um veículo policial, utilizado por uma Força Policial e não pelas Forças Armadas, sendo que os mesmos apresentarão a pintura de preto e as marcações do BOPE, muito embora serão conduzidos por motoristas do Exército. Estes veículos são oriundos do lote repatriado do Haiti, remanescentes da então MINUSTAH (Missão das Nações Unidas para a Estabilização do Haiti), onde o Brasil comandou a parte militar de 2004 a 2017 e se encontravam no 15º Regimento de  Cavalaria Mecanizado (15º RCMec) os quais foram manutenidos pelo Batalhão Central de Manutenção e Suprimentos (BCMS), antigo Parque Regional de Manutenção da 1ª Região Militar – PqRMnt/1), em parceria com empresas privadas, a maioria no Rio de Janeiro. (Para maiores informações sobre o emprego de blindados no Haiti, sugiro o livro: BLINDADOS NO HAITI – MINUSTAH – UMA EXPERIÊNCIA REAL, de minha autoria).

EE-11 Urutu do Exército Brasileiro em operação no Haiti (MINUSTAH) em 2008. Notar que o
mesmo possui proteção blindada para o motorista, torreta blindada para o atirador e lâmina do
tipo “bulldozer” na parte frontal, chamado de Moustache (Bigode). Sem dúvida um grande avanço
obtido pelas necessidades locais de emprego do veículo.

Os três veículos possuem proteção balística para o motorista e dois deles com torreta giratória do atirador totalmente protegida, e um destes está equipado com lâmina frontal, desenvolvidos pela Centigon Blindagens do Brasil em parceria com o Arsenal de Guerra de São Paulo – AGSP, em 2009. Já o terceiro veículo possui o modelo de torreta com proteção lateral, desenvolvida no Esquadrão de Cavalaria Mecanizado (Escola) – Esquadrão Paiva Chaves, em 2005 e empregados no Haiti (MINUSTAH), tudo fruto da experiência brasileira atuando como Força Policial a serviço das Nações Unidas no Haiti. Quer se queira quer não este foi o nosso grande laboratório, possibilitando entender na prática a utilização de blindados sobre rodas em áreas urbanas, lembrando ainda que também foram empregados por tropas da Bolívia e Jordânia, sendo os modelos mais  antigos e últimos de série produzidos respectivamente.

O emprego e a entrega destes veículos estão cercados de um “secretismo” por parte das autoridades envolvidas na Intervenção, dando a entender que os mesmos fossem uma “arma secreta de última geração”, e de um ineditismo único, porém, precisam ter cuidado, nem sempre as soluções apresentadas do Haiti terão o resultado
esperado por aqui, bastando lembrar que os armamentos na mão dos ilegais no Rio de Janeiro, tanto em calibre quanto em quantidade e modelos, superam em muito os das gangues no Haiti e lá vários veículos blindados de diversos tipos e modelos foram atingidos por munição 7,62 mm perfurante, sem grandes problemas, mas em  certos casos penetraram, lembrando que um blindado OT-64 8×8 Uruguaio foi destruído numa emboscada em 2006. Neste ano o EE-11 Urutu completa 38 anos de emprego em combates reais, seja como versão Transporte de Tropas, razão de sua criação, sejam como veículos remuniciadores, lançadores de foguetes, com diversas  adaptações locais no Oriente Médio, África e América Latina.

A Viatura Blindada Anfíbia EE-11 Urutu foi um projeto iniciado no ano de 1970, numa iniciativa da Engesa (Engenheiros Especializados S/A) e a Marinha do Brasil, para atender a uma demanda do Corpo de Fuzileiros Navais. (CFN) da Marinha do Brasil, para adquirir blindados sobre rodas com capacidade anfíbia. Os dados relativos  ao projeto surgiram no então Ministério da Marinha – Corpo de Fuzileiros Navais – Comando-Geral em abril de 1972. Sua fabricação a cargo da Engesa, muito embora não tenha atendido às expectativas da Marinha, acabou por ser de extrema utilidade para o Exército e alcançou a cifra de 888 unidades produzidas, entre 1973 e 1993, contando com diversas versões como: antiaérea (com um canhão de 25 mm ou dois de 20 mm), porta-morteiro de 81 mm, suporte de fogo (com torre e canhão de 90 mm), carro comando, transporte de tropas para 13 soldados e o motorista, ambulância, viatura de socorro e veículo policial antimotim (equipado com lâmina frontal tipo bulldozer e torreta com metralhadora 7,62mm).

Engesa EE-11 Urutu do Corpo de Fuzileiros Navais da Marinha do Brasil,
em 1973. Notar os snorkel levantados.

Além do Exército e Marinha do Brasil que receberam respectivamente 217 e 6 (Corpo de Fuzileiros Navais), oram exportados para o Iraque (148), Dubai (132), Jordânia (82), Colômbia (56), Líbia (40), Venezuela (38), chile (37), Equador (32), Angola (24), Tunísia (18), Suriname (16), Bolívia (12), Paraguai (12), Gabão (11) e
Zimbabwe (7), lembrando que o usuário mais recente é o Senegal, que os adquiriu de Israel, o qual havia comprado um lote de 31 oriundos do Exército Chileno que foram modernizados pela empresa israelense Saymar Ltd em 2002. O EE-11 Urutu, compartilhando a maioria dos componentes mecânicos com o EE9 Cascavel, conta com a mesma simplicidade mecânica e mobilidade exemplar.

Rápido e silencioso, em terra ou na água, pode ser conduzido com facilidade, quase como um caminhão civil. Na sua configuração original, adotada pelo Exército Brasileiro, o EE-11 possui as seguintes dimensões: 6,15m de comprimento, 2,65m de largura e 2,20m de altura. Com um peso (vazio) de 11ton, podia atingir 95 km/h em estradas e 2,5 km/h em águas calmas. Nesses  primeiros carros, produzidos a partir de 1974, a tração na água se  dava apenas pela movimentação das seis rodas. Como esse sistema se mostrou insatisfatório, os veículos da primeira versão produzida para o Exército Brasileiro (M2) acabaram sendo marinizados, recebendo hélices e lemes, a exemplo da versão do Corpo de Fuzileiros Navais.

Os modelos EE-11 da Marinha do Brasil também eram identificados pelos tubos rebatíveis nos flancos da carroceria. Quando levantados, asseguravam o suprimento de ar aos tripulantes, funcionando como um snorkel para o motor, dando vazão aos gases do escapamento. Assim sendo, com esses equipamentos, o Urutu podia deslocar-se a uma velocidade de 8 km/h em águas agitadas e manobrar contra correntes marinhas, levando a tropa até o local escolhido para o desembarque. As versões do EE-11 para exportação também eram muito interessantes. O modelo mais curioso foi o “Uruvel”, o Urutu com torre de Cascavel. Inicialmente, tinha
a frente em quilha, como um barco, e uma torre inglesa Alvis com canhão de 76 mm,  porém, esse design diferenciado foi logo abandonado, pois não trouxe melhorias à navegabilidade, como era esperado.

EE-11 Urutu com Quilha

 Em seguida, foi montado um novo protótipo, com a torre nacional Engesa, o armamento de 90 mm do Cascavel e a frente padrão do Urutu. Denominado “Hydracobra”, chegou a participar de uma concorrência no Canadá e disputou uma licitação do Corpo de Fuzileiros Navais dos Estados Unidos, mas não foi escolhido. O primeiro contrato de exportação do “Uruvel” acabou sendo fechado com a Tunísia, que incorporou algumas unidades às suas forças armadas (Guarda Nacional).

O Hydracobra seria inicialmente oferecido em duas variantes principais, uma de assalto com um canhão de 90 mm e outra mais leve, com canhão de 25 mm. Posteriormente outras versões seriam desenvolvidas.

 

 

Avaliado severamente na Malásia, em 1981, outro “Uruvel”, conseguiu realizar tiro enquanto navegava. Como era algo inédito, o teste causou uma grande preocupação entre os engenheiros da Engesa, mas por fim, foi um sucesso. Sua blindagem também foi avaliada com tiros reais de armas leves (calibres 5,56mm e 7,62 mm), disparados a distâncias de 30m e 100m.

 

Na atualidade, o EE-11 Urutu, segue desempenhando um importante papel como veículo de transporte de tropas no Exército Brasileiro, inclusive sendo usado em missões de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) em diversas cidades brasileiras, onde o chamado “crime organizado” tem produzido sérios problemas para a população local e mostrando a incapacidade da área de segurança pública dos estados. O curioso é que com um grande atraso vai ser empregado como veículo policial no Brasil, fato este, que já ocorre há diversas décadas em países como Tunísia, Jordânia, Dubai, etc., e que desde 2010 tanto a Jordânia como a Tunísia o Urutu têm tido um papel de relevante importância no emprego em áreas urbanas, seja fruto da chamada Primavera Árabe em garantia da ordem interna até embates contra os integrantes do Estado Islâmico (ISIS/Daesh) como, por exemplo, o que ocorreu em 18 de dezembro de 2016, quando forças do ISIS/Daesh efetuaram um ataque terrorista contra turistas na localidade de Al-Karak, no sul do país. Este ataque provocou baixas entre civis, atacantes e a força policial que imediatamente conseguiu atuar com alguns veículos blindados, dentre eles alguns Urutus, na versão transporte de tropas, modificados para atuarem em áreas urbanas, onde receberam uma lâmina do tipo bulldozer na sua parte frontal e todo o controle hidráulico na parte lateral traseira do veículo, capaz de remover obstáculos em vias públicas, visto que dos 82 adquiridos, alguns o foram na versão antidistúrbios, os demais não, razão que levou a esta modificação.

EE-11 M7 Urutu da Força Policial da Jordânia, com a adaptação da lâmina frontal.
(Crédito da foto: Jordanian National Police).

Para um veículo concebido e produzido há mais de 40 anos, o EE-11 Urutu ainda é extremamente eficaz e operacional na atualidade, cuja produção foi encerrada em 1993, lembrando sim que possui algumas vulnerabilidades, porém estas podem ser sanadas sem maiores problemas ou grandes complicações técnicas pelos remanescentes da Base Industrial de Defesa Brasileira. Sem dúvida, o veículo blindado EE-11 Urutu foi o segundo mais expressivo produto produzido e amplamente melhorado em suas diversas versões pela ENGESA,
mantendo sua simplicidade e fácil manutenção, sendo o que melhor representou ao lado do EE-9 Cascavel, os anseios da Cavalaria Brasileira como um produto genuinamente nacional, que mesmo transcorridos mais de quatro décadas continua inabalável e íntegro em plena e eficaz atividade, combatendo ao lado de verdadeiros mitos da indústria estrangeira, ficando em nada a dever tática e operacionalmente nos campos de batalha, além de receber funções que nunca foram sequer pensadas e imaginadas pelos seus criadores, mas que acabam por nos impressionar pela versatilidade e eficiência com os resultados obtidos.

EE-11 M7 Urutu da Força Policial da Jordânia (Guarda Nacional) na versão
Uruvel com torre e canhão Engesa de 90 mm

O Exército Brasileiro como maior usuário do EE-11 Urutu na atualidade, parece não ter compreendido e assimilado as potencialidades deste projeto, sonhando em substituí-lo por outro de concepção e produção estrangeira, a custos estratosféricos, com inúmeros itens modernos que nos tornam a cada dia, mais dependentes de quem os produzem, gerando empregos e serviços além-mar, além de não atender em sua plenitude as demandas estratégicas e operacionais da Força Terrestre, no momento em que esta foi chamada a atuar na Garantia da Lei e da Ordem (GLO) em algumas grandes cidades do país.  Chegamos perto de perceber as necessidades em adaptações para estas finalidades, fruto de nossa experiência no Haiti, mas como esta missão chegou ao fim, voltamos a novamente seguir os manuais convencionais para atuarmos em áreas não  convencionais, sem percebermos que temos dois produtos – EE-9 Cascavel e EE-11 Urutu que podem muito bem preencher esta lacuna atendendo totalmente a necessidade tático-estratégica das Forças Armadas, seja na área urbana ou em qualquer terreno.

Um conjunto EE-11 Urutu para transporte de tropas e EE-9 Cascavel armado com metralhadora calibre 7,62mm no lugar de seu canhão de 90 mm seria uma dupla e tanto no combate ao dito crime organizado em áreas urbanas, visto que esta versão tem sido empregada em larga escala por unidades que dão apoio ao Novo Exército do Iraque na luta contra o Estado Islâmico (ISIS/Daesh) com resultados expressivos. (Para maiores informações sugiro a leitura do livro: ENGESA EE-9 CASCAVEL – 40 ANOS DE COMBATES 1977 – 2017 de minha autoria). Todavia, caso tivéssemos uma visão estratégica de longo prazo e vontade política, este dois blindados poderiam ainda estar em plena produção, com pequenas modificações técnicas, a um custo baixo, com um vasto mercado consumidor, gerando empregos, aprimorando conhecimentos e trazendo divisas ao país, na exportação, podendo equipará-lo, guardadas as devidas proporções e peculiaridades, aos veículos civis Toyota Land Cruise, que hoje são largamente empregados em praticamente todos os conflitos assimétricos que estão a ocorrer em diversas áreas do planeta, como uma plataforma extremamente eficaz e totalmente adaptável às necessidades de cada usuário nesses conflitos que estão a ocorrer neste conturbado século XXI.

 

Texto: Expedito Bastos da UFJF/Defesa

Edição Plano Brasil

10 Comentários

  1. Ótimo caminho para uma Força Nacional de Segurança, inclusive com pessoas egressas das Forças Armadas, deixando o caminho aberto para estes fazerem o trabalho de garantia da Lei e da Ordem.

  2. Uma força de ocupação nas favelas não vai resolver o problema da criminalidade. Enquanto houver desemprego e baixo s salários o tráfico continuará a recrutar jovens para suas fileiras. E o Norte e Nordeste vão continuar fornecendo mão de obra para eles.
    É enxugar gelo. Exército de ocupação nunca, em tempo algum, resolveu qualquer problema. Além do mais o gasto com a repressão é bem maior do que se gastaria com a implantação de uma política de distribuição de rendas. Ocorre que a “elite” apátrida brasileira não quer nem saber quando se fala em distribuir rendas.

    • Concordo, mas o erro de vocês esta justamente na metodologia “distribuir renda” quando o correto seria “gerar renda”
      E uma diferença monstruosa entre as duas, sendo que a primeira e baboseira ideológica falida e a segunda funciona.

  3. Esses jornalistas são uma piada! “Tanque de Guerra” KKKKKK São os mesmos que dizem que o AR-15 é arma de grosso calibre KKKKKKKKKKKK

    • “João Gabriel
      30 de Março de 2018 at 0:01

      Esses jornalistas são uma piada! “Tanque de Guerra” KKKKKK ”

      Mas é claro que eles estão corretos….

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