América Latina atônita pede que Colômbia mantenha os esforços pela paz

A América Latina lamentou a rejeição dos eleitores colombianos ao acordo de paz com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC), mas líderes regionais pediram que Bogotá continuasse os esforços para terminar com o mais longo conflito nas Américas.

Países da região se envolveram bastante na elaboração do plano para terminar com os 52 anos de conflito. Havana recebeu negociações de paz que duraram quatro anos, enquanto Chile, Cuba e Venezuela atuaram como avalistas e observadores. 

Da Venezuela, governada pela esquerda, ao Peru, comandando pela centro-direita, países lamentaram o resultado do referendo de domingo, quando o voto “não” ganhou por menos do que meio ponto percentual.

“Muito infelizmente, ontem uma minoria se expressou, devido a ataques dos meios de comunicação, guerra psicológica e guerra de propaganda”, disse a ministra do Exterior da Venezuela, Delcy Rodríguez, chamando a votação de “inacreditável”.

O presidente do Peru, Pedro Pablo Kuczynski, alertou que “será muito difícil renegociar” o acordo de paz.

Outros na região, incluindo os governos de centro-direita de Argentina e do Brasil, afirmaram que apoiariam a retomada do plano de paz, como os dois lados em guerra disseram que iriam.

“Consideramos que não se deve desistir da causa da paz no país. Nesse sentido, encorajamos o governo, as Farc e todas as forças políticas da Colômbia a prosseguirem na busca de uma solução pacífica para esse conflito de meio século que tanto sofrimento causou ao povo colombiano”, disse o Ministério das Relações Exteriores brasileiro em comunicado, se dizendo disposto a ajudar.

Colombianos que votaram contra o acordo apresentado pelo presidente de centro-direita Juan Manuel Santos afirmam que ele era muito leniente com os rebeldes das Farc ao permitir que eles se reintegrassem à sociedade, formassem um partido político e não cumprissem pena da prisão.

Os estrangeiros celebram o acordo de paz sem entender as suas implicações, dizem eles.

O conflito matou cerca de 220 mil pessoas, expulsou milhões de suas casas e viu atrocidades de todos os lados.

No entanto, numa região bastante polarizada politicamente, houve os que celebraram a derrota do acordo.

Na vizinha Venezuela, muitos na oposição estavam chocados com o acordo, que segundo eles dava impunidade às Farc e dava ao presidente Nicolás Maduro e ao líder de Cuba, Raúl Castro, uma vitória política.

“Se as conversas entre o governo da Colômbia e a guerrilha narcoterrorista forem retomadas, elas devem excluir os cubanos do processo”, afirmou Henry Ramos, presidente da Congresso venezuelano.

(Reportagem de Alexandra Ulmer e Diego Ore em Caracas, Mitra Taj em Lima, Caroline Stauffer em Buenos Aires, Lisandra Paraguassu em Brasília, Alexandra Valencia em Quito, Adriana Barrera e Anahi Rama em Cidade do México).

Edição: Konner/Plano Brasil

Fonte: Reuters

Colômbia entra em terreno incerto após plebiscito

Após “NÃO” do povo a acordo, governo e Farc tentam salvar processo de paz. Apelo internacional é para que curso seja mantido, mas resultado mostra que feridas de cinco décadas de guerra ainda estão longe de ser curadas.

Apesar de o presidente colombiano, Juan Manuel Santos, e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) garantirem que o compromisso com a paz será respeitado, e dos apelos internacionais para que esse curso seja mantido, o resultado do plebiscito deste domingo (02/10) precipitou o país sul-americano em terreno incerto.

E mostrou que as feridas de mais de cinco décadas de conflito ainda estão longe de ser cicatrizadas.

O “não” teve uma maioria apertada: apenas 50,22% dos votantes se manifestaram contrários à implementação do acordo de paz recém-assinado. Além disso, mais de um terço dos 34 milhões de colombianos com direito de voto sequer foi às urnas.

Analistas comparam a surpresa com a decisão popular na Colômbia à causada pela opção dos eleitores britânicos, em junho último, a favor da saída do país da União Europeia, o assim chamado Brexit. Além do elevado nível de abstenção, em ambos os casos a voz das urnas acabou contrariando o que indicavam as principais pesquisas de opinião.

Rejeição à “impunidade”

Após 52 anos de guerra civil e mais de 220 mil mortos, o pacto de paz selado em Havana, resultado de quatro anos de negociações, oferecia aos combatentes rebeldes a possibilidade de entregarem as armas à ONU, confessar seus crimes e formar um partido político baseado na ideologia marxista.

Agora, os guerrilheiros que planejavam se reintegrar à sociedade colombiana como civis se deparam com um futuro incerto. Também é difícil prever o que acontecerá com a guerra civil em si, que ambos os lados declararam encerrada em 26 de setembro, ao assinar o acordo de paz com o famoso “balígrafo” – símbolo da transição dos projéteis para a educação no país.

Embora em grande parte das regiões de conflito o “sim” tenha predominado, no centro do país, região da capital e da metrópole econômica Medellín, venceu o voto contrário. A rejeição partiu, sobretudo, dos que consideram o acordo leniente demais para com os rebeldes, oferecendo-lhes o que muitos tacharam de “impunidade”.

Tons conciliadores em Bogotá

No entanto, logo em seguida ao choque inicial, o próprio presidente Santos, que não era obrigado por lei a realizar um plebiscito, se mostrou disposto a buscar alternativas. Admitindo não haver um plano B para o fracasso da consulta popular, ele propôs que se convoquem todas as forças políticas nacionais para buscar “espaços de diálogo”.

O convite se dirige, sobretudo ao partido de direita radical Centro Democrático, do Álvaro Uribe, que liderou a campanha pelo “não”. O ex-presidente respondeu que deseja “contribuir para um grande pacto nacional” que corrija os “erros” do acordo.

As Farc igualmente adotaram um tom conciliador, assegurando, em comunicado oficial, que manterão o cessar-fogo bilateral e definitivo. Seu comandante-chefe, Rodrigo Londoño (“Timochenco”), acrescentou que o grupo guerrilheiro “mantém sua vontade de paz”, e quer seguir usando “somente a palavra como arma de construção para o futuro”.

Segundo fontes oficiais, apesar de ter colocado seu cargo à disposição do presidente, o chefe da equipe negociadora do acordo, Humberto De la Calle, viajará para Havana com o alto comissário de Paz, Sergio Jaramillo. Juan Manuel Santos informou que a finalidade é “manter informados os negociadores das Farc” sobre o diálogo político que ele pretende iniciar com todos os partidos políticos colombianos.

Decepção e apoio internacional

As reações internacionais foram basicamente de decepção com a rejeição em plebiscito – acompanhada pela esperança de que, ainda assim, o curso pacificador se mantenha.

A ONG de direitos humanos Anistia Internacional considerou o resultado uma “oportunidade perdida”. O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, enviou seu encarregado especial Jean Arnault nesta segunda-feira à capital cubana, para assistir as delegações de Bogotá e das Farc na busca de uma solução.

Uma semana atrás, Ban estivera presente à assinatura do acordo de paz. “Em Cartagena, testemunhei o profundo desejo dos colombianos por um fim da violência. Conto que eles continuarão, até alcançarem uma paz segura e duradoura”, declarou o político sul-coreano.

A porta-voz das Relações Exteriores da Comissão Europeia, Maja Kocijancic, declarou, em coletiva de imprensa: “Neste momento respeitamos o voto dos colombianos, como também respeitaremos as decisões que sejam tomadas adiante.”

Está previsto que a alta representante da UE para Política Externa, Federica Mogherini, dê uma declaração em breve, após falar com o presidente Santos e. Em seguida à assinatura do acordo de paz, a UE retirara as Farc de sua lista de organizações terroristas.

Possíveis efeitos econômicos negativos

O ministro alemão do Exterior, Frank-Walter Steinmeier, falou de uma “péssima surpresa”. “Os responsáveis políticos [da Colômbia] têm agora o dever para com as vítimas e suas famílias que a esperança de paz apenas despontada não volte a ser destruída.”

“O plebiscito está perdido, mesmo assim espero que se consiga ganhar a paz”, concluiu o social-democrata alemão. Seu colega norueguês, Borge Brende, desabafou: “Estou desapontado, há tanto em jogo.” Oslo já enviou um grupo de diplomatas a Cuba, para também contribuir na busca de soluções.

Em comunicado publicado no site do Ministério russo do Exterior, Moscou manifestou apoio ao país sul-americano: “Reiteramos nossa invariável postura a favor de uma solução política do conflito armado na Colômbia, em prol do progresso social e econômico desta nação amiga da América Latina.”

Da mesma forma, o porta-voz do Departamento de Estado americano, John Kirby, prometeu o respaldo de seu país: “A Colômbia pode contar com o apoio continuado dos Estados Unidos, enquanto segue buscando a paz democrática e a prosperidade para todos os colombianos.”

A decisão dos eleitores colombianos poderá ter também consequências econômicas para o país. A agência de classificação de risco Moody’s considera o resultado “negativo” para o perfil de crédito da Colômbia – atualmente cotado como “Baa2” –, pois provavelmente “minará a capacidade do governo de aprovar outras reformas”.

Antes, as agências concorrentes Fitch e Standard & Poor’s haviam negado que o resultado do plebiscito teria impacto imediato sobre sua avaliação do país, classificado por ambas como “BBB com perspectiva negativa”.

AV/dpa/efe/afp/rtr

Edição: Konner/Plano Brasil

Fonte: DW

“Colômbia é uma sociedade totalmente traumatizada”

Pesquisadora Josefina Echavarría diz que resultado do plebiscito não é racionalmente explicável: há um conflito profundo no país, marcado por raiva e luto. Porém, afirma, a paz já pode ser sentida no quotidiano.

Para muitos, o resultado das urnas permanece inacreditável: por uma maioria de apenas 0,22 ponto percentual, os colombianos rejeitaram neste Domingo (02/10), em plebiscito, a implementação do acordo de paz entre Bogotá e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc).

Na prática, portanto, após penosas negociações e a recente assinatura do documento, o povo disse “não” à chance de dar fim a 52 anos de um conflito interno que já custou centenas de milhares de vidas e consome recursos preciosos.

A DW entrevistou a pesquisadora da paz Josefina Echavarría, nascida na Colômbia, que trabalha na Universidade de Innsbruck, na Áustria. Para ela, o profundo trauma da sociedade colombiana explica, em parte, a decisão popular, difícil de justificar com argumentos racionais.

Mas nem tudo está perdido: há iniciativas para implementar o acordo por outros meios. E o processo de paz viu nascer várias pequenas iniciativas de pacificação, em localidades e junto às famílias, que deverão sobreviver ao resultado das urnas.

“Espero que esses movimentos não sejam afetados pela grande rejeição ao acordo de paz, em nível nacional”, torce Echavarría.

DW: O acordo de paz entre as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) e o governo da Colômbia foi negociado a duras penas. Apesar disso, diversos grupos faziam campanha contrária. Como se explica isso?

Josefina Echavarría: Havia no país uma oposição, liderada pelo ex-presidente Álvaro Uribe, que movimentava os ânimos contra o governo. Essa posição fundamental, em princípio, nada tinha a ver com as negociações de paz. Além disso, uma série de grupos menores simplesmente consideravam injusto o acordo de paz.

Mas esse conflito dura mais de 50 anos, custou mais de 220 mil vidas. Depois de todo o sofrimento que ele tem causado na Colômbia, como alguém pode, a sério, ser contra um acordo de paz?

Não acho que esse resultado seja racionalmente explicável. Para compreendê-lo, é preciso considerar os diferentes estados de espírito entre os diversos grupos colombianos. A Colômbia é uma sociedade totalmente traumatizada, há tanta raiva, tanto luto no país. Muitos não se sentem escutados. E está claro que o governo e todos os que eram a favor do acordo subestimaram o tamanho desse grupo.

O que o resultado do plebiscito significa para o processo de paz colombiano?

Já há tentativas para dar forma de lei ao acordo por outros caminhos. É também preciso enfatizar: graças a esse processo de paz, nos últimos anos foram fundadas numerosas iniciativas, a maioria trabalhando em nível local, que deram grande impulso a todo o processo. Justamente por atuarem nas pequenas localidades e, especificamente, com as famílias locais, eu espero que esses movimentos não sejam afetados pela grande rejeição ao acordo, em nível nacional.

A senhora acaba de voltar da Colômbia. Como se anuncia o futuro para as próximas gerações?

Acho que depende inteiramente de como os colombianos se comportarão após essa consulta popular. No momento, todos só estão olhando para esse resultado eleitoral. Vê-se nas urnas que a população estava totalmente dividida. Isso significa que há um conflito profundo na nação. Os colombianos precisam olhar para si e se perguntar: o que esse resultado representa agora, para o dia a dia no país? Acima de tudo, eles precisam aprender, ainda mais, a solucionar todos os seus conflitos de forma democrática.

Ainda há esperança para esse país sul-americano?

Acho que há muitas pequenas ilhas de esperança. A Colômbia é um país marcado por grandes disparidades. Há, por exemplo, em acentuado abismo entre as condições de vida no campo e nas grandes cidades. E, apesar dessas diferenças, dessa polarização da sociedade, sente-se, já agora, a paz em muitíssimos setores da vida quotidiana.

  • Josefina Echavarría trabalha como pesquisadora da ‘Paz’ na Universidade de Innsbruck.

Edição: Konner/Plano Brasil

Fonte: DW

3 Comentários

  1. Bora prá selva! Cambada,terrorista tem vez não se entrar na política vai se igual aqui no Brasil vão roubar até os centavos e leva Dilma e Lula.

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