Guerra ao Terror: A discreta guerra de Obama na África

Tropas_Chade
TROPAS DO CHADE MARCHAM EM EXERCÍCIO CONJUNTO COM O EXÉRCITO AMERICANO. FOTO: JOE PENNEY/REUTERS

Fora do radar, ações militares dos EUA na Líbia e na Somália tentam conter o avanço de radicais islâmicos sobre os chamados ‘Estados falidos’

  • João Paulo Charleaux

Os EUA mataram pelo menos 150 pessoas num ataque aéreo realizado contra um campo de treinamento da milícia radical islâmica Al-Shabaab, ao norte de Mogadício, capital da Somália, no sábado (5). No momento do ataque, os guerrilheiros participavam de uma cerimônia de formatura. Foi o maior ataque militar americano em número de mortos no país em 15 anos.

Um mês antes, a aviação dos EUA havia bombardeado outro alvo semelhante, dessa vez na cidade de Sabratha, na costa noroeste da Líbia, matando Noureddine Chouchane. Ele era apontado como idealizador de dois atentados na Tunísia em 2015: o primeiro, em março, deixou 22 mortos num museu da capital, Túnis; o segundo, em junho, matou 38 no balneário de Sousse. Antes de morrer, Chouchane teria recrutado mais de 1.500 militantes para o Estado Islâmico na África.

As duas ações, realizadas num intervalo de menos de um mês, mostram como o Comando dos EUA para a África está ampliando a perseguição ao Estado Islâmico e a grupos radicais como o Al-Shabaab – filial africana da Al-Qaeda – num continente situado na periferia do interesse da grande mídia e da opinião pública.

Estados falidos, milícias prósperas

ESTADO ISLÂMICO NUM SUPOSTO VÍDEO DE EXECUÇÃO DE CRISTÃOS NA LÍBIA. FOTO: SOCIAL MEDIA/REUTERS
ESTADO ISLÂMICO NUM SUPOSTO VÍDEO DE EXECUÇÃO DE CRISTÃOS NA LÍBIA. FOTO: SOCIAL MEDIA/REUTERS

Líbia e Somália viraram terreno fértil para o terrorismo. Os dois países vivem vácuos de poder.

A Somália é considerado um “Estado falido” desde 1991, quando a ditadura de Siad Barre foi substituída pela poder dos chamados “senhores da guerra”, que fatiaram o controle entre pequenos grupos autônomos.

A Líbia viveu processo semelhante depois da deposição e morte do ditador Muamar Kadafi, em 2011. Hoje, dois grandes blocos disputam o poder, um deles tendo a capital, Trípoli, como base, e outro na cidade líbia de Trobuk. Desde dezembro, a ONU tenta emplacar um acordo de paz com o envio do diplomata alemão Martin Kobler.

A desintegração das instituições tanto na Somália quanto na Líbia favoreceu a penetração de grupos radicais.

"6.500
É o número estimado de combatentes 
do Estado Islâmico na Líbia hoje, de 
acordo com o Departamento de Defesa dos EUA"

O processo de desintegração e penetração dos grupos terroristas é semelhante ao ocorrido em 2011 na Síria, onde uma guerra civil entre o governo e grupos dissidentes locais transformou o país num terreno fértil para o Estado Islâmico, cuja ação, até então, estava restrita apenas ao vizinho Iraque.

Guerra sem fronteiras

 OBAMA DISCURSA A MILITARES AMERICANOS NA BASE AÉREA DE TAMPA, NA FLÓRIDA. FOTO: LARRY DOWNING/REUTERS
OBAMA DISCURSA A MILITARES AMERICANOS NA BASE AÉREA DE TAMPA, NA FLÓRIDA. FOTO: LARRY DOWNING/REUTERS

O Estado Islâmico não é um movimento guerrilheiro circunscrito às fronteiras de um país ou mesmo de uma região. Ele teve início no Iraque, migrou para a Síria e avança na Líbia. O grupo tem a pretensão manifesta de estender sobre o mundo um califado – regime teocrático com base no islã, liderado por uma autoridade religiosa, o califa.

Conforme o grupo avança, avança também em seu encalço uma caçada cujas origens remontam à “guerra ao terror” lançada pelo presidente americano George W. Bush, após os atentados de 11 de setembro de 2001.

Nesse sentido, Obama deu continuidade à perseguição aos terroristas iniciada na era Bush. Se, naquela época, os EUA desembarcaram tropas no Afeganistão e no Paquistão em busca de membros da Al-Qaeda, Obama levou agora a países da África como a Líbia, a Somália, o Djibuti e o Iêmen os bombardeios aéreos realizados – principalmente, mas não apenas – por aviões não tripulados, os chamados drones. Tanto Bush quanto Obama têm como pretexto debelar o terror.

“Nós continuaremos usando todas 
as ferramentas disponíveis para 
eliminar o Estado Islâmico onde 
quer que ele esteja” 
Barack Obama Presidente americano, 
ao se dirigir ao Conselho Nacional de
 Segurança dos EUA, em 25 de fevereiro
 
“Onde houver uma oportunidade de conduzir 
operações contra o Estado Islâmico, [uma oportunidade]
 de interrompê-los nesse ponto sem minar o processo 
político, lá nós estaremos”
General Joseph F. Dunford Jr.
Presidente do Comando do Estado Maior americano

Bombardeios, sozinhos, não resolvem

COLUNA DE FUMAÇA SE ERGUE APÓS BOMBARDEIO AÉREO NA CIDADE LÍBIA DE BENGHAZI. FOTO: STRINGER/REUTERS
COLUNA DE FUMAÇA SE ERGUE APÓS BOMBARDEIO AÉREO NA CIDADE LÍBIA DE BENGHAZI. FOTO: STRINGER/REUTERS

O Nexo ouviu EJ Hogendoor, vice-diretor do Programa de África do Crisis Group, um centro de estudo que monitora e analisa os principais conflitos armados e crises de segurança no mundo.

Hogendoor considera que “esses bombardeios aéreos podem ser uma ação efetiva para conter a ação de grupos terroristas, mas não resolvem os problemas de fundo. A solução para a questão depende da capacidade das forças somalis enfrentarem esses grupos em terreno. O problema é como investir milhões de dólares na cooperação com governos ineficazes e corruptos”.

Os americanos sabem da dependência dos atores locais. “Tudo o que nós queríamos é contar com um governo na Líbia com o qual pudéssemos trabalhar e do qual pudéssemos receber consentimento para realizar operações militares”, disse ao Congresso americano o diretor nacional de Inteligência, James R. Clapper, em fevereiro.

Mas nada disso impede Obama de ordenar os ataques. O jornal americano “The New York Times” publicou na terça-feira (8) uma reportagem em que afirma ter tido acesso a informações que indicam que o Pentágono apresentou a Obama um plano para realizar ataques aéreos contra até 40 alvos em quatro regiões da Líbia (campos de treinamento, centros de comando, depósitos de munição).

O esforço não é isolado. Reino Unido, França e Itália também enviaram forças especiais e fizeram operações de reconhecimento e inteligência no norte da África recentemente.

Os ingleses anunciaram este ano o envio de pelo menos 20 instrutores militares para ajudar na preparação de tropas tunisianas que agem na fronteira com a Líbia. O governo tunisiano ergueu um muro que já cobre quase metade da linha de fronteira com o território líbio.

Claudia Gazzini, analista sênior para a Líbia no Crisis Group, disse aoNexo que “Somália e Líbia têm semelhanças no papel, enquanto ‘Estados falidos’, mas guardam diferenças importantes”. Segundo ela, a violência na Líbia ainda é muito menor que na Somália. Claudia vê, em ambos casos, uma estratégia americana de “combinar bombardeios aéreos com forte apoio às forças locais”.

Quem é quem no terror da África

ESTADO ISLÂMICO

O grupo teve origem no Iraque, como um braço da Al-Qaeda, no início do ano 2000, mas se firmou a partir de 2011, depois de migrar para a Síria, onde o início de uma guerra civil tornou o terreno favorável para a ação de pequenos grupos rebeldes. Foi responsável por atentados de grande magnitude, como o que deixou 130 mortos em Paris, em novembro de 2015.

AL-SHABAAB

É uma filial da Al-Qaeda, com ação na Somália, Uganda, Nigéria, Quênia e Iêmen. Foi responsável por grandes atentados como o que deixou quase 70 mortos num shopping de Nairóbi, em 2013. Defende o estabelecimento de governos teocráticos regidos pela sharia, a interpretação literal e inflexível do Alcorão, o livro sagrado dos muçulmanos.

Fonte: NEXO

 

 

4 Comentários

  1. Terrorista Supremo manda suas milicias terroristas islamicas terrorizar Africa, naqueles paises mais receptivos ao BRICS em particular investimentos chineses Depois manda soldados ianques para construirem bases militares nesses mesmos paises. Tudo parte da Guerra contra o BRICS e tentative de preserver o privilegio exorbitante que lhe e concedido pelo dolar como moeda internacional.

  2. Estados falidos…
    Pois… A Líbia era um Estado Nacional próspero. Hoje é o quê?

    Revoluções “coloridas” em nações ricas em petróleo e gás, ou que representem interesse geoestratégico evidente.

    É a Rússia, ou a China, os patrocinadores de tais revoluções?
    Não. Não o são.

    Use o seu cérebro e ligue os pontos.

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