Estratégia da Otan lembra ataques à ex-Iugoslávia


Depois das infraestruturas militares, os aviões passaram a destruir as consideradas de interesse militar, como pontes, estradas e armazéns portuários.

Achille Lollo
de Roma (Itália)

Nenhum jornal, TV, rádio ou revista europeia deu destaque ao bombardeio da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) à redação da TV Al-Jamairiya em Trípoli, capital da Líbia, que causou a morte de três jornalistas e a internação de 15 pessoas em estado gravíssimo. Devido ao fato de se tratar de jornalistas da TV oficial do governo de Muamar Kadafi, não houve nenhuma moção de solidariedade. Ao mesmo tempo, os conflitos no seio do Conselho Nacional de Transição (CNT) explodiram e o
chefe militar dos rebeldes, Abdel Fattah Yomes, foi executado como se fosse um inimigo.

Ao se analisar os planos operacionais das missões dos caças da Otan, fica evidente que os limites impostos pela ONU por meio da resolução sobre a criação de uma No-Fly-Zone foram literalmente desrespeitados, violando, assim, o “status pacificador” do Conselho de Segurança do organismo. Uma realidade que se deteriorou a partir de 30 junho, quando o presidente francês Nicolas Sarkozy e o primeiro-ministro britânico David Cameron conseguiram impor que o comando da Otan tomasse outras iniciativas, como o planejamento dos bombardeios contra todos os objetivos que podiam sustentar a resistência do exército de Kadafi.

Dessa forma, a resolução das Nações Unidas que previa o uso dos aviões da Otan apenas para impedir que os aviões da Força Aérea Líbia ou as colunas de blindados do exército de Kadafi atacassem os rebeldes em Bengasi ou em outras cidades controladas pelo CNT (Conselho Nacional de Transição) se tornou, na realidade, o justificativo legal para promover uma guerra de aniquilamento seletivo com o objetivo de provocar a queda do governo líbio e, sobretudo, a morte de Kadafi e seus dois filhos

Mesmo roteiro

Isso faz lembrar a guerra de agressão que a Otan e os EUA promoveram contra a ex-Iugoslávia para “proteger a população civil do Kosovo”. A semelhança da progressão estratégica dos ataques aéreos demonstra que o roteiro dos bombardeios é igual. Por exemplo, depois das infraestruturas militares (casernas, campos de aviação, paióis de munições, centros de comunicações, oficinas etc.), os aviões passaram a destruir as infraestruturas consideradas de interesse militar, tais como pontes, estradas, armazéns portuários etc. Uma estratégia que ainda não deu resultados, apesar das centenas de missões de bombardeios que diariamente descarregam bombas e foguetes contra objetivos civis considerados “de interesse militar” na própria capital Trípoli.

Foi sob essa lógica assassina que o comando da Otan – da mesma forma como aconteceu na Iugoslávia – planejou o bombardeio da Al-Jamairiya no momento em que os jornalistas estavam preparando o noticiário. Por isso, o diretor da TV, Khaled Bazilia, em uma nota, disse: “Esse bombardeio foi um ato de terrorismo internacional que evidencia ainda mais a contínua violação das resoluções da ONU”.

Em resposta, o porta-voz do comando da Otan distribuiu uma nota explicando que o ataque aéreo contra a Al- Jamairiya, “na realidade, fazia parte de uma incursão contra três centros de comunicação via-satélite gerenciados pela TV líbia que eram utilizados pelo coronel Kadafi para amedrontar as populações e para promover e incitar a realização de atos de violência contra as populações civis”.

Nenhum jornal europeu, sequer os progressistas, contestou tal declaração, mesmo sabendo que o ataque foi planejado para impedir que o mundo saiba o que realmente está acontecendo na Líbia no momento em que o “exército rebelde” do CNT entrou em crise, tornando-se uma representação virtual da TV Al Jazeera sustentada pelos serviços secretos militares de França e da Inglaterra.

A luta no seio do CNT

Depois da TV Al-Jamairiya ter anunciado que na capital dos rebeldes, Bengasi, houve combates no bairro em que se encontram os escritórios do Conselho Nacional de Transição, o porta-voz do CNT, Mahmoud Shammam, apareceu na Al Jazeera para declarar que “houve uma dura batalha aqui em Bengasi, que durou muitas horas porque os homens de Kadafi estavam equipados com armas pesadas. Perdemos quatros homens”.

Logo em seguida – e não foi casual – os aviões da Otan foram destruir a TV Al-Jamairiya, o que não impediu a divulgação de que, em Bengasi, as hostilidades no seio do CNT passaram das palavras às balas, provocando, em 28 de julho, o “fuzilamento” do próprio comandante em chefe, Abndel Fatah Younis, em Marsa el-Brega. Inicialmente, Shammam afirmou, na TV Al Jazeera, que Younis havia sido assassinado por capangas de Kadafi. Por isso ele dissera que o que ocorrera era um combate contra partidários de Kadafi.

A seguir, quando as evidências demonstravam o contrário, apareceram duas versões sobre o fuzilamento do chefe militar do CNT. A primeira foi veiculada pelo ministro das Finanças e do Petróleo, Ali Tarhouni, segundo o qual o assassinato de Younis foi realizado por um grupo de militares do próprio CNT que voltavam da frente de batalha onde teriam sofrido muitas baixas. Portanto, o ministro deu a entender que o assassinato, na realidade, teria sido uma espécie de ajustamento de contas devido ao fato de Abndel Fatah Younis ter provocado o aniquilamento desse grupo de combatentes.
A segunda versão revela que “Abndel Fatah Younis havia sido convocado em Bengasi para prestar declarações a quatro magistrados sobre questões de âmbito militar. Um grupo de combatentes que voltava da frente foi encarregado de escoltá-lo. Porém, os soldados e os suboficiais desse grupo resolveram fuzilar Younis e abandonar seu corpo nos arredores de Bengasi. Apenas o comandante deles foi preso, os outros conseguiram fugir”.

Apoio secreto

É evidente que não se fuzila um homem com mais de cem balas somente porque foi convocado por quatro magistrados e sem nem saber o verdadeiro motivo. A verdade é que no seio do CNT começou a luta interna entre grupos que, por um lado, devem responder às exigências “financeiras” dos chefes de clã tribais de Cirenaica, e, por outro, devem ganhar a confiança dos emissários dos serviços secretos europeus em função da formação de um futuro governo de transição.

Segundo algumas fontes confidenciais, o ex-ministro da Segurança de Kadafi, Abndel Fatah Younis, negociou o apoio do serviço secreto britânico para ser apresentado aos homens do CNT como o “homem de Londres” e, por isso, recebeu a chefia das operações militares, tornando-se o número dois do CNT. É preciso lembrar que o chefe político dos rebeldes, Mustafá Abdul Jalil, é um peão da França, enquanto o ministro das Finanças e do Petróleo, Ali Tarhouni, é intimamente ligado aos EUA.

As mesmas fontes indicam que há também muitas dúvidas sobre a notícia de que Younis deveria encontrar os magistrados por ter sido acusado de manter relações com o grupo de Kadafi. O que é certo é que, com sua morte, fica reduzido o poder dos “ex-oficiais de Kadafi” que, desde maio, praticamente controlam grande parte do CNT.

Nesse contexto, surgiu outra notícia que pegou de surpresa até o comando da Otan. O porta-voz do governo líbio, Mussa Ibrahim, revelou à CNN que “entre a Líbia e os Estados Unidos, houve contatos, mas nenhuma pré-condição. Foi dado um primeiro passo e mais ações desse tipo serão bem-vindas, visto que o governo da Líbia não pretende ficar amarrado ao passado. Estamos prontos para discutir propostas, de forma que não morra mais gente”.

O que parece é que as negociações começaram em separado com os EUA e sem a participação dos aliados da Otan. Diante disso, fica a pergunta: será que para tais negociações chegarem a resultados objetivos Abndel Fatah Younis era demais?

Achille Lollo, jornalista italiano, é editor do programa de TV “Quadrante

Fonte: Brasil de Fato via, Patria Latina

7 Comentários

  1. Os “rebeldes” estão se matando para por a mão na grana roubada da Líbia…
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    ASSALTO À MÃO ARMADA EM TRÍPOLI
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    Rede Voltaire | Roma (Itália) | 29 de Julho de 2011
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    O que faria se um banco, no qual teria depositado 100 000 euros para os fazer render, lhe comunicasse que no espaço de um ano o valor do seu depósito estaria reduzido a menos de 2 000 euros ?
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    Isso foi o que aconteceu na Líbia, segundo uma pesquisa do Wall Street Journal [1]. Depois dos EUA e a União Europeia terem revocado o embargo em 2004, afluíram para a Líbia dezenas de bancos e instituições financeiras estadunidenses e europeias. Dentre as quais a Goldman Sachs, um dos maiores bancos de investimentos do mundo, cuja sede se encontra em New York.
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    Na primeira metade do ano 2008, a Autoridade líbia para o investimento confiou-lhe (a Goldman Sachs) 1300 milhões de dólares em fundos soberanos (capital que o Estado investe no estrangeiro).
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    O banco Goldman Sachs investiu-os num conjunto de seis empresas : a Citigroup Inc. dos EUA, o banco italiano Unicredit e o banco espanhol Santander, a companhia de seguros alemã Allianz, a fornecedora de energia francesa Électricité de France e a italiana Eni.
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    Um ano depois, a Goldman Sachs comunicou á Autoridade líbia que, por causa da crise financeira, os fundos líbios tinham perdido 98 % do seu valor, sendo que os 1 300 milhões ficaram reduzidos a 25 milhões de dólares. Furiosos, os responsáveis da Autoridade líbia convocaram em Tripoli o gerente da Goldman Sachs – Norte de África.
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    O encontro foi turbulento e resultou na evacuação precipitada de Tripoli dos empregados do banco, com receio de serem presos.
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    Visto que a Líbia ameaçava intentar um processo judicial, comprometendo a reputação do banco aos olhos dos investidores, Goldman Sachs ofereceu indemnizações na forma de acções do próprio banco.
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    Os líbios justamente desconfiados, não assinaram o acordo. Restava assim aberta a possibilidade da Autoridade líbia processar a Goldman Sachs.
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    Vários casos semelhantes, de «má administração do capital líbio», foram trazidos á tona num relatório publicado pelo New York Times [2].
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    Por exemplo, a empresa Permal – unidade de Legg Mason, uma das principais empresas de gestão de investimentos, cuja sede se encontra em Baltimore – administrou 300 milhões de dólares em fundos soberanos líbios, os quais perderam 40% do seu valor entre Janeiro 2009 e Setembro 2010. Em compensação, a Permal resgatou 27 milhões de dólares para as suas prestações.
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    A mesma coisa aconteceu com bancos e instituições financeiras, como a holandesa Palldyne, a francesa BNP Paribas, a britânica HSBC e o Crédit Suisse. A Autoridade líbia ameaçava processar judicialmente e internacionalmente estas entidades, estragando assim a imagem e reputação destes «prestigiosos» organismos financeiros.
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    Tudo se resolveu de forma feliz quando, no passado mês de Fevereiro, os EUA e a União europeia «congelaram» o fundo soberano líbio. A sua «supervisão» foi confiada a estes mesmos bancos e instituições financeiras, que anteriormente os tinham gerido de forma excelente.
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    Do roubo passou-se ao assalto á mão armada quando a guerra teve início em Março. Protegidos pelas bombas da NATO, a HSBC e outros bancos de investimento chegaram a Benghazi para criar o novo « Central Bank of Libya », que lhes permitirá no futuro gerir os fundos soberanos líbios «congelados» bem como a riqueza obtido pela exploração de petróleo.
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    Desta vez, sem dúvida, obtendo um forte e grande rendimento.
    Manlio Dinucci
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    Tradução
    David Lopes

  2. Deve se ter muito cuidado com a mídia,a liberdade de expressão só é boa quando favorece os poderosos,quando e contrária e chamada de órgãos de manipulação!

  3. O mundo se revoltou contra a ditadura de Kadafi. Mas acho que a OTAN esta se mostrando muito pior que ele. Logo estarão matando crianças líbias com a desculpa que estes poderão se tornar partidários de Kadafi qdo crescerem.

  4. Senhores, kadafhi não vai sair do poder por nada!
    daqui a pouco os aviões da otan vão se retirar e vai continuar tudo igual, só que com uma líbia muito mais maltratada e destruida pelos bombardeios… QUEM SOFRE COM ISSO TUDO É O POVO LÍBIO!!!

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