A descoberta do mundo

http://chocolatesemcacau.files.wordpress.com/2010/11/l_o_pensador.jpgPor NELSON DE SÁ

O Brasil carece de uma rede vibrante de “think tanks”, os centros de pensamento que subsidiam e ajudam a direcionar a política externa nos EUA, na Europa ou na China. Os mais reconhecidos por aqui, Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), FGV (Fundação Getúlio Vargas) e Cebri (Centro Brasileiro de Relações Internacionais), intervêm com timidez no debate público e na mídia –em geral, por meio de opiniões individuais de seus integrantes, não por diagnósticos institucionais.

As ferramentas de comunicação dos laboratórios de ideias nacionais são rudimentares. Além disso, eles têm pouca ressonância no governo, ao contrário do que se observa, por exemplo, na China.

O ex-chanceler Celso Amorim diz que não há “influência diretamente perceptível dos nossos embrionários ‘think tanks'” na política externa. Relata ter “recorrido incidentalmente ao Ipea”, em negociações comerciais, e “mantido conversas com a FGV, que tem potencial para funcionar como um laboratório de idéias”. Nota que tem ªdificuldade até para encontrar uma tradução adequada para a expressão ‘think tank'”.

Matias Spektor, ex-pesquisador do Council on Foreign Relations (CFR), o mais influente dos EUA, e hoje coordenador do Centro de Relações Internacionais da FGV, no Rio, faz coro. “A caracterização ‘think tank’ ainda é muito incipiente no Brasil.” Ele elogia o Ipea, que “é do governo, mas faz pesquisa de interesse público e promove o debate”, mas cobra mais. “Há poucos ‘think tanks’. Isso precisa mudar. Aquilo que acontece no mundo afeta o Brasil cada vez mais, e vice-versa.”

TRADIÇÃO ENDOGENISTA

Marcio Pochmann, presidente do Ipea, frisa que o instituto criou há três anos uma divisão de relações internacionais e ampliou seus quadros. Segundo ele, o país “tem tradição muito endogenista e só agora começa a mudar”.

Não só o Brasil, aliás. Nas últimas décadas, “FMI e Banco Mundial orientavam [a política externa], mas agora há uma disputa de conhecimento”, diz Pochmann, citando os encontros de “think tanks” dos Brics realizados nos últimos dois anos, em Pequim e Brasília, nos quais o Ipea representou o Brasil.

O ex-chanceler Luiz Felipe Lampreia, que criou e ainda é a voz mais influente do Cebri, diz que “só com o tempo” os “think tanks” brasileiros terão o peso dos congêneres dos EUA e outros países. Ele lembra que o CFR, por exemplo, foi criado pela “elite da costa leste, preocupada com o papel dos EUA depois da Primeira Guerra”, quando o país despontou como grande potência.

O ex-ministro do Desenvolvimento Sergio Amaral, criador e diretor do Centro de Estudos Americanos na Faap (Fundação Armando Alvares Penteado), em São Paulo, acrescenta que a “demanda por uma informação mais ampla e de melhor qualidade sobre a questão internacional começa a surgir agora”.
Amaral lembra o chiste com que abria palestras como embaixador no exterior: “Vocês certamente sabem que o Brasil foi descoberto em 1500, mas talvez não saibam que ele só descobriu que o mundo existe faz uns dez anos”.

COMUNICAÇÃO

Há, no entanto, quem adote tom menos otimista. David Fleischer, professor de relações internacionais na Universidade de Brasília (UnB), ressalta que “os nossos ‘think tanks’ não cresceram o necessário, acompanhando o tamanho do Brasil”. Para ele, “o Itamaraty age praticamente no vazio” e mostra até “resistência”; de seu lado, as vozes do país no campo das relações internacionais são “individuais, não institucionais”.

Fleischer cobra, em especial, estratégias de comunicação que permitam participação cotidiana no debate de política externa. Lembra que, em Washington, “think tanks” como o Inter-American Dialogue produzem “análises diárias” que abastecem a imprensa.

Os centros de pensamento reconhecem o problema. Lampreia diz que o Cebri está “estudando ativamente” modelos americanos. “Na política de comunicação deles, blog e sites são fortes. Nós aqui quase não temos conteúdo próprio. Temos eventos.”

Spektor também relata um “debate muito intenso” na FGV, opondo uma corrente defensora da manutenção do foco em “pesquisa, não blog” a outra que pleiteia mais atenção à comunicação. Ele cita o modelo do CFR, que “tem um jornalista com grande traquejo de política internacional cujo trabalho é provocar os especialistas –acadêmicos que não escrevem necessariamente num estilo jornalístico– a produzir análises curtas que ele edita”.

Pochmann anuncia que o Ipea, que já lançou uma publicação, “Tempos do Mundo”, está em fase de remodelação, com um “novo plano de comunicação”. Mas a menina dos olhos atual é o “investimento em tecnologia”.

FINANCIAMENTO

Outro nó é o financiamento das atividades dos laboratórios brasileiros de ideias, hoje realizado em bases heterogêneas. Amorim indica que “o grande problema dos ‘think tanks’ –salvo aqueles que se querem claramente partidários ou de apoio a governos± é o de assegurar um mínimo de independência”.

Dono da maior estrutura, o Ipea é estatal e está ligado à Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, o que ajuda a entender a expansão recente.
Embora vinculado à PUC-RJ, também o recém-criado Centro de Estudos e Pesquisas dos Brics tem sustentação estatal (da Prefeitura do Rio). Já o Cebri recebia recursos federais quando foi criado, em 1998, e, “de repente, o governo do PT cortou”, diz Lampreia. Hoje, “é mais ou menos autossuficiente”, com apoio de empresas privadas.

A FGV e os centros de universidades têm o suporte de seus braços educacionais, além de acesso a linhas de financiamento nacionais, a saber, CNPq, Capes e Finep, e internacionais, como Carnegie e British Academy.

CURSOS

É na academia que se origina boa parte do entusiasmo com as perspectivas para os “think tanks” no Brasil. O interesse ficou claro no terceiro encontro da Associação Brasileira de Relações Internacionais, há duas semanas, na USP. “A associação viu um crescimento muito expressivo no número de filiados”, diz Spektor. “A gente fica muito esperançoso com a área. Houve um aumento exponencial no número de cursos de graduação e de pós-graduação.”

A procura pelos cursos de relações internacionais é hoje “muito maior”, atesta Lampreia. “Na década de 1970, havia um. Hoje, são 115. Já encontrei estudante de relações internacionais em Roraima, no Acre e nos lugares em que você menos suspeitaria.”

Amaral, que foi professor na UnB nos anos 80 e 90, relata que, “naquela época, a grande preocupação era se os alunos iriam encontrar mercado de trabalho”. Já hoje os encontros estudantis reúnem “2.500, 3.000 pessoas”. Em contraste, anota, “estamos engatinhando nos ‘think tanks'”.

Celso Amorim contemporiza, chamando atenção para “certa movimentação em torno de temas como Brics e China” nos laboratórios de ideias –o que, ele sugere, configura “um começo”.

Fonte: Folha de S.Paulo

8 Comentários

  1. Acho ótimo que nossos representantes procurem ser mais instruídos do que falar e quando falar.
    Aqguns já tem um dom para isso, outros é melhor ficar de boca calada e discursar lendo, sem perder uma vírgula.
    Na verdade, alguém já disse que cada um de nós, o que dizemos e o que pensamos é produto das diversas heranças que recebemos ,do acumulo de tudo que aprendemos na vida, de todas as suas influências e experiências.
    E não estamos escolhendo bem nossos políticos, é necessário mesmo uma intervenção de assessores realmente qualificados à aconselhá-los.
    Em outros tempos havia um cargo que assessorava os reis :
    CONSELHEIRO.

  2. NÃO SE FAZ MAIS FILÓSOFOS BRASILEIROS COMO ANTIGAMENTE
    .
    .
    Geralmente as elites pensantes do Brasil tem um visão bem grotesca do nosso país,até por que eles não passam de multiplicadores de pensamento europeu,muitos estudam na europa ou nos EUA,passando um bom tempo por lá.
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    Monteiro Lobato,Gilberto Freyre,Celso Monteiro Furtado,…etc;são brasileiros pensantes que contribuiriam em uma idéia política genuinamente brasileira.
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    Trazer idéias de fora com filosofia ultrapassadas e fora do nosso contexto do tipo:
    _“O que é bom para os americanos é bom para o Brasil”,não acrescentam nada para nós.
    .
    Se deve ter idéias genuinamente brasileiras, para que posamos sair definitivamente do atoleiro,sem “engenharia reversas” de filosofia estrangeiras que não servem para nós.

  3. “As ferramentas de comunicação dos laboratórios de ideias nacionais são rudimentares. Além disso, eles têm pouca ressonância no governo, ao contrário do que se observa, por exemplo, na China.”
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    O tradicional sistema imperial de exames foi essencial para identificar as elites, na antiga China. Que papel teve a educação, para combater a corrupção na China moderna?
    ……………..
    *”Como na China tradicional, a China moderna continua competente para identificar pessoas capazes e formadas por bons princípios morais. Uma vez que não há clivagens sociais na China – não, com certeza, no sentido de clivagens fixas, demarcadas e insuperáveis –, a sociedade chinesa é como grãos de areia espalhados numa grande superfície. Tem de haver meios pelos quais alguns desses cidadãos cheguem ao governo, para se encarregarem das tarefas do governo, e têm de ser os melhores, os que mais se destaquem na vida social.
    .
    Há três critérios para identificar e selecionar nossas elites: primeiro, são selecionadas ideologicamente; depois, organizacionalmente, porque todos passam por esse sistema meritocrático. Em todos os casos, para cada seleção há um exame; ninguém é promovido, sem ser avaliado. E em terceiro lugar, nossas elites são avaliadas também no exercício do governo, dentro do grupo governante: têm de demonstrar competência no que fazem; e têm de demonstrar competência na aplicação das políticas que lhes cabe aplicar, nas diferentes regiões do país. Desse modo, a China consegue ter elites avançadas politicamente e organizacionalmente; e são elites, se não uniformes, com certeza qualificadas, numa seleção que não visa a ser neutra.
    O conceito de “neutralidade” não é adequado no caso do governo chinês, porque a sociedade chinesa não é dividida em classes.”
    ……………..
    *Pan Wei, cientista político da Universidade de Pequim, autor de vários livros sobre o modelo chinês.

  4. Nesta linha de “PENSAMENTO ESTRATÉGICO NACIONAL”:
    ——————————
    Professor do PUCG, Luiz Claudio Duarte apresentou a comunicação: Os Conceitos de Segurança e Desenvolvimento: Desvelando o Discurso Esguiano no Simpósio Temático: “Militares, sociedade”, no XXVI Simpósio Nacional de História.
    .
    http://www*proac*uff*br/campos/professor-do-pucg-luiz-claudio-duarte-apresentou-comunicacao-os-conceitos-de-seguranca-e
    ———————————————-
    “V Encontro Nacional (ENABED)
    .
    “Democracia, Defesa e Forças Armadas”
    Fortaleza, de 8 a 10 de agosto de 2011″
    .
    http://www*abed-defesa*org/

  5. começou mal…
    Porque carecemos tanto assim de Think Tanks? Careçemos mesmo? E claro que reconheço sua importancia, mas…
    Que tal desenvolvermos novos modelos institucionais e administrativos e parar com esse papo de: como na china na europa e eua…

  6. Pq temos de seguir modelos de fora ,temos pessoas q pensam e mt , nomes de grd projeçao: como o sr.Mangabeira Unger e mt outros, e só traze-los p cá..e zás , poderá acontecer. Sds

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